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Processo n.º 1028/05
 
 2.ª Secção
 Relator:  Conselheiro  Paulo Mota Pinto
 
                     (Conselheiro Maria Fernanda Palma)
 
  
 
                                                                                  
 
                
 
  
 Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 I. Relatório
 
 1.Por acórdão de 19 de Outubro de 2005, o Supremo Tribunal Administrativo negou 
 provimento ao recurso jurisdicional interposto por A., natural da Ucrânia e 
 melhor identificada nos autos, da sentença proferida no 1.º Juízo Liquidatário 
 do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa que, por irrecorribilidade do acto 
 impugnado, rejeitou o recurso contencioso ali interposto da decisão do Inspector 
 Geral do Trabalho, datada de 3 de Setembro de 2003, que manteve a decisão do 
 Subdelegado do Barreiro do Instituto de Desenvolvimento e Inspecção das 
 Condições de Trabalho/Inspecção Geral do Trabalho (IDICT/IGT), a qual, por sua 
 vez, que indeferira um requerimento de depósito do contrato de trabalho para 
 efeito de concessão à trabalhadora, pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras 
 
 (SEF), de autorização de residência em território nacional. Consequentemente, 
 confirmou a sentença recorrida. Pode ler-se nesse aresto:
 
 «(…)
 
 2. A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos:
 a) Em 07.03.2003, foi entregue no IDICT cópia de um documento denominado 
 
 “contrato de trabalho a termo certo”, em que figuram como outorgantes “B., Lda.” 
 
 [e “A.”];
 b) O documento foi acompanhado de cópias de documentos de identificação da 
 recorrente, de declarações de entidades patronais da mesma e de uma lista dos 
 documentos entregues intitulada “para legalização”;
 c) Do “contrato de trabalho”, datado de 13.12.2002, consta, na cláusula 17.ª, o 
 seguinte: “O original e duas cópias são entregues no IDICT, para promover o 
 depósito de contrato ao abrigo da Lei n.º 20/98, de 12 de Maio, ficando a 
 efectiva resolução deste contrato dependente do deferimento do Depósito do 
 contrato por parte do IDICT”.
 d) Em 09.04.2003, o Subdelegado do IDICT, do Barreiro, emitiu “informação 
 desfavorável”;
 e) A recorrente recorreu hierarquicamente, para o Presidente do IDICT, da 
 decisão do Subdelegado do Barreiro (por lapso, refere-se ‘Delegado de Lisboa’) 
 do IDICT, referida na alínea anterior;
 f) Por despacho de 03.09.2003, o Inspector-Geral do Trabalho indeferiu o recurso 
 hierárquico, mantendo a decisão do Subdelegado do Barreiro (por lapso, refere-se 
 
 ‘Delegado de Lisboa’) do IDICT/IGT.
 
 3. O objecto do presente recurso jurisdicional é a sentença, de fls. 116, ss., 
 dos autos, que rejeitou, por ilegalidade da respectiva interposição, o recurso 
 contencioso do acto da autoria do Inspector Geral do Trabalho, que manteve 
 informação desfavorável do Subdelegado do Barreiro do IDICT/IGT, relativamente 
 ao depósito de contrato de trabalho, para efeito de concessão, pelo Serviço de 
 Estrangeiros e Fronteiras (SEF), de autorização de residência em território 
 nacional à recorrente, cidadã ucraniana. a notificação da entidade recorrida 
 para que junte aos autos cópia dos modelos T.F.1 e T.F.2, emitidos pela IGT. Com 
 o que renovou a pretensão qu
 Na respectiva alegação [Concl. XXVII e al. a)], esta recorrente requereu e 
 anteriormente já formulara e que foi objecto de indeferimento, no despacho de 
 fls. 115, dos autos, o qual não foi objecto de impugnação, designadamente pela 
 recorrente, apesar de devidamente notificado, designadamente à recorrente (vd. 
 fls. 124, 128 e 129, dos autos).
 Pelo que não se conhecerá daquele requerimento.
 Assim sendo, a única questão a decidir consiste em saber se é ou não susceptível 
 de recurso contencioso o impugnado acto do Inspector Geral do Trabalho, que 
 manteve a referida informação/parecer do Subdelegado do Barreiro do IDICT/IGT.
 A sentença recorrida considerou que, sendo tal parecer do IDICT/IGT obrigatório, 
 face ao disposto no art.º 55.º, n.º 1, al. a), do DL n.º 244/98, de 8.8 (red. DL 
 n.º 4/2001, de 10.1), não decorre deste preceito legal que esse mesmo parecer 
 seja vinculativo para a decisão a proferir pelo SEF. Pelo que, terá que 
 considerar-se não vinculativo, em conformidade com o disposto no art.º 98.º do 
 Código do Procedimento Administrativo (CPA), onde se estabelece que “2. Salvo 
 disposição expressa em contrário, os pareceres referidos na lei consideram-se 
 obrigatórios e não vinculativos”.
 Assim, entendeu a sentença que o acto impugnado é meramente preparatório da 
 decisão final a proferir pelo SEF, carecendo, por isso, de alcance lesivo dos 
 direitos e interesses legalmente protegidos da interessada recorrente e sendo, 
 por consequência, insusceptível de impugnação contenciosa. Daí que tenha 
 decidido pela rejeição do recurso contencioso dele interposto.
 Contra este entendimento da sentença, a recorrente, baseando-se em interpretação 
 de diversos preceitos do citado DL n.º 244/98, defende que o questionado parecer 
 do IDICT/IGT tem natureza vinculativa, e, sendo desfavorável, tem alcance lesivo 
 dos seus direitos e interesses legalmente protegidos. Assim, concluiu a 
 recorrente, a referida decisão do IGT constitui um acto administrativo 
 susceptível de recurso contencioso.
 Adiante-se, desde já, que a razão está do lado da sentença recorrida, que 
 decidiu a suscitada questão em termos que correspondem ao entendimento, que 
 temos por acertado, afirmado já nos acórdãos desta 1.ª Secção, de 14.1.04, de 
 
