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Processo n.º 204/09
 
 2ª Secção
 Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro
 
 
 
      Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
 
             
 I - Relatório   
 
  
 
 1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos 
 do Tribunal da Relação de Lisboa, em que são recorrentes A. e B. e recorrido o 
 Ministério Público, o relator proferiu decisão sumária nos termos seguintes:
 
 «2. Os recorrentes pretendem ver apreciadas duas questões.
 A primeira refere-se à «inconstitucionalidade interpretativa da norma contida no 
 artigo 254.°, n.° 2, do Código de Processo Civil, em conjugação e concomitância 
 com as normas dos artigo 24.°, n.° 5, alínea a), artigo 26.°, n.° 1, artigo 
 
 31.°, n.°s 1 e 2, todos estes da Lei n.° 34/2004, de 29 de Julho, na redacção 
 anterior à entrada em vigor das alterações introduzidas pela Lei n.° 47/2007, de 
 
 28 de Agosto, aplicável in casu, com a interpretação emanente da decisão sumária 
 proferida pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, confirmando a anterior 
 da 1.ª Instância, ainda que ambas imperfeitamente expressas, de que se basta a 
 norma da presunção de notificação com a informação dada aos autos de que ela foi 
 efectuada por correio simples em dia determinado, sem necessidade de aferição da 
 data do registo postal.».
 Os recorrentes afirmam que suscitaram esta questão, perante o Tribunal da 
 Relação de Lisboa, na reclamação que apresentaram da decisão sumária do relator 
 naquele Tribunal, proferida em 26.08.2008. Mas nessa reclamação limitam-se a 
 referir o seguinte:
 
 «(…) numa interpretação normativa que os recorrentes subscrevem e que têm por 
 correcta [a posição do Ministério Público que aí transcrevem], o entendimento 
 diferente daquelas normas plasmado na decisão sumária ora submetida à 
 conferência é, de todo, inconstitucional, por violação dos artigos 3.º, n.º 2, 
 
 13.º, 18.º, n.ºs 1 e 2, 20.º, n.ºs 1, 4 e 5, 202.º, n.º 2, 203.º, 266.º, e 
 
 268.º, n.º 3, todos da Constituição da República Portuguesa, o que aqui se deixa 
 arguido para todos os efeitos legais» (cfr. fls. 179 dos autos).
 Do exposto resulta que os recorrentes não suscitaram de forma adequada, perante 
 o tribunal recorrido, uma questão de constitucionalidade. 
 Desde logo porque não foram capazes de enunciar a interpretação normativa, 
 alegadamente adoptada na decisão sumária. Somente dizem que está em causa “o 
 entendimento diferente daquelas normas plasmado na decisão sumária”. 
 Como este Tribunal tem reiteradamente afirmado, quando um recorrente pretende 
 questionar a conformidade constitucional de uma determinada interpretação 
 normativa, deve identificar expressamente o sentido ou dimensão normativa 
 atribuído à norma em causa que considera inconstitucional. Só assim o recorrente 
 cumpre o ónus de delimitação do objecto do recurso e, além disso, só dessa forma 
 se garante que, caso o Tribunal Constitucional venha a julgar inconstitucional 
 essa mesma norma − entendida nesse preciso sentido − possa enunciar, na decisão 
 que proferir, de modo a que o tribunal recorrido e todos os operadores jurídicos 
 disso fiquem cientes, qual a interpretação que não pode ser adoptada, por ser 
 incompatível com a Constituição (cfr., entre muitos outros, os Acórdãos n.º 
 
