 Imprimir acórdão
 Imprimir acórdão   
			
Processo n.º 1189.07
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
 
 
 
       Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 A – Relatório
 
  
 
       1 – A. reclama para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do art.º 
 
 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), da 
 decisão do relator, no Tribunal Constitucional, que decidiu não conhecer do 
 recurso de constitucionalidade.
 
  
 
       2 – Como fundamento da reclamação, o recorrente alega o seguinte:
 
  
 
             «[…] 
 
  
 
 1º
 Inconformado com a decisão do Supremo Tribunal de Administrativo, veio o 
 Recorrente, por entender que o artigo 3º, nº 1, da Lei 4/83, de 2 de Abril, na 
 redacção da Lei 25/95, de 18 de Agosto, na interpretação que lhe é dada por 
 aquele Tribunal, segundo a qual “não seria de valorizar a entrega da declaração 
 antes da instauração da acção para perda de mandato, embora posterior ao prazo 
 de 30 dias após a notificação do Tribunal constitucional, não sendo necessária 
 para a perda de mandato a violação das regras de isenção e desinteresse (a 
 imparcialidade) e de independência exigíveis a quem deve estar ao serviço do bem 
 comum”, é materialmente inconstitucional por violação do disposto no artigo 50º 
 da C.R.P., interpor recurso para este Alto Tribunal. 
 
  
 
 2º
 Por decisão sumária proferida pelo Exmo. Juiz Conselheiro Relator, decidiu o 
 Tribunal não tomar conhecimento do recurso. Isto porque, 
 
  
 
 3º
 Entendeu esse Tribunal que a questão da inconstitucionalidade não foi suscitada 
 durante o processo. 
 
  
 
 4º
 Mais salienta que o Recorrente teria tido a oportunidade de o fazer, pelo menos, 
 aquando das contra alegações após notificação do teor do recurso interposto pelo 
 Ministério Público. 
 
  
 Sucede que, 
 
  
 
 5º
 Nas suas contra-alegações ao recurso interposto pelo Ministério Público o ora 
 Recorrente faz uma remissão para os fundamentos que constam da sentença 
 proferida pelo TAF de Leiria naquele processo (nº 501/07.OBELRA). 
 
  
 
 6º
 Ora, para fundamentar, e bem, a sua decisão a Meritíssimo Juiz daquele Tribunal 
 invocou a decisão do STA proferida no processo nº 39678, de 21/03/96, bem como o 
 Acórdão do Tribunal Constitucional nº 25/92. 
 
  
 
 7º
 Precisamente neste Acórdão nº 25/92, esse Alto Tribunal doutamente consignou que 
 
 “Atendendo: (i) à natureza sancionatória da medida de perda de mandato, (ii) 
 intrínseca gravidade desta medida, equivalente às penas disciplinares; (iii) a 
 que a conduta dos titulares de cargos políticos electivos é periodicamente 
 apreciada pelo universo dos respectivos eleitores; (iv) a que o decretamento da 
 perda de mandato implica uma situação de inelegibilidade para o mandato 
 interrompido e para o mandato subsequente, o que representa uma restrição ao 
 direito de acesso a cargos públicos de carácter electivo (direito de sufrágio 
 passivo), consagrado no art. 50, nº 1, da CRP, restrição essa que, por estar em 
 causa um “direito, liberdade e garantia de participação política”, só pode ser 
 operada pela lei ordinária “nos casos expressamente previstos na Constituição, 
 devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos 
 ou interesses constitucionalmente protegidos” e nunca podendo “diminuir a 
 extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais” (nºs 2 
 e 3 do art. 18); (v) a que, no acesso a cargos electivos, o nº 3 do citado art. 
 
