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Processo n.º 1004/06
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Mário Torres
 
  
 
  
 
      Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,
 
  
 
  
 
                                  1. Relatório
 
                                  O representante do Ministério Público no 
 Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia interpôs recurso para o Tribunal 
 Constitucional, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de 
 Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, 
 aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela 
 Lei n.º 13‑A/98, de 26 de Fevereiro (LTC), contra o despacho de 22 de Setembro 
 de 2006 do Juiz do respectivo 2.º Juízo, que declarou esse Tribunal 
 incompetente em razão da matéria para conhecer de acção de declaração de 
 insolvência intentada por A., Limitada, contra B., e, consequentemente, 
 absolveu o réu da instância, tendo, para o efeito, recusado a aplicação, com 
 fundamento em inconstitucionalidade, por violação do artigo 165.º, n.º 1, 
 alínea p), da Constituição da República Portuguesa (CRP), da norma constante 
 da alínea a) do n.º 1 do artigo 89.º da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro (Lei 
 Orgânica dos Tribunais Judiciais), na redacção que lhe foi dada pelo artigo 29.º 
 do Decreto‑Lei n.º 76‑A/2006, de 29 de Março.
 
                                  O despacho impugnado é do seguinte teor:
 
  
 
 “Estipula o artigo 102.º do Código de Processo Civil que a incompetência 
 absoluta pode ser suscitada oficiosamente pelo tribunal em qualquer estado do 
 processo.
 
                  Constituem casos de incompetência absoluta, entre outros, os de 
 violação de regras de competência em razão da matéria.
 
                  A competência deste Tribunal encontra‑se delimitada pelo artigo 
 
 89.º da LOTJ.
 
                  Por força do disposto no artigo 89.º, n.º 1, alínea a), da Lei 
 Orgânica dos Tribunais Judiciais, na redacção que lhe foi conferida pelo 
 Decreto‑Lei n.º 53/2004, de 18 de Março, este Tribunal apenas é competente para 
 tramitar processos de insolvência nos casos em que o devedor seja uma sociedade 
 comercial ou a massa insolvente integre uma empresa.
 
                  Em 30 de Junho de 2006 entrou em vigor o Decreto‑Lei n.º 
 
 76‑A/2006 (cf. artigo 64.º do referido diploma), que, no seu artigo 29.º, 
 alterou a redacção do artigo 89.º da Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais, 
 conferindo‑lhe, no que aqui interessa, e na alínea a) do n.º 1, competência 
 para «os processos de insolvência».
 
                  Ora, estipula o artigo 165.º da Constituição da República 
 Portuguesa que «é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar 
 sobre as seguintes matérias, salvo autorização ao Governo: p) Organização e 
 competência dos tribunais e do Ministério Público e estatuto dos respectivos 
 magistrados, bem como das entidades não jurisdicionais de composição de 
 conflitos».
 
                  Por sua vez, prescreve o n.º 2 do mesmo preceito que «as leis 
 de autorização legislativa devem definir o objecto, o sentido, a extensão e a 
 duração da autorização».
 
                  In casu, o Decreto‑Lei n.º 76‑A/2006 foi promulgado no uso de 
 autorização legislativa concedida pelo artigo 95.º da Lei n.º 60‑A/2005, de 30 
 de Dezembro.
 
                  A referida Lei prevê no seu artigo 95.º, sob a epígrafe 
 
 «dissolução e liquidação das entidades comerciais», o seguinte:
 
  
 
                  «1. O Governo fica autorizado, durante o ano de 2006, a alterar 
 o regime da dissolução e liquidação de entidades comerciais, designadamente 
 das sociedades comerciais, das sociedades civis sob a forma comercial, das 
 cooperativas e dos estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada, 
 através da aprovação de um regime de dissolução e liquidação por via 
 administrativa aplicável às referidas entidades.
 
