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Processo nº 935/2006
 
 2ª Secção
 Relator: Conselheira Maria Fernanda Palma
 
  
 
  
 
  
 Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 I
 Relatório
 
  
 
 1.  Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos 
 do Tribunal da Relação de Lisboa, em que figuram como reclamantes A. e Outro e 
 como reclamada B., foi julgada procedente uma acção de despejo por obras não 
 autorizadas.
 Os réus interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, apresentando 
 alegações que concluíram do seguinte modo:
 
  
 
 1ª  De todo em todo não foi alegada, qualquer eliminação de uma porta e 
 colocação de um arco, nem é facto instrumental, sendo antes essencial por ter 
 servido e até ditado a procedência da acção juntamente com a restante ou 
 primeira parte da resposta ao quesito 10º. 
 
 2ª  Só que apesar de igualmente não ter sido alegado esse outro facto de que os 
 RR. procederam à demolição parcial de uma parede ser essencial também ele não 
 completa nem concretiza qualquer outro, designadamente o conteúdo do aludido 
 quesito 10º pois este constitui a mera alegação vaga e genérica de que os «RR. 
 procederam à demolição de paredes no interior do locado». 
 
 3ª  Do facto do R. marido ter assumido a autoria da demolição e eliminação da 
 conclusão anterior não é lícito concluir daí e sem mais que a ele e a ambos 
 tenha sido facultado o exercício do contraditório. 
 
 4ª  E tanto pior, porquanto se silencia ou esquece a R. mulher que assim e sem 
 mais também é e se vê discriminada relativamente ao marido e sancionada com o 
 despejo a partir de um facto sobre o qual não foi ouvida nem chamada para nada 
 ou coisa alguma quando ela é tanto inquilina quanto ele. 
 
 5ª  E tudo isso ou que vem descrito desde 1 não resultou da instrução e 
 discussão da causa tendo assim surgido e aparecido nos autos ao arrepio do 
 principio do contraditório particularmente previsto no artigo 264° bem como com 
 carácter geral no artigo 3º ambos do C.P.C. 
 
 6ª  E não tendo o A. manifestado a vontade de se aproveitar de algum dos factos 
 em apreço ou da resposta ao quesito 10° isso também corresponde a dizer que a 
 causa de pedir foi indevidamente alterada, ofendido o princípio da estabilidade 
 da instância e a ocupação de questões não suscitadas pelas partes e a tomada em 
 consideração na douta sentença de factos não alegados e ao arrepio dos dois 
 artigos da conclusão anterior e ainda 273°, 268°, 659°, 660º e 664° também do 
 C.P.C. 
 
 7ª  Consequentemente a factualidade da aludida resposta ao quesito 10º surge a 
 fundamentar a douta sentença e a determinar a sua procedência inteiramente ao 
 arrepio das disposições legais da conclusão anterior e como assim deve ser 
 anulada e eliminada tendo-a por não escrita e não tida em conta na douta 
 sentença e se não na sua totalidade, então e no mínimo, a dita segunda parte da 
 resposta ao quesito n° 10º na medida que refere a eliminação da porta e 
 colocação do arco e sempre ou em qualquer dos casos absolvendo totalmente os 
 RR.. 
 
 8ª  Por igual ou maioria de razão ou como é bom de ver, o que se escreve desde a 
 
 1ª Conclusão sobre a resposta ao quesito n° 10 da BI (que aqui se dá por 
 reproduzido) tem inteiro cabimento quanto àquela outra parte supra transcrita e 
 sublinhada a fls. 5 da douta sentença reportada à materialização da eliminação 
 parcial da parede e porta. 
 
 9ª  Havendo de realçar que sobre essa outra «novidade ou surpresa processual» 
 nem se pode dizer que foi indicada ao Tribunal pelo R. marido nem que este tenha 
 assumido a sua autoria, porque na realidade não o foram de todo em todo nem tal 
 consta de alguma outra folha dos autos exceptuando a referida sentença. 
 
 10ª  E como não foram previamente ouvidos sobre essa factualidade também aí não 
 lhes foi assegurado o direito de contraditar ou defesa nem lhes foi 
 proporcionada a oportunidade para se poderem justificar, ficando assim impedidos 
 de exercer esse direito fundamental e essencial em qualquer País do mundo 
 civilizado. (art° 11º da Declaração Universal dos Direitos do Homem).
 
 11ª  Semelhante interpretação e aplicação privou por completo o interessado de 
 apresentar a sua defesa, nega-lhes o direito de escolher residência, discrimina 
 a R. na medida em que a esquece ou não importa para nada a não ser...para ser 
 despejada. (26° n° 1; 36° n° 3; 44°; 18° n° 2; 65° n° 1; 204° e 205° da 
 Constituição da República Portuguesa).
 
 12ª  E considerando que o conteúdo genérico do direito fundamental do acesso aos 
 Tribunais leva implícita a proibição da indefessa ou a não permissão da mesma 
 há-de ter-se por seguro que a norma da alin. d) do n° 1 do artigo 64° do RAU 
 quando interpretada e aplicada, como foi na douta sentença em apreço, ou por 
 forma a ordenar o despejo sem a prévia audição naquela parte e medida padece de 
 inconstitucionalidade por ofensa daquele outro princípio e que também é 
 constitucional. 
 
 13ª  E o que tudo significa que a douta sentença em causa violou, para além 
 daquela alin. d) n° 1 do artigo 64° do RAU, n° 3 do 3°, do C.P.C. e ainda os 
 princípios constitucionais do acesso ao direito, do contraditório e da 
 conformação do processo segundo os direitos fundamentais desaplicando o n° 1 do 
 artigo 20° da Constituição da República Portuguesa. 
 
 14ª  E de igual modo também essa outra parte deve ser anulada e eliminada 
 tendo-se por não escrita e consequentemente não tida em conta na douta sentença 
 e absolvendo os RR. do pedido. 
 
 15ª  Também não se pode dar como provado o quesito 11º mesmo na forma restrita 
 em que foi ou seja de «provado apenas que as obras referidas em 10 foram 
 realizadas sem a autorização verbal ou por escrito dos senhorios». 
 
 16ª  Independentemente de saber a quem compete a prova do mesmo, se ao senhorio 
 se aos RR., a verdade é que a estes e, como atrás abundantemente se diz e 
 demonstra nas conclusões anteriores, não foi dada oportunidade de o fazer uma 
 vez que ela foi surpreendida com o aparecimento nos autos da demolição parcial 
 da parede e os dois RR. com a eliminação da porta e colocação de um arco no seu 
 lugar. 
 
 17ª  Deste modo os RR. nunca poderiam ter feito a prova de que as obras 
 referidas em I e II foram realizadas com autorização verbal ou por escrito do 
 senhorio se e por quanto às primeiras ela foi apanhada de surpresa e 
 relativamente quanto às segundas ambos só ouviram falar delas na Sentença e 
 tanto mais que resultaram não propriamente da instrução e discussão da causa mas 
 antes da inspecção judicial levada a cabo depois de ouvidas todas as testemunhas 
 e assim sendo aos RR. não pode ser exigido o impossível e daí dever dar-se como 
 não provado o quesito 11º. 
 