 15.2.02 e de 31.5.05, proferidos, nos processos n.º 1575/03, n.º 788/05 e n.º 
 
 342/05, respectivamente.
 Vejamos.
 O Decreto-Lei n.º 244/98, de 8 de Agosto, regulamentou a entrada, permanência, 
 saída e afastamento de estrangeiros do território nacional.
 Na alínea f) do seu art.º 27.º e no art.º 36.º[1] prevê-se a possibilidade de 
 concessão de vistos de trabalho, que se destinam a permitir ao seu titular a 
 entrada em território português a fim de exercer temporariamente uma actividade 
 profissional, subordinada ou não, que conste de uma lista de oportunidades de 
 trabalho e sectores de actividade elaborada anualmente pelo Governo através de 
 um relatório, mediante parecer do Instituto do Emprego e Formação Profissional e 
 ouvidas as associações patronais e sindicais, visto esse [visto ser] válido para 
 múltiplas entradas em território português e que pode ser concedido para 
 permanência até um ano.
 A concessão de vistos de trabalho para exercício de uma actividade profissional 
 subordinada, que não se insira no âmbito do desporto ou dos espectáculos, como 
 era o caso da referida nos autos[2], carece de consulta prévia ao Serviço de 
 Estrangeiros e Fronteiras – art.º 37.°, alíneas a), b) e d), e 40.°, alínea a), 
 daquele diploma.
 De harmonia com o disposto no art.º 55.°, n.º 1, do mesmo diploma, até à 
 aprovação do relatório governamental previsto no artigo 36.° e em casos 
 devidamente fundamentados, pode ser autorizada a permanência a cidadãos 
 estrangeiros que não sejam titulares de visto adequado e que reúnam as condições 
 aí indicadas, entre as quais se inclui a de serem “titulares de proposta de 
 contrato com informação da Inspecção-Geral do Trabalho” – alínea a) deste 
 número.
 No caso em apreço, foi de uma informação emitida no âmbito desta alínea a) pelo 
 Subdelegado do Barreiro do IDICT/IGT que a recorrente interpôs recurso 
 hierárquico, em que veio a ser praticado o acto recorrido, da autoria do 
 Inspector Geral do Trabalho.
 Na sentença recorrida, entendeu-se que essa informação, que é obrigatória, não 
 tem carácter vinculativo para a decisão final a proferir pelo Serviço de 
 Estrangeiros e Fronteiras, sobre a autorização de permanência em território 
 nacional.
 E, como antes de se disse, é acertado este entendimento.
 Como bem se decidiu, face ao referido quadro legal e perante situação idêntica à 
 dos presentes autos, no referido acórdão de 14.1.03, invocado pela sentença 
 impugnada:
 De harmonia com o disposto no art.º 98.° do C.P.A., “os pareceres são 
 obrigatórios ou facultativos, consoante sejam ou não exigidos por lei; e são 
 vinculativos ou não vinculativos, conforme as respectivas conclusões tenham ou 
 não de ser seguidas pelo órgão competente para a decisão” e, “salvo disposição 
 expressa em contrário, os pareceres referidos na lei consideram-se obrigatórios 
 e não vinculativos”.
 Como resulta do preceituado no corpo do n.º 1 daquele art.º 55.°, ao estabelecer 
 que “pode ser autorizada a permanência a cidadãos estrangeiros que não sejam 
 titulares de visto adequado e que reúnam as seguintes condições”, o 
 preenchimento de todas as condições arroladas nas cinco alíneas seguintes é 
 indispensável para viabilizar a autorização de permanência. Por isso, a obtenção 
 do referido parecer da Inspecção Geral do Trabalho tem de ser considerada 
 obrigatória.
 No entanto, não se faz depender esta viabilidade de a informação da Inspecção 
 Geral do Trabalho ser favorável à pretensão de permanência, nem nada se refere 
 quanto ao carácter vinculativo ou não do referido parecer para o Serviço de 
 Estrangeiros e Fronteiras, quer ele seja favorável quer seja desfavorável.
 Assim, na falta de qualquer disposição expressa que revele tal carácter 
 vinculativo, por força do preceituado no n.º 2 do art.º 98.° do C.P.A. tem de 
 entender-se que aquele parecer é obrigatório, mas não vinculativo.
 Isto é, o interessado não pode obter a autorização de permanência sem que tal 
 parecer seja proferido, mas o facto de ele ser desfavorável não vincula o 
 Serviço de Estrangeiros e Fronteiras a uma decisão de indeferimento do pedido de 
 autorização. Nestas condições, é manifesto que o referido parecer não afecta a 
 esfera jurídica de qualquer dos interessados na concessão da autorização de 
 permanência, pois só a decisão final do procedimento tem tal potencialidade. 
 Assim, aquele parecer tem de ser considerado um mero acto preparatório da 
 decisão final do procedimento tem tal potencialidade. 
 Assim, aquele parecer tem de ser considerado um mero acto preparatório da 
 decisão final do procedimento, sem lesividade autónoma.
 
 5 – O n.º 1 do art.º 25.° da LPTA estabelece a regra de que só os actos 
 definitivos, em todos os aspectos, são contenciosamente impugnáveis.
 Porém, o art.º 268.°, n.º 4, da C.R.P. assegura o direito dos administrados ao 
 recurso contencioso de todos os actos administrativos que lesem os seus direitos 
 ou interesses legalmente protegidos.
 Assim, por força do preceituado neste n.º 4 do art.º 268.° da C.R.P, não pode 
 deixar de se admitir a impugnabilidade contenciosa imediata de actos lesivos, 
 que são actos que têm efeitos negativos na esfera jurídica dos particulares. 
 Esta norma é um corolário, no domínio do contencioso administrativo, do 
 princípio geral, enunciado no n.º 1 do art.º 20.° da C.R.P., do direito dos 
 cidadãos a aceder aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses 
 legalmente protegidos.
 Este direito de acesso aos tribunais, embora não englobado no Título II da Parte 
 I da Constituição, destinado aos “direitos, liberdades e garantias” é, 
 inquestionavelmente, um direito análogo a estes, uma vez que é, ao fim e ao 
 cabo, a primacial garantia da consagração prática de todos os direitos e 
 liberdades. Por isso, por força do preceituado no art.º 17.° da Constituição, 
 que estabelece que “o regime dos direitos, liberdades e garantias aplica-se aos 
 enunciados no título II e aos direitos fundamentais de natureza análoga”, o 
 direito de acesso aos tribunais está sujeito ao disposto no n.º 2 do art.º 18.° 
 que estabelece que “a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias 
 nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições 
 limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses 
 constitucionalmente protegidos”.
 A esta luz, a restrição que o art.º 25.°, n.º 1, da L.P.T.A. faz ao direito de 
 acesso aos tribunais só é compaginável com estas normas constitucionais, se 
 afastar a possibilidade de recurso contencioso em casos em que ele não seja 
 necessário para assegurar a tutela judicial dos direitos, mas não afaste essa 
 possibilidade nos casos em que o interessado necessite dele para assegurar tais 
 direitos.
 Assim, este n.º 1 do art.º 25.° contém um condicionamento do direito ao recurso 
 contencioso que visa apenas afastar a possibilidade de uso de tal meio 
 processual nos casos em que ele é desnecessário.
 Por isso, este condicionamento não é proibido pela Constituição, pois não impede 
 o exercício do direito de impugnação contenciosa de actos lesivos, antes sendo 
 uma medida que visa optimizar a tutela judicial, através do afastamento da 
 possibilidade de acesso aos tribunais quando ele é desnecessário[3].
 
