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Processo nº 452/06
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria João Antunes
 
  
 
  
 
  
 
  
 Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
  
 I. Relatório
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é 
 recorrente A. e recorrido o Conselho Superior da Magistratura, foi interposto 
 recurso para o Tribunal Constitucional ao abrigo do disposto no artigo 70º, nº 
 
 1, alínea b), da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal 
 Constitucional (LTC).
 
  
 
 2. Em 5 de Julho de 2006, foi proferida decisão sumária, pela qual se entendeu 
 não tomar conhecimento do objecto do recurso (artigo 78º-A, nº 1, da LTC), com 
 os seguintes fundamentos:
 
  
 
 “O conhecimento do objecto do recurso de constitucionalidade interposto ao 
 abrigo do disposto no artigo 70º, nº 1, alínea b), da LTC depende da suscitação 
 da questão de inconstitucionalidade, durante o processo, de modo processualmente 
 adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este 
 estar obrigado a dela conhecer (artigo 72º, nº 2, da LTC).
 Consideradas as peças processuais indicadas pelo recorrente, em cumprimento do 
 preceituado no nº 2 do artigo 75º-A da LTC, não pode dar-se como verificado este 
 requisito, desde logo porque a questão de constitucionalidade foi sempre 
 reportada a disposições legais alternativas ou cumulativas:
 
  
 
 «Tal como se deduz da deliberação do Conselho Permanente do CSM, o entendimento 
 referido, relacione-se com o art. 3.° do mencionado Regulamento Interno ou com o 
 art. 69.° da Lei n.° 3/99 (porque a deliberação recorrida não o esclarece com 
 precisão), é violador do princípio constitucional da igualdade ínsito nos arts. 
 
 13.° e 59.°, n.°1, a), da Constituição da República Portuguesa»;
 
 «A deliberação recorrida, ao indeferir a reclamação apresentada, pretendendo 
 que, designadamente para efeitos retributivos, não se aplica o regime de 
 acumulação de funções aos juízes colocados nas Bolsas de Juízes, fez errada 
 interpretação do art. 3.° do mencionado Regulamento Interno (Deliberação 
 
 (extracto) n.° 399/99. Diário da República n.° 157/99, Série II de 1999-07-08 
 Conselho Superior da Magistratura) e/ou do art. 69.° da Lei n.° 3/99 (porque a 
 deliberação recorrida não o esclarece com precisão)»;
 
 «Ou, se assim não se entender, efectuou uma interpretação e aplicação do(s) 
 artigo(s) 3.° do mencionado Regulamente Interno e 69.° da Lei n.° 3/99 violadora 
 do princípio constitucional da igualdade ínsito nos arts. 13.° e norma do art. 
 
 59.°, n.°1, a), da Constituição da República Portuguesa»;
 
 «O entendimento do CSM, relacione-se com o art. 3.° do mencionado Regulamento 
 Interno ou com o art. 69.° da Lei n.° 3/99 é violador do princípio 
 constitucional da igualdade ínsito nos arts. 13.° e 59.°, n.°1, a), da 
 Constituição da República Portuguesa»;
 
 «Tal como se deduz da deliberação do Conselho Permanente do CSM, o entendimento 
 referido, relacione-se com o art. 3.° do mencionado Regulamento Interno ou com o 
 art. 69.° da Lei n.° 3/99 (porque a deliberação recorrida não o esclarece com 
 precisão), é violador do princípio constitucional da igualdade ínsito nos arts. 
 
 13.° e 59.°, n.°1, a), da Constituição da República Portuguesa, pois nada 
 distingue a situação de acumulação de funções que suportei perante a de qualquer 
 juiz não colocado no quadro complementar de juízes que também acumula funções».
 
  
 O recorrente não especificou, por conseguinte, a norma cuja constitucionalidade 
 questionava, o que obsta à verificação do requisito da suscitação prévia, de 
 forma adequada, da questão de constitucionalidade. Isto, porque “a norma sujeita 
 a fiscalização aparece sob a veste de um texto, de um preceito ou disposição 
 
 (artigo, base número, parágrafo, alínea) e é a partir dessa forma verbal que 
 há-de ser encontrada, através dos métodos hermenêuticos” (Jorge Miranda, Manual 
 de Direito Constitucional, Coimbra Editora, 2001, Tomo VI, p. 154).
 Por outras palavras, a norma agora identificada no requerimento de interposição 
 de recurso para o Tribunal Constitucional – a que resulta do artigo 69º, nºs 1 e 
 
 2, da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, em conjugação 
 com o disposto no artigo 3º do Regulamento do quadro complementar de juízes – 
 não foi a norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada durante o processo.
 Por outro lado, resulta até daquelas peças processuais que o recorrente 
 configurou a questão suscitada como questão de inconstitucionalidade da decisão 
 e não de uma qualquer norma, quando sustenta e conclui que:
 
  
 
 «29.Além disso, a deliberação em causa viola, de forma evidente, o disposto no 
 art. 59.°, n.°1, a), da mesma Constituição, que dispõe que “Todos os 
 trabalhadores, sem distinção [...], têm direito à retribuição do trabalho, 
 segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que 
 para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência 
 condigna”»;
 
 «xvi) A deliberação recorrida viola, de forma evidente, o disposto no a. 59.°, 
 n.°1, a), da mesma Constituição, que dispõe que “Todos os trabalhadores, sem 
 distinção [...], têm direito à retribuição do trabalho, segundo a quantidade, 
 natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual 
 salário igual, de forma a garantir uma existência condigna”»;
 
 «20. Além disso, a deliberação em causa viola, de forma evidente, o disposto no 
 art. 59.°, n.°1, a), da mesma Constituição, que dispõe que “Todos os 
 trabalhadores, sem distinção [...], têm direito à retribuição do trabalho, 
 segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que 
 para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência 
 condigna”».
 
  
 Circunstância que obsta ao conhecimento do objecto do recurso, já que ao 
 Tribunal Constitucional cabe apreciar a inconstitucionalidade de normas e não de 
 decisões (artigos 280º e 281º da CRP e 70º da LTC)”.
 