 18ª  De toda a maneira a acção deve ser julgada improcedente por a eventual 
 factualidade, que se venha a dar como provada não integra a alteração 
 substancial do locado prevista na alínea d) do n° 1 do artigo 64° do RAU uma vez 
 que tais obras não se traduzem em modificação considerável definitiva, podendo 
 tudo ser reposto no estado anterior sem demoras e danos da primitiva estrutura 
 do locado e por uma quantia irrisória. 
 
 19ª  Ao entender e decidir de modo diverso, a douta sentença recorrida violou 
 entre outras as disposições legais citadas nestas conclusões. 
 Termos em que deve dar-se provimento ao presente recurso.
 
  
 O Tribunal da Relação de Lisboa proferiu, em 6 de Julho de 2001, o seguinte 
 acórdão:
 
  
 
 1.  C., que veio a falecer no dia 10‑3‑2005, deixando como sucessora habilitada 
 B., propôs no dia 29-4-2002 acção de despejo contra A. e D. pedindo que se 
 decrete a resolução do contrato de arrendamento respeitante ao prédio urbano com 
 a área de 156 m2, dos quais 109 m2 são de logradouro, situado na Travessa do …, 
 freguesia de Santa Maior, concelho do Funchal, de que os RR são arrendatários, 
 ordenando‑se o despejo com entrega imediata do mesmo ao A., totalmente livre e 
 desocupado. 
 
 2.  O A. alegou que os RR procederam a obras, sem autorização, que integram o 
 fundamento resolutivo constante do artigo 64º/1, alínea d) do R.A.U., a saber: 
 
 –  Construção de uma dependência, que ocupa 16 m2 do quintal cuja área de 109 m2 
 ficou reduzida a 93 m2, utiizada como cozinha e quarto de jantar (artigos 12º a 
 
 14º da petição).
 
 –  Dependência que está unida à casa arrendada dando acesso ao seu interior 
 através de uma porta (artigos 15º e 16º da petição. 
 
 –  Em Fevereiro de 2002 os RR fecharam a blocos de cimento uma porta exterior 
 existente no lado norte do locado, transformando-a em janela. (artigo 18º da 
 petição).
 
 –  Nas divisões interiores foram demolidas paredes, modificando a disposição 
 interna das divisões do locado (artigos 21º e 31º in fine).
 
 3.  Na contestação, os RR alegam que a dependência foi construída pelos 
 anteriores arrendatários em 1979, conhecidas e autorizadas pelo A que vive 
 
 “paredes meias” com a casa dos autos.
 
 4.  A dependência ocupa apenas 12 m2 do quintal e tem 2 m de altura.
 
 5.  Existia do lado norte porta com tapassol velho e estragado, que não impedia 
 a entrada da chuva e, por isso, em Fev. 2002 os RR taparam 86 cm da parte de 
 baixo da porta, com blocos de cimento, deixando a água de entrar para dentro de 
 casa. 
 
 6.  A acção foi julgada procedente. 
 
 7.  Na decisão não se considerou que a construção do anexo constituísse 
 fundamento resolutivo porque a sua construção foi efectuada por anterior 
 arrendatário do locado. 
 
 8.  Das obras efectuadas a considerar, para efeito resolutivo, fica (a) o fecho 
 da porta com blocos de cimento e (b) a eliminação parcial de parede e eliminação 
 da porta com colocação no seu lugar de um arco.
 
 9.  Quanto às primeiras, a decisão considerou que a realização das obras foi 
 determinada por estado de necessidade já que a porta do tapassol, anteriormente 
 existente no local, estava podre e deixava entrar água, não alterando a 
 estrutura externa do prédio. 
 
 10.  Quanto às segundas, entendeu a decisão que “estão relacionadas com a 
 disposição interna das divisões do locado e traduzem-se numa modificação 
 permanente do número e configuração da sua planta interior”.
 
 11.  Prossegue a decisão referindo que no caso concreto “a eliminação parcial da 
 parede e da porta aí existente materializou‑se na diminuição de uma das divisões 
 do prédio, já que dois dos quartos anteriormente existentes, com eliminação 
 parcial da parede e da porta aí existente, ficaram reduzidos a um único quarto, 
 embora com maior dimensão”. 
 
 12.  Foi esta obra que conduziu a acção à procedência por se preencher a 
 previsão legal acima referida (artigo 64º, nº 1, alínea d) do RAU).
 
 13.  Nas suas alegações de recurso os RR consideram que a referência “à 
 eliminação de uma porta colocando no seu lugar um arco” constitui facto 
 inteiramente novo que não se pode considerar contido no âmbito do quesito 10º 
 que encerra a alegação vaga e genérica de que “os RR procederam à demolição de 
 paredes no interior do locado”.
 
 14. O facto de o réu ter assumido a autoria da demolição e eliminação 
 desrespeita o contraditório na medida em que a sua mulher “não foi ouvida nem 
 achada para nada ou coisa alguma quanto ela é tão inquilina como ele”.
 
 15.  Tal factualidade não resultou da instrução nem discussão da causa, 
 desrespeitando‑se, assim, o disposto no artigo 264º e o artigo 3º ambos do 
 C.P.C.
 
 16.  Houve, assim, indevida alteração da causa de pedir.
 
 17.  A resposta ao aludido quesito 10º deve ser dada como não escrita pelo menos 
 no que respeita à parte final “eliminação da porta e colocação no seu lugar de 
 um arco”. 
 
 18.  Aliás, no que a esta parte da matéria de facto respeita, o réu não assumiu 
 a sua autoria, nem essa autoria consta dos autos. 
 
 19.  Foi, assim, prejudicado o direito de defesa dos RR que não se puderam 
 defender sobre esse ponto.
 
 20.  Tudo isto traduz violação dos princípios constitucionais do acesso ao 
 direito, do contraditório e da conformação do processo segundo os direitos 
 fundamentas, desaplicando o nº 1 do artigo 20º da Constituição da República 
 Portuguesa. 
 
 21.  Por isso, porque tais factos são novos e os RR deles não se defenderam, 
 porque não podiam defender‑se, deve ser dada como não provada a resposta ao 
 quesito 11º (“Todas estas obras foram realizadas sem autorização verbal ou por 
 escrito dos senhorios”).
 
 22.  Alegam finalmente os recorrentes que “ tais obras não se traduzem em 
 modificação considerável definitiva, podendo tudo ser reposto no estado anterior 
 sem demoras e danos da primitiva estrutura do locado e por uma quantia 
 irrisória”. 
 
 23.  Factos provados: 
 
 1 – O A. é dono e legítimo proprietário de um prédio urbano com a área de 156 
 m2, dos quais 109 m2 são logradouro, situado na Travessa do …, freguesia de 
 Santa Maria Maior, concelho do Funchal, a confrontar do Norte com herdeiros de 
 E., Sul e Leste com F. e Oeste com G. inscrito na matriz sob o artigo 1157º (A).
 
