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Processo n.º 705/08
 
 1.ª Secção
 Relator: Conselheiro José Borges Soeiro
 
 
 Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
 
 I – Relatório
 
 1. A., S.A, inconformada com a decisão sumária proferida a 9 de Dezembro de 
 
 2008, vem dela reclamar nos seguintes termos:
 
 “1. A recorrente interpôs recurso de agravo do despacho proferido na 1.ª 
 instância, que admitiu à autora o requerimento de depoimento de parte a prestar 
 por pessoa que indicou. 
 
 2. Nesse requerimento, a recorrente requereu a fixação de efeito suspensivo ao 
 agravo. 
 
 3. E no ponto 47 desse requerimento de fixação de efeito suspensivo, a 
 recorrente arguiu a inconstitucionalidade do sentido com que o tribunal aplicara 
 a norma do n° 2 do artigo 553° do CPC, por referência às normas e princípios 
 constitucionais citados nos pontos precedentes desse mesmo requerimento (cf. 
 página 08 do requerimento). 
 
 4. Na verdade, a recorrente pôs a hipótese de essa norma do n° 2 do artigo 553° 
 do CPC ter sido aplicada, implicitamente, com o sentido referido no ponto 45 do 
 mesmo requerimento da recorrente, a saber: ‘[...] no sentido de que cabe à parte 
 que requer o depoimento de uma sociedade o poder de designar quem representará 
 essa sociedade em juízo para esse fim’. 
 
 5. Ao mesmo tempo, a recorrente arguiu a nulidade do despacho recorrido, por 
 falta de fundamentação, já que a decisão recorrida não mencionava o normativo em 
 que se fundara para decidir (cf. página 9 do requerimento citado). 
 
 6. A fls. 289, o tribunal da 1.ª instância decidiu a arguida nulidade suprimindo 
 a omissão de fundamentação, nos seguintes termos: 
 
 [...] consigno que entendo que é à parte que requer o depoimento pessoal que 
 compete indicar a pessoa que o deve prestar, dentro daqueles que, de acordo com 
 os estatutos da ré sociedade anónima, têm poderes para a obrigar – art. 553.º, 
 
 2, CPC e 353° do CC [...]”. 
 
 7. A fls. 288, rejeitou-se o requerimento de efeito suspensivo, sem a menor 
 menção à questão da inconstitucionalidade da referida norma, tão claramente 
 suscitada pela recorrente. 
 
 8. Em reclamação para o Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, a 
 recorrente/reclamante voltou a suscitar, nos mesmos termos, a 
 inconstitucionalidade do n° 2 do artigo 553.º do CPC, na apontada interpretação, 
 agora já acolhida, expressamente, pela 1.ª instância (cf. ponto 47, página 8, 
 dessa reclamação). 
 
 9. Ao mesmo tempo que a recorrente lembrou que o Supremo Tribunal de Justiça 
 acabara de interpretar em sentido oposto a mesma norma, em processo laboral, em 
 que — ao invés do que sucedera nos presentes autos – fora atribuído efeito 
 suspensivo ao recurso que tinha por objecto o despacho de admissão de depoimento 
 de parte (cf. página 2, 2° parágrafo, da citada reclamação). 
 
 10. Essa reclamação mereceu deferimento, parcial, ordenando-se a subida imediata 
 do recurso, o que a 1.ª instância observou. 
 
 11. Na Relação, decidiu-se sumariamente não conhecer do objecto do recurso, com 
 a consideração, designadamente, de que ‘[...) não se vislumbra onde é que possa 
 existir dilema moral, constrangimento moral traduzido numa ofensa à integridade 
 moral [...]’ (cf. 1° parágrafo, pág. 4, dessa decisão). 
 
 12. Essa decisão sumária teve, pois, em conta a mencionada questão de 
 inconstitucionalidade, porque é por referência à essa mesma questão que a 
 recorrente põe a questão da ofensa à integridade moral. 
 
 13. Em reclamação dessa decisão, para a Conferência, a recorrente/reclamante 
 voltou a referir-se à questão da inconstitucionalidade do n° 2 do artigo 553° do 
 CPC, ‘na interpretação inicialmente acolhida pelo tribunal a quo e confirmada na 
 douta decisão ora reclamada’ (cf. ponto 23 dessa reclamação). 
 
 14. A Conferência, na Relação, veio a proferir acórdão praticamente nos mesmos 
 termos da decisão reclamada. 
 
 15. Isto é, nesse acórdão, a Relação rejeitou que a decidida admissão do 
 depoimento de parte da sociedade ré, através da pessoa indicada pela autora, 
 possa traduzir-se em qualquer violação do direito à integridade moral, sendo 
 esse, afinal, o fundamento básico da questão da suscitada inconstitucionalidade 
 do n° 2 do artigo 553° do CPC, na interpretação que as instâncias acolheram, por 
 referência ao artigo 25°, n.º 1 da CRP. 
 
 16. Foi desse acórdão que a recorrente recorreu para o Tribunal Constitucional, 
 identificando a norma do n° 2 do artigo 553° do CPC, como norma cuja 
 inconstitucionalidade se suscita. 
 