  
 
 3. Desta decisão reclamou o recorrente, ao abrigo do disposto no nº 3 do artigo 
 
 78º-A da LTC, nos seguintes termos:
 
  
 
 «1.º Sinteticamente, ficou expresso na decisão sumária reclamada que o 
 recorrente não suscitou a questão da inconstitucionalidade durante o processo, 
 de modo processualmente adequado, perante o tribunal que proferiu a decisão 
 recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer.
 
 2.º E tal aconteceu, ainda segundo a referida decisão, porque não pode ter-se 
 por verificado o mencionado requisito (estabelecido no art. 75.°-A da LTC) já 
 que, por um lado, a questão da constitucionalidade foi sempre reportada a 
 disposições legais alternativas ou cumulativas (fls. 14 da decisão reclamada), e 
 por outro, a questão suscitada pelo recorrente é da inconstitucionalidade de uma 
 decisão concreta.
 
 3.º Salvo o devido respeito, não é possível concordar nem com os pressupostos de 
 tal decisão sumária, nem com o critério de decisão utilizado, sendo de destacar 
 que o disposto no art. 75.°-A, n.° 2, da LTC foi cumprido, de tal forma que o 
 Supremo Tribunal de Justiça (STJ), que proferiu a decisão recorrida, conheceu 
 efectivamente da questão da constitucionalidade em causa neste recurso. E, por 
 outro lado, a invocação da inconstitucionalidade de uma norma não impede que, no 
 tribunal recorrido, também se tenha invocado a inconstitucionalidade derivada de 
 uma decisão concreta.
 
 4.º Para que se perceba a forma de interposição de recurso concretamente 
 adoptada e a discordância apresentada, há que considerar que o recorrente 
 interpôs recurso para o STJ de uma deliberação do Conselho Superior da 
 Magistratura (CSM).
 
 5.º Nas alegações então apresentadas perante o STJ o recorrente disse 
 expressamente (e tal consta da decisão sumária reclamada) que a deliberação do 
 CSM, recorrida, não esclarece com precisão em que dispositivo legal se baseou 
 para decidir da forma por que o fez, e por isso se escreve no ponto 13. das 
 alegações e ponto 26. do requerimento de recurso “…o entendimento referido, 
 relacione-se com o art. 3.° do mencionado Regulamento interno ou com o art. 69.° 
 da Lei n.° 3/99 (porque a deliberação recorrida não o esclarece com precisão), é 
 violador do princípio constitucional da igualdade ínsito nos arts. 13.° e 59.°, 
 n.°1, a), da Constituição da República Portuguesa, pois nada distingue a 
 situação de acumulação de funções que suportei perante a de qualquer juiz não 
 colocado no quadro complementar de juízes que também acumula funções”.
 
 6.º A leitura da deliberação do CSM só pôde permitir a alegação mencionada, pelo 
 que não podia o recorrente ter outro tipo de precisão quanto aos números e 
 artigos, já que das deliberações do CSM se recorre directamente para o STJ. Está 
 claramente em causa naqueles pontos uma questão de inconstitucionalidade com 
 referência a uma dimensão normativa.
 
 7.º Já o Acórdão do STJ, após tecer considerações sobre o disposto no art. 69.° 
 da Lei n.° 3/99, sustenta, a fls. 12, que “… É esse o sistema retributivo dos 
 juízes do quadro complementar, com o que se conforma o disposto no artigo 3º do 
 Regulamento interno do recorrido, normativo inspirado pelo princípio salário 
 igual para trabalho igual...”.
 
 8.º Face ao decidido pelo STJ foi possível, então, dizer que a norma cuja 
 inconstitucionalidade foi apreciada, e cuja reapreciação se pretende, deriva, 
 para o STJ, da conjugação do disposto no art. 69.° da Lei n.° 3/99 e no art. 3.° 
 da regulamento Interno do CSM referido nos autos; não tinha o recorrente outra 
 forma de se expressar no seu recurso, pretendendo ser rigoroso.
 
 9.º Mas, aqui, há que chamar a atenção para o que, no nosso entendimento, é um 
 lapso da decisão sumária reclamada.
 
 10.º Por um lado não se pretende discutir neste recurso a conformidade com a 
 Constituição do art. 69.° da Lei n.° 3/99 de 13 de Janeiro, ponderado em geral, 
 nem segundo o “bom direito”, nem segundo o “mau direito” (até porque, segundo o 
 recorrente, o art. 69.° não devia ter a interpretação que lhe foi atribuída pelo 
 STJ), pretendendo-se do Tribunal Constitucional (TC) a apreciação da 
 constitucionalidade da interpretação da norma que o STJ fez resultar do art. 
 
 69.° da Lei n.° 3/99 de 13 de Janeiro em conjugação com o art. 3.° do 
 Regulamento Interno relativo à gestão das Bolsa de Juízes, na interpretação 
 concretamente adoptada por aquele Tribunal (idêntica à do CSM), segundo a qual, 
 para efeitos remuneratórios, não se aplica o regime de acumulação de funções 
 constante do art. 69.° da Lei n.° 3/99 de 13 de Janeiro aos juízes colocados nas 
 Bolsas de Juízes, mesmo na situação em que tal exercício de funções tenha 
 implicado um efectivo exercício simultâneo de funções correspondentes a duas 
 titularidades em tribunais judiciais, com realização de todo o serviço judicial 
 pendente em ambos os tribunais.
 
 11.º A norma cuja inconstitucionalidade se pretende que o TC aprecie não se 
 confunde com o dispositivo do art. 69.° da Lei n.° 3/99 ou do art. 3.º do 
 Regulamento do CSM (que, para o recorrente não têm a interpretação acolhida pelo 
 STJ); é sim, porque estamos em sede de fiscalização concreta da 
 constitucionalidade, o critério de decisão (não a decisão) efectivamente 
 utilizado para a resolução da causa, ou ainda, uma interpretação ou dimensão 
 normativa, ainda que na perspectiva de um caso concreto, por referência a um 
 certo dispositivo (sempre a mesma desde o CSM).
 