 450/2004 e 405/2006).
 Acresce que ainda que se entenda dispensável esta indicação explícita − nos 
 casos em que é possível retirá-la, de forma absolutamente segura e inequívoca, 
 da leitura cruzada das peças processuais − esse entendimento não pode ser 
 aplicado neste caso. Pois a questão aparentemente visada pelos recorrentes 
 respeita a um problema de registo da notificação postal e da prova desse mesmo 
 registo, feita no caso concreto, questão que, manifestamente, carece de natureza 
 normativa, como também o comprova o teor do próprio requerimento de interposição 
 do recurso, que se centra na defesa da interpretação que in casu os recorrentes 
 consideram correcta.
 Conclui-se, assim, que a falta de indicação − perante o tribunal recorrido, bem 
 como no próprio requerimento de interposição do presente recurso − da dimensão 
 normativa cuja constitucionalidade se pretende questionar é, só por si, 
 fundamento para o não conhecimento do objecto do recurso (artigos 70.º, n.º 1, 
 alínea b), e 72.º, n.º 2, da LTC).
 
  
 
 3. A segunda questão que os recorrentes pretendem ver apreciada é a da 
 
 «inconstitucionalidade interpretativa da norma contida no artigo 145.°, n.° 7, 
 do Código de Processo Civil, na sua conjugação com as normas dos seus artigos 
 
 514.° e 515.°, aplicáveis ex vi artigo 4.° do Código de Processo Penal, com a 
 interpretação expressa nas decisões ora sindicadas constitucionalmente de que 
 não sendo a regra sancionatória pelos atrasos processuais um encargo normal do 
 processo não pode o beneficiário de apoio judiciário estar abrangido pela regra 
 da dispensa do pagamento dessa sanção.»
 Ainda que imperfeitamente expressa, a questão ora colocada pelos recorrentes (e 
 por eles suscitada na conclusão 9.ª do recurso de fls. 142 dos autos, ainda que 
 em termos igualmente pouco rigorosos) é a da conformidade constitucional da 
 norma do artigo 145.º, n.º 7, do Código de Processo Civil, quando interpretada 
 no sentido, explanado no acórdão recorrido, de que «o apoio judiciário não cobre 
 
 “actuação negligente ou dolosa tendente à dilatação indevida dos prazos legais, 
 em detrimento do tratamento de igualdade em que os restantes utentes processuais 
 não isentos estariam colocados (…)”».
 O Tribunal Constitucional já apreciou esta dimensão normativa, pronunciando-se 
 sempre no sentido da sua não inconstitucionalidade.
 Assim, no Acórdão 723/98, seguindo jurisprudência anterior deste tribunal, aí 
 citada, escreveu-se o seguinte:
 
 «Cumprindo o imperativo constitucional de assegurar o acesso ao direito (artigo 
 
 20º da Constituição da República Portuguesa), a lei ordinária, através do 
 instituto do apoio judiciário confere a possibilidade de aceder aos tribunais, 
 de qualquer grau hierárquico, mesmo às pessoas que não disponham de meios 
 económicos necessários para recorrer aos serviços de um mandatário judicial ou 
 para satisfazer os custos da subida de um recurso.
 O instituto do apoio judiciário não abrange – nem, para cumprir a respectiva 
 função, teria de abranger – o pagamento de multas. Na verdade, as multas não 
 integram o 'preço' do serviço de justiça, não constituem a contrapartida da 
 prestação de qualquer serviço público. As multas têm antes carácter 
 sancionatório, são sanções processuais, de natureza pecuniária, impostas à parte 
 que, no decurso do processo, não cumpre adequada e tempestivamente os seus 
 deveres.»
 No mesmo sentido, mas com maior desenvolvimento, refere-se o seguinte no Acórdão 
 n.º 197/2006:
 
 «O facto de o interessado beneficiar de apoio judiciário não o dispensa do 
 pagamento das multas processuais que sejam condição de validade dos actos 
 praticados com inobservância dos prazos peremptórios, a que se refere o artigo 
 
 145.º do CPC. Efectivamente, como se afirma no acórdão n.º 17/91, publicado no 
 Boletim do Ministério da Justiça, n.º 404 (cfr. também, além do acórdão citado 
 no despacho reclamado, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Março 
 de 1994, Colectânea de Jurisprudência – Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, 
 Ano II, tomo I, pág. 167), essa multa não cabe no conceito legal de custas 
 