 50 só permite que a lei estabeleça “as inelegibilidades necessárias para 
 garantir a liberdade de escolha dos eleitores e a isenção e independência do 
 exercício dos respectivos cargos” - há que concluir que a aplicação de tal 
 medida só se justifica relativamente a quem, “tendo sido eleito membro de um 
 
 órgão de uma autarquia local, no exercício das respectivas funções não observou 
 as regras de isenção e desinteresse (a imparcialidade) e de independência 
 exigíveis a quem deve estar ao serviço do bem comum”, a quem “violou os deveres 
 do cargo em termos tais que o seu afastamento se tornou imperioso”. 
 
  
 
 8º
 Assim, o Recorrente ao remeter para a fundamentação da sentença onde se alude 
 
 àquela inconstitucionalidade está, ainda que de forma indirecta, a invocar a 
 referida inconstitucionalidade. 
 
  
 
 9º
 Estando, por isso, cumprido aquele pressuposto de admissibilidade do recurso 
 interposto. 
 
  
 
 10º
 Por outro lado, mesmo que assim não se entenda, sempre estará verificada a 
 restrição àquela doutrina, pois trata-se de uma situação excepcional ou anómala 
 na qual o Recorrente não dispôs de oportunidade processual para melhor suscitar 
 a questão de constitucionalidade antes de proferida a decisão. Vejamos: 
 
  
 
 11º
 
 É certo que, no caso sub judicio, quando o Recorrente respondeu ao recurso 
 interposto pelo Ministério Público sabia da existência da norma constante do 
 artigo 3º, nº 1, da Lei nº 4/83. 
 
  
 
 12º
 No entanto, não é menos verdade que o Recorrente só tem conhecimento do 
 verdadeiro âmbito de aplicação daquela norma, isto é da interpretação que lhe 
 foi dada, após notificação do acórdão do Tribunal recorrido (no caso vertente, 
 Ac. do STA do qual não cabia qualquer outro recurso). 
 
  
 
 13º
 De facto, só então estará em condições de avaliar da eventual 
 inconstitucionalidade do preceito e da sua influência na resolução da causa. 
 
  
 
 14º
 Sucede que, após a prolação desse acórdão, isto é, após percepcionar a 
 interpretação que foi atribuída ao artigo 3º nº 1 da Lei nº 4/83 o Recorrente 
 não teve qualquer oportunidade processual para suscitar aquela 
 inconstitucionalidade. 
 
  
 
 15º
 Até porque, até então, não era de esperar aquela interpretação, pois, como 
 resulta dos autos, a primeira decisão do TAF de Leiria foi conducente com a 
 interpretação que o Recorrente fazia da norma. 
 
  
 
 16º
 Interpretação que não afigurava qualquer ofensa à constituição, ao contrário do 
 que sucede com aquela que, de forma inesperada, veio a ser efectuada pelo STA. 
 
  
 
  
 
 17º
 Assim, o não conhecimento daquela inconstitucionalidade por parte do STA deve 
 ser considerado como equivalendo a aplicação implícita daquela norma, para o 
 efeito de recurso para o Tribunal Constitucional. 
 
  
 
 18º
 Na verdade, tal como também ficou consignado no Acórdão nº 176/88, este Tribunal 
 Constitucional «não pode ficar dependente de uma eventualmente indevida ‘omissão 
 de pronúncia sobre a questão de constitucionalidade, por parte dos restantes 
 tribunais». 
 
  
 
 19º
 Assim, embora a questão da inconstitucionalidade ser, em regra, suscitada antes 
 de proferida a decisão de que se recorre, pode, no entanto, sê-lo em momento 
 posterior quando, como sucedeu no caso dos autos, a parte não teve oportunidade 
 processual para o fazer antes (cfr., entre outros, Acórdãos nºs 136/85 e 94/88, 
 publicados no Diário da República, II Série, de 21 de Janeiro de 1986 e de 22 de 
 Agosto de 1988, respectivamente). 
 
  
 
 20º
 Posto isto, deve considerar-se atempadamente suscitada a questão de 
 inconstitucionalidade para o efeito do artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 
 
 28/82, encontrando-se igualmente verificados os restantes pressupostos. 
 