 2. O sentido e a extensão da autorização legislativa concedida no número 
 anterior são os seguintes:
 a) atribuição às conservatórias do registo das competências necessárias para 
 que possam proceder à dissolução e liquidação de entidades comerciais através 
 de um procedimento administrativo, em substituição do regime de dissolução e 
 liquidação judicial de entidades comerciais, sem prejuízo das excepções 
 previstas na alínea seguinte;
 b) estabelecimento das situações em que a dissolução e a liquidação judicial de 
 entidades comerciais pode ter lugar;
 c) aplicação imediata do regime de dissolução e liquidação de entidades 
 comerciais através de um procedimento administrativo aos processos judiciais de 
 dissolução e liquidação que, à data da sua entrada em vigor, se encontrem 
 instaurados e pendentes em tribunal;
 d) regulação das condições e requisitos da remessa às conservatórias de registo 
 dos processos judiciais referidos na alínea anterior;
 e) determinação do tribunal competente para a impugnação judicial dos actos 
 praticados no âmbito do procedimento administrativo de dissolução e liquidação 
 de entidades comerciais.»
 
  
 Assim sendo, não há dúvidas de que a alteração da alínea a) do artigo 89.º da 
 Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais não foi autorizada por tal Lei (nem sequer 
 se relaciona com a matéria que a mesma visa regular), pelo que, sendo tal 
 matéria da competência da Assembleia da República e não se encontrando o 
 Governo autorizado a legislar sobre a mesma, é organicamente inconstitucional a 
 alteração em apreço, não se aplicando a redacção em causa, antes se 
 repristinando a anterior.
 Ora, o requerido nos presentes autos é uma pessoa singular e não é referido na 
 petição inicial que a massa insolvente integre uma empresa.
 A referida Lei prevê também os tribunais de competência genérica, aos quais 
 compete residualmente, para além do mais, preparar e julgar os processos 
 relativos a causas não atribuídas a outro tribunal (cf. artigo 77.º, n.º 1, 
 alínea a)).
 A competência em razão da matéria para preparar e julgar a presente acção tem de 
 caber, pois, ao tribunal de comarca.
 Nestes termos, julgo este Tribunal incompetente em razão da matéria para a 
 presente acção e, em consequência, absolvo o réu da instância, nos termos 
 previstos nos artigos 89.º, alínea c), da LOTJ e 101.º, 105.º, 494.º, alínea a), 
 e 493.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.” 
 
  
 
                                  Neste Tribunal, o representante do Ministério 
 Público apresentou alegações, no termo das quais formulou as seguintes 
 conclusões:
 
  
 
 “1 – A norma constante do artigo 89.º, n.º 1, alínea a), da Lei de Organização 
 e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, na versão emergente do Decreto‑Lei n.º 
 
 76‑A/2006, de 29 de Março, ao ampliar a competência material dos tribunais de 
 comércio, de modo a abranger a preparação e julgamento de todos os «processos de 
 insolvência», independentemente da natureza do devedor e da massa insolvente, 
 configura‑se como inovatória face ao regime legal que a precedia, resultante do 
 diploma que aprovou o Código de Insolvência – tendo, deste modo, ampliado a 
 competência material dos tribunais de comércio relativamente à dos tribunais 
 comuns.
 
 2 – Na verdade, no regime emergente do citado Decreto‑Lei n.º 53/2004 – e em 
 estrita consonância com a respectiva lei de autorização legislativa – a Lei n.º 
 
 39/2003, de 22 de Agosto – a competência material dos tribunais de comércio 
 apenas abrangia os processos de insolvência em que o devedor fosse uma sociedade 
 comercial ou a massa insolvente integrasse uma empresa.
 
 3 – Tal inovação legislativa carece de credencial parlamentar bastante, já que o 
 artigo 95.º da Lei n.º 60‑A/2005, de 30 de Dezembro, apenas autoriza o Governo a 
 legislar sobre o tema da desjudicialização dos processos de liquidação e 
 dissolução de entidades comerciais – matéria perfeitamente diversa e autónoma da 
 que se reposta à repartição de competências entre tribunais de comércio e 
 tribunais comuns para o processamento da insolvência
 
 4 – Termos em que deverá confirmar‑se o juízo de inconstitucionalidade orgânica 
 da norma desaplicada na decisão recorrida.”
 
  
 
                                  O recorrido não contra‑alegou.
 