 (artigo 1.º e artigo 74.º do Código das Custas Judiciais), nem está abrangida no 
 elenco de benefícios do apoio judiciário (artigo 15.º da Lei n.º 30-E/2000, de 
 
 20 de Dezembro).
 Contra este entendimento não milita o elemento teleológico de interpretação da 
 lei, nem o princípio da interpretação conforme à Constituição, designadamente o 
 direito de acesso aos tribunais e o direito a um processo equitativo (artigo 
 
 20.º, n.ºs 1 e 4 da Constituição). Uma vez obtida a concessão do apoio 
 judiciário, traduzido na dispensa da taxa de justiça e demais encargos com o 
 processo, a parte com insuficiência económica não pode considerar-se impedida, 
 por causa dessa insuficiência, de defender judicialmente os seus direitos e 
 interesses legalmente protegidos. E fica colocada no mesmo plano de igualdade 
 que o interessado que possa suportar esses pagamentos. Ambas têm de se submeter 
 
 às regras processuais, nomeadamente quanto a prazos, só podendo praticar o acto 
 fora de prazo em caso de justo impedimento ou com multa. É certo que, no plano 
 fáctico, a multa pesa diferentemente em função da situação económica de quem a 
 suporta. Mas a multa é consequência da inobservância do prazo, pelo que, suposta 
 a razoabilidade deste, a parte se queixará de si própria. Resquício de objecções 
 que possam subsistir – e só poderão emanar de considerações relativas ao direito 
 a um processo equitativo, na vertente do princípio da igualdade – são corrigidas 
 pelo n.º 7 do artigo 145.º do CPC. 
 
 3.2. A faculdade de redução ou dispensa da multa ao abrigo do n.º 7 do artigo 
 
 145.º do CPC constitui uma providência excepcional. Permite a adequação da 
 sanção processual para a prática tardia do acto, quer relativamente à situação 
 económica do responsável (manifesta carência económica), quer na relação entre o 
 montante da multa e a repercussão do atraso no bom andamento da lide e, até, a 
 relevância processual do acto (princípio da proporcionalidade). Porém, enquanto 
 a redução fundada no carácter desproporcionado da sanção se obtém com base em 
 factos que, geralmente, serão revelados pela marcha processual e pelo regime 
 legal de cálculo da multa, já cabe sempre ao interessado, quando pedida a 
 redução ou dispensa com fundamento em manifesta insuficiência económica, o ónus 
 da alegação e prova dos factos integradores dessa situação juridicamente 
 relevante, que são constitutivos do direito que se arroga (artigo 342.º, n.º 1 
 do Código Civil), que tem de ser actuais e que são externos ao processo. A 
 circunstância de a parte beneficiar de apoio judiciário – que já vimos não 
 abranger a multa – não dispensa do ónus de alegação precisa dos factos 
 pertinentes ao deferimento dessa outra pretensão. Basta ver – além do aspecto 
 posto em destaque no despacho reclamado, de que a apreciação tem de ser referida 
 
 à situação económica actual do interessado e que esta pode ter melhorado – que o 
 conceito de insuficiência económica é sempre um conceito relativo (de 
 determinada capacidade ou disponibilidade, para determinados encargos) e que a 
 concessão de um e outro benefício depende do preenchimento de conceitos 
 jurídicos com diferente recorte. Para obter apoio judiciário basta a 
 
 “insuficiência de meios económicos” (n.º 1 do artigo 1.º), a prova da 
 
 “insuficiência económica” provada ou presumida (artigos 19.º e 20.º da Lei n.º 
 
 30 E/2000). Para que o pagamento da multa seja dispensado ou esta seja reduzida 
 
 é necessário que o interessado esteja em situação de “manifesta carência 
 económica” para suportá-la. Há aqui a exigência de uma situação de mais 
 acentuada incapacidade económica O que bem se compreende porque no primeiro caso 
 se trata de viabilizar o acesso aos tribunais e no segundo de corrigir a 
 desproporção de um obstáculo às condições desse acesso que tem a sua causa 
 imediata no incumprimento do prazo, (processualmente) imputável ao requerente.»
 A fundamentação destes arestos − com a qual concordamos − é inteiramente 
 transponível para o caso em apreço, em que estava em causa o pagamento, pelos 
 recorrentes, beneficiários de apoio judiciário, de multa processual devida por 
 