 6 – Freitas do Amaral, em Direito Administrativo, volume III, 1989, páginas 
 
 209-212, refere três aspectos diferentes da definitividade dos actos 
 administrativos, cumulativamente necessários para permitir a qualificação de um 
 acto como definitivo:
 
 - definitividade em sentido horizontal, que se consubstancia em o acto ser o 
 termo do procedimento administrativo;
 
 - definitividade vertical que consiste em o acto ser praticado por quem ocupa a 
 posição suprema na hierarquia;
 
 - definitividade material que existe quando o acto é definidor de situações 
 jurídicas.
 O mesmo Autor define acto materialmente definitivo “o acto administrativo que, 
 no exercício do poder administrativo, define a situação jurídica de um 
 particular perante a Administração, ou da Administração perante um particular”, 
 acto horizontalmente definitivo “o acto administrativo que constitui resolução 
 final de um procedimento administrativo, ou um incidente autónomo desse 
 procedimento, ou ainda que exclui um interessado da continuação num procedimento 
 em curso” e acto verticalmente definitivo “aquele que é praticado por um órgão 
 colocado de tal forma na hierarquia que a sua decisão constitui a última palavra 
 da Administração activa”[4].
 O referido parecer do Senhor Delegado do Instituto de Desenvolvimento e 
 Inspecção das Condições de Trabalho de Lisboa, que foi objecto do recurso 
 hierárquico em que foi praticado o acto impugnado, não é um acto lesivo, directa 
 ou indirectamente, pois ele não produz, por si mesmo, qualquer efeito na esfera 
 jurídica dos destinatários nem determina o sentido da decisão final.
 Por outro lado, este parecer também não é um acto horizontal e materialmente 
 definitivo, pois não concede nem recusa a autorização de permanência e a sua 
 emissão não dispensa a prática de um outro ulterior acto procedimental que 
 contenha uma decisão final, num sentido ou noutro.
 Por isso, o referido parecer não pode ser considerado como acto material e 
 horizontalmente definitivo, nem lesivo, pelo que tem de ser considerado como um 
 mero acto preparatório, que não é contenciosamente recorrível.
 Sendo assim, tem de se considerar correcta a posição assumida na sentença 
 recorrida.
 Assim sendo, conclui-se que a alegação da recorrente é totalmente improcedente.
 
 4. Pelo exposto, acordam em negar provimento ao recurso jurisdicional, 
 confirmando a sentença recorrida.»
 
 [notas de rodapé no original]
 
 2.Inconformada, a recorrente interpôs o presente recurso para o Tribunal 
 Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei 
 de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, pretendendo 
 ver apreciada a constitucionalidade do n.º 1 do artigo 25.º da Lei de Processo 
 dos Tribunais Administrativos, por entender que a interpretação que dela é feita 
 pelo Supremo Tribunal Administrativo “é materialmente desconforme ao disposto no 
 art.º 268.º, n.º 4, da CRP”. Notificada para alegar, concluiu nos seguintes 
 termos:
 
 «(…)
 I.      O que aqui se discute nas presentes alegações é a violação do princípio 
 da plenitude da garantia jurisdicional administrativa, consagrado no art.º 
 
 268.º, n.º 4, da CRP.
 II. Diz o n.º 2 do art.º 18.º da CRP que “a lei só pode restringir os direitos, 
 liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, 
 devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos 
 ou interesses constitucionalmente protegidos”. (sublinhado nosso)
 III.                              A Constituição não prevê, em qualquer lugar, a 
 possibilidade de se restringir o direito constitucional dos administrados à 
 tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos ou interesses legalmente 
 protegidos, antes pelo contrário.
 IV.                               O disposto no n.º 4 do art.º 268.º da CRP 
 obsta à possibilidade de se restringir o direito constitucional dos 
 administrados ao recurso contencioso de todos os actos administrativos que lesem 
 os seus direitos ou interesses legalmente protegidos, ao garantir a plenitude da 
 tutela efectiva desses direitos e interesses legalmente protegidos.
 V.   Entendeu o Supremo Tribunal Administrativo (STA) que o acto impugnado não é 
 um acto lesivo, nem um acto definitivo, sendo antes um mero acto preparatório, 
 que não é contenciosamente recorrível, nos termos do art.º 25.º, n.º 1, da LPTA.
 VI.                               Entende a recorrente que a aplicação do 
 disposto naquele preceito, in casu, é inconstitucional na interpretação que lhe 
 foi dada pelo acórdão sob recurso, por violação do art.º 268.º, n.º 4, da 
 Constituição da República Portuguesa (CRP).
 VII.                           Os Tribunais Administrativos bem sabem que o SEF 
 não recepciona, sequer, os processos que vêm do IDICT com informação 
 desfavorável. 
 VIII.                      A figura jurídica da autorização de permanência surge 
 no âmbito de uma situação de facto, a existência de milhares de cidadãos 
 estrangeiros indocumentados a trabalhar em Portugal – como resulta claramente da 
 Resolução de Conselho de Ministros n.º 164/2001 e do Preâmbulo do Decreto‑Lei 
 n.º 4/2001, de 10/01. 
 IX.                               Diz a Resolução de Conselho de Ministros n.º 
 
 164/2001 que “Considerando que desde a entrada em vigor das alterações 
 introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 4/2001, de 10 de Janeiro, ao Decreto-Lei n.º 
 
