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Processo n.º 779/08
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
 
  
 Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
 
 I. Relatório
 
 
 A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional da sentença do Tribunal 
 Judicial da Comarca de Barcelos que julgou improcedente a impugnação judicial 
 deduzida contra a decisão dos serviços de segurança social relativa a um pedido 
 de apoio judiciário.
 
  
 No requerimento de interposição de recurso, alegou ter invocado, em tempo, «a 
 inconstitucionalidade da interpretação dada ao disposto na Lei n.º 34/2004 […] 
 no sentido de considerar relevante, para efeitos do cálculo do valor de 
 referência para beneficiar da protecção jurídica conferida pelo sistema de 
 acesso ao Direito, o rendimento do agregado familiar, tal como este é tributado 
 em sede de liquidação de imposto sobre os rendimentos».
 
  
 Por decisão sumária proferida ao abrigo do diposto no artigo 78º-A da LTC, o 
 relator entendeu ser de não tomar conhecimento do objecto do recurso, por 
 considerar que essa interpretação normativa não foi questionada, sob o ponto de 
 vista da sua conformidade constitucional, perante o tribunal recorrido, 
 designadamente, na impugnação judicial da decisão dos serviços da segurança 
 social.
 
  
 Contra o assim decidido vem agora o recorrente deduzir reclamação para a 
 conferência, alegando o  seguinte:
 
  
 Como se depreende da decisão proferida foi entendimento do Ex.mo Senhor Juiz 
 Relator: 
 
 - deveria o recorrente ter questionado e submetido à apreciação a interpretação 
 dada ao disposto na Lei 34/2004, com as alterações introduzidas pela Lei 
 
 47/2007, conjugada com o disposto na Portaria 1085-A/2004, de 31 de Agosto, no 
 sentido de considerar relevante, para efeitos de cálculo no valor de referência 
 para beneficiar da protecção jurídica conferida pelo sistema de acesso ao 
 Direito, o rendimento do agregado familiar, tal como este é tributado em sede de 
 liquidação de imposto sobre os rendimentos 
 Mais alega que esta questão interpretativa não foi questionada pelo recorrente 
 sob o ponto de vista da sua conformidade constitucional, perante o tribunal 
 recorrido (concretamente, na impugnação judicial da decisão dos serviços da 
 segurança social). tendo-o sido apenas a constitucionalidade de certa decisão. 
 E, sendo assim, não se justifica sequer convidar o recorrente a indicar a que 
 preceito legal se reporta a mencionada interpretação (através de despacho de 
 aperfeiçoamento proferido ao abrigo do artigo 75º-A da Lei do Tribunal 
 Constitucional), uma vez que é, desde já, possível concluir no sentido de que 
 não deve conhecer-se do objecto do presente recurso, por falta de preenchimento 
 de um dos seus pressupostos processuais. 
 Pelo que se indefere o recurso. 
 Acontece que, salvo o devido respeito. não assiste razão ao Ex.mo Senhor Juiz 
 Relator 
 Determina o artigo 8° da Lei 34/2004 que: 
 encontra-se em situação de insuficiência económica, aquele que tendo em conta o 
 rendimento o património e a despesa permanente do seu agregado familiar não tem 
 condições objectivas para suportar pontualmente os custos de um processo.
 Está suficientemente provado nos autos que o recorrente não aufere qualquer 
 rendimento conforme declaração de IRS junta aos autos. 
 Por outro lado e conforme as suas motivações de recurso o recorrente encontra-se 
 desacompanhado do seu cônjuge em processo de natureza criminal. 
 E se aos serviços da Segurança Social é desculpável em questões de direito, uma 
 deficiente interpretação do caso concreto, mesmo se não dirá relativamente ao 
 tribunal que confirmou a decisão impugnada. 
 Determina o artigo 204° da CRP: 
 Nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que 
 infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados. 
 Por outro determina o artigo 205°/1 da CRP: 
 As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na 
 forma prevista na lei. 
 Prescreve o artigo 20º/1 da CRP: 
 A todos é assegurado o acesso ao Direito e aos tribunais para defesa dos seus 
 direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada 
 por insuficiência de meios económicos. 
 Ainda e à luz do direito internacional aplicável em território nacional 
 prescreve o artigo 16°/2: 
 Os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem 
 ser integrados de harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem. 
 Estabelece ainda o artigo 18°/1 da CRP: 
 Os preceitos Constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias 
 são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas. 
 Acontece que a decisão recorrida viola um dos princípios dos direitos 
 fundamentais — o acesso aos tribunais e defesa dos seus direitos e interesses 
 legalmente protegidos. 
 E, como consta dos autos, sempre o recorrente invocou quer junto da entidade 
 competente para apreciação do pedido de protecção jurídica - SS - a 
 inconstitucionalidade da decisão que entendeu aplicar a norma que entende 
 reunidos os requisitos para a não dispensa de pagamento da taxa de justiça por 
 violar o artigo 20° da CRP. 
 Bem como no mesmo sentido invocou junto do tribunal que apreciou o recurso da 
 decisão que o recorrente não preenchia os requisitos previstos no na norma 
 aplicada tendo em consideração que o mesmo não aufere qualquer rendimento. 
 Logo, o entendimento de que o recorrente preenche os requisitos previstos no 
 artigo 8° alínea 1) da Lei 34/2004, violou o artigo 204° e artigo 20° da CRP. 
 O despacho ora objecto de reclamação, salvo o devido respeito. entendeu mal ao 
 decidir pela falta de um pressuposto para a admissão do recurso no caso concreto 
 tendo em consideração que: 
 Não é, como se depreende da factualidade concreta dos autos a norma que é 
 inconstitucional mas a aplicação da mesma norma ao caso concreto do recorrente 
 que, dessa aplicação resulta a violação do artigo 204° e 20° da CRP e os 
 princípios de direito fundamental de que o recorrente goza plasmados na 
 Constituição da República Portuguesa nomeadamente o Acesso ao Direito e Tutela 
 Jurisdicional Efectiva. 
 Termos em que deverá ser julgada procedente a presente Reclamação, revogando-se 
 a decisão sumária e proferida decisão que admita o recurso interposto com a 
 consequente notificação ao recorrente para apresentar as suas alegações de 
 recurso. 
 