 12.º Assim, a norma cuja apreciação se pretende seja feita pelo TC é, na 
 realidade, a que dispõe que, para efeitos remuneratórios, não se aplica o regime 
 de acumulação de funções constante do art. 69.° da Lei n.° 3/99 de 13 de Janeiro 
 aos juízes colocados nas Bolsas de Juízes, mesmo na situação em que tal 
 exercício de funções tenha implicado um efectivo exercício simultâneo de funções 
 correspondentes a duas titularidades em tribunais judiciais, com realização de 
 todo o serviço judicial pendente em ambos os tribunais.
 
 13.º Tal norma, segundo o STJ, deriva dos arts. 69.° da Lei n.° 3/99 e 3.° do 
 Regulamento do CSM; segundo o CSM deriva de algum ou alguns desses preceitos; 
 mas é sempre a mesma norma que é inconstitucional.
 
 14.º De resto, não se percebe que regra da LTC proíbe que exista uma cumulação 
 de dispositivos (números de artigos ou de leis) de onde se retira uma norma 
 
 (critério de decisão) cuja inconstitucionalidade se pretende seja apreciada.
 
 15.º Aliás, segundo o Acórdão do TC proferido no processo n.° 95- 045 de 10 de 
 Julho de 1996 (www.dgsi.pt) “...Impendia sobre o reclamante o ónus de avaliar as 
 diversas e possíveis linhas de interpretação normativa susceptíveis de virem a 
 ser utilizadas na resolução do caso submetido a julgamento...”; e no Acórdão 
 proferido no processo n.° 97-63 de 23 de Maio de 1997 (www.dgsi.pt) 
 estabeleceu-se que “...não pode deixar de recair sobre as partes o ónus de 
 considerarem as várias possibilidades interpretativas das normas de que se 
 pretendem fazer valer e de adoptarem, face a elas, as necessárias cautelas 
 processuais....”.
 
 16.º Ora, o recorrido enunciou sempre qual o sentido ou dimensão normativa que 
 tinha por violador da Constituição e, por outro lado, está demonstrado que essa 
 norma, uma interpretação normativa, foi aplicada na decisão impugnada como seu 
 suporte.
 
 17.º Por outro lado, indicando o recorrente, de forma expressa, o critério de 
 decisão (norma) cuja validade constitucional pretende ver apreciada, e havendo 
 identidade desta arguição com aquela feita no tribunal recorrido, a referência 
 de que se pretende especificamente a apreciação dessa norma, quer ela resulte de 
 um ou de outro números de leis (sobretudo quando existiam razões para 
 incertezas), não deixa efectivamente qualquer dúvida, e é até a estratégia 
 processualmente mais sustentada pelo próprio TC.
 
 18.º Mesmo aqui, a referência feita pelo recorrente, nas alegações perante o 
 STJ, de que a norma cuja inconstitucionalidade se suscita pode resultar de um ou 
 de outro dos dispositivos legais, não tem por efeito criar a dúvida sobre qual a 
 norma cuja apreciação se pretende efectivamente, tão-só expressar que, em 
 qualquer dos casos, a norma é inconstitucional. É uma expressão de 
 simultaneidade. Que norma da LTC foi infringida com este comportamento 
 processual?
 
 19.º Podia o recorrente ter arguido a inconstitucionalidade apenas da norma 
 referida enquanto deduzida do art. 69.° da Lei n.° 3/99, mas o STJ ter 
 considerado que tal norma resultava do art. 3.° do Regulamento do CSM; e podia 
 ter ocorrido o inverso.
 
 20.º Para prevenir tal falha o recorrente arguiu perante o STJ a 
 inconstitucionalidade do critério de decisão, em qualquer dos casos, ou seja, 
 independentemente de qual dos dispositivos o STJ a pudesse fazer derivar (porque 
 desconhecia até o recorrente se o STJ admitia a existência de tal norma).
 
 21.º Não se vê de que outra forma poderia o recorrente ter arguido a 
 inconstitucionalidade que pretende ver apreciada pelo TC, em sindicância do 
 juízo de constitucionalidade feito pelo CSM e pelo STJ.
 
 22.º As regras processuais, incluindo as que regem o processo do TC, têm uma 
 razão de ser e um objectivo claros, não se destinando nem a coarctar o direito 
 de acesso aos tribunais, nem a ser meros jogos de palavras ou enigmas que os 
 recorrentes têm de ultrapassar para chegar à possibilidade de apreciação pelo 
 TC.
 
 23.º E, neste caso, o disposto nos arts. 75.°-A, n.°2 e 72.°, n.°2, da LTC não 
 tem outro objectivo que não seja o de obrigar a que o TC seja sempre um tribunal 
 de recurso, que não decida senão sobre a inconstitucionalidade de normas 
 efectivamente aplicadas, em casos em que tal vício foi concretamente suscitado, 
 como diz a lei, de forma a permitir que o tribunal recorrido pudesse 
 pronunciar-se sobre a concreta questão de inconstitucionalidade.
 
 24.º Ora, não podem existir dúvidas de que o STJ pronunciou-se sobre a concreta 
 questão da constitucionalidade suscitada, e fê-lo de forma expressa e 
 inequívoca, sem qualquer dúvida sobre a alegação do recorrente, ponderando, nos 
 termos descritos (como que se retira do teor da fundamentação), que, na sua 
 opinião, esse critério deriva simultaneamente dos arts. 69.° da Lei n.° 3/99 e 
 
 3.° do Regulamento do CSM.
 
 25.º Para quem tenha dúvidas sobre o conceito de norma é de lembrar que logo o 
 Acórdão do TC n.° 86-150-2 de 26 de Julho de 1986 (      ) estabeleceu “...0 
 abandono de uma noção material, doutrinária e aprioristicamente fixada do 
 conceito de norma, em beneficio da opção por um conceito funcional, adequado ao 
 sistema de fiscalização da constitucionalidade...” e que “...0 sistema de 
 fiscalização da constitucionalidade, em geral, tem por objectivo o controlo 
 daqueles actos que contêm uma regra de conduta ou um critério de decisão para os 
 particulares, para a Administração e para os tribunais...”.
 