  
 Assim, formulam-se as seguintes conclusões: 
 
  
 
 1 - O Recorrente ao remeter – e dar por boa – para a fundamentação da sentença 
 na qual se faz alusão à inconstitucionalidade está, ainda que de forma indirecta 
 ou implícita, a invocou a questão da (in)constitucionalidade da norma; 
 
  
 
 2 - Por outro lado, sempre se diga que, mesmo que assim não se entenda sempre 
 estará verificada uma situação excepcional ou anómala na qual o Recorrente não 
 dispôs de oportunidade processual para melhor suscitar a questão da 
 
 (in)constitucionalidade antes de proferida a decisão;
 
  
 
 3 - O Recorrente só teve conhecimento do verdadeiro âmbito de aplicação daquela 
 norma, isto é da interpretação que lhe foi dada, após notificação do acórdão do 
 Tribunal recorrido (no caso vertente, Ac. do STA do qual não cabia qualquer 
 outro recurso); 
 
  
 
 4 - Só então estava em condições de avaliar da eventual inconstitucionalidade do 
 preceito e da sua influência na resolução da causa. 
 
  
 
 5 - Sucede que, após a prolação desse acórdão, isto é, após percepcionar a 
 interpretação que foi atribuída ao artigo 3º nº 1 da Lei nº 4/83 o Recorrente 
 não teve qualquer oportunidade processual para suscitar aquela 
 inconstitucionalidade. 
 
  
 
 6 - Até então, não era espectável. 
 
  
 
 7 - Posto isto, deve considerar-se atempadamente suscitada a questão de 
 inconstitucionalidade para o efeito do artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 
 
 28/82, encontrando-se igualmente verificados os restantes pressupostos. 
 
  
 
 8 - Assim se espera, Venerandos Conselheiros, por ser de 
 
  
 JUSTIÇA!!!».
 
  
 
       3 – O Procurador-Geral Adjunto, no Tribunal Constitucional, respondeu 
 dizendo:
 
  
 
 «1º
 A presente reclamação é manifestamente improcedente. 
 
  
 
 2º
 Na verdade a argumentação do reclamante assenta em evidente equívoco acerca do 
 
 ónus de suscitação da questão de inconstitucionalidade durante o processo. 
 
  
 
 3º
 O qual manifestamente se não basta com a suscitação “indirecta” ou “implícita” 
 de inconstitucionalidade, mediante remissão para outros elementos ou peças 
 processuais — cabendo ao interessado o ónus de a colocar expressamente na 
 alegação ou resposta, criando para o Tribunal o dever de se pronunciar sobre tal 
 matéria, sob pena de omissão de pronúncia. 
 
  
 
 4º
 Por outro lado – e atento o objecto do litígio – é evidente que o ora reclamante 
 teve plena oportunidade processual para prever ou antecipar a interpretação 
 normativa que pretendia questionar “sub specie constitutionis”, mesmo antes do 
 momento em que ela foi aplicada ou plasmada na decisão impugnada.».
 
  
 
       4 – A decisão reclamada tem o seguinte teor:
 
  
 
       «1 – A., melhor identificado nos autos, recorre para o Tribunal 
 Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei 
 n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual redacção (LTC), pretendendo ver 
 fiscalizada a constitucionalidade da norma do artigo 3.º, n.º 1, da Lei n.º 
 
 4/83, de 2 de Abril, na redacção da Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, na 
 interpretação segundo a qual “não seria de valorizar a entrega da declaração 
 antes da instauração da acção para perda de mandato, embora posterior ao prazo 
 de 30 dias após a notificação do Tribunal Constitucional, não sendo necessária 
 para a perda de mandato a violação das regras de isenção e desinteresse (a 
 imparcialidade) e de independência exigíveis a quem deve estar ao serviço do bem 
 comum”, por violação do disposto no artigo 50.º da Constituição da República 
 Portuguesa.
 