 2 – Este prédio veio à posse e propriedade do Autor por sucessão legítima, por 
 
 óbito de sua esposa, H., a qual faleceu em 22‑7‑2001, sem ascendentes e sem 
 descendentes, tendo‑lhe sucedido como seu único e universal herdeiro (B).
 
 3 – Tendo, por sua vez, o casal do autor adquirido o mesmo por sucessão 
 legítima, por óbito de seu pai e sogro, I. (C).
 
 4 – Em 1‑2‑1962, o casal do autor deu de arrendamento ao irmão e cunhado dos 
 réus, J., de modo verbal, com destino a habitação e pela renda mensal de 500$00, 
 o referido prédio (D).
 
 5 – Aquando do arrendamento do referido J., a sua mãe, Encarnação da Silva 
 Pereira e sua irmã, A., ora ré, foram viver com ele no locado (E).
 
 5 – A ré A. casou com D. (F).
 
 6 - Por volta de 1967, o casal J. e mulher emigraram para a Inglaterra (1º).
 
 7 – Por volta do ano de 1990, o casal do referido J. regressou definitivamente à 
 RAM, indo viver para casa e companhia de um filho, localizado no beco do …, 
 freguesia do Monte, concelho do Funchal, em comunhão de mesa e habitação, onde 
 fixaram a sua residência permanente, deixando de viver no locado (G).
 
 8 – A mãe da ré, L. e os réus A. e marido, D., continuaram a viver no locado, 
 sendo que a partir de 1990, era aquela L. quem pagava a renda ao casal do autor, 
 passando os respectivos recibos (H).
 
 9 – Em 10-6-1998, a mãe e sogra dos réus, L., faleceu, ficando estes a viver no 
 local (I).
 
 10 – Deste modo, o contrato de arrendamento em vigor entre o casal do Autor e a 
 falecida L. passou a vigorar entre o autor e os ora réus  (J). 
 
 11 – Junto à casa arrendada, mais precisamente do lado poente do quintal, existe 
 uma dependência que é utilizada pelos réus como cozinha e sítio para comer (L).
 
 12 – Este compartimento encontra‑se unido ao lado poente do locado, dando acesso 
 para o interior do mesmo através de uma porta e tem acesso para o lado sul do 
 quintal através de uns degraus de mosaicos (M).
 
 13 - O casal J. e mulher construiu a dependência aludida em L) e M) em blocos de 
 cimento, devidamente revestido e pintado de branco por fora e por dentro, 
 coberto de folhas de zinco, com duas portas de alumínio e janelas de ferro, com 
 luz eléctrica e água canalizada, sendo que a dependência está ligada à casa, por 
 cima, através de folhas de zinco, do lado Norte, pela porta e por uma viga em 
 cimento na parte de cima que a suporta, e do lado Sul, por outra porta que dá 
 acesso ao quintal (2).
 
 14 – O pavimento desta dependência é em mosaicos (3).
 
 15 – Esta construção ocupa cerca de 16 m2 do quintal e tem do lado Norte a 
 altura de 1,26 metros e do lado Sul 1,07 metros (4).
 
 16 – O A. e a sua falecida mulher sempre viveram paredes meias com a casa 
 arrendada por isso sempre conheceram as obras referidas de 13 a 15 (17 e 18). 
 
 17 – Os RR procederam à demolição parcial de uma parede e à eliminação de uma 
 porta, colocando no seu lugar um arco  (10).
 
 18 – As obras referidas em 17 foram realizadas sem autorização verbal ou por 
 escrito dos senhorios (11).
 
 19 – Do lado Norte do locado, existia uma porta com tapassol que estava todo 
 velho e estragado, que nunca era usado pelos réus e que, quando chovia, entrava 
 
 água para dentro de casa (21 e 23).
 
 20 – Para resolver esta situação, em Fevereiro de 2001, os RR taparam 71,50 cm 
 da parede de baixo da porta com blocos de cimento, mantendo a parte superior do 
 tapassol e assim passou a não entrar água para dentro de casa (24 e 25).
 Apreciando: 
 
 24.  A primeira observação a fazer é que a demolição parcial de uma parede no 
 interior da casa e eliminação de uma porta, colocando no seu lugar um arco, se 
 materializou, para usar a expressão da própria sentença, “na diminuição de uma 
 das divisões do prédio, já que dois dos quartos anteriormente existentes, 
 ficaram reduzidos a um único quarto, embora de menor dimensão”.
 
 25.  Esta realidade não é negada pelos recorrentes. 
 
 26.  Os recorrentes sustentam que o tribunal, quando respondeu ao quesito 10º 
 
 (“Os RR procederam à demolição de paredes no interior do locado?), quesito 
 formulado a partir do alegado no artigo 21º da petição (“Para além das 
 transformações da porta em janela, os RR procederam também a alterações nas 
 divisões interiores, demolindo paredes no interior do locado”) respondeu 
 excessivamente visto que deu como provado que “os RR procederam à demolição 
 parcial de uma parede e à eliminação de uma porta, colocando no seu lugar um 
 arco”.
 
 27.  Essa matéria final “eliminação de porta, colocando em seu lugar um arco”, 
 não foi objecto de alegação e, por conseguinte, não houve, quanto a ela, defesa. 
 
 
 
 28.  Aceitar‑se tal factualidade, seria afinal permitir a introdução de matéria 
 relevante sem se possibilitar o exercício do contraditório, desrespeitando-se os 
 direitos de defesa.
 
 29.  Os recorrentes pretendem que, no mínimo, este Tribunal considere a resposta 
 não escrita na parte que têm por excessiva e, assim sendo, a resposta ao quesito 
 ficaria assim redigida: “provado que os réus procederam à demolição parcial de 
 uma parede”. 
 
 30.  Não oferece dúvida que uma resposta excessiva deve considerar‑se não 
 escrita, ou seja, deve ser eliminada, e muito justamente porque, a não ser 
 assim, por via do excesso, permitir‑se‑ia a inclusão de matéria de facto não 
 articulada, o que constitui violação do princípio dispositivo (artigo 264º do 
 CPC) e, consequentemente, dos princípios do contraditório (artigo 3º do CPC) e 
 da proibição da indefesa: ver Ac. do STJ de 5‑5‑2005 (Custódio Montes) (P. 
 