 “entrega de requerimento no segundo dia útil ao do termo do prazo”.
 Pelo que, reiterando o juízo de não inconstitucionalidade constante da 
 jurisprudência citada, julga-se o recurso improcedente quanto a esta questão.
 
 4. Pelo exposto, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, decide-se:
 a) Não conhecer do objecto do recurso quanto à questão referente à norma do 
 artigo da “norma contida no artigo 254.°, n.° 2, do Código de Processo Civil, em 
 conjugação com as normas dos artigo 24.°, n.° 5, alínea a), artigo 26.°, n.° 1, 
 artigo 31.°, n.°s 1 e 2, todos estes da Lei n.° 34/2004, de 29 de Julho, na 
 redacção anterior à entrada em vigor das alterações introduzidas pela Lei n.° 
 
 47/2007, de 28 de Agosto”;
 b) Não julgar inconstitucional a norma do artigo 145.º, n.º 7, do CPC, na 
 interpretação segundo a qual o apoio judiciário não cobre actuação negligente ou 
 dolosa tendente à dilatação indevida dos prazos legais, em detrimento do 
 tratamento de igualdade em que os restantes utentes processuais não isentos 
 estariam colocados, pelos fundamentos constantes, nomeadamente, do Acórdão n.º 
 
 197/2006; e, consequentemente,
 c) Julgar o recurso improcedente, em conformidade com o juízo de não 
 inconstitucionalidade referido em b).»
 
  
 
 2. Notificados da decisão, os recorrentes vieram reclamar para a conferência, ao 
 abrigo do artigo 78.º-A, n.º 3, da LTC, nos seguintes termos:
 
 «[…] Em síntese, serve de sustentação à primeira das questões de 
 inconstitucionalidade interpretativa apreciadas sucintamente na doutíssima 
 decisão sumária em causa a invocada falta de suscitação de forma adequada 
 perante o tribunal recorrido da questão de constitucionalidade, por indefinição 
 da dimensão normativa a apreciar. 
 Olvida, no entanto, esta decisão sumária que foi invocada pelos Recorrentes uma 
 primária imperfeição na fundamentação que pudesse exprimir a interpretação da 
 norma em ambas as decisões que antecediam o presente recurso, como se alcança do 
 texto: “(...)com a interpretação imanente da decisão sumária proferida pelo 
 Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, confirmando a anterior da 1.ª 
 Instância, ainda que ambas imperfeitamente expressas(...)” — sublinhado de agora 
 para facilidade de entendimento. 
 De facto, existe uma deficiência grave na fundamentação dessas decisões que 
 impede uma clara percepção da tese doutrinal que as sustenta, mesmo após a 
 reclamação para a conferência do tribunal a quo, facto inquestionável que jamais 
 poderá prejudicar os Recorrentes no seu direito à justiça constitucional. 
 A isto acresce o inesperado, imprevisto e inusitado da tese que - 
 imperfeitamente expressa, repete-se - se logra alcançar do confuso conjunto de 
 raciocínios que pretendem sustentar a(s) decisão(oes) e que os Recorrentes 
 resumiram como puderam no requerimento recursivo apresentado ante este subido 
 tribunal: “(...)de que se basta a norma da presunção de notificação com a 
 informação dada aos autos de que ela foi efectuada por correio simples em dia 
 determinado, sem necessidade de aferição da data do registo postal”. 
 O inusitado de uma tal interpretação normativa foi expressa, de modo prévio e 
 perfeito, no mesmo requerimento, em sede de invocação de inconstitucionalidade, 
 como se afere pelo seu texto: “(...)matéria que foi suscitada expressamente em 
 sede de Reclamação dos Recorrentes apresentada após a decisão sumária do 
 Venerando Tribunal da Relação a quo e só então em vista do inusitado e 
 inesperado dessa tese de tão invulgar teor e alcance.” — sublinhado de agora, 
 pelas mesmas razões do antecedente. 
 