                                  Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
                                  2. Fundamentação
 
                                  A questão de inconstitucionalidade que 
 constitui objecto do presente recurso foi recentemente apreciada por este 
 Tribunal, que, pelos Acórdãos n.ºs 690/2006 e 692/6000, confirmou o juízo de 
 inconstitucionalidade constante da decisão recorrida.
 
                                  Lê‑se no primeiro Acórdão citado:
 
  
 
                  “2. Por intermédio do artigo 8.º do Decreto‑Lei n.º 53/2004, de 
 
 18 de Março, diploma editado ao abrigo da Lei n.º 39/2003, de 22 de Agosto, e na 
 sequência do que se prescreveu no artigo 11.º desta última, foi alterada a 
 redacção da alínea a) do artigo 89.º da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro (Lei de 
 Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais), vindo a ser conferida aos 
 tribunais de comércio competência para o processo de insolvência se o devedor 
 for uma sociedade comercial ou a massa insolvente integrar uma empresa.
 
                  Em 30 de Dezembro de 2005 foi editada a Lei n.º 60‑A/2005 (Lei 
 do Orçamento de Estado para 2006), a qual, no que ora interessa, dispôs no seu 
 artigo 95.º: –
 
  
 
 «Artigo 95.º
 Dissolução e liquidação de entidades comerciais
 
  
 
                  1 – O Governo fica autorizado, durante o ano de 2006, a alterar 
 o regime da dissolução e liquidação de entidades comerciais, designadamente 
 das sociedades comerciais, das sociedades civis sob forma comercial, das 
 cooperativas e dos estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada, 
 através da aprovação de um regime de dissolução e liquidação por via 
 administrativa aplicável às referidas entidades. 
 
                  2 – O sentido e a extensão da autorização legislativa concedida 
 no número anterior são os seguintes: 
 
                  a) Atribuição às conservatórias do registo das competências 
 necessárias para que possam proceder à dissolução e liquidação de entidades 
 comerciais através de um procedimento administrativo, em substituição do regime 
 de dissolução e liquidação judicial de entidades comerciais, sem prejuízo das 
 excepções previstas na alínea seguinte;
 
                  b) Estabelecimento das situações em que a dissolução e a 
 liquidação judicial de entidades comerciais pode ter lugar;
 
                  c) Aplicação imediata do regime de dissolução e liquidação de 
 entidades comerciais através de um procedimento administrativo aos processos 
 judiciais de dissolução e liquidação que, à data da sua entrada em vigor, se 
 encontrem instaurados e pendentes em tribunal;
 
                  d) Regulação das condições e requisitos da remessa às 
 conservatórias de registo dos processos judiciais referidos na alínea 
 anterior;
 
                  e) Determinação do tribunal competente para a impugnação 
 judicial dos actos praticados no âmbito do procedimento administrativo de 
 dissolução e liquidação de entidades comerciais.»
 
  
 
                  Invocando o uso da autorização legislativa concedida pelo 
 artigo 95.º da Lei n.º 60‑A/2005, de 30 de Dezembro (cf. palavras finais do seu 
 exórdio), foi, em 29 de Março de 2006, publicado o Decreto‑Lei n.º 76‑A/2006, o 
 qual, no seu artigo 29.º, veio a dispor: –
 
  
 
 «Artigo 29.º
 Alteração à Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais
 
  
 
                  O artigo 89. ° da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro, alterada pela 
 Lei n.º 101/99, de 26 de Julho, pelos Decretos‑Leis n.ºs 323/2001, de 17 de 
 Dezembro, e 38/2003, de 8 de Março, pela Lei n.º 105/2003, de 10 de Dezembro, 
 pelo Decreto‑Lei n.º 53/2004, de 18 de Março, e pela Lei n.º 42/2005, de 29 de 
 Agosto, passa a ter a seguinte redacção:
 
  
 
 “Artigo 89.º
 
 [...]
 