 244/98, de 8 de Agosto, até ao final de Julho de 2001, já foram concedidas cerca 
 de 86.000 autorizações de permanência, encontrando-se presentemente em fase de 
 apreciação um número superior a 19.000 pedidos de concessão de autorização de 
 permanência;”
 X.   Decorre do Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 4/2001, de 10/01, que o que se 
 pretendeu com estas introduções foi “garantir os direitos e interesses que se 
 pretenderam salvaguardar aquando da elaboração dos referidos diplomas legais 
 tendo em vista a evolução do fenómeno migratório verificado em Portugal.”
 XI.                               Se por um lado a figura da autorização de 
 permanência surge como uma norma excepcional, porque visa fazer face a uma 
 situação real e concreta, de outro lado é uma figura jurídica mais precária do 
 que a concessão de visto de trabalho.
 XII.                           Se atendermos à tramitação da obtenção de visto 
 de trabalho, nomeadamente do tipo IV, e no qual o contrato de trabalho sub 
 judice se insere, constatamos que no âmbito do n.º 1 do art.º 43.º do 
 Decreto-Lei n.º 244/98, o visto de trabalho IV só é concedido com parecer 
 favorável da Inspecção Geral do Trabalho. (sublinhado nosso).
 XIII.                      Decorre claramente da Lei, respeitando o preceituado 
 no art.º 98.º, n.º 2, do CPA, que no caso de obtenção de visto de trabalho IV o 
 parecer da IGT não só é obrigatório como também vinculativo. 
 XIV.                        Uma vez que as tramitações, quer do visto de 
 trabalho quer da autorização de permanência, exigem que os respectivos processos 
 se façam no âmbito do mesmo Decreto-Lei, o 244/98, e passem pelas mesmas 
 entidades, IGT e SEF, bem se compreende que o SEF exija um parecer favorável 
 daquela entidade quando decorre da lei que para o visto de trabalho esse parecer 
 favorável para além de obrigatório é vinculativo de acordo com o art.º 43.º do 
 Decreto-Lei n.º 244/98.
 XV.                            E nem se alegue que a regra do art.º 55.º é de 
 natureza excepcional e por isso nunca comportaria analogia. Na verdade é de se 
 fazer uma interpretação extensiva do que resulta do art.º 43.º do Decreto-Lei 
 n.º 244/98 com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 4/2001, de 10/01.
 XVI.                        Atendendo a que a tramitação do visto de trabalho 
 bem como a autorização de permanência se baseiam no mesmo Decreto-Lei e ambas 
 passam pelas mesmas entidades resulta que o legislador, ao formular a norma, 
 disse menos do que queria e claro está que se para o visto de trabalho se exige 
 o parecer favorável do IGT também para a autorização de permanência o exigirá.
 XVII.                   E outro argumento entende a recorrente existir a seu 
 favor quando nos deparamos com o descrito no n.º 7.º do art.º 55.º do 
 Decreto-Lei n.º 244/98, O contrato de trabalho deve ser elaborado nos termos do 
 disposto na Lei n.º 20/98, de 12/05...”.
 XVIII.                Diz o art.º 4.º, n.º 1, que “A entidade empregadora deve, 
 previamente à data do início da actividade pelo trabalhador estrangeiro, 
 promover o depósito do contrato de trabalho na delegação ou 
 subdelegações...IDICT”.
 XIX.                        Continua o n.º 2: “Depositado o contrato de 
 trabalho, um exemplar selado fica arquivado nos serviços do IDICT e dois 
 exemplares são devolvidos à entidade empregadora com o averbamento e número de 
 depósito, devendo esta fazer a entrega de uma ao trabalhador”.
 XX.                            Conclui o n.º 3: “Considera-se tacitamente 
 deferido o pedido de depósito do contrato de trabalho quando, decorridos 30 dias 
 sobre a data da apresentação do requerimento respectivo no serviço competente do 
 IDICT, não for proferida decisão de aceitação ou recusa.” (sublinhado nosso)
 XXI.                        O que decorre da conjugação destes números é que, 
 para que seja atribuído um número e consequentemente o averbamento do depósito 
 do contrato de trabalho de cidadão estrangeiro é necessário que seja proferida 
 
 “decisão de aceitação”, leia-se parecer favorável, para que o processo de 
 legalização siga a sua tramitação legal.
 XXII.                   Dada a importância do parecer do IDICT (vd. art.º 4.º, 
 n.º 1, 2 e 3, da Lei n.º 20/98), no sentido de viabilizar ou não a legalização 
 de trabalhador estrangeiro, é que o legislador entendeu fugir à regra do 
 indeferimento tácito e considerar que no caso de omissão de aceitação ou recusa 
 no prazo de 30 dias, se devia considerar tal parecer favorável concedido ou 
 aceite.
 XXIII.               Diz o art.º 55.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 
 
 244/98, de 08/08, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 4/2001, 
 de 10/01, que “Até à aprovação do relatório previsto no art.º 36.º, e, em casos 
 devidamente fundamentados, pode ser autorizada a permanência a cidadãos 
 estrangeiros que não sejam titulares de visto adequado que reúnam as seguintes 
 condições: a) Sejam titulares de proposta de contrato com informação da 
 Inspecção-geral de Trabalho;”
 XXIV.                Diz o art.º 55.º, n.º 7, que “O contrato de trabalho deve 
 ser elaborado nos termos do disposto na Lei n.º 20/98, de 12/05...”.
 XXV.                     Sendo certo que o art.º 4.º, n.º 1, da Lei n.º 20/98, 
 de 12/05 diz que “A entidade empregadora deve, previamente à data do início da 
 actividade pelo trabalhador estrangeiro, promover o depósito do contrato de 
 trabalho na delegação ou subdelegações...IDICT” (sublinhado nosso)
 XXVI.                Por sua vez o n.º 3 do art.º 3.º da citada Lei, exige que 
 ao contrato de trabalho seja apenso documento comprovativo do cumprimento das 
 disposições legais, relativas à entrada e à permanência ou residência do cidadão 
 estrangeiro em Portugal.
 XXVII.            O art.º 55.º do Decreto-Lei n.º 244/98 por um lado exige, no 
 seu n.º 7, que o contrato de trabalho seja elaborado de harmonia com o disposto 
 na Lei n.º 20/98, de outro lado, no seu n.º 1, exige que os cidadãos 
 estrangeiros sejam titulares de proposta de contrato de trabalho, com informação 
 da IGT. Ou bem que o processo de depósito de contrato de trabalho se inicia pelo 
 IGT ou bem que se inicia pelo SEF.
 XXVIII.       Note-se que do n.º 5 do art.º 55.º decorre, ainda, que após a 
 concessão de autorização de permanência o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras 
 notificará a entidade empregadora, para efeitos de comunicação ou de depósito do 
 contrato, quando exigível (sublinhado nosso).
 XXIX.                Bem sabe a entidade recorrida como os tribunais 
 administrativos, que o processo de regularização de um cidadão estrangeiro, para 
 obter visto de autorização de permanência, se inicia com o depósito de contrato 
 de trabalho ou pedido de informação favorável a esse mesmo depósito, condição 
 essencial para seguir os trâmites legais para o SEF, aliás como resulta 
 claramente de todo o art.º 55.º.
 XXX.                     Se atendêssemos apenas ao teor literal da alínea a) do 
 n.º 1 do citado art.º 55.º, os cidadãos estrangeiros que apresentassem propostas 
 de trabalho, ou seja, qualquer cidadão estrangeiro que já tivesse celebrado 
 contrato de trabalho com a entidade patronal, que já se encontrasse a executar 
 esse mesmo trabalho, pagando impostos e contribuindo para o sistema da Segurança 
 Social, ficaria desde logo impedido de recorrer à figura da autorização de 
 permanência.
 XXXI.                São considerados actos administrativos, as decisões dos 
 