 É assim que, sem perder de horizonte a exigência legal de suscitação oportuna 
 ante as instâncias primitivas, se apresentaram, desde logo, no requerimento 
 decidendo as razões do imprevisto, inesperado e inusitado entendimento 
 normativo, verdadeiramente invulgar na jurisprudência conhecida, não se podendo 
 também escamotear que a jurisprudência deste Tribunal Constitucional tem vindo a 
 assegurar o direito ao recurso sempre que ao interessado não se pudesse ter 
 exigido que antevisse a possibilidade de aplicação de uma interpretação da norma 
 tão insólita quanto a do caso em apreço, de modo a impor-se-lhe o ónus de 
 suscitar a questão mesmo antes da decisão. 
 De resto, se na conclusão 9.ª do recurso interposto para o TRL os recorrentes 
 limitaram a suscitação de inconstitucionalidade interpretativa à questão da 
 segunda das normas — que infra se apreciará também - é exactamente porque não 
 antolhou qualquer probabilidade de a fundamentação de 1.ª Instância, a que o 
 tribunal superior aderiu depois, não ser mais que um grosseiro erro na 
 interpretação da prova, como se alcança da conclusão 3.ª desse mesmo recurso que 
 ora se transcreve para mais fácil apreciação: 
 
 “Só o erro grosseiro manifesto na apreciação dos documentos de fls. 106 a 108 
 dos presentes autos e sua indevida valoração pode fazer concluir pela 
 extemporaneidade da prática do acto e correlativa aplicação de multa processual 
 para sua validação, documentos esses que impõem decisão diversa.” 
 Não seria razoável prever, nada na decisão primária o faria acautelar, que esse 
 erro grosseiro fosse afinal uma sui generis interpretação da regra processual do 
 n.° 2 do art.° 254.° no sentido de fazer presumir a recepção das notificações 
 sem prova mínima da sua efectiva existência e data de remessa através de via 
 postal registada, cuja exigência tem assento na letra da lei e não cabe 
 interpretação diversa quanto ao seu espírito por submissão ao dispositivo do 
 art.° 9.°, n.° 1, do Código Civil. 
 O conjunto de normativos subsidiários à norma legal cuja inconstitucionalidade 
 se invocou expressa e formalmente apontavam apenas e só para um erro grosseiro 
 na apreciação da prova existente nos autos, jamais para tão inusitada 
 interpretação legislativa. 
 
             Mas, expresso esse entendimento pelo tribunal a quo, mesmo que 
 sucinto e meramente indiciário, logo os recorrentes se apressaram a invocar a 
 violação da lei fundamental de uma tão invulgar tese interpretativa em sede de 
 reclamação para a conferência do TRL, como segue: 
 
 “Também no que tange ao quarto dos problemas em equação na presente reclamação 
 não alcançam os recorrentes em momento algum, tampouco em local algum do 
 processo, prova suficiente para se deixar tão taxativamente assente a data da 
 notificação da Ordem dos Advogados à recorrente A. nomeando-lhe patrona 
 oficiosa. 
 Pese embora o muito respeito que esta prestimosa instituição lhes merece, porque 
 errare humanum est, não pode merecer acolhimento, de forma alguma, a simples 
 declaração dos seus serviços administrativos de que a data aposta no oficio 
 corresponde com rigor ao dia da entrega nos serviços postais para entrega no 
 domicilio da recorrente. 
 E qualquer presunção de que essas datas correspondem não é legalmente 
 admissível, como bem referiu o Digno Procurador-Adjunto nas suas 
 contra-motivações. 
 Para além de que mesmo que fosse admissível como prova tal declaração da Ordem 
 dos Advogados - sem conceder - a sua força probatória e a presunção dela 
 retirada é elidida pelos documentos que os recorrentes fizeram juntar à sua 
 posição aquando da oportunidade processual do n.° 2 do art.° 417. ° CPP. 
 Nesses documentos se constata que as datas dos ofícios não correspondem às datas 
 de carimbo dos serviços postais apostas nos respectivos envelopes, quiçá porque 
 tais ofícios serão datados automaticamente pelo sistema informático o que, 
 especialmente se ocorrer afinal do dia, poderá não corresponder à efectiva 
 entrega para expedição. 
 Matéria extraída sem dificuldade das regras da experiência comum ao alcance do 
 bónus paterfamilias e que, de pública e notória, carece sequer de prova, ao 
 invés é à remessa postal da notificação, necessariamente registada, que é 
 exigida prova bastante, sendo lapidar a posição da Procuradoria da República na 
 