                  1 – Compete aos tribunais de comércio preparar e julgar:
 
                  a) Os processos de insolvência;
 
                  b) ………………………………………………………………………
 
                  c) ………………………………………………………………………
 
                  d) ………………………………………………………………………
 
                  e) As acções de liquidação judicial de sociedades;
 
                  f) ………………………………………………………………………
 
                  g) ………………………………………………………………………
 
                  h) ………………………………………………………………………
 
                  2  – Compete ainda aos tribunais de comércio julgar:
 
                  a) ………………………………………………………………………
 
                  b) As impugnações dos despachos dos conservadores do registo 
 comercial, bem como as impugnações das decisões proferidas pelos conservadores 
 no âmbito dos procedimentos administrativos de dissolução e de liquidação de 
 sociedades comerciais;
 
                  c) ………………………………………………………………………
 
                  3 – …………………………………………………………………….»
 
  
 
                  Com a alteração de redacção dada à alínea a) do n.º 1 do artigo 
 
 89.º da Lei n.º 3/99 ficou, pois, cometida aos tribunais de comércio competência 
 para, na área da respectiva jurisdição, curarem dos processos de insolvência, 
 
 «alargando‑se», desta sorte, a competência de que, no domínio daquela Lei, 
 anteriormente à entrada em vigor do Decreto‑Lei n.º 76‑A/2006 e posteriormente 
 
 à vigência do Decreto‑Lei nº 53/2004, e para os processos em causa, 
 desfrutavam. Isso, justamente, porque, com a referência esses processos, aquela 
 espécie de tribunais tão só era competente para curar daqueles em que o devedor 
 fosse uma sociedade comercial ou a massa insolvente integrasse uma empresa. O 
 mesmo é dizer que, se em causa se postasse a insolvência de uma pessoa singular 
 e em que a massa insolvente não fosse considerada como integrando uma empresa, a 
 competência para a preparação e julgamento do respectivo processo era cometida 
 ao tribunal de competência genérica [cf. alínea a) do n.º 1 do artigo 77.º da 
 Lei n.º 3/99], ainda que de competência específica, e não a um dado tribunal de 
 competência especializada.
 
                  A questão que se coloca reside, consequentemente, em saber, em 
 primeiro lugar, se dispunha o Governo, desacompanhado de credencial 
 parlamentar, de competência para editar uma norma tal como a ínsita no artigo 
 
 29.º do Decreto‑Lei n.º 76‑A/2006, e, em segundo, caso se confira resposta 
 negativa à primeira questão, se a autorização concedida pelo artigo 95.º da Lei 
 n.º 60‑A/2005 pode ser considerada como abarcando a devida autorização para uma 
 tal edição.
 
  
 
                  2.1. Como resulta evidente, a alteração de redacção introduzida 
 na alínea a) do n.º 1 do artigo 89.º da Lei n.º 3/89 pelo Decreto‑Lei n.º 
 
 76‑A/2006 consequenciou uma «inovação» na competência material dos tribunais de 
 comércio relativamente à que detinham antes de se operar a vigência deste último 
 diploma.
 
                  Ora, como tem este Tribunal sublinhado, é da reserva relativa 
 de competência da Assembleia da República [nos termos da alínea p) do n.º 1 do 
 artigo 165.º da Constituição na versão da Lei Fundamental decorrente desde a Lei 
 Constitucional n.º 1/92, de 20 de Setembro, vigente à data do diploma em causa] 
 a edição de legislação sobre a competência material dos tribunais, onde se 
 inclui, «para além da definição das matérias cujo conhecimento cabe aos 
 tribunais judiciais e a daquelas cuja conhecimento cabe aos tribunais 
 administrativos e fiscais – … a distribuição das matérias da competência dos 
 tribunais judiciais pelos diferentes tribunais de competência genérica e de 
 competência especializada ou específica» (cf., verbi gratia, os Acórdãos n.ºs 
 
 36/87, 356/89, 72/90, 271/92, 163/95, 198/95 e 268/97, publicados, 
 respectivamente, no Diário da República, I Série, de 4 de Março de 1987, 23 de 
 Maio de 1989 e 2 de Abril de 1990, mesmo jornal oficial, II Série, de 23 de 
 Novembro de 1992, 8 de Junho de 1992, 22 de Junho de 1995 e 22 de Maio de 1997). 
 Ou, como se referiu no Acórdão n.º 476/98 (disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt), «inclui‑se na reserva parlamentar a definição de 
 toda a competência judiciária ratione materiae – ou seja: a distribuição das 
 matérias pelas diferentes espécies de tribunais dispostos horizontalmente, no 
 mesmo plano, sem que, entre eles, intercedam relações de supra‑ordenação e de 
 subordinação».
 