  
 
       2 – Integrando-se o caso sub judicio na hipótese recortada no artigo 
 
 78.º-A, n.º 1, da LTC, e dado que o despacho do tribunal a quo que admitiu o 
 recurso não vincula o Tribunal Constitucional (artigo 76.º, n.º 3, do mesmo 
 diploma) passa a decidir-se com base nos seguintes fundamentos.
 
  
 
 3 - Vem o presente recurso interposto ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea 
 b), da LTC. 
 
       Constituem exigências sustentadoras da sua admissibilidade que estejamos 
 perante a sindicância de uma norma efectivamente aplicada pela decisão recorrida 
 como sua ratio decidendi (cfr., entre muitos, os Acórdãos deste Tribunal nºs 
 
 674/99, 155/2000, 157/2000 e 232/2002, publicados no Diário da República II 
 Série, respectivamente, de 25 de Fevereiro de 2000, 9 de Outubro de 2000, 9 de 
 Outubro de 2000 e 15 de Julho de 2002) e que a questão da inconstitucionalidade 
 haja sido suscitada pela recorrente durante o processo.
 
       Quanto a este último requisito, o Tribunal Constitucional tem afirmado, em 
 múltiplas decisões, que ele deve ser entendido “não num sentido meramente formal 
 
 (tal que a inconstitucionalidade pudesse ser suscitada até à extinção da 
 instância)”, mas “num sentido funcional”, de tal modo que essa invocação haverá 
 de ter sido feita em momento em que o tribunal a quo ainda pudesse conhecer da 
 questão, “antes de esgotado o poder jurisdicional do juiz sobre a matéria a que 
 
 (a mesma questão de constitucionalidade respeita” (v. Acórdão n.º 352/94, 
 publicado no Diário da República II Série, de 6 de Setembro de 1994). 
 
       Tal significa que, em rigor, quer os pedidos de aclaração e reforma de uma 
 decisão, quer a arguição da sua nulidade, não são, enquanto incidentes 
 pós-decisórios, momentos adequados para suscitar uma questão de 
 inconstitucionalidade normativa, porquanto já não provocam a intervenção do 
 Tribunal Constitucional ao nível do reexame ou reapreciação da questão de 
 constitucionalidade (cf., nesse sentido, o já referido Acórdão 352/94 – onde se 
 afirma que “porque o poder jurisdicional se esgota, em princípio, com a prolação 
 da sentença, e porque a eventual aplicação de uma norma inconstitucional não 
 constitui erro material, não é causa de nulidade da decisão judicial, não torna 
 esta obscura e ambígua, há-de entender-se que o pedido de aclaração de uma 
 decisão judicial ou a reclamação da sua nulidade não são já, em princípio, meios 
 idóneos e atempados para suscitar a questão de inconstitucionalidade” – e também 
 o Acórdão n.º 560/94 - publicado no Diário da República II Série, de 10 de 
 Janeiro de 1995 -, onde se esclarece que «a exigência de um cabal cumprimento do 
 
 ónus de suscitação atempada – e processualmente adequada – da questão de 
 constitucionalidade não é […] “uma mera questão de forma secundária”. É uma 
 exigência formal, sim, mas essencial para que o tribunal recorrido deva 
 pronunciar-se sobre a questão de constitucionalidade para que o Tribunal 
 Constitucional, ao julgá-la em via de recurso, proceda ao reexame da questão»).
 A razão de ser de tal exigência é explicada por Cardoso da Costa (“A jurisdição 
 constitucional em Portugal”, in Estudos em homenagem ao Professor Doutor Afonso 
 Rodrigues Queiró, Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, I, 
 