 1.ª Instância que, data venia, os recorrentes se atrevem a transcrever, com 
 sublinhado de sua autoria, pela sua relevância in casu: 
 Assim, o art.° 254.º, n.° 2, do C.P. C., passou a estatuir que «a notificação 
 postal presume-se feita no terceiro dia posterior ao do registo, ou no primeiro 
 dia seguinte a esse, quando o não seja». (...) 
 Deste modo, para considerar-se presumida a notificação, estabelecendo a lei unia 
 dilação de três dias sobre a data do registo da carta, terá de, previamente, 
 provar-se o facto essencial da expedição da carta sob registo ao notificando. 
 
 (...) é óbvio que inexiste qualquer registo das mencionadas notificações. 
 Assim sendo, não bastando a afirmação do Conselho Distrital da Ordem dos 
 Advogados desacompanhada de comprovativo, e porque é necessário saber, com 
 rigor, em que data, designadamente, se considera notificada a patrona nomeada à 
 requerente, atento, também, o disposto nos art.°s 24.°, da Lei n.° 34/2004, de 
 
 29.07, e 254.° do C.P.C., ter-se-á que concluir pela procedência do recurso. 
 Como daqui resulta, numa interpretação normativa que os recorrentes subscrevem e 
 têm por correcta, o entendimento diferente daquelas normas plasmado na decisão 
 sumária ora submetida à conferência é, de todo, inconstitucional por violação 
 dos art.°s 3.°, n.° 2, 13.º, 18.º, n.°s 1 e 2, 20.°, n.°s 1, 4 e 5, 202.°, n.°2, 
 
 203.º, 266.°, e 268.°, n.°3, todos da Constituição da República Portuguesa, o 
 que aqui se deixa arguido para todos os efeitos legais.” 
 Por tudo isto a especialidade desta situação abre o precedente à regra geral da 
 suscitação atempada durante o processado segundo o conceito doutrinário que se 
 passa a transcrever com a devida vénia: 
 
 “A orientação geral de que, após a prolação da decisão já não é possível 
 suscitar a questão da inconstitucionalidade, também não é de aplicar naqueles 
 casos «anómalos» ou «excepcionais» em que o recorrente é confrontado com uma 
 situação de aplicação ou interpretação normativa de todo imprevista e 
 inesperada, feita pela decisão. Aqui o interessado não dispõe de «oportunidade 
 processual» para suscitar a questão antes de esgotado o poder jurisdicional do 
 tribunal a quo, por não poder antever a possibilidade dessa aplicação (acs. 
 
 61/92, 188/93, 181/96, 569/95, 596/96).” 
 E é esta jurisprudência que, em nome da mais elementar justiça em questão tão 
 capital quanto o cerceamento do acesso ao direito e aos tribunais por violação 
 de preceitos legais pacíficos até ao momento da decisão recorrida, que os 
 recorrentes invocam para sustentar a possibilidade efectiva de aceder à 
 fiscalização deste Tribunal Constitucional no que tange ao entendimento das 
 instâncias ordinárias sobre a vexata quaestio do presente recurso e que se lhes 
 perfila como suscitada de forma e em tempo adequados logo que percepcionada 
 minimamente, merecendo, por isso, conhecimento perfeito e integral após a 
 tramitação necessária, o que se requer. 
 