                  Aqui chegados, e uma vez que o Decreto‑Lei n.º 76‑A/2006 veio 
 invocar o uso da autorização legislativa concedido pelo artigo 95.º da Lei n.º 
 
 60‑A/2005, claramente que, para a dilucidação no problema em apreço, se terá de 
 enfrentar a questão de saber se, ponderando o que se prescreve no n.º 2 do 
 artigo 165.º da Lei Fundamental, aquele normativo da Lei do Orçamento de Estado 
 para 2006 (acima transcrito) constituía credencial parlamentar bastante para 
 habilitar o Governo a emitir a norma ínsita no artigo 29.º do mencionado 
 Decreto‑Lei n.º 76‑A/2006.
 
                  Torna‑se a todos os títulos claro que o sentido e extensão 
 
 (que, como sabido é, para se usarem as palavras de Jorge Miranda e Rui Medeiros, 
 in Constituição da República Portuguesa Anotada, tomo II, p. 537, significam a 
 concretização do «objectivo e o critério da disciplina legislativa a estabelecer 
 a condensação dos princípios ou a orientação fundamental a seguir pelo 
 decreto‑lei») da autorização legislativa constante do aludido artigo 95.º e 
 enunciados no seu n.º 2, não podem comportar um entendimento que conduza a 
 considerar que nela foi delineado, por entre o mais, um programa legislativo que 
 implicasse a atribuição de uma dada competência a uma sorte de tribunais (para o 
 caso, afectando‑a a determinados de competência especializada).
 
                  Na verdade, aquele artigo, substancialmente, visou a introdução 
 de um programa legislativo que consubstanciasse uma real «desjudicialização» do 
 regime de dissolução e liquidação das entidades comerciais – a operar por via 
 administrativa –, e prevendo‑se ainda uma forma de possibilitação da impugnação 
 das decisões tomadas por essa via, em passo algum se descortina [ou] se 
 surpreende a atribuição de competência a que acima se aludiu.
 
                  E, mesmo focando a alínea b) do n.º 2 do citado artigo, 
 torna‑se patente que a autorização para o editando diploma governamental 
 estabelecer as situações em que a dissolução e a liquidação judicial das 
 entidades comerciais pode ter lugar não pode comportar um sentido de onde se 
 extraia qual a atribuição de competência a uma dada espécie de tribunal, pois 
 que o «estabelecimento das situações» significa, inequivocamente, a definição 
 dos casos e condicionalismos em que aquelas entidades podem vir a ser 
 liquidadas por via jurisdicional e não a definição do órgão judicial que vai 
 aferir deles.
 
                 Neste contexto, o normativo em apreço, ao ser editado pelo 
 Governo a descoberto de credencial parlamentar e tendo em conta a matéria que 
 regula, enferma do vício de inconstitucionalidade orgânica.”
 
  
 
                                  Subscrevendo este entendimento – que, como se 
 referiu, foi reproduzido no Acórdão n.º 692/2006 –, impõe‑se a confirmação da 
 decisão recorrida.
 
  
 
                                  3. Decisão 
 
                                  Em face do exposto, acorda‑se em:
 
                                  a) Julgar inconstitucional, por violação do 
 disposto na alínea p) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, a norma 
 constante do artigo 29.º do Decreto‑Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março, na parte 
 em que veio conferir nova redacção à alínea a) do n.º 1 do artigo 89.º da Lei 
 n.º 3/99, de 13 de Janeiro, atribuindo aos tribunais de comércio competência 
 para preparar e julgar os processos de insolvência mesmo que o devedor não fosse 
 uma sociedade comercial e que a massa insolvente não integrasse uma empresa; e, 
 consequentemente,
 
                                  b) Confirmar a decisão recorrida, na parte 
 impugnada.
 
                                  Sem custas.
 
                                  Lisboa, 23 de Janeiro de 2007.
 Mário José de Araújo Torres
 Benjamim Silva Rodrigues
 Maria Fernanda Palma
 Paulo Mota Pinto
 Rui Manuel Moura Ramos