 26.º Também o Acórdão n.° 95-94-02 de 1 de Março de 1994 (……) afirmou que 
 
 “Constitui jurisprudência reiterada e uniforme deste Tribunal, tal como já antes 
 sucedia com a adoptada pela Comissão Constitucional, que o conceito de “norma”, 
 para o efeito de fiscalização da constitucionalidade, não abrange apenas os 
 preceitos de natureza “geral” e “abstracta”, mas inclui todo e qualquer acto do 
 poder público que contiver uma “regra de conduta” para os particulares ou para a 
 administração, um critério de decisão para esta última ou para o juiz, ou em 
 geral, um padrão de valoração de comportamento”.
 
 27.º E no Acórdão do Tribunal Constitucional n° 106/99, seguido pelo Acórdão do 
 mesmo Tribunal n.° 90/2005 (www.tribunalconstitucional.pt), aceita-se que: “Pode 
 suscitar-se a inconstitucionalidade de uma determinada norma jurídica (ou de 
 várias) ou uma dada interpretação dessa norma (ou de várias). Quando, porém, se 
 suscita a inconstitucionalidade de uma determinada interpretação de certa (ou de 
 certas) normas jurídicas, necessário é que se identifique essa interpretação em 
 termos de o Tribunal, no caso de a vir a julgar inconstitucional, a poder 
 enunciar na decisão, de modo a que os destinatários dela e os operadores do 
 direito em geral fiquem a saber que essa (ou essas) normas não podem ser 
 aplicadas com um tal sentido”.
 
 28.º Ora foi precisamente essa orientação que o recorrente cumpriu, não podendo 
 existir dúvidas sobre qual a norma em causa.
 
 29.º Na doutrina, Oliveira Ascensão relembra que “Toda a regra é necessariamente 
 um critério…mas para o direito a regra é necessariamente um critério de decisão. 
 A regra surge como medianeira da solução jurídica de casos concretos. Dá ao 
 intérprete o critério pelo qual ele pode julgar ou resolver... Mas a norma no é 
 o dado da ordem jurídica. No se confunde com a fonte, realidade objectiva... A 
 regra jurídica pode pois ser caracterizada como um critério material de decisão 
 de casos concretos...” (O DIREITO, Introdução e Teoria Geral, Almedina, 1991, 
 pp. 503e 304).
 
 30.º Por isso, não é possível deixar de entender, como o fez o STJ, que a 
 inconstitucionalidade da norma cuja apreciação se pretende foi suscitada de 
 forma processualmente adequada, ordenando-se o seguimento do processo.
 
 31.º Note-se que a referência feita a fls. 16 da decisão sumária ao ponto 29. 
 das alegações perante o STJ, em que se pondera também a inconstitucionalidade de 
 uma decisão, nada releva, pois não foi ao abrigo dessa alegação que foi 
 interposto recurso para o TC (obviamente que o recorrente sustentou, perante o 
 STJ, que a aplicação de uma norma inconstitucional, num caso concreto, 
 implicaria a inconstitucionalidade de uma decisão; o que agora não releva).
 
 32.º A simples análise do que foi escrito o demonstra; diz-se naquele ponto 29. 
 que “Além disso, a deliberação em causa viola ... a Constituição...”. Ora o 
 simples facto de se ter referido “além disso”, deveria, em boa-fé, fazer notar 
 que “antes” se efectuou uma outra alegação: precisamente a da 
 inconstitucionalidade normativa».
 
 4. Notificado da reclamação, o Conselho Superior da Magistratura respondeu o 
 seguinte:
 
 «1. Não pode deixar de concordar-se com os termos da decisão sumária.
 
 2. Efectivamente, se só no recurso para o Tribunal Constitucional o recorrente 
 especificou a norma cuja constitucionalidade questiona – a que resulta do art° 
 
 69°, n°s 1 e 2, da Lei n° 3/99, de 13 de Janeiro, em conjugação com o art° 3° do 
 Regulamento do Quadro Complementar de Juízes –, deve concluir-se que não 
 suscitou de modo processualmente adequado a questão de inconstitucionalidade 
 perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, não se preenchendo, assim, 
 a previsão da norma ao abrigo da qual o recurso foi interposto – alínea b) do n° 
 
 1 do art° 70° da Lei n° 28/82.
 
 3. Deve, pois, indeferir-se a reclamação».
 
 5. Em 27 de Setembro de 2006, em cumprimento do disposto no artigo 3º, nº 3, do 
 Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 69º da Lei de 
 Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, o recorrente e 
 o recorrido foram notificados para, querendo, se pronunciarem sobre a seguinte 
 questão:
 
  
 
 «Face ao teor do requerimento de reclamação para a conferência, é de admitir que 
 esta venha a decidir não conhecer do objecto do recurso interposto, com 
 fundamento na não aplicação pelo tribunal recorrido da norma cuja 
 inconstitucionalidade o recorrente pretende ver apreciada por este Tribunal, a 
 qual, por outro lado, não foi suscitada durante o processo.
 Com efeito, a decisão recorrida não aplicou a norma que resulta do disposto no 
 artigo 69º, nºs 1 e 2, da Lei nº 3/99, de 13 de Janeiro, em conjugação com o 
 disposto no artigo 3º do Regulamento Interno relativo à gestão da Bolsa de 
 Juízes, na interpretação segundo a qual, para efeitos remuneratórios, não se 
 aplica o regime de acumulação de funções constante do artigo 69º da Lei nº 3/99 
 de 13 de Janeiro aos juízes colocados nas Bolsas de Juízes, mesmo na situação em 
 que tal exercício de funções tenha implicado um efectivo exercício simultâneo de 
 funções correspondentes a duas titularidades em tribunais judiciais, com 
 realização de todo o serviço judicial pendente em ambos os tribunais (fl. 66 e 
 s. dos presentes autos), nem tão-pouco foi esta a norma cuja 
 inconstitucionalidade foi suscitada durante o processo. Perante o Supremo 
 Tribunal de Justiça foi questionada a constitucionalidade do (s) artigo (s) 3º 
 daquele Regulamento Interno e 69º daquela Lei, quando interpretado (s) no 
 sentido de que, designadamente para efeitos retributivos, não se aplica o regime 
 de acumulação de funções aos juízes colocados nas Bolsas de Juízes (fl. 11 dos 
 presentes autos), sem qualquer especificação de trabalho judiciário realizado».
 