 órgãos da Administração, que ao abrigo de normas de direito público, visem 
 produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta, de acordo com o 
 disposto no artigo 120.º do CPA.
 XXXII.            É pacífico que a decisão do Inspector-Geral do Trabalho que 
 manteve o indeferimento do requerimento para obtenção de parecer favorável, 
 sobre o contrato de trabalho da recorrente, constitui um acto administrativo, ou 
 seja, trata-se de uma decisão de um ente administrativo que, ao abrigo de normas 
 de direito público, visa produzir efeitos jurídicos numa situação individual e 
 concreta.
 XXXIII.       Após a revisão constitucional de 1989, o critério de selecção dos 
 actos administrativos que se consideram contenciosamente impugnáveis, deixou de 
 assentar nas características da definitividade e da executoriedade do acto, para 
 passar a determinar-se pela virtualidade de o acto em causa lesar direitos ou 
 interesses legalmente protegidos.
 XXXIV.         E tanto assim é, que o legislador no novo Código de Processo nos 
 Tribunais Administrativos, no art.º 51.º, n.º 1, veio consagrar o princípio da 
 plenitude da tutela jurisdicional, em harmonia com o disposto no n.º 4 do art.º 
 
 268.º da CRP, determinando o recurso de actos administrativos susceptíveis de 
 lesar direitos e interesses legalmente protegidos. (sublinhado nosso)
 XXXV.             De acordo com o n.º 4 do artigo 268.º da CRP o acto lesivo é 
 susceptível de recurso contencioso.
 XXXVI.         É um acto lesivo, o acto administrativo que produz efeitos 
 negativos na esfera jurídica do interessado, afectando os seus direitos ou 
 interesses legalmente protegidos. 
 XXXVII.    A emissão de um parecer favorável ou desfavorável por parte da 
 Inspecção-Geral do Trabalho é um dos muitos actos que formam o procedimento 
 administrativo, definido no artigo 1.º, n.º 1, do CPA.
 XXXVIII.                                 Para a recorrente, a emissão de um 
 parecer desfavorável sobre o seu contrato de trabalho, uma das condições para a 
 sua autorização de permanência em território português, constitui, 
 inequivocamente, um acto lesivo.
 XXXIX.         O n.º 1 do artigo 25.º da LPTA, tem de ser interpretado de 
 harmonia com o n.º 4 do artigo 268.º da CRP, sendo recorríveis os actos que, 
 independentemente da sua forma, tenham idoneidade para, só por si, lesarem 
 direitos ou interesses legítimos dos particulares. 
 XL.                            São recorríveis, todos os actos administrativos 
 que afectem os direitos ou interesses legalmente protegidos dos particulares e, 
 o que determina a sua recorribilidade são os efeitos que deles decorrem e o seu 
 carácter lesivo, independentemente de o acto ser definitivo ou executório. 
 XLI.                        Termos em que deve ser declarada a 
 inconstitucionalidade da norma constante do art.º 25.º, n.º 1, da LPTA, na 
 interpretação que lhe foi dada pelo Tribunal a quo, por violação do art.º 268.º, 
 n.º 4, da Constituição da República Portuguesa.»
 Nas suas contra-alegações, concluiu o Inspector-Geral do Trabalho:
 
 «- a informação/parecer do Senhor Delegado do Instituto de Desenvolvimento e 
 Inspecção das Condições de Trabalho de Lisboa que foi objecto do recurso 
 hierárquico em que foi praticado o acto impugnado não é um acto lesivo, directa 
 ou indirectamente, pois ele não produz efeito na esfera jurídica de A., nem 
 determinou a decisão final de autorização de permanência a praticar pelo Serviço 
 de Estrangeiros e Estrangeiros.
 
 - constituindo um acto intercalar do procedimento, preparatório da decisão final 
 e sem carácter vinculativo, a informação/parecer da IGT pode ou não ser 
 considerada pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras na produção do acto final 
 que culmina o procedimento de autorização de permanência, acto esse sim que 
 afecta de forma lesiva a esfera jurídica de A., e portanto, recorrível 
 contenciosamente.
 Nestes termos, e nos melhores de direito não deve a norma em referência ser 
 declarada inconstitucional, quando interpretada e aplicada no sentido de não 
 impedir o exercício do direito de impugnação contenciosa de actos lesivos, mas 
 tão somente afastar a possibilidade de acesso aos tribunais quando esta é 
 desnecessária, optimizando assim a via judicial efectiva.»
 
 3.Já no Tribunal Constitucional foi elaborado, pela Relatora, o “memorando” que 
 se transcreve:
 
 «1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos 
 do Supremo Tribunal Administrativo, em que figura como recorrente A. e como 
 recorrido o Inspector-Geral do Trabalho, é submetido à apreciação do Tribunal 
 Constitucional a norma do artigo 25.º da Lei de Processo nos Tribunais 
 Administrativos interpretada no sentido de ser irrecorrível um acto preparatório 
 da decisão final da Administração (nos autos está em causa uma informação 
 desfavorável do Delegado da Inspecção-Geral do Trabalho sobre um contrato de 
 trabalho, do qual a recorrente é parte, no âmbito de um processo de autorização 
 de permanência em território nacional de cidadão estrangeiro).
 Pela essencial das razões constantes do voto de vencida aposto no Acórdão n.º 
 
 115/96, reiterado no Acórdão n.º 40/01, entendo que a norma que constitui 
 objecto do presente recurso de constitucionalidade é inconstitucional, por 
 violação do n.º 4 do artigo 268.º da Constituição.
 
 É verdade que nesses arestos, nos quais as questões subjacentes se relacionavam 
 com a contagem do tempo de serviço no âmbito de um processo de aposentação e com 
 a aprovação de um projecto de arquitectura no âmbito de um processo de 
 licenciamento de construção, respectivamente, a questão da vinculatividade do 
 acto preparatório não se colocou como surge no presente recurso. Com efeito, 
 nestes autos o tribunal recorrido assumiu que o acto preparatório (o parecer 
 desfavorável sobre o contrato de trabalho) não vincula a decisão final do 
 processo de autorização de permanência de estrangeiro em território nacional.
 No entanto, é inegável que o parecer desfavorável proferido fragiliza a posição 
 da recorrente, repercutindo-se negativamente nas possibilidades de procedência 
 da pretensão deduzida (o pedido de autorização de permanência). Ora, o juízo de 
 constitucionalidade a formular não pode evitar a ponderação dessa circunstância.
 