 1984, pp. 210 e ss.): “quanto ao controlo concreto – ao controlo incidental da 
 constitucionalidade (…), no decurso de um processo judicial, de uma norma nele 
 aplicável – não cabe o mesmo, em primeira linha, ao Tribunal Constitucional, mas 
 ao tribunal do processo. 
 Na verdade, não obstante a instituição de uma jurisdição constitucional 
 autónoma, manteve-se na Constituição de 1976, mesmo depois de revista, o 
 princípio, vindo das Constituições anteriores (…), segundo o qual todos os 
 tribunais podem e devem, não só verificar a conformidade constitucional das 
 normas aplicáveis aos feitos em juízo, como recusar a aplicação das que 
 considerarem inconstitucionais (…). Este allgemeinen richterlichen Prüfungs-und 
 Verwerfungsrecht encontra-se consagrado expressamente (…), e com o 
 reconhecimento dele a Constituição vigente permanece fiel ao princípio, 
 tradicional e característico do direito constitucional português, do “acesso” 
 directo dos tribunais à Constituição (…). Quando, porém, se trate de recurso de 
 decisão de aplicação de uma norma (…) é ainda necessário que a questão da 
 inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, em consequência do 
 que o juiz tomou posição sobre ela (…). Compreende-se, na verdade, que a 
 invocação da inconstitucionalidade unicamente ex post factum (depois de 
 proferida a decisão) não seja suficiente para abrir o recurso para o Tribunal 
 Constitucional (sob pena, além do mais, de se converter num mero expediente 
 processual dilatório)”.
 
 É certo que tal doutrina sofre restrições, como se salientou naquele Acórdão n.º 
 
 352/94, mas isso apenas acontece em situações excepcionais ou anómalas, nas 
 quais o interessado não dispôs de oportunidade processual para suscitar a 
 questão de constitucionalidade antes proferida ou não era exigível que o 
 fizesse, designadamente por o tribunal a quo ter efectuado uma aplicação de todo 
 insólita e imprevisível. 
 Contudo, não poderá deixar de entender-se que o recorrente tem essa oportunidade 
 quando a apreensão do sentido com que a norma é aplicada numa decisão 
 posteriormente proferida é susceptível de ser perscrutado no(s) articulado(s) 
 processual(ais) funcionalmente previsto(s) para discretear juridicamente sobre 
 as questões cuja resolução essa decisão tem de ditar, por antecedentemente 
 colocadas, e em que aquele sentido, cuja constitucionalidade se poderá 
 questionar, se apresenta como sendo um dos plausíveis a ser aplicados pelo juiz. 
 
 
 Em todo o caso, ao encararem ou equacionarem na defesa das suas posições a 
 aplicação das normas, as partes não estão dispensadas de entrar em linha de 
 conta com o facto de estas poderem ser entendidas segundo sentidos divergentes e 
 de os considerar na defesa das suas posições, aí prevenindo a possibilidade da 
 
 (in)validade da norma em face da lei fundamental, recaindo sobre elas um dever 
 de prudência técnica na antevisão do direito plausível de ser aplicado e, nessa 
 perspectiva, quanto à sua conformidade constitucional. 
 
  
 
 4 – Enquadrando-se o dever de suscitação da inconstitucionalidade durante o 
 processo e pela forma adequada nos parâmetros acabados de definir, é manifesto 
 que, in casu, a inconstitucionalidade da norma sindicanda não foi adequadamente 
 suscitada durante o processo, nem, por outro lado, ocorre qualquer situação 
 excepcional ou anómala que permitisse desonerá-lo do cumprimento de tal ónus 
 processual.
 Na verdade, o recorrente, notificado do teor do recurso interposto pelo 
 Ministério Público, teve, nas suas contra-alegações, oportunidade processual 
 para controverter a inconstitucionalidade do disposto no artigo 3.º, n.º 1, da 
 Lei n.º 4/83, cuja aplicação foi claramente reclamada no referido recurso. Ora, 
 apesar de ter pugnado pela improcedência do recurso – designadamente, por 
 entender que “tal incumprimento não se verifica na medida em que dentro do prazo 
 da contestação da acção de perda do mandato, o recorrido fez prova da entrega da 
 mencionada declaração junto do Tribunal Constitucional, ainda que tenha 
 ultrapassado o prazo de 30 dias estabelecido no artigo 3.º, n.º 1, do citado 
 preceito legal” –, o recorrente não suscitou perante o Tribunal a quo qualquer 
 questão de constitucionalidade em termos deste se encontrar vinculado ao seu 
 conhecimento.
 