 1078/2005) onde se refere que “respondendo o tribunal ao quesito por excesso, 
 aditando matéria de facto não alegada, deve o tribunal superior eliminá‑la, ao 
 abrigo do disposto no art. 646º nº 4 do CPC” e também o Ac. do S.T.J. de 
 
 6-1-2004 (Ribeiro de Almeida) (revista nº 1648/2004 da 6ª secção) onde se 
 refere: “assim, a resposta explicativa (à matéria de facto quesitada) só será 
 excessiva desde que não esteja no âmbito da matéria articulada e no âmbito do 
 objecto da acção; tratando-se de um acidente de viação, a resposta explicativa 
 não exorbita o âmbito do quesito (relativo ao estado dos travões e ao sistema de 
 travagem) já que a explicação incidiu sobre a causa do estado do sistema de 
 travagem ou ainda o Ac. da Relação do Porto de 17‑6‑1977 (Joaquim Gonçalves) 
 C.J., 5, pág. 1149 assim sumariado: “As respostas excessivas ou exuberantes aos 
 quesitos, na medida em que o sejam, considerar‑se‑ão não escritas, isto é, não 
 produzirão qualquer efeito, a não ser que, situando‑se dentro da matéria 
 articulada, devam considerar‑se explicativas” (acórdãos do STJ consultáveis em 
 
 www.dgsi.pt).
 
 31.  O processo deixaria de ser equitativo e leal. 
 
 32. Houve, é certo, nesta temática, alguma limitação ao princípio dispositivo, 
 decorrente da oficiosidade resultante dos “ factos instrumentais que resultaram 
 da instrução e discussão da causa” (artigo 264º/2 do CPC) e até mesmo dos factos 
 essenciais que sejam “complemento ou concretização de outros que as partes hajam 
 oportunamente alegado” conquanto (a) “resultem da instrução e discussão da 
 causa”, (b) “desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se 
 aproveitar” e (c) “à parte contrária tenha sido facultado o exercício do 
 contraditório” (artigo 264º/3 do C.P.C.). 
 
 33.  Mas esta limitação do princípio dispositivo não pode ir ao ponto de a busca 
 da verdade material – que se traduz na coincidência entre os factos provados e 
 os factos realmente verificados – aligeirar os cuidados que a lei põe no tocante 
 ao ónus de alegação e de prova.
 
 34.  Há situações em que o tribunal se pode ver envolvido num dilema que resulta 
 do conflito entre o conhecimento real das coisas, que alcançou directamente, 
 designadamente quando há inspecção ao local, como sucedeu no caso vertente, e a 
 matéria que resulta da base instrutória, limitada necessariamente aos factos 
 alegados.
 
 35.  Em regra o conhecimento do tribunal advém-lhe do contacto directo com 
 terceiros, designadamente as testemunhas e peritos, que tiveram conhecimento 
 directo da realidade; no entanto, nesta e noutras situações similares o tribunal 
 vê‑se colocado perante o facto de ele próprio ficar também a conhecer 
 directamente uma realidade e, não a considerando, ver‑se colocado na mesma 
 situação da parte, que arrolou testemunhas que presenciaram essa mesma realidade 
 e cujo depoimento foi credível e, no entanto, não vê o depoimento prestado 
 assumir expressão nas respostas dadas à base instrutória.
 
 36.  E tudo isto com uma nota acrescida muito relevante: é que ao juiz cabe 
 proferir a decisão e, assim sendo, ele vai responder à matéria de facto que ele 
 sabe, por via directa, que não traduz a realidade que importa à resolução do 
 litígio. 
 
 37.  Se o princípio da imediação, nestes casos, é levado às últimas 
 consequências porque o tribunal presencia a realidade, também é levada às 
 
 últimas consequências o princípio dispositivo.
 
 38.  Dir‑se‑á que não há nenhuma razão para surpresa porque a inspecção judicial 
 não é diligência destinada a fazer o tribunal enriquecer‑se com a factualidade 
 que não foi, mas deveria ter sido alegada; o seu propósito é apenas o de 
 permitir que o tribunal se esclareça sobre qualquer facto que interesse à 
 decisão da causa” (artigo 612º, nº 1 do C.P.C.) e não que o tribunal 
 oficiosamente indague e inscreva no rol dos factos todos aqueles que 
 interessariam à decisão da causa. 
 
 39.  A matéria constante da parte final da resposta ao aludido quesito 10º tem 
 natureza essencial e não instrumental. 
 
 40.  Basta considerar que, por si, é suficiente para que a acção proceda, 
 considerado o fundamento invocado. A eliminação de porta colocando em seu lugar 
 um arco permite ligar duas divisões, ou seja, altera a “disposição interna das 
 divisões” do local arrendado. Já a mera “demolição parcial de uma parede” não 
 impõe de facto aquela conclusão.
 
 41.  Entende o recorrente que, com a aludida resposta, a acção ainda assim não 
 devia proceder como o argumento, a nosso ver falhado (duplamente falhado: no 
 plano do direito, como se dirá a seguir e no plano de facto visto que o quesito 
 
 26º a tal propósito formulado não se provou), de que é possível “tudo ser 
 reposto no estado anterior sem demoras e danos da primitiva estrutura do locado 
 e por uma quantia irrisória”.
 
 42.  Se assim fosse, salvo situações raríssimas, jamais procederiam as acções 
 com este fundamento porque, na construção civil, com maior ou menor custo, tudo 
 se pode repor na situação anterior.
 
 43.  Remetemos para as considerações que a este propósito tecemos no Ac. da 
 Relação de Lisboa de 10‑5‑2001 (P. 2899/2001), CJ, 3, pág. 87: “os actuais 
 processos técnicos permitem que todas as obras novas ou, pelo menos, quase 
 todas, delimitação que se introduz por mera cautela, sejam retiradas repondo o 
 imóvel no estado anterior. Se este fosse o critério utilizado quase nenhuma 
 acção de despejo procederia com base neste fundamento.
 
 44.  Januário Gomes refere que “para o caso, parece‑nos totalmente irrelevante o 
 facto de as referidas obras – de cimento e tijolo — serem removíveis, ou melhor, 
 serem elimináveis com a técnica do camartelo, tornando, assim, fácil a reposição 
 do rés‑do‑chão no estado anterior. É que, a bem ver, nos tempos que correm, será 
 muito difícil, para não dizer impossível, encontrar situações de alteração da 
 disposição interna que não sejam, a final, removíveis; sê‑lo‑ão, porventura, as 
 dos autos, apesar de terem sido feitas em tijolo e cimento, mas sê‑lo‑iam também 
 se tivessem sido feitas em ferro e aço. Não é isso, de facto, que conta: o que 
 efectivamente releva é o carácter definitivo ou perene da obra. À luz deste 
 critério, a divisão do rés‑do‑chão em tabique de madeira ou contraplacado não 
 relevaria em termos de resolução; não pode, porém, deixar de relevar nesses 
 termos o facto de a compartimentação ser feita em material sólido e implantado 
 na estrutura do prédio, como é o caso das paredes de tijolo e cimento.
 