 2. Reitero assim o entendimento constante do voto de vencida referido, acrescido 
 das presentes considerações, propugnando a inconstitucionalidade da norma em 
 apreciação.»
 Inscrito o processo em tabela, e após mudança de Relator, cumpre apreciar e 
 decidir.
 II. Fundamentos
 
 4.A dimensão normativa em causa nos presentes autos corresponde à norma do 
 artigo 25.º da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos, aprovada pelo 
 Decreto‑Lei n.º 267/85, de 16 de Julho, interpretada no sentido de não admitir 
 recurso contencioso contra uma informação/parecer desfavorável da 
 Inspecção-Geral do Trabalho sobre um contrato de trabalho, do qual a recorrente 
 
 é parte, no âmbito de um procedimento de autorização de permanência em 
 território nacional de cidadão estrangeiro, com fundamento em que se trata de um 
 acto meramente preparatório, que não produz efeitos na esfera jurídica do 
 administrado, não sendo vinculante para a decisão final sobre a autorização de 
 permanência, a tomar pelo Serviço de Estrangeiros e Estrangeiros.
 A recorrente rematou as suas alegações de recurso defendendo, entre o mais, que 
 
 “decorre claramente da Lei, respeitando o preceituado no art.º 98.º, n.º 2, do 
 CPA, que no caso de obtenção de visto de trabalho IV o parecer da IGT não só é 
 obrigatório como também vinculativo” (conclusão XIII) e que, para si, “a emissão 
 de um parecer desfavorável sobre o seu contrato de trabalho, uma das condições 
 para a sua autorização de permanência em território português, constitui, 
 inequivocamente, um acto lesivo” (conclusão XXXVIII). O tribunal recorrido 
 entendeu, porém, que “na falta de qualquer disposição expressa que revele tal 
 carácter vinculativo, por força do preceituado no n.º 2 do art.º 98.° do C.P.A., 
 tem de entender-se que aquele parecer é obrigatório, mas não vinculativo”, e que 
 
 “o referido parecer não pode ser considerado como acto material e 
 horizontalmente definitivo, nem lesivo, pelo que tem de ser considerado como um 
 mero acto preparatório, que não é contenciosamente recorrível.”
 Recorde-se que a aplicação de uma determinada norma ou dimensão normativa pelo 
 tribunal recorrido – e o seu entendimento ou interpretação – constituem para o 
 Tribunal Constitucional um dado, que este Tribunal tem de aceitar como base para 
 o recurso de constitucionalidade, que visa apenas a apreciação da 
 constitucionalidade de normas. Como se escreveu já no Acórdão n.º 44/85 
 
 (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 5º vol., p. 408):
 
 “(…) Para o Tribunal Constitucional a norma de direito infra-constitucional que 
 vem questionada no recurso é um dado; cabe-lhe apenas verificar se essa norma é 
 ou não inconstitucional. Saber se essa norma era ou não aplicável ao caso, se 
 foi ou não bem aplicada, isso é da competência dos tribunais comuns, e não do 
 Tribunal Constitucional. Em princípio, o Tribunal Constitucional não pode 
 censurar o modo como os restantes tribunais aplicam o direito 
 infra-constitucional; apenas lhe compete controlar o modo como eles aplicam (ou 
 não) o direito constitucional.”
 Tendo, pois, o tribunal recorrido assumido que o acto em causa é um acto 
 preparatório – a informação/parecer sobre o contrato de trabalho – que não 
 vincula a decisão final da Administração (do procedimento de autorização de 
 permanência de estrangeiro em território nacional), o Tribunal Constitucional 
 não pode no presente recurso alterar tal entendimento, que constitui um 
 pressuposto da dimensão normativa impugnada.
 Assim sendo, importa recordar que, no acórdão n.º 283/2001 (publicado no Diário 
 da República, II Série, de 8 de Novembro de 2001, e disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt), este Tribunal decidiu, num caso em que estava em 
 causa dimensão interpretativa substancialmente idêntica à ora em apreciação, não 
 julgar inconstitucional a norma do n.º 1 do artigo 25.º da Lei de Processo nos 
 Tribunais Administrativos (no caso, interpretada no sentido de considerar 
 irrecorrível uma deliberação do Conselho Científico da Faculdade de Direito de 
 Lisboa de não propor uma renovação do contrato do então recorrente, por não ser 
 essa deliberação imediatamente lesiva dos seus direitos e interesses legalmente 
 protegidos, mas tão-só eventual). Pode ler-se na respectiva fundamentação:
 
 «2.1. Assim delimitado o objecto do recurso, ou seja, restrito à interpretação 
 normativa do artigo 25.º, n.º 1, da LPTA, no sentido de considerar irrecorrível 
 a deliberação do Conselho Científico da Faculdade de Direito de Lisboa, de 12 de 
 Março de 1986, de não propor a renovação do contrato do recorrente, não sendo 
 esta imediatamente lesiva dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, 
 mas tão só eventual, vejamos, então, se este entendimento afronta o disposto no 
 n.º 4 do artigo 268.º da Constituição.
 As questões convocadas pelo recorrente foram já objecto de apreciação neste 
 Tribunal pelos acórdãos n.ºs 9/95 (publicado no Diário da República, II Série, 
 de 22 de Março de 1995), 603/95 (publicado no Diário da República, II Série, de 
 
 14 de Março de 1996), 115/96 (publicado no Diário da República, II Série, de 6 
 de Maio de 1996) e 32/98 (publicado no Diário da República, II Série, de 9 de 
 Março de 1998), entre outros.
 Conforme se conclui no acórdão 9/95, a respeito da garantia consagrada no artigo 
 
 268.º, n.º 4 (redacção da Lei n.º 1/89, de 8 de Julho), da Constituição:
 
 “O sentido da garantia constitucional de recurso contencioso contra actos 
 administrativos ilegais é, portanto, este: ali onde haja um acto da 
 Administração que defina a situação jurídica de terceiros, causando-lhe lesão 
 efectiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, existe o direito 
 de impugná-lo contenciosamente, com fundamento em ilegalidade. Tal direito de 
 impugnação contenciosa já não existe, se o acto da Administração não produz 
 efeitos externos ou produz uma lesão de direitos ou interesses apenas 
 potencial”.
 A este respeito, acrescentou-se no acórdão n.º 115/96, a propósito da redacção 
 dada ao n.º 4 do artigo 268.º pela 2.ª revisão constitucional – Lei 
 Constitucional n.º 1/89, de 8 de Julho –, em confronto com o texto anterior – o 
 n.º 3 do artigo 268.º, que:
 
 “A intenção terá sido a de ampliar o âmbito do recurso contencioso de modo a 
 abranger quaisquer actos administrativos, tornando-os sindicáveis, desde que 
 lesantes de ‘direitos ou interesses legalmente protegidos’ e, do mesmo passo, 
 abandonou-se a referência à executoriedade e à definitividade desses actos, de 
 conceituação polémica ou, pelo menos, de formalização excessiva.
 Como se observou na discussão parlamentar deste preceito constitucional, fez-se 
 recair directamente a recorribilidade do acto na circunstância de ele lesar os 
 direitos ou interesses legalmente protegidos, reconhecendo-se que as apontadas 
 características de executoriedade e de definitividade, a que a LPTA se refere 
 ainda, acabavam por diminuir as garantias de defesa do administrado, reduzindo 
 as possibilidades do recurso contencioso (cfr. Deputado Rui Machete, in Diário 
 da Assembleia da República, II Série, n.º 55-RC, de 7 de Novembro de 1988, pág. 
 