  
 
 5 – Destarte, atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide não tomar 
 conhecimento do objecto do recurso.
 
  
 Custas pelo Recorrente, fixando-se a taxa de Justiça em 8 (oito) UCs.».
 
  
 B – Fundamentação
 
  
 
       5 – Para refutar a decisão reclamada, o reclamante sustenta, por um lado, 
 dever considerar-se suscitada a questão de constitucionalidade através da 
 remissão feita para a sentença da 1.ª instância, e, por outro, dever 
 considerar-se o mesmo dispensado do cumprimento do ónus de adequada suscitação 
 da questão de constitucionalidade, por a dimensão normativa do art.º 3.º, n.º 1, 
 da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na redacção dada pela Lei n.º 25/95, de 18 de 
 Agosto, que foi aplicada como fundamento do Acórdão do Supremo Tribunal 
 Administrativo, recorrido, apenas ter sido conhecida a quando da sua 
 notificação.
 
       Mas esta argumentação não procede. 
 
       Mesmo consentindo, por mor de um princípio de economia processual, que 
 fosse admissível suscitar-se a questão de constitucionalidade por remissão para 
 outra peça processual anterior, sempre seria de exigir que essa remissão pudesse 
 ser entendida pelo tribunal de recurso com o sentido de o recorrente estava a 
 recolocar, nos termos antes apresentados, uma questão de constitucionalidade.
 
       Ora, tal não sucede no caso em apreço, em que o recorrente se limita a 
 defender a bondade da solução dada à causa na decisão recorrida. 
 Trata-se de uma remissão de sentido genérico para a decisão recorrida da qual 
 não é possível inferir qualquer sentido de pretender colocar, perante o tribunal 
 de recurso, qualquer questão de constitucionalidade e, mormente, a do art.º 3.º, 
 n.º 1, da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na redacção dada pela Lei n.º 25/95, de 
 
 18 de Agosto.
 
             Improcede, assim, este fundamento da reclamação.
 
             E o mesmo se há-de entender relativamente à dispensa do ónus de 
 suscitação, aqui pelas exactas razões expendidas na decisão sumária reclamada.   
 
           Na verdade, colocada a questão da aplicação da norma em causa nas 
 alegações de recurso do Ministério Público, dispôs o reclamante da oportunidade 
 de suscitar a questão de constitucionalidade no articulado das contra-alegações. 
 
 
 
             E o cumprimento desse ónus era de exigir-lhe mesmo que o preceito em 
 causa não viesse a ser aplicado com o exacto sentido que fora defendido pelo 
 recorrente, mas com outro que o tribunal nele viesse a descortinar, desde que 
 não fosse desrazoável e inadequado exigir do interessado um prévio juízo de 
 prognose relativamente à utilização dessa dimensão normativa ou, dito em termos 
 mais simples, desde que não se estivesse perante uma interpretação “insólita” ou 
 
 “imprevisível”. 
 
             Ora, este não é seguramente o caso de uma interpretação desse 
 género, pois a decisão recorrida acaba por sufragar um sentido normativo que faz 
 decorrer directa e imediatamente da funcionalidade do preceito legal em causa, 
 ao relevar como elemento determinante do incumprimento do dever de apresentação 
 da declaração de rendimentos a circunstância de já haver decorrido (antes da 
 acção judicial) o prazo estipulado na lei para essa apresentação.
 
  
 C – Decisão
 
  
 
             6 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional 
 decide indeferir a reclamação.
 
             Custas pelo reclamante, com taxa de justiça que se fixa em 20 UCs.
 
  
 Lisboa, 20.02.2008
 Benjamim Rodrigues
 Joaquim de Sousa Ribeiro
 Rui Manuel Moura Ramos