  
 
 6. O recorrente respondeu, alegando o seguinte:
 
  
 
 «1º De acordo com o despacho ora proferido existe a possibilidade de o Tribunal 
 Constitucional considerar que o recorrente não suscitou a questão da 
 inconstitucionalidade durante o processo, nomeadamente tendo em conta a 
 especificação do trabalho realizado, e não em geral, e que o Supremo Tribunal de 
 Justiça (STJ) não aplicou a norma cuja inconstitucionalidade o recorrente 
 pretende ver apreciada.
 
 2º Para além do já exposto no requerimento de reclamação para a conferência, que 
 se mantém, há que, sinteticamente, fazer referência às questões colocadas.
 
 3º A questão da constitucionalidade foi efectivamente suscitada, devendo 
 atentar-se que neste tipo de processos, em que o recurso é directo para o STJ, é 
 sempre apresentado um requerimento de recurso, onde se indicam os fundamentos de 
 facto e de direito (art. 172.º, n.º1, do Estatuto dos Magistrados Judiciais), a 
 que se lhe segue a possibilidade de serem efectuadas alegações (art. 176.º do 
 mesmo Estatuto).
 
 4º No ponto 3. do requerimento de recurso dirigido ao STJ consta que “[,,,] como 
 era propósito dessa colocação, e conforme se encontrava acordado com o Exmo. 
 Vogal do CSM [...], durante o período de 4 de Janeiro de 2005 até 11 de Abril de 
 
 2005, despachei diariamente a totalidade dos processos conclusos e presidi a 
 todas as audiências de julgamento simultaneamente na 8.ª Vara Criminal de 
 Lisboa, 1.ª Secção e 7.ª Vara Criminal de Lisboa, 3.ª Secção, e fiz igualmente 
 parte do Tribunal Colectivo em todos os julgamentos das restantes Secções de 
 ambas as Varas’
 
 5º As circunstâncias de facto referidas não podiam, assim, ser mais concretas.
 
 6º Por outro lado, no ponto 13. das alegações de direito apresentadas ao STJ foi 
 sustentado que: “Tal como se deduz da deliberação do Conselho Permanente do CSM, 
 o entendimento referido, relacione-se com o art. 3.º do mencionado Regulamento 
 Interno ou com o art. 69.º da Lei n.º 3/99 (porque a deliberação recorrida não o 
 esclarece com precisão), é violador do princípio constitucional da igualdade 
 
 ínsito nos arts. 13.º e 59.º, n.º1, a), da Constituição da República Portuguesa, 
 pois nada distingue a situação de acumulação de funções que suportei perante a 
 de qualquer juiz não colocado no quadro complementar de juízes que também 
 acumula funções”
 
 7º E, para boa interpretação, note-se que da deliberação do CSM (nessa altura a 
 decisão recorrida), a fls. 2, consta que “[...] Fala o senhor juiz em violação 
 do princípio da igualdade, consagrado no art. 13.º da Constituição, por nada 
 distinguir a situação de acumulação de funções que suportou perante a de 
 qualquer juiz não colocado no quadro complementar de juízes. Mas não tem razão. 
 
 [...].
 
 8º É bem patente a referência concreta à situação concreta do recorrente (à sua 
 especificação do trabalho), e não apenas a ponderação genérica sobre a aplicação 
 dos mencionados regimes ou critérios legais (até pela redacção da parte final do 
 mencionado ponto 13. ou da deliberação do CSM, em que se cuida de chamar a 
 atenção para a situação concreta, constante da fundamentação de facto, por 
 referência à situação abstracta).
 
 9º De resto, o entendimento do CSM foi sempre um entendimento concreto, visando 
 apenas uma situação concreta, a propósito de circunstâncias bem definidas, e não 
 uma ponderação abstracta, apenas referida enquanto forma de raciocínio dedutivo.
 
 10º O entendimento, ou critério de decisão, em vista da sua aplicação ao caso 
 concreto, cuja inconstitucionalidade foi suscitada perante o STJ (como no CSM), 
 foi, claramente, o de que, para efeitos remuneratórios, não se aplica o regime 
 de acumulação de funções aos juízes colocados nas Bolsas de Juízes, mesmo na 
 situação (verificada) em que tal exercício de funções tenha implicado um 
 efectivo exercício simultâneo de funções correspondentes a duas titularidades em 
 tribunais judiciais, com realização de todo o serviço judicial pendente em ambos 
 os tribunais.
 
 11º Foi forçoso concluir que, para o CSM e para o STJ, tal norma resulta do 
 disposto no art. 69.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 3/99 de 13 de Janeiro, em 
 conjugação com o disposto no art. 3.º do Regulamento Interno relativo à gestão 
 das Bolsa de Juízes (Deliberação (extracto) n.° 399/99, Diário da República n.° 
 
 157/99, Série I de 1999-07-08 do Conselho Superior da Magistratura), sendo certo 
 que nem o CSM, nem o STJ fizeram, no dispositivo, referência a qualquer artigo 
 ou norma.
 
 12º Também o STJ, que proferiu a decisão recorrida, conheceu efectivamente da 
 questão da constitucionalidade em causa neste recurso, tendo aplicado a norma 
 cuja inconstitucionalidade se pretende seja apreciada pelo Tribunal 
 Constitucional.
 
 13º É verdade que, como foi referido, o STJ não faz uma referência no 
 dispositivo do acórdão que proferiu a qualquer norma, pois é simplesmente 
 proferida uma decisão de indeferimento.
 