 1740).
 A possibilidade de impugnação de um acto administrativo implica que se trate de 
 uma decisão de autoridade tomada no uso de poderes jurídico‑administrativos com 
 vista à produção de efeitos jurídicos externos sobre determinado caso concreto, 
 o que, em princípio, exclui da recorribilidade os actos internos e os actos 
 preparatórios. Nas palavras de Gomes Canotilho e Vital Moreira, ‘nestes casos 
 não existem efeitos externos ou existem apenas efeitos prodrómicos de um acto 
 procedimental que só se torna acto decisório através do acto conclusivo do 
 procedimento’; só assim não será, segundo os mesmos autores, se estes forem 
 idóneos para produzir efeitos imediatamente lesivos (e, por conseguinte efeitos 
 externos) porque então, sendo actos preparatórios dotados de efeitos próprios de 
 um acto administrativo, já são susceptíveis de impugnação contenciosa (cfr. 
 Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra, 3.ª ed., 1993, pág. 939).
 O Tribunal Constitucional, de resto, também assim o vem entendendo, como 
 exemplifica o seu acórdão n.º 9/95, já citado, onde se fala de uma purificação 
 do conceito de acto administrativo contenciosamente impugnável, segundo a qual, 
 
 ‘o que a garantia constitucional da accionabilidade dos actos administrativos 
 ilegais procura assegurar é que haja sempre a possibilidade de sindicar 
 judicialmente, com fundamento na sua ilegalidade, todo e qualquer acto de 
 autoridade que produz ofensa de situações juridicamente reconhecidas (isto é, 
 que tenha efeitos externos)’. No domínio do contencioso de anulação – como mais 
 se acrescenta, seguindo-se Rogério E. Soares, ‘O acto administrativo’, in 
 Scientia Iuridica, T. XXXIX, 1990, pág. 32) – há-de, no entanto, excluir‑se todo 
 e qualquer acto que não esteja a concretizar lesões, todo o acto que no 
 procedimento serve apenas actos de primeira grandeza”.
 Deste modo, a interpretação sufragada na decisão recorrida que, entendendo que o 
 acto em causa não tinha idoneidade para autonomamente produzir efeitos lesivos 
 da esfera jurídica do interessado, não era autonomamente recorrível, nos termos 
 do artigo 25.º, n.º 1, e, bem, assim, do artigo 34.º, da Lei de Processo nos 
 Tribunais Administrativos, está de acordo com a jurisprudência do Tribunal 
 Constitucional sufragada, entre outros, nos arestos acima referidos, cuja 
 fundamentação aqui, no essencial, se acolhe.
 
 2.2. É certo que a Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de Setembro, deu nova 
 redacção aos n.ºs 4 e 5 do artigo 268.º e levou a cabo duas transformações 
 notáveis, como salientou o Deputado Barbosa de Melo: «a primeira é que o nº4 
 integra, num todo harmónico, o que actualmente, sem grande aprumo racional, anda 
 derramado pelos n.ºs 4 e 5 vigentes; a segunda consta do n.º 5, no ponto em que 
 este consagra inequivocamente o direito de acção contra regulamentos da 
 Administração que afectem desfavorável e directamente cidadãos nos seus direitos 
 e interesses» (Diário da Assembleia da República, VII legislatura, 2.ª sessão 
 legislativa, reunião plenária de 30 de Julho de 1997, página 3955).
 Com a redacção introduzida, o n.º 4 deste preceito passou a ficar redigido de 
 modo a garantir aos administrados «tutela jurisdicional efectiva dos seus 
 direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo, nomeadamente, o 
 reconhecimento desses direitos ou interesses, a impugnação de quaisquer actos 
 administrativos que os lesem, independentemente da sua forma, a determinação da 
 prática de actos administrativos legalmente devidos e a adopção de medidas 
 cautelares adequadas».
 O que o legislador constitucional pretendeu foi deixar claro que «o princípio da 
 plenitude da garantia jurisdicional administrativa – a mais do que obrigar o 
 legislador a regular o clássico direito ao recurso contencioso contra actos 
 administrativos; e, bem assim, o direito de acesso à justiça administrativa para 
 tutela dos direitos ou interesses legalmente protegidos (nomeadamente, das 
 acções para o reconhecimento desses direitos ou interesses) – obriga-o a prever 
 meios processuais que permitam ao administrado exigir da Administração a prática 
 de actos administrativos legalmente devidos (acções cominatórias) e, quando for 
 o caso, lançar mão de medidas cautelares adequadas». É que tudo são 
 manifestações (concretizações) do direito de acesso aos tribunais para defesa, 
 por banda dos administrados, dos “seus direitos e interesses legalmente 
 protegidos”, como dispõe o n.º 1 do artigo 20.º da Constituição» (cfr. acórdãos 
 n.ºs 104/99, 105/99 e 469/99, publicados no Diário da República, II Série, de 10 
 de Abril de 1999, 15 de Maio de 1999 e 14 de Março de 2000, respectivamente).
 
 “Todavia, da consagração desta garantia de protecção jurisdicional, dirigida à 
 protecção dos particulares através dos tribunais, e deste direito de impugnação 
 dos actos administrativos lesivos, não tem de decorrer a impossibilidade de 
 condicionamento, pelo legislador, de tal recurso contencioso à existência de uma 
 necessidade concreta de protecção judicial do particular – ou, o que é o mesmo, 
 não decorre uma obrigatória impugnabilidade jurisdicional imediata de todos os 
 actos, ainda que mediatamente lesivos, independentemente de se tratar de um acto 
 que traduza a última palavra da Administração”, como se salientou no acórdão n.º 
 
 40/2001 (publicado no Diário da República, II Série, de 9 de Março de 2001).
 