 45.  Aliás, a não se entender desta forma, ficaria inutilizada a inovação, bem 
 ou mal introduzida pelo legislador de 1966 na alínea d) do nº 1 do artigo 1093º, 
 uma vez que, qualquer que fosse a dimensão das alterações, a acção de resolução 
 naufragaria pela prova da removibilidade das mesmas, mantendo‑se o locatário 
 obrigado a repor a coisa no estado anterior, mas só no momento da restituição da 
 coisa” (“Resolução do Contrato de Arrendamento em Consequência da Feitura de 
 Obras que alteram Substancialmente a Disposição Interna das Divisões do Prédio” 
 por M. Januário Gomes, O Direito, Ano 125º, 1993 – III/IV, pág. 439/478, 
 designadamente pág. 467/468) …
 
 46.  Assim sendo, não assiste razão ao Réu quando defende a ideia de que a 
 possibilidade de reposição do arrendado no statu quo ante obsta à resolução do 
 contrato com base no artigo 1093º/1, alínea d) do Código Civil.
 
 47. E muito menos lhe assiste razão quando defende que as alterações 
 introduzidas pelo inquilino são aquelas a que se refere o artigo 1092º do Código 
 Civil (pequenas deteriorações necessárias para assegurar o conforto ou 
 comodidade do arrendatário) ou o artigo 1043º (deteriorações inerentes a uma 
 prudente utilização do local arrendado)”. 
 
 48.  Assente, portanto, que a referida matéria de facto tem em si natureza 
 essencial, parece que a razão está inteiramente do lado do recorrente. 
 
 49.  Importa, no entanto, constatar uma determinada realidade processual que não 
 pode deixar de ser compaginada com a referida previsão constante do artigo 264º, 
 nº 3 do CPC.
 
 50.  Se é verdade – já o dissemos – que a inspecção judicial ou acto similar em 
 que a imediação do tribunal se realiza directamente, não pode valer como 
 instrumento de aquisição processual (ver artigo 515º do CPC, parte final), a 
 disposição constante do artigo 264º/3 do C.P.C. admite, a nosso ver, o 
 entendimento de que o tribunal pode considerar os factos verificados por 
 inspecção judicial quando, com o acordo das partes, os haja elencado e as partes 
 tenham disposto da oportunidade de, quanto a eles, exercerem o contraditório.
 
 51.  Verifica‑se que, no caso vertente, o tribunal, depois de produzida prova 
 testemunhal, decidiu fazer uma inspecção ao local “para aquilatar a construção 
 existente no prédio arrendado, ao abrigo do disposto no artigo 612º, nº 1 do 
 C.P.C.” e “de imediato … deslocaram‑se ao local do prédio urbano em causa, sito 
 na Travessa do Lombo da Boa Vista, nº 21, na freguesia de Santa Maria Maior, 
 concelho do Funchal, o Tribunal e os ilustres mandatários das partes” (ver fls. 
 
 178).
 
 52.  Foi consignado em auto todo um conjunto de factos verificados pelo tribunal 
 
 (ver fls. 179), designadamente que “dentro da casa, existe um arco que por 
 indicação do réu marido e da procuradora do autor e aqui testemunha B. não 
 existia e no lugar do mesmo havia uma parede. Anteriormente no lugar do arco 
 existia uma parede que tinha uma porta normal”.
 
 53.  Curiosamente, como se pode constatar, a resposta dada ao quesito 10º da 
 base instrutória é menos clara do que a realidade de facto que o auto de 
 inspecção permite evidenciar.
 
 54.  De facto, houve uma demolição da parede que separava divisões só que o 
 tribunal, porque em tal parede havia uma porta, resolveu responder da forma 
 indicada que se lhe afigurou mais rigorosa.
 
 55.  A ilação, seja qual for a resposta, dir‑se‑á, será sempre aquela que o 
 tribunal alcançou (ver supra 21), o que retiraria interesse à constatação do 
 
 “excesso” que afinal nada adiantaria para o resultado dos autos.
 
 56.  É certo que os recorrentes pretendem que a resposta se restrinja à primeira 
 parte, ou seja, à mera prova de que o réu se limitou a proceder “à demolição 
 parcial de uma parede”, factualidade que já não admite a referida ilação. 
 
 57.  No entanto, a admitir‑se o excesso, a resposta não podia deixar de se 
 adequar, nos termos quesitados, à constatação de que “o réu procedeu à demolição 
 de uma parede” visto que a referência à “demolição parcial” resultou tão somente 
 do propósito de se evidenciar que no local havia parede e porta. 
 
 58.  Admitindo a natureza de facto essencial complementar ou concretizador da 
 realidade referenciada no aludido auto, designadamente a que respeita à parte 
 final do quesito 10º, afigura‑se‑nos que o disposto no artigo 3 do C.P.C. foi 
 observado. 
 
 59.  A introdução nos autos dessa realidade resultou de um acto de instrução 
 
 (inspecção ao local) onde se constatou a existência de um arco onde antes 
 existia uma parede e porta demolidos, reconhecidamente pelo próprio réu, sendo 
 manifesto que esta realidade foi aceite pelas partes, o que impõe o entendimento 
 de que dela se pretendem aproveitar (artigo 217º do Código Civil). 
 
 60.  Não há, na verdade, nenhuma declaração de qualquer das partes, opondo‑se à 
 descrição dos factos constantes do auto; até houve mais, a elaboração de um 
 
 “croquis” junto aos autos que, com a concordância das partes, foi assinado.
 
 61.  A circunstância de o réu ter reconhecido que procedeu à aludida demolição 
 livra‑o da condenação como litigante de má fé. 
 
 62.  A resolução do contrato de arrendamento não pode deixar de se decretar 
 ainda que apenas um dos arrendatários haja incorrido em violação da lei. 
 
 63.  No entanto, como flui do referido de 52. a 57. supra, a resposta em causa 
 não se pode considerar excessiva, mas apenas explicativa, pois o que o tribunal 
 fez foi explicar que a demolição da parede, no interior do locado -arrendado, 
 implicou a demolição da porta e, havendo demolição, há a criação de um espaço 
 amplo onde existiam espaços autonomizados. A questão da abertura se fazer por um 
 arco é indiferente. 
 
 64.  Uma resposta explicativa tem por objectivo a concretização de uma 
 determinada realidade. Se a concretização está dentro do âmbito da matéria 
 questionada, não há excesso e, não havendo excesso, não importa que a matéria 
 concretizada em si mesma seja instrumental ou essencial para a sorte do litígio; 
 se está fora do âmbito, uma de duas: ou a matéria em causa assume a natureza de 
 facto instrumental e, assim sendo, o excesso é irrelevante, porque hoje a lei 
 admite a aquisição nos autos de factos instrumentais que, apesar de 
 instrumentais, não deixam de ser factos novos, factos não alegados; ou a matéria 
 em causa assume a natureza de facto essencial concretizador e, nesse caso, o seu 
 aproveitamento carece da verificação dos requisitos indicados no artigo 264º/3 
 do C.P.C. 
 Concluindo: 
 I – A resposta excessiva a um quesito impõe que, quanto ao excesso, seja 
 considerado não escrito (artigo 646º, nº 4 do C.P.C.) aplicável por analogia). 
 II – Já não é excessiva, porém, a resposta que seja explicativa se a 
 concretização se inserir no âmbito da questão formulada, o que acontece quando, 
 perguntando‑se se os réus procederam à demolição de paredes no interior do 
 locado, se provar que procederam à demolição de uma parece com porta, levando o 
 tribunal a responder que houve uma demolição parcial da parede e eliminação da 
 porta, colocando-se um arco. 
 III – A admitir‑se que havia excesso, então, na resposta a dar, eliminado o 
 excesso, não poderia aproveitar‑se a primeira parte da resposta explicativa 
 
