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Processo nº 1113/2006.
 
 3ª Secção.
 Relator: Conselheiro Bravo Serra.
 
  
 
  
 
                                  1. Após a apresentação, em 11 de Maio de 2006, 
 da petição que deu origem aos autos de acção, seguindo a forma de processo 
 especial prevista no Decreto-Lei nº 269/98, de 1 de Setembro, veio o autor, A., 
 S.A., em 22 de Maio de 2006, fazer juntar àqueles autos requerimento em que se 
 escreveu: –
 
  
 A., S.A., nos autos à margem referenciados, e em complemento do já referido na 
 petição inicial vem ainda deixar expresso que, a Lei n.º 14/2006, de 26 de 
 Abril, na parte e na medida em que altera a redacção do artigo 110º, n.º 1, 
 alínea a), do Código de Processo Civil, é inconstitucional, e consequentemente, 
 a referida alínea a) do n.º 1 do dito artigo 110º, com a mencionada redacção, é 
 inconstitucional – logo inaplicável pelos Tribunais ‘ex-vi’ o disposto no artigo 
 
 204º da Constituição da República Portuguesa –na interpretação que permita a 
 aplicação do disposto no referido artigo 110º, n.º 1, alínea a), a contratos 
 celebrados anteriormente à publicação da referida Lei em que as partes tenham 
 optado, nos termos do artigo 100º, n.ºs 1,2, 3 e 4 do Código de Processo Civil, 
 por um foro convencional no que respeita à competência dos Tribunais em razão do 
 território, por violação dos princípios da adequação, da exigibilidade e da 
 proporcionalidade, e da não retroactividade consignado nos artigos 18º, n.ºs 2 e 
 
 3, da Constituição da República Portuguesa e, também ainda, por violação dos 
 princípios da segurança jurídica e da confiança corolários ambos do Estado de 
 Direito Democrático consagrado no artigo 2 da Constituição da República 
 Portuguesa, donde o Tribunal de Lisboa ser o competente para conhecer da 
 presente acção.”
 
  
 
                                  Sobre o transcrito requerimento, o Juiz do 8º 
 Juízo do Tribunal e Pequena Instância Cível de Lisboa, em 6 de Julho de 2006, 
 proferiu o seguinte despacho: –
 
  
 
 “Fls. 18:
 O requerimento apresentado é manifestamente anómalo e estranho ao andamento 
 normal do processo. 
 Na verdade inexiste previsto no código de Processo Civil a figura do 
 
 ‘requerimento complementar’, sendo certo que o aduzido no sobredito requerimento 
 não faz sentido no estado actual do processo, constituindo uma antecipação da 
 decisão a proferir e normas a aplicar, contendo matéria de eventual recurso para 
 o Tribunal Constitucional, órgão competente para apreciar a questão suscitada.
 Pelo exposto, determina-se o desentranhamento do requerimento de fls. 18 e a sua 
 devolução ao apresentante.
 Custas do incidente pelo autor que se fixam em 2 Uc’s.
 Notifique.
 Oportunamente conclua”.
 
  
 
                                  Notificado desse despacho, o autor fez juntar 
 aos autos em 13 de Julho de 2006 requerimento em que se disse: –
 
  
 
 “A., SA, nos autos de acção com processo especial que, por este Juízo, intentou 
 contra B. e mulher, tendo sido notificado do despacho de V.Exa. de fls. 27, que 
 ordenou o desentranhamento do requerimento de fls. 18, despacho que, nos termos 
 da lei, não admite recurso, vem consignar nos autos – para efeitos de oportuno 
 recurso para o Tribunal Constitucional, atento o decidido pelo mesmo no acórdão 
 
 191/9, de 8 de Maio de 1991, publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 
 Volume 19°, pgs. 283 – que a questão da inconstitucionalidade referida no dito 
 requerimento foi levantada ‘durante o processo’ em momento em que o Tribunal se 
 podia pronunciar validamente sobre a mesma.”
 
  
 
                                  Em 17 de Julho de 2006 o indicado Juiz proferiu 
 despacho por intermédio do qual declarou a incompetência territorial do aludido 
 
 8º Juízo, julgando competente para a acção o “Tribunal Judicial de Vila Nova de 
 Gaia”, em face do que se dispõe nos artigos 74º, nº 1, 108º, 110º, nº 1, alínea 
 a), e 11º, nº 3, todos do Código de Processo Civil na redacção emergente da Lei 
 nº 14/2006, de 26 de Abril.
 
  
 
                                  Do assim decidido intentou o autor recorrer 
 para o Tribunal Constitucional ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei 
 nº 28/82, de 15 de Novembro, pretendendo, por via desse recurso, ver “apreciada 
 a inconstitucionalidade da alínea a) do nº 1 do artigo 110º do Código de 
 Processo Civil, com a redacção que lhe foi dada pela Lei 14/2006, de 6 de Abril, 
 na parte e na medida em que permite a interpretação do dito preceito no sentido 
 de o considerar aplicável a contratos celebrados anteriormente à publicação da 
 referida Lei 14/2006”.
 
  
 
                                  Porém, o citado Juiz, por despacho de 3 de 
 Outubro de 2006, não admitiu o recurso.
 