 17. Deste modo, salvo o devido respeito, afigura-se incompreensível que na douta 
 decisão sumária, ora reclamada: 
 a) Se entenda que a questão da inconstitucionalidade do n° 2 do artigo 553° do 
 CPC não foi suscitada durante o processo em termos adequados (?), ‘relativamente 
 a norma ou normas que tenham sido aplicadas pela decisão a quo enquanto ratio 
 decidendi’; e 
 b) Se conclua ‘pela respectiva impossibilidade de conhecimento na medida em que 
 um juízo sobre a eventualidade constitucionalidade da norma impugnada não 
 reflectiria qualquer efeito útil nos autos — sempre subsistiria a decisão a quo 
 
 [...]’. 
 
 18. Mas a decisão a quo não é, precisamente, a que teve por efeito o não 
 conhecimento imediato do recurso, nos termos que suscitam a questão de 
 inconstitucionalidade? 
 
 19. E não está bem claro que essa questão de inconstitucionalidade foi suscitada 
 e discutida durante o processo, até ao esgotamento dos mecanismos de recurso 
 ordinário? 
 
 20. O que sucedeu foi que tal questão não foi, como devia ter sido, enfrentada, 
 pelas instâncias. 
 
 21. Mas o facto de a questão de inconstitucionalidade não ter sido conhecida 
 adequadamente, durante essa discussão, não pode dar lugar à conclusão, no 
 Tribunal Constitucional, de que essa inadequação se refere ao modo como a 
 recorrente suscitou a questão! 
 
 22. Para conhecer, adequadamente, dessa questão, como lhe compete, deve agora o 
 Tribunal Constitucional agir no sentido de, pelo menos no seu seio, ser a 
 questão, finalmente, adequadamente discutida e decidida.” 
 
 2. A decisão reclamada, e no que ora importa, tem o seguinte teor:
 
 “2.1. O recurso que a Recorrente pretendeu interpor pressupõe a suscitação de 
 questão constitucionalidade normativa durante o processo, em moldes 
 processualmente adequados, relativamente a norma ou normas que tenham sido 
 aplicadas pela decisão a quo enquanto ratio decidendi. A ratio decidendi, isto 
 
 é, o critério decisivo do acórdão recorrido (acórdão proferido em conferência 
 pela Relação de Lisboa) assenta no sentido atribuído aos artigos 84.º, e 86.º, 
 do Código de Processo do Trabalho, em conjugação com os artigos 733.º, e 741.º, 
 do Código de Processo Civil, pelo qual se determinou o efeito e modo de subida 
 do recurso.
 
 2.2. Ora, o que a Recorrente pretende agora é ver apreciada a 
 constitucionalidade do artigo 553.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, 
 interpretado, como foi nos autos, no sentido de que “cabe à parte que requer o 
 depoimento de uma sociedade o poder de designar quem representará essa sociedade 
 em juízo para esse fim.” No entanto, como vimos, não é na interpretação desta 
 norma que reside o fundamento da decisão recorrida. Assim sendo, e na medida em 
 que o recurso de constitucionalidade em apreço pressupõe, em ordem à sua 
 admissão, um juízo prévio acerca da sua utilidade, conclui-se pela respectiva 
 impossibilidade de conhecimento na medida em que um juízo sobre a eventual 
 constitucionalidade da norma impugnada não reflectiria qualquer efeito útil nos 
 autos – sempre subsistiria a decisão a quo, estando relegada a apreciação 
 definitiva sobre a questão de constitucionalidade suscitada pela Recorrente para 
 um momento posterior. 
 Em face do exposto, por falta de pressupostos, não pode conhecer-se do objecto 
 do presente recurso.”
 
 3. O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se 
 no sentido da improcedência da reclamação.
 Cumpre apreciar e decidir.
 II – Fundamentação
 
 4. A reclamação deduzida carece manifestamente de fundamento. Com efeito, a 
 argumentação da Reclamante em nada abala a fundamentação da decisão sumária 
 reclamada.
 
 4.1. Repete-se que a ratio decidendi da decisão a quo – Acórdão da Relação de 
 Lisboa de 2008 – assenta no bloco normativo apontado na decisão sumária 
 reclamada e com base no qual foi fixado o regime de subida e efeito do agravo 
 interposto previamente pela Reclamante. Quaisquer referências ao artigo 553.º, 
 n.º 2, do Código de Processo Civil, nomeadamente a apreciação da questão 
 suscitada pela Reclamante, constituem obiter dicta face a tal ratio decidendi. E 
 o Tribunal Constitucional não pode apreciar, sob pena de desvirtuar a 
 arquitectura do recurso de constitucionalidade, em que actua apenas em sede de 
 recurso e desde que a sua pronúncia revista um reflexo útil nos autos, os 
 critérios normativos das decisões judiciais em tudo o que não contenda com a 
 respectiva ratio decidendi. Um juízo sobre a eventual incompatibilidade com 
 princípios e regras constitucionais do artigo 553.º, n.º 2, do Código de 
 Processo Civil, na dimensão apontada, não implicaria qualquer alteração de tal 
 decisão, i.e., no regime fixado a tal agravo. 
 
 4.2. Consequentemente, não tendo sido, sequer, aplicada pela decisão recorrida a 
 norma cuja inconstitucionalidade é invocada pela Reclamante, resta concluir pela 
 impossibilidade de conhecimento do recurso, e, consequentemente, pela manifesta 
 improcedência da presente reclamação.
 III – Decisão
 
 5. Assim, e, sem necessidade de maiores considerações, acordam, em conferência, 
 indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão 
 reclamada no sentido de não tomar conhecimento do recurso.
 Custas pela Reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 Lisboa, 28 de Janeiro de 2009
 José Borges Soeiro
 Gil Galvão
 Rui Manuel Moura Ramos