 (demolição parcial), pois impor‑se‑ia a resposta conforme à realidade de que 
 houve demolição de parede. 
 IV – A resposta explicativa, que é sempre concretização de algo, pode 
 traduzir‑se em excesso. O excesso pode consubstanciar facto instrumental ou 
 facto essencial. 
 V – Quando o tribunal, no exercício de actividade probatória (por exemplo, 
 inspecção judicial efectivada nos termos do artigo 612º/1 do C.P.C.), se 
 apercebe de determinada realidade, que traduza facto essencial complementar ou 
 concretizador de facto essencial alegado (artigo 264º/2 do C.P.C.) e inscreve em 
 auto a realidade em causa sem oposição das partes presentes, e até com a sua 
 concordância, preenche-se a previsão constante do referido nº 2 do artigo 264º 
 do C.P.C. por ser manifesto, com tal atitude à luz da parte final do artigo 217º 
 do Código Civil (declaração tácita), que as partes se pretendem aproveitar e 
 aceitam essa realidade conquanto se verifique que elas puderam exercer, 
 relativamente a tais factos, o contraditório. 
 Decisão: nega‑se provimento ao recurso confirmando‑se a decisão recorrida
 
  
 
  
 
 2.  Os apelantes interpuseram recurso de constitucionalidade nos seguintes 
 termos:
 
  
 Os Apelantes A. e marido no recurso onde é recorrida a habilitada B. por óbito 
 do A. C. vêm do douto Acórdão final interpor o presente recurso para o Tribunal 
 Constitucional 
 
 É interposto ao abrigo da alínea b) do n° 1 do artigo 70º da Lei 28/82 de 15 de 
 Novembro porquanto ao interpretar e aplicar a alínea d) do n° 1 do artigo 64° do 
 RAU e o n° 3 do artigo 264° do C.P.C., tal como acontecera com a douta sentença 
 da 1° Instância, justificou a resolução do arrendamento e consequente despejo 
 imediato do locado com factos que não tinham sido alegados e isso sem prévia 
 audição dos assim sancionados (os ora Recorrentes) com aquele despejo. 
 Desta feita padecem de inconstitucionalidade por violação dos princípios do 
 contraditório, do direito de defesa e de contraditar, implícitos nos princípios 
 constitucionais do acesso ao direito, do contraditório, da confiança e da 
 conformação do processo segundo os direitos fundamentais, para além de lhes 
 ofender o direito de terem uma habitação adequada e de ter discriminado a 
 Apelante relativamente a ele e isso quando, como actualmente sucede entre nós, o 
 direito de defesa, é tanto quanto o direito de acção, uma manifestação do 
 princípio da tutela judicial efectiva, pelo que assiste a ambos os demandados, 
 entre outros, o direito ao contraditório pleno. 
 Estas questões de inconstitucionalidade foram suscitadas por diversas vezes, nas 
 Alegações e Conclusões da Apelação e onde a propósito se apontam como violados 
 os artigos 2°, 20° n° 1, 26° n° 1; 36° n° 3; 18° n° 2; 65° n° 1 e 204° da 
 Constituição da República Portuguesa, bem como o 11º da Declaração Universal dos 
 Direitos do Homem. 
 A decisão recorrida não admite recurso ordinário. 
 Sobe nos próprios autos e tem efeito devolutivo. (artigo 78° n° 1 da citada Lei 
 
 28/82).
 Assim e uma vez recebido o presente recurso, rogam a V.Exa se digne ordenar que 
 se sigam os seus ulteriores termos.
 
  
 O recurso de constitucionalidade não foi admitido por despacho de 7 de Setembro 
 de 2006, com o seguinte teor:
 
  
 
 1.  Os RR vencidos interpõem recurso do acórdão de 6-7-2006 para o Tribunal 
 Constitucional, ao abrigo da alinea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº  28/82, 
 de 15 de Novembro, considerando que a decisão “ao interpretar e aplicar a alínea 
 d) do nº  1 do artigo 64º do RAU e o nº 3 do artigo 264º do C.P.C, tal como 
 acontecera com a [...] sentença de 1ª instância, justificou a resolução do 
 arrendamento e consequente despejo imediato do locado com factos que não tinham 
 sido alegados e isso sem prévia audição dos assim sancionados ( os ora 
 recorrentes) com aquele despejo”. 
 
 2.  É para nós evidente que o acórdão recorrido não justificou a resolução do 
 arrendamento com base me factos não alegados. 
 
 3.  O quesito 1Oº (“os RR procederam à demolição de paredes no interior do 
 locado”) tem por base matéria alegada no artigo 21º da petição (veja-se § 26º do 
 acórdão). 
 
 4.  O que o recorrente sustentou foi que a resposta ao aludido quesito é 
 excessiva por se ter nela consignado que os RR procederam à demolição parcial de 
 uma parede e à eliminação de uma porta, colocando em seu lugar um arco”). 
 
 5.  A decisão recorrida, sempre no plano da apreciação da matéria de facto, 
 considerou que a resposta não era excessiva, pois, se o fosse, deveria 
 considerar‑se não escrita na medida do excesso, mas meramente explicativa. 
 
 6.  Não houve, por conseguinte, nem podia haver nos termos em que as coisas se 
 apresentaram, nenhuma interpretação normativa passível de um juízo de 
 constitucionalidade. 
 
 7.  O Tribunal aceitou que uma resposta excessiva deve ser considerada não 
 escrita, o Tribunal aceitou que uma resposta excessiva pode ferir o princípio 
 dispositivo, o Tribunal aceitou que o excesso contido numa resposta pode 
 implicar desrespeito do princípio do contraditório. 
 
 8.  No entanto, tratando-se de resposta explicativa é claro que não ocorre o 
 excesso e, nesse caso, o Tribunal não tem de declarar a resposta não escrita 
 
 (artigo 646º, nº 4 do C.P.C.). 
 
 9.  Talvez se pudesse suscitar uma questão de inconstitucionalidade se o 
 Tribunal entendesse que uma resposta reconhecida excessiva não deve ser 
 considerada não escrita à luz de uma determinada interpretação do artigo 646º, 
 nº 4 do C.P.C. ou do artigo 264º do C.P.C. 
 
 10.  No caso em apreço, porém, o Tribunal limitou‑se, no uso dos seus poderes de 
 instância de facto, a analisar uma determinada resposta à luz do quesito 
 formulado considerando que a resposta não excedia o âmbito do quesito. 
 
 11.  Ora, como se vê, não há aqui nenhuma interpretação normativa, mas tão 
 somente uma interpretação de facto. 
 
 12.  Pode, no plano da análise dos factos, discordar‑se da decisão considerando 
 que a resposta afinal padecia de excesso. 
 