  
 
                                  Para tanto, escreveu nesse despacho: –
 
  
 
 “O sentido e alcance do despacho proferido a fls. 27 foi o de considerar que o 
 A. suscitou a questão da inconstitucionalidade através de requerimento 
 
 ‘manifestamente anómalo e estranho ao andamento normal do processo’. 
 Do conteúdo da referida decisão e da conjugação do disposto nos artigos 70º, nº 
 
 1, al. b), parte final, 72, nº 2 e 75º-A, nº 2. da Lei do TC, tem de se concluir 
 que o A. não suscitou a questão da inconstitucionalidade de modo 
 
 ‘processualmente adequado’ (art. 72, nº 2), pois não fez na ‘peça processual’ 
 que ao caso caberia, ou seja, na petição inicial (ali. 75º-A, nº 2). 
 Pelo exposto, tendo presente que o referido despacho produziu efeitos de caso 
 julgado e ao abrigo do preceituado no art. 76º, nº 2 da Lei do TC, não se admite 
 o recurso interposto a fls. 37. 
 Custas do incidente pelo A. 
 Notifique.”
 
  
 
                                  É deste despacho que vem, pelo autor, deduzida 
 a vertente reclamação, na qual, em síntese se defende que foi cumprido o ónus de 
 suscitação da questão de inconstitucionalidade antes da decisão querida impugnar 
 perante este Tribunal.
 
  
 
                                  Pronunciando-se sobre a reclamação, o Ex.mo 
 Representante do Ministério Público veio dizer: –
 
  
 
                  “A presente acção foi intentada em momento posterior à entrada 
 em vigor das novas regras de competência decorrentes da Lei nº 14/2006, de 26/4 
 
 – pelo que teve naturalmente o autor oportunidade processual para, no âmbito de 
 tal petição, se pronunciar sobre os reflexos na questão da competência do 
 tribunal  das regras ali inovatoriamente estabelecidas (cfr. sobre situação 
 diversa os acs. 94/88 e 559/98).
 
                  De qualquer modo – e mesmo que se considerasse que não tinha o 
 autor o ónus de, na petição inicial, se pronunciar logo sobre a questão de 
 constitucionalidade que delineou ulteriormente, em requerimento ‘atípico’ – é 
 duvidoso que a questão de constitucionalidade colocada se não deva considerar 
 
 ‘manifestamente infundada’, face ao teor do acórdão nº 691/2006, proferido nesta 
 mesma Secção sobre questão idêntica à dos autos – o que sempre ditaria a 
 improcedência da presente reclamação”.
 
  
 
                                  Cumpre decidir.
 
  
 
  
 
                                  2. É certo que o despacho proferido em 6 de 
 Julho de 2006 pelo Juiz do 8º Juízo do Tribunal de Pequena Instância Cível de 
 Lisboa determinou o desentranhamento dos autos do requerimento apresentado em 22 
 de Maio anterior. Todavia, atento o valor da acção, porque esse mesmo despacho 
 não seria impugnável em termos ordinários, não se vislumbra que a ora reclamante 
 pudesse reagir contra a determinação ínsita nesse mesmo despacho.  
 
  
 
                                  Também é certo, por outro lado, que aquando da 
 apresentação da petição – 11 de Maio de 2006 – já estava em vigor, embora há 
 muitos poucos dias, a Lei nº 14/2006, na qual se prescreveu que a mesma se 
 aplicava apenas às acções e aos requerimentos de injunção instauradas ou 
 apresentados depois da sua entrada em vigor, pelo que, na data daquela 
 apresentação, era possível, na petição, impostar-se a questão de 
 inconstitucionalidade que veio a ser suscitada no requerimento de 22 de Maio de 
 
 2006.
 
  
 
                                  Seja como for, e não cabendo efectuar-se agora 
 um juízo sobre a propriedade do despacho de 6 de Julho de 2006, o que é certo é 
 que a suscitação da aludida questão ocorreu num momento processual precedente à 
 prolação do despacho de 17 de Julho de 2006 – justamente aquele que se intenta 
 impugnar perante o Tribunal Constitucional – ao que se adita que, com o 
 requerimento apresentado pela ora reclamante em 13 do mesmo mês (e não consta 
 dos autos que, relativamente a este, tivesse incidido decisão de 
 desentranhamento), igualmente se verifica um reiterar da questão de 
 inconstitucionalidade.
 
  
 
                                  Não se pode, neste contexto, sustentar que, na 
 situação sub specie, não houve o levantamento da questão de desarmonia 
 constitucional antecedentemente ao proferimento do despacho de que se quer 
 recorrer para este órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade.
 
  
 
                                  Por outro lado, igualmente não se poderá 
 sustentar que, aquando da referida suscitação, a questão de constitucionalidade 
 se apresentasse como manifestamente infundada.
 
  
 
                                  Na verdade, o deste Tribunal nº Acórdão nº 
 
 691/2006 foi prolatado algum tempo depois (a data nele aposta é a de 19 de 
 Dezembro de 2006) da mencionada suscitação e, de todo o modo, justamente porque 
 a questão aí foi analisada pela formação colectiva deste órgão de administração 
 de justiça, isso significa que, ao menos do ponto de vista do Relator desse 
 aresto, ela não se patenteava como manifestamente infundada, já que o processo 
 não sofreu decisão nos termos do nº 1 do artº 78º-A da Lei nº 28/82.
 
  
 
                                  Em face do que se deixa exposto, defere-se a 
 reclamação.
 Lisboa, 15 de Janeiro de 2007
 Bravo Serra
 Gil Galvão
 Artur Maurício