  
 Não houve resposta da entidade recorrida
 
  
 Cabe apreciar e decidir.
 
  
 II. Fundamentação 
 
  
 
  
 A decisão sumária ora reclamada, em vista ao não conhecimento do objecto do 
 recurso, baseou-se no entendimento de que o recorrente não tinha suscitado 
 durante o processo a questão de inconstitucionalidade normativa que pretendia 
 ver apreciada pelo Tribunal Constitucional.
 
  
 E sabe-se que o recurso de constitucionalidade, quando interposto ao abrigo do 
 disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional – 
 como era o caso –, tem como pressuposto processual a suscitação da questão de 
 inconstitucionalidade normativa de modo processualmente adequado perante o 
 tribunal recorrido (cfr., ainda, o artigo 72º, n.º 2, da mesma Lei).
 
  
 O não conhecimento do objecto do recurso fundamentou-se, por conseguinte, o não 
 preenchimento de um requisito processual legalmente previsto.
 
  
 Insurgindo-se contra o assim decidido, o reclamante não revela, em nenhum 
 momento, qual a peça processual em que terá suscitado a questão de 
 inconstitucionalidade normativa e em que termos o terá feito, e limita-se antes 
 a tecer diversas considerações jurídicas, com invocação do disposto nos artigos 
 
 20º, 16º, n.º 2, e 204º da Constituição, para concluir que a decisão recorrida 
 viola o direito de acesso aos tribunais e que é inconstitucional o entendimento 
 que considera que o reclamante se não encontra em situação de insuficiência 
 económica para efeitos de concessão de apoio judiciário.
 
  
 Ora, como bem se vê, o reclamante imputa a inconstitucionalidade à decisão 
 recorrida, e não a qualquer norma ou dimensão normativa que tenha sido aplicada 
 pelo tribunal recorrido, e, em qualquer caso, não demonstra que tenha suscitado 
 a questão de inconstitucionalidade de forma processualmente adequada, perante o 
 tribunal recorrido.
 
  
 O reclamante não põe, por isso, em causa o fundamento da decisão reclamada, que, 
 como tal, não pode deixar de ser confirmada.
 
  
 III. Decisão
 
  
 Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir a reclamação. 
 
  
 Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
 
 
 Lisboa, 14 de Janeiro de 2009
 Carlos Fernandes Cadilha
 Maria Lúcia Amaral
 Gil Galvão