 13.  O recorrente pretende isso mesmo, ou seja, que o Tribunal Constitucional 
 
 (já que o Supremo Tribunal de Justiça não o pode fazer por ser tribunal de 
 revista) reconheça que houve erro no plano da análise facto e, desse modo, 
 declare que houve excesso na resposta. 
 
 14.  Ainda que o Tribunal Constitucional assim procedesse, continuaria a não se 
 lobrigar nenhuma interpretação normativa na decisão do Tribunal recorrido de 
 sorte que se pudesse considerar que foi aplicada norma cuja 
 inconstitucionalidade houvesse sido suscitada durante o processo. (artigo 
 
 280º/1, alínea b) da Constituição da República). 
 
 15.  E suscitar a inconstitucionalidade de uma norma durante o processo não se 
 satisfaz com a mera invocação da ofensa a determinados princípios — se assim 
 fosse então seria facílimo o acesso ao Tribunal Constitucional (v.g. a parte 
 diria que o Tribunal ao aplicar determinada norma violou o princípio da 
 confiança, mas não fundamentando a afirmação, para logo se impor ao Tribunal 
 Constitucional descortinar se, no caso, o referido princípio fora desrespeitado 
 e em que medida) pois, por tal via, impor‑se‑ia, na prática, um controlo 
 oficioso de inconstitucionalidade pelo Tribunal Constitucional. 
 
 16.  Assim sendo, porque não houve aplicação de norma cuja inconstitucionalidade 
 houvesse sido suscitada durante o processo, o recurso interposto não é 
 admissível.
 
  
 
  
 
 3.  Os apelantes reclamaram do seguinte modo:
 
  
 No processo supra referenciado onde é A. e Apelado C. e RR. e Apelantes A. e 
 marido não se conformando estes com o douto despacho que lhes indeferiu o 
 requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional do mesmo 
 Vêm reclamar para VEXa e o que fazem ao abrigo do n°4 do artigo 76 da Lei 28/82 
 e com os fundamentos seguintes: 
 Nos seus n°s 1 a 13, o douto despacho de indeferimento fundamenta o não 
 recebimento do recurso partindo do princípio de que a resposta ao quesito 10 foi 
 considerada pelo Tribunal da Relação como excessiva mas meramente explicativa, 
 quando ao invés o que o ora Reclamante disseram nas suas alegações junto da 
 Relação e reafirmam no requerimento de interposição do recurso para o Tribunal 
 Constitucional é que essa resposta (e não só) contém factos que nunca foram 
 alegados e que foram eles que precisamente justificaram a resolução do 
 arrendamento, e tudo isso sem audiência das partes interessadas, como de resto 
 se escreve no parágrafo 1° do douto despacho reclamado. 
 Os primeiros daqueles factos não alegados consistem em «que os RR procederam à 
 eliminação de uma porta, e colocação no seu lugar de um arco»  e isso quando em 
 boa verdade o quesito 100 tem a redacção: «Os Réus procederam à demolição de 
 paredes no interior do Locado?» 
 Tanto é dizer e constatar que desse quesito não consta aquela «eliminação de uma 
 porta e colocação no seu lugar de um arco», como não consta da restante 
 factualidade alegada por qualquer das partes. 
 Com salvaguarda do respeito devido, é indiferente ou não importa nem está em 
 causa que a Relação tenha classificado essa resposta de meramente explicativa. O 
 que está em causa e importa é que aquela «eliminação duma porta e colocação no 
 seu lugar de um arco» não foram alegados e ainda e sobretudo que foram eles que 
 ditaram a resolução do arrendamento sem audiência das partes interessadas, como 
 de resto se escreve no parágrafo 1° do douto despacho reclamado e se disse já. 
 Por outras palavras, o que verdadeiramente importa não é a classificação daquela 
 resposta mas sim o seu conteúdo e principalmente as suas consequências no plano 
 factual e sobretudo normativo (fundamento da resolução) e tudo isso sem que 
 semelhante factualidade tenha sido alegada por alguma das partes ou sem que 
 tenha sido facultado o direito do contraditório aos ora Reclamantes e mormente à 
 R. mulher que em todo o caso foi descriminada relativamente ao marido e ofendido 
 o seu direito a uma habitação condigna. 
 Para mais, esses factos não alegados e que assim justificaram a resolução do 
 arrendamento, não se circunscrevem apenas a esses conexionados com a resposta ao 
 quesito 10 mas também a estes outros constantes do douto Acórdão da Relação e 
 contra o qual os Reclamantes antecipadamente se insurgem nas suas Alegações 
 junto do Tribunal da Relação e sobre os quais também ninguém tinha sido ouvido 
 nem chamado e a saber: 
 
 «Ora, no caso concreto, a eliminação parcial da parede e da porta aí existente 
 materializou-se na diminuição de uma das divisões do prédio, já que dois dos 
 quartos anteriormente existentes, com a eliminação parcial da parede e da porta 
 aí existente, ficaram reduzidos a um único quarto, embora com maior dimensão. 
 Desta feita com o recurso não se pretende o reconhecimento pelo Tribunal 
 Constitucional de que houve erro no plano factual mas sim o reconhecimento da 
 falta do contraditório pleno, da defesa, da discriminação da R. mulher e da 
 ofensa do direito a uma habitação condigna no douto Acórdão da Relação e com o 
 que este violou, entre outros aqueles princípios constitucionais e aplicou entre 
 outros os artigos 64°, alínea b) do n° 1 do RAU e o n° 3 do 264° do C.P.C. por 
 forma que violou aqueles princípios e várias disposições da Constituição, 
 designadamente os seus artigos 2°, 20º n° 1, 26° n° 1; 36° n° 3; 18° n° 2; 65° 
 n° 1 e 204° bem como o 11º da Declaração Universal dos Direitos do Homem. 
 Ao fim e ao cabo, o que se pretende e o fundamento do que se pretende não é o 
 que a propósito se escreve no parágrafo 13° do douto despacho reclamando mas sim 
 o que a esse respeito consta das Alegações dos Recorrentes junto da Relação e 
 que depois repetiram sumariamente no seu requerimento de interposição do recurso 
 para o Tribunal Constitucional, escrevendo neste textualmente: 
 