 14º Mas não é possível esquecer a análise da questão efectuada no acórdão 
 recorrido para além da própria decisão.
 
 15º Note-se, com particular cuidado, que a norma ou critério de decisão em causa 
 
 é a que impõe a não aplicação do regime de acumulação de funções (designadamente 
 art. 69. da Lei n.º3/99), por interpretação precisamente dessa norma em 
 conjugação com o artigo 3° do Regulamento Interno do CSM.
 
 16º É a recusa da aplicação do regime de acumulação de funções, por 
 interpretação do referido normativo, que permite identificar o critério 
 utilizado.
 
 17º E, por isso, em rigor, se escreve no acórdão do STJ que “Em consequência a 
 decisão é no sentido da não aplicabilidade ao destacamento do recorrente o 
 regime legal de acumulação de funções, designadamente a sua vertente de 
 remuneração especial complementar” (ponto 5., parte final).
 
 18º Mas logo a seguir, no mesmo acórdão (ponto 6., primeiro parágrafo), se 
 acrescenta “Atentemos agora na vertente de saber se a interpretação das 
 referidas normas no sentido em que o foram [pelo STJ] está ou não afectada de 
 inconstitucionalidade”
 
 19º O que se pretende do Tribunal Constitucional é esta reapreciação da 
 constitucionalidade da interpretação da norma que o STJ fez resultar do art. 
 
 69.º da Lei n.º 3/99 de 13 de Janeiro em conjugação com o art.º 3 do Regulamento 
 Interno relativo à gestão das Bolsa de Juízes, na interpretação concretamente 
 adoptada por aquele Tribunal.
 
 20º Não é o art. 69.º da Lei n.º 3/99 a norma cuja inconstitucionalidade se 
 pretende seja apreciada e cuja aplicação foi recusada.
 
 21º A norma aplicada efectivamente pelo STJ (e, por isso, não houve qualquer 
 dúvida na admissão do recurso para o TC, no STJ), é a que resulta da 
 interpretação restritiva do art. 69.º da Lei n.º 3/99 e do art. 3.º do 
 mencionado regulamento Interno, e que consiste no seguinte preceito: para 
 efeitos remuneratórios, não se aplica o regime de acumulação de funções 
 constante do art. 69.º da Lei n.º 3/99 de 13 de Janeiro aos juízes colocados nas 
 Bolsas de Juízes, mesmo na situação em que tal exercício de funções tenha 
 implicado um efectivo exercício simultâneo de funções correspondentes a duas 
 titularidades em tribunais judiciais, com realização de todo o serviço judicial 
 pendente em ambos os tribunais.
 
 22º A norma cuja inconstitucionalidade se pretende que o TC aprecie não se 
 confunde com o dispositivo do art. 69.º da Lei n.º 3/99 ou do art. do 
 Regulamento do CSM (separada ou conjuntamente); é sim, porque estamos em sede de 
 fiscalização concreta da constitucionalidade, o critério de decisão (não a 
 decisão) efectivamente utilizado para a resolução da causa, ou ainda, uma 
 interpretação ou dimensão normativa, ainda que na perspectiva de um caso 
 concreto, por referência a um certo dispositivo, que foi adoptada.
 
 23º Ora, o recorrido enunciou sempre qual o sentido ou dimensão normativa, em 
 virtude da sua aplicação ao caso concreto, que tinha por violador da 
 Constituição e, por outro lado, está demonstrado que essa norma, uma 
 interpretação normativa, foi aplicada na decisão impugnada como seu suporte e no 
 acórdão do STJ foi especificamente analisada a sua conformidade com a 
 Constituição.
 
 24º No acórdão do STJ não andou aquele Tribunal a efectuar considerações etéreas 
 sobre a constitucionalidade da interpretação que fez, mas a ponderar realmente 
 da conformidade com a Constituição de tal interpretação, e, por isso, lá se 
 escreve que “inexiste, por isso, fundamento legal para que se considere 
 contrária ao disposto no art. 13.º da Constituição a interpretação do artigo 
 
 69.º, n.º 2 da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais no 
 sentido da sua não aplicabilidade ao destacamento de juízes do quadro 
 complementar em mais de um órgão jurisdicional”.
 
 25º A interpretação efectuada, que implicou o indeferimento do requerimento 
 apresentado, no sentido da não abrangência do caso concreto pelo art. 69.º da 
 Lei n.º 3/99, foi utilizada ou aplicada pelo STJ no caso concreto.
 
 26º A sua aplicação no caso concreto implicou o indeferimento por se ter 
 rejeitado que estava preenchida uma determinada previsão, o que não é idêntico à 
 situação de uma norma não ser aplicada a um caso concreto; o que é 
 inconstitucional é a interpretação restritiva da previsão do art. 69.º da Lei 
 n.º 3/99.
 
 27º E, mesmo perante outra perspectiva, é essencial não esquecer que o 
 recorrente também sempre suscitou a questão da constitucionalidade da 
 interpretação feita no caso concreto em consideração do disposto no art. 3.º do 
 mencionado Regulamento Interno do CSM (que estabelece que “Os juízes são 
 nomeados para a bolsa do distrito judicial [...] auferindo o vencimento 
 correspondente ao que lhes competiria se exercessem funções como efectivos nos 
 lugares em que estão destacados e ajudas de custo nos termos da lei geral, sem 
 limite de tempo”).
 
 28º E tal art. 3.º do Regulamento do CSM terá que se considerar aplicado ao caso 
 concreto pelo acórdão do STJ (parágrafo final do seu ponto II.)
 
 29º Como já foi referido na reclamação para a conferência, as regras 
 processuais, incluindo as que regem o processo do TC, têm uma razão de ser, uma 
 lógica e um objectivo claros, não se destinando nem a coarctar o direito de 
 acesso aos tribunais, nem a ser meros jogos de palavras ou enigmas que os 
 recorrentes têm de ultrapassar para chegar à possibilidade de apreciação pelo 
 TC.
 