 * * *
 Já no que diz respeito à segunda das normas arguida de inconstitucionalidade 
 interpretativa contém ela também um erro de apreciação que inquina fatalmente 
 todo o raciocínio que preside e sustenta o recurso interposto. 
 De facto, a raiz desta parte da decisão sumária sob reclamação é a existência de 
 decisões anteriores deste subido tribunal quanto à mesma questão, tomada esta 
 como sendo a de que, em súmula, o benefício de apoio judiciário dispensa o seu 
 titular do pagamento de multas processuais por se considerarem elas objecto da 
 abrangência desse instituto, o que até é diferente do elencado em sede de 
 interposição de recurso. 
 Ora, atentos aos fundamentos do pedido de dispensa de pagamento de multa 
 processual nos termos do n.° 7 do art.° 145.° do Código de Processo Civil 
 inicialmente requerido pela Recorrente mulher terá sempre que se verificar que 
 este assenta na sua grave situação de insuficiência económica, sendo o instituto 
 de protecção jurídica trazido à colação como mero meio indiciador disso mesmo, 
 como a leitura correcta do requerimento final alternativo que a recorrente 
 formulou em 1.ª instância: 
 
 “Alternativamente, caso assim se não entenda - ainda que sem conceder - se 
 requer expressamente, ao abrigo da disposto no n.° 7 do mesmo art.° 145.º do 
 Código de Processo Civil que seja dispensada a arguente atentos a sua grave 
 situação económica, desde logo patenteada em sede de protecção jurídica e aqui 
 reitera, protestando melhor e actualizada prova, se tida por necessário, a 
 notificar nesse caso.” — com sublinhado actual para melhor e mais fácil 
 percepção. 
 Como é claro e evidente, a Recorrente apenas se limitou a invocar ali como 
 elemento de prova da insuficiência económica para pagamento da multa a inerente 
 ao instituto de protecção jurídica de que beneficiava, protestando actualizar 
 esses elementos probatórios se o tribunal lhos exigisse expressamente, o que não 
 aconteceu. 
 Patentemente isto é bem diverso daquilo que vem julgado nos arestos deste Subido 
 Tribunal invocados na decisão ora reclamada onde se vislumbram situações em que 
 a dispensa de pagamento se estribou na essência do próprio instituto, por causa 
 dele, como elemento componente do benefício. 
 E sendo o fundamento tão distinto não pode ser aplicada essa jurisprudência com 
 a qual, de resto, se concorda plenamente mas que não constitui essência do 
 recurso ora apresentado onde o apoio judiciário é mero elemento de prova 
 indiciária e somente isso, antes os valores pecuniários da sanção processual 
 fazem aplicar-se ao caso o acórdão invocado no texto recursivo, o n.° 420/2006. 
 Destarte, esta substancial e relevante diversidade de matéria, ainda que análoga 
 
 à vertida nos acórdãos referidos na decisão sumária em causa, não é aplicável ao 
 caso dos autos, pelo que carece ela da devida reapreciação nesta sede 
 subsequente após o cumprimento da tramitação alegatória onde, com a 
 indispensável limpidez, os recorrentes detalhem a tese jurídica em que fundam 
 esta parte do recurso decidendo, o que aqui se requer expressa e formalmente.»
 
  
 
 3. O representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional 
 apresentou resposta nos termos seguintes:
 
 «1º
 A presente reclamação é improcedente. 
 
 2°
 Na verdade, a argumentação do reclamante em nada abala os fundamentos da decisão 
 reclamada, quer na parte em que não conheceu do recurso, por inverificação dos 
 pressupostos de admissibilidade, quer na parte em que - com base na 
 jurisprudência anterior deste Tribunal — não julgou inconstitucional a norma do 
 artigo 145.°, n.° 7, do Código de Processo Civil, quando interpretada no sentido 
 de que “o apoio judiciário não cobre” a actuação negligente ou dolosa tendente à 
 dilatação dos prazos legais, em  detrimento do tratamento de igualdade em que os 
 restantes utentes processuais não isentos estariam colocados (...)”».
 