 «É interposto ao abrigo da alínea b) do n° 1 do artigo 70° da Lei 28/82 de 15 de 
 Novembro porquanto ao interpretar e aplicar a alínea d) do n° 1 do artigo 64° do 
 RAU e o n° 3 do artigo 264° do C.P.C., tal como acontecera com a douta sentença 
 da 1ª Instância, justificou a resolução do arrendamento e consequente despejo 
 imediato do locado com factos que não tinham sido alegados e isso sem prévia 
 audição dos assim sancionados (os ora Recorrentes) com aquele despejo. 
 Desta feita padecem de inconstitucionalidade por violação dos princípios do 
 contraditório, do direito de defesa e de contraditar, implícitos nos princípios 
 constitucionais do acesso ao direito, do contraditório, da confiança e da 
 conformação do processo segundo os direitos fundamentais, para além de lhes 
 ofender o direito de terem uma habitação adequada e de ter discriminado a 
 Apelante relativamente a ele e isso quando, como actualmente sucede entre nós, o 
 direito de defesa, é tanto quanto o direito de acção, uma manifestação do 
 princípio da tutela judicial efectiva, pelo que assiste a ambos os demandados, 
 entre outros, o direito ao contraditório pleno. 
 Estas questões de inconstitucionalidade foram suscitadas por diversas vezes, nas 
 Alegações e Conclusões da Apelação e onde a propósito se apontam como violados 
 os artigos 2°, 20° n° 1, 26° n° 1; 36° n° 3; 18° n° 2; 65° nº 1 e 204° da 
 Constituição da República Portuguesa, bem como o 11º da Declaração Universal dos 
 Direitos do Homem. 
 Tanto é dizer que o douto despacho em apreço das diversas questões postas no 
 requerimento de interposição do recurso não trata de uma única que seja antes de 
 todas se afasta e foge... 
 Em suma: 
 Examinando as Alegações junto da Relação e o requerimento de interposição do 
 recurso para o Tribunal Constitucional não estará certo dizer-se «que não houve 
 aplicação de norma cuja inconstitucionalidade houvesse sido suscitada durante o 
 processo» e consequentemente também não estará certo que a partir daí se tenha 
 ditado a inadmissibilidade do recurso porque efectivamente o douto Acórdão 
 aplicou normas e princípios constitucionais que os Recorrentes nas suas 
 Alegações e conclusões consideram violados e onde por isso ou prevendo isso 
 também ali suscitaram a questão da sua inconstitucionalidade. 
 Nestes termos e nos do artigo 77° da citada Lei e demais de direito, deve dar-se 
 provimento à presente reclamação revogando‑lhe o despacho de indeferimento da 
 interposição do recurso e consequentemente decidir-se admitir o mesmo. 
 E se admitirmos (por mera hipótese e contra-argumentação) que as coisas não são 
 como as apresentam os ora Reclamantes, então e uma vez que antes do 
 indeferimento restava o convite a prestar a indicação em falta nos termos do n° 
 
 5 do artigo 75º da Lei 28/82 então no lugar daquela revogação devem os 
 Reclamantes serem convidados a prestar indicação em falta.
 
  
 
  
 O Ministério Público pronunciou‑se nos seguintes termos:
 
  
 A presente reclamação é manifestamente improcedente. 
 Desde logo, não se pode considerar suscitada, durante o processo e em termos 
 processualmente adequados, a questão da inconstitucionalidade que o reclamante 
 refere no seu requerimento de interposição de recurso, sendo evidente que a 
 argumentação expendida, nomeadamente, nas conclusões 10ª a 13ª da sua apelação 
 não cumprem adequadamente o ónus de clareza e definição inteligível do critério 
 normativo que considera violador da Constituição.
 Em segundo lugar, esquece o reclamante que a este Tribunal apenas cumpre 
 sindicar da constitucionalidade do critério normativo aplicado pela decisão 
 recorrida, e não sindicar da concreta e casuística especificidade da situação 
 processual em análise: ora, é evidente que o acórdão proferido pela Relação não 
 aplicou o critério normativo delineado pelo recorrente, já que considera, de 
 forma cabal, que foi exercido o contraditório aquando da aquisição processual 
 dos factos “novos” que integram a resposta “explicativa” à matéria de facto.
 Finalmente, há óbvia inutilidade na dirimição da questão de constitucionalidade 
 delineada pelo recorrente, já que – como nota o acórdão recorrido – os factos 
 que originariamente sempre constaram do processo, mesmo sem o “complemento” ou 
 
 “concretização” aditada pela resposta “explicativa” questionada – ter o 
 locatário procedido à demolição de uma parede – determinaria, sem mais, a 
 procedência da acção de despejo.
 
  
 
  
 
 4.  Cumpre apreciar.
 
  
 
 
 
 
 
  
 I
 Fundamentação
 
  
 
 5.  No recurso de constitucionalidade que os reclamantes pretendem ver admitido, 
 
 é submetida à apreciação do Tribunal Constitucional uma dada dimensão normativa 
 dos artigos 64º, nº 1, alínea c), do RAU, e 264º, nº 3, do CPC, segundo a qual a 
 resolução do arrendamento foi justificada com factos que não tinham sido 
 alegados, acerca dos quais os reclamantes não foram ouvidos.
 Em primeiro lugar, cabe sublinhar que os reclamantes não suscitaram perante o 
 Tribunal da Relação de Lisboa a inconstitucionalidade de tal dimensão normativa. 
 Com efeito, nas alegações de recurso, nomeadamente nas conclusões 10ª a 13ª 
 
 (transcritas supra), os reclamantes impugnam, não uma norma ou dimensão 
 normativa, mas antes a própria decisão.
 Assim, não se verifica o pressuposto do recurso da alínea b) do nº 1 do artigo 
 
 70º da Lei do Tribunal Constitucional, consistente na suscitação durante o 
 processo da questão de constitucionalidade normativa.
 Por outro lado, a dimensão normativa impugnada pelos reclamantes não foi 
 aplicada pela decisão recorrida. Com efeito, impugnando os reclamantes uma 
 dimensão normativa que permite a não audição dos interessados acerca de um dado 
 facto alegadamente novo, é demonstrado no acórdão impugnado no recurso de 
 constitucionalidade não admitido que as partes tiveram oportunidade de se 
 pronunciar sobre a questão, tendo mesmo sido enviado um “croquis” descritivo dos 
 factos, sem qualquer oposição (nºs 54 a 61 e ponto V da parte conclusiva do 
 acórdão transcrito supra).
 Assim, também não se verifica o pressuposto do recurso interposto, consistente 
 na aplicação pela decisão recorrida da dimensão normativa impugnada.
 Por último, cabe realçar que a apreciação da questão de constitucionalidade 
 suscitada no requerimento de interposição do recurso não admitido é inútil, já 
 que o Tribunal da Relação de Lisboa considerou que a matéria constante da parte 
 final da resposta ao quesito 10º é suficiente para que a acção proceda, ou seja, 
 a procedência da acção não se fundamenta nos factos alegadamente novos, pois 
 seriam suficientes para o efeito os factos que sempre constaram do processo (cf. 
 pontos 39 a 46 do acórdão transcrito supra).
 
  
 
  
 
 6.  Assim, o recurso de constitucionalidade não podia ser admitido, pelo que a 
 presente reclamação improcede.
 
  
 
  
 III
 Decisão
 
  
 
 7.  Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente 
 reclamação.
 
  
 
  
 Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em  20  UCs.
 Lisboa, 17 de Janeiro de 2007
 Maria Fernanda Palma
 Benjamim Rodrigues
 Rui Manuel Moura Ramos