 30º E, neste caso, o disposto nos arts. 75.º-A, n.º2 e 72.º, n.º2, da LTC, não 
 tem outro objectivo que não seja o de obrigar a que o TC seja sempre um tribunal 
 de recurso, que não decida senão sobre a inconstitucionalidade de normas 
 efectivamente aplicadas (e não sobre questões sem relevância para a decisão a 
 tomar), em casos em que tal vício foi concretamente suscitado, como diz a lei, 
 de forma a permitir que o tribunal recorrido pudesse pronunciar-se sobre a 
 concreta questão de inconstitucionalidade.
 
 31º Ora, não podem existir dúvidas de que a questão da constitucionalidade, em 
 concreto, foi suscitada, o STJ pronunciou-se sobre a concreta questão da 
 constitucionalidade suscitada, e tê-lo de forma expressa e inequívoca, como 
 ponto essencial para a decisão final, sem qualquer dúvida sobre a alegação do 
 recorrente, ponderando, nos termos descritos que, na sua opinião, não existe 
 desconformidade com a Constituição do critério utilizado pelo CSM.
 
 32º Basta notar, em consonância com a LTC, que se a norma em causa não tivesse 
 sido aplicada pelo STJ, o recorrente não teria qualquer interesse no recurso 
 perante o TC, pois a decisão a proferir em nada poderia interferir com o 
 decidido pelo STJ.
 
 33º De resto, caberá a quem sustentar outra posição o ónus da identificação da 
 norma aplicada pelo STJ para a decisão da causa».
 
  
 
 7. O recorrido respondeu sustentando que a reclamação deve ser julgada 
 improcedente.
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II. Fundamentação
 A decisão agora reclamada conclui que o recorrente não suscitou a questão de 
 inconstitucionalidade normativa de modo processualmente adequado perante o 
 tribunal que proferiu a decisão recorrida e que a questão suscitada foi 
 configurada, durante o processo, como questão de inconstitucionalidade da 
 deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura. 
 Não contrariando esta segunda conclusão, já que se limita a destacar que não foi 
 ao abrigo da alegação da inconstitucionalidade da decisão que foi interposto o 
 recurso para este Tribunal, o ora reclamante sustenta, por um lado, que a 
 questão de inconstitucionalidade foi reportada a disposições legais alternativas 
 ou cumulativas, uma vez que “a deliberação do CSM, recorrida, não esclarece com 
 precisão em que dispositivo legal se baseou para decidir da forma por que o 
 fez”; e, por outro, que a norma questionada é a que o Supremo Tribunal de 
 Justiça fez resultar do artigo 69º da Lei nº 3/99, de 13 de Janeiro, em 
 conjugação com o artigo 3º do Regulamento Interno relativo à gestão das Bolsa de 
 Juízes, na interpretação concretamente adoptada por aquele Tribunal (idêntica à 
 do CSM), segundo a qual, para efeitos remuneratórios, não se aplica o regime de 
 acumulação de funções constante do artigo 69º da Lei nº 3/99, de 13 de Janeiro, 
 aos juízes colocados nas Bolsas de Juízes, mesmo na situação em que tal 
 exercício de funções tenha implicado um efectivo exercício simultâneo de funções 
 correspondentes a duas titularidades em tribunais judiciais, com realização de 
 todo o serviço judicial pendente em ambos os tribunais. 
 Independentemente da questão de saber se houve suscitação adequada de uma 
 questão de inconstitucionalidade normativa, o segundo argumento utilizado é, por 
 si só, demonstrativo que a “norma” constante do requerimento de interposição de 
 recurso para este Tribunal não foi aplicada pela decisão recorrida e que não foi 
 sequer questionada, do ponto de vista jurídico-constitucional, durante o 
 processo.
 Com efeito, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça aplica, como ratio 
 decidendi, o artigo 69º da Lei nº 3/99, interpretando-o no sentido da sua não 
 aplicabilidade ao destacamento de juízes do quadro complementar em mais de um 
 
 órgão jurisdicional:
 
  
 