  
 Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II – Fundamentação
 
  
 
 4. A decisão sumária ora reclamada pronunciou-se pelo não conhecimento do 
 objecto do recurso relativamente à questão referente à “norma contida no artigo 
 
 254.°, n.° 2, do Código de Processo Civil, em conjugação com as normas dos 
 artigo 24.°, n.° 5, alínea a), artigo 26.°, n.° 1, artigo 31.°, n.°s 1 e 2, 
 todos estes da Lei n.° 34/2004, de 29 de Julho, na redacção anterior à entrada 
 em vigor das alterações introduzidas pela Lei n.° 47/2007, de 28 de Agosto”, com 
 fundamento na não suscitação adequada da questão de constitucionalidade por 
 falta de indicação, perante o tribunal recorrido − também omissa no requerimento 
 de interposição do recurso – do sentido ou dimensão normativa cuja 
 constitucionalidade se pretendia questionar.
 E julgou o recurso manifestamente improcedente pelos fundamentos constantes, 
 nomeadamente, do Acórdão n.º 197/2006, no que respeita à invocada 
 inconstitucionalidade do artigo 145.º, n.º 7, do CPC, na interpretação segundo a 
 qual “o apoio judiciário não cobre actuação negligente ou dolosa tendente à 
 dilatação indevida dos prazos legais, em detrimento do tratamento de igualdade 
 em que os restantes utentes processuais não isentos estariam colocados”.
 A extensa reclamação apresentada em nada abala os fundamentos da decisão sumária 
 reclamada.
 No que respeita à decisão de não conhecimento da primeira “questão” de 
 constitucionalidade, vêm os reclamantes contrapor, invocando jurisprudência do 
 Tribunal Constitucional, que se trata de um caso “anómalo” ou “excepcional”, por 
 terem sido surpreendidos com uma interpretação normativa imprevista e que, por 
 isso, suscitaram a questão «de forma e em tempo adequados logo que percepcionada 
 minimamente».
 Sem qualquer razão, porém. 
 Como se refere na decisão sumária reclamada, os reclamantes não indicaram, no 
 decurso do processo, a dimensão ou interpretação normativa cuja 
 inconstitucionalidade pretendiam suscitar. Aliás, mesmo no requerimento de 
 interposição do recurso de constitucionalidade e na reclamação agora apresentada 
 continuam a não lograr enunciar, de forma minimamente rigorosa e perceptível, 
 qual a dimensão normativa que pretendiam submeter a julgamento – sem prejuízo de 
 estes já não serem os momentos adequados para o fazer atempadamente.
 Improcede também a arguição dos reclamantes de que não seria aplicável ao caso 
 em apreço a jurisprudência do Tribunal Constitucional, invocada na decisão 
 reclamada para fundamentar a manifesta improcedência da segunda questão de 
 constitucionalidade, acima referida.
 
  Na verdade, tanto nos arestos citados como no caso vertente, estava em causa o 
 pagamento de multa processual por parte de beneficiários de apoio judiciário, 
 sendo de reiterar – por não haver qualquer razão para dela divergir – a 
 orientação fixada em jurisprudência anterior, aplicando-a ao caso em apreço, o 
 que determina a manifesta improcedência da questão de constitucionalidade aqui 
 colocada, pelas razões desenvolvidas na decisão sumária reclamada.
 
 É, por isso, de manter a decisão sumária reclamada.
 
  
 III. Decisão
 
  
 Pelo exposto, acordam em indeferir a presente reclamação.
 Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 Lisboa, 2 de Junho de 2009
 Joaquim de Sousa Ribeiro
 Benjamim Rodrigues
 Rui Manuel Moura Ramos