 2.3. Por outro lado, também não se mostra violado o disposto no artigo 20.º da 
 Constituição, conforme se salientou no acórdão 32/98, já citado, “pois aquela 
 disposição constitucional consagra de forma genérica o direito de acesso aos 
 tribunais, que é concretizado pelo artigo 268.º, n.º 4, da CRP, estabelecendo o 
 direito de acesso aos tribunais administrativos, pelo que, não se demonstrando a 
 violação desta norma constitucional, pela mesma ordem de razões não poderá 
 resultar qualquer ofensa ao princípio genérico de que a última é uma 
 concretização”.
 Sendo assim, a interpretação dada pelo acórdão recorrido ao n.º 1 do artigo 
 
 25.º, e, bem assim, ao artigo 34.º, da Lei de Processo nos Tribunais 
 Administrativos, não viola os artigos 20.º e 268.º, n.º 4, da Constituição, nem 
 reduz, de forma desproporcionada e injustificada, a garantia de protecção 
 jurisdicional consagrada na Lei Fundamental.»
 
 5.A conclusão assim obtida, no sentido da não inconstitucionalidade da solução 
 normativa então em apreço, é transponível para os caso dos autos. Neste, a 
 informação/parecer desfavorável sobre o contrato de trabalho, inserida num 
 procedimento que conduz à emissão de outro acto administrativo, esse final – a 
 autorização de permanência de estrangeiro em território nacional –, enquanto 
 acto funcionalmente não autónomo, não representa a última palavra da 
 Administração na matéria, nem produz efeitos imediatamente lesivos da posição do 
 administrado, na medida em que não é vinculativo.
 Ora, independentemente da questão de saber qual é a solução preferível de jure 
 condendo, ou que corresponde ao melhor Direito, é certo que a reacção contra uma 
 lesão eventualmente resultante da informação/parecer desfavorável sobre o 
 contrato de trabalho não tem, por força da norma constitucional que consagra o 
 recurso contencioso de actos administrativos, que poder efectivar-se logo 
 através do recurso aos tribunais, antes sendo legítima a exigência pelo 
 legislador de que tal reacção seja dirigida contra o acto em que vem a culminar 
 o procedimento administrativo. Podendo recorrer-se contenciosamente do acto 
 final, definitivo, não é violada a garantia constitucional de impugnação 
 contenciosa dos actos administrativos lesivos de direitos ou interesses 
 legalmente protegidos.
 III. Decisão
 Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide:
 a)        Não julgar inconstitucional a norma do artigo 25º, n.º 1, da Lei de 
 Processo nos Tribunais Administrativos, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 267/85, de 
 
 16 de Julho, interpretada no sentido de não admitir imediato recurso contencioso 
 contra uma informação/parecer não vinculativo da Inspecção-Geral do Trabalho 
 sobre um contrato de trabalho em que a recorrente é parte, no âmbito de um 
 procedimento de autorização de permanência em território nacional de cidadão 
 estrangeiro.
 b)        Consequentemente, negar provimento ao recurso e confirmar a decisão 
 recorrida no que à questão de constitucionalidade respeita;
 c)         Condenar a recorrente em custas, com 20 (vinte )   unidades de conta 
 de taxa de justiça.
 
  
 
  
 Lisboa, 17 de Janeiro de 2007
 Paulo Mota Pinto
 Mário José de Araújo Torres
 Benjamim Rodrigues
 
                                       Maria Fernanda Palma (vencida nos termos 
 da declaração de voto junta)
 Rui Manuel Moura Ramos
 
  
 
  
 
  
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 
                  
 Votei vencida o presente Acórdão em face do seguinte:
 Nestes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Supremo 
 Tribunal Administrativo, é submetida à apreciação do Tribunal Constitucional a 
 norma do artigo 25.º da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos 
 interpretada no sentido de ser irrecorrível um acto preparatório da decisão 
 final da Administração (nos autos está em causa uma informação desfavorável do 
 Delegado da Inspecção-geral do Trabalho sobre um contrato de trabalho, do qual a 
 recorrente é parte, no âmbito de um processo de autorização de permanência em 
 território nacional de cidadão estrangeiro).
 Pelo essencial das razões constantes do voto de vencida aposto no Acórdão nº 
 
 115/96, reiterado no Acórdão n.º 40/01, entendo que a norma que constitui 
 objectivo do presente recurso de constitucionalidade é inconstitucional, por 
 violação do nº 4 do artigo 268º da Constituição.
 
                  É verdade que nesses arestos, nos quais as questões subjacentes 
 se relacionavam com a contagem do tempo de serviço no âmbito de um processo de 
 aposentação e com a aprovação de um projecto de arquitectura no âmbito de um 
 processo de licenciamento de construção, respectivamente, a questão da 
 vinculatividade do acto preparatório não se colocou como surge no presente 
 recurso. Com efeito, estes autos o tribunal recorrido assumiu que o acto 
 preparatório (o parecer desfavorável sobre o contrato de trabalho) não vincula a 
 decisão final do processo de autorização de permanência de estrangeiro em 
 território nacional.
 
                  No entanto, é inegável que o parecer desfavorável proferido 
 fragiliza a posição da recorrente, repercutindo-se negativamente nas 
 possibilidades de procedência da pretensão deduzida (o pedido de autorização de 
 permanência). Ora, o juízo de constitucionalidade a formular não pode evitar a 
 ponderação dessa circunstância.
 Reitero assim entendimento constante do voto de vencida referido, acrescido 
 destas considerações, votando vencida a decisão do Tribunal quanto à não 
 inconstitucionalidade da norma em apreciação.
 
                                         Maria Fernanda Palma
 
  
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 [1] A redacção do Decreto-Lei n.º 244/98 a considerar é a resultante do 
 Decreto-Lei n.º 4/2001, de 10 de Janeiro, vigente à data em que ocorreram os 
 factos.
 
 [2] O contrato de trabalho refere-se a serviços de limpeza, como se vê pelo 
 
 ‘processo instrutor’.
 
 [3] Aceitando a constitucionalidade do art.º 25.º, n.º 1, da L.P.T.A., podem 
 ver-se os seguintes acórdãos do Tribunal Constitucional:
 
 - n.º 9/95, de 11-1-95, proferido no processo n.º 728/92, publicado no Diário da 
 República, II Série, de 22-3-95, página 3160, e em Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional, 30.º Volume, página 333, e no Boletim do Ministério da Justiça, 
 n.º 446 (Suplemento), página 121;
 
 - n.º 603/95, de 7-11-95, proferido no processo n.º 223/96, publicado em 
 Acórdãos do Tribunal Constitucional, 32.º Volume, página 411, e no Diário da 
 República, II Série, de 14-3-96;
 
 - n.º 115/96, de 6-2-96, proferido no processo n.º 378/93, publicado no Boletim 
 do Ministério da Justiça, n.º 454, página 218;
 
 - n.º 32/98, de 22-1-98, publicado no Diário da República, II Série, de 19-3-98;
 
 - n.º 425/99, de 30-6-99, proferido no processo n.º 1116/98, publicado no Diário 
 da República, II Série, de 3-12-99.)
 
 [4] Obra e volume citados, páginas 214, 223 e 234.