 «Vejamos agora se é ou não aplicável ao destacamento do recorrente o regime 
 legal de acumulação de funções, designadamente no que concerne à respectiva 
 vertente remuneratória (…).
 Tendo em conta o que resulta da lei, o regime legal de acumulação de funções 
 pelos juízes em mais de um juízo, vara ou tribunal, é essencialmente diverso do 
 regime legal de destacamento de juízes integrados no quadro complementar de 
 juízes, e não se trata, ao invés do o recorrente alegou, apenas de diferença 
 meramente formal ou de títulos.
 Com efeito, o primeiro dos referidos regimes, que é excepcional em relação ao 
 regime regra de colocação de magistrados judiciais, pressupõe, além da 
 necessidade do serviço, a deliberação do Conselho Superior da Magistratura nesse 
 sentido e a anuência do magistrado que vai suportar a acumulação.
 O segundo dos mencionados regimes, também excepcional em relação à referida 
 regra de colocação de magistrados judiciais, depende, além do impedimento de 
 juízes ou vacatura de lugares por determinado período de tempo, a ponderação da 
 inconveniência da solução de substituição ou de acumulação.
 Na primeira situação, não há limite de tempo, na segunda a duração mínima é, em 
 regra, de trinta dias, salvo casos de urgência, com direito a ajudas de custo 
 nos termos gerais.
 O normativo que estabelece auferirem os juízes nomeados para a bolsa o 
 vencimento que correspondente ao que lhes competiria se exercessem funções como 
 efectivos nos lugares em que estão destacados visa esclarecer, por exemplo, que 
 se exercerem as funções de juiz de círculo ou equiparado auferirão o vencimento 
 correspondente.
 Assim, o referido normativo é inaplicável à situação em causa, ou seja, não 
 implica que algum juiz da bolsa aufira a remuneração prevista para a acumulação 
 de funções a que se reporta ao artigo 69°, n° 2, da Lei de Organização e 
 Funcionamento dos Tribunais Judiciais.
 A lei prevê a remuneração complementar dos juízes que acumulem funções, mas não 
 a prevê relativamente aos juízes do quadro complementar destacados, salvo no que 
 concerne a ajudas de custo, o que se conforma com a vertente de mobilidade que 
 lhes é próprio.
 A nomeação de juízes integrados no quadro complementar de juízes para exercerem 
 simultaneamente funções em mais de um órgão jurisdicional, naturalmente com 
 vista a superar necessidades prementes do regular funcionamento dos órgãos 
 jurisdicionais, não se traduz em nomeação em acumulação de funções, nem 
 pressupõe o seu consentimento.
 O normativo relativo à remuneração em situações de acumulação do artigo 69° da 
 Lei da Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais assume-se como 
 especial em relação às normas que estabelecem sobre a remuneração dos juízes em 
 geral, certo que, não está em oposição com estas últimas, antes constituindo em 
 relação a elas desvio motivado por particulares situações funcionais.
 A letra e o escopo finalístico da lei, por um lado no quadro da remuneração 
 complementar de juízes, colocados normalmente em órgãos jurisdicionais 
 determinados, e por outro, na vertente do destacamento de juízes da bolsa, este 
 envolvido de significativa particularidade de mobilidade e de satisfação de 
 prementes necessidades funcionais, não permitem a conclusão sustentada pelo 
 recorrente no sentido de que tem direito à supracitada remuneração.
 Trata-se de situações diversas, assentes em pressupostos de facto diversos, em 
 quadro de regimes jurídicos diversificados, com a particularidade de a solução 
 de destacamento de juízes da bolsa só poder funcionar quando não dever operar a 
 solução de acumulação ou de substituição a que a lei se reporta.
 Não se verifica a similitude de situações que permita a aplicação do disposto no 
 artigo 69°, n° 2, da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, 
 por força do artigo 10°, n°s 1 e 2, do Código Civil, à situação em que juízes do 
 quadro complementar sejam destacados para o exercício da função jurisdicional em 
 mais do que órgão jurisdicional.
 A única compensação remuneratória especial que inere aos juízes do quadro 
 complementar é a que decorre do seu direito a ajudas de custo, consoante o local 
 do órgão jurisdicional de destacamento, o que é harmónico com o seu estatuto de 
 mobilidade, a que acima se fez referência.
 Em consequência, a conclusão é no sentido da não aplicabilidade ao destacamento 
 do recorrente o regime legal de acumulação de funções, designadamente a sua 
 vertente de remuneração especial complementar.
 
 6.
 Atentemos agora na vertente de saber se a interpretação das referidas normas no 
 sentido em que o foram está ou não afectada de inconstitucionalidade.
 Alegou o recorrente que o entendimento do recorrido quer se relacione com o 
 artigo 3° do aludido Regulamento, 
 quer se relacione com o disposto no artigo 69° da Lei n° 3/99,de 13 de Janeiro, 
 viola o princípio da igualdade ínsito nos artigos 13° e 59°, 0 1, alínea a), da 
 Constituição (…)
 Inexiste, por isso, fundamento legal para que se considere contrária ao disposto 
 no artigo 13° da
 Constituição a interpretação do artigo 69°, n° 2, da Lei de Organização e 
 Funcionamento dos Tribunais Judiciais
 no sentido da sua não aplicabilidade ao destacamento de juízes do quadro 
 complementar em mais de um órgão jurisdicional (…).
 A interpretação do artigo 69º da Lei de Organização e Funcionamento dos 
 Tribunais Judiciais no sentido da referida inaplicabilidade não infringe o 
 disposto nos artigos 13º ou 59º, nº 1, alínea a), da Constituição» (itálico 
 aditado).
 
  
 Por outras palavras, o Supremo Tribunal de Justiça interpretou aquele artigo da 
 Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais sem que fosse 
 
 “critério da decisão” a inaplicabilidade do regime de acumulação de funções 
 ainda que tenha havido a realização de todo o serviço judicial pendente em ambos 
 os tribunais. Esta especificidade integra não o “critério da decisão”, mas sim a 
 aplicação de tal critério ao caso concreto. É, aliás, sintomático do acabado de 
 referir o que o ora reclamante alega nos pontos 4º e 6º da resposta ao despacho 
 referido no ponto 5. do Relatório: 
 
  
 
 «No ponto 3. do requerimento de recurso dirigido ao STJ consta que “[,,,] como 
 era propósito dessa colocação, e conforme se encontrava acordado com o Exmo. 
 Vogal do CSM [...], durante o período de 4 de Janeiro de 2005 até 11 de Abril de 
 
 2005, despachei diariamente a totalidade dos processos conclusos e presidi a 
 todas as audiências de julgamento simultaneamente na 8.ª Vara Criminal de 
 Lisboa, 1.ª Secção e 7.ª Vara Criminal de Lisboa, 3.ª Secção, e fiz igualmente 
 parte do Tribunal Colectivo em todos os julgamentos das restantes Secções de 
 ambas as Varas’»;
 
 «6º Por outro lado, no ponto 13. das alegações de direito apresentadas ao STJ 
 foi sustentado que: “Tal como se deduz da deliberação do Conselho Permanente do 
 CSM, o entendimento referido, relacione-se com o art. 3.º do mencionado 
 Regulamento Interno ou com o art. 69.º da Lei n.º 3/99 (porque a deliberação 
 recorrida não o esclarece com precisão), é violador do princípio constitucional 
 da igualdade ínsito nos arts. 13.º e 59.º, n.º1, a), da Constituição da 
 República Portuguesa, pois nada distingue a situação de acumulação de funções 
 que suportei perante a de qualquer juiz não colocado no quadro complementar de 
 juízes que também acumula funções”» (sublinhado aditado).
 
  
 De resto, estas passagens e a “norma” formulada pelo recorrente são 
 significativas de uma configuração da questão de inconstitucionalidade como de 
 inconstitucionalidade da decisão, tal como já havia sido destacado na decisão 
 que é objecto da presente reclamação.
 
  
 
  
 
  
 III Decisão
 Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, 
 manter a decisão de não conhecimento do objecto do recurso.
 Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 
  
 Lisboa, 28 de Novembro de 2006
 Maria João Antunes
 Rui Manuel Moura Ramos
 Artur Maurício