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Processo n.º 715/06
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Vítor Gomes
 
  
 
  
 
  
 
  
 
                  Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal 
 Constitucional
 
  
 
  
 
 1. O relator proferiu a seguinte decisão sumária, nos termos do n.º 1 do artigo 
 
 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC):
 
  
 
 “1. A., melhor identificado nos autos, foi julgado na 6ª Vara Criminal de 
 Lisboa, tendo sido condenado por acórdão de 20 de Fevereiro de 2004, proferido 
 nos autos de processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo nº 94/03, pela 
 prática de: – um crime de abuso de confiança, previsto e punido pelo artigo 
 
 300.º, n.ºs 1 e 2, alínea b), do Código Penal de 1982, actualmente, previsto e 
 punido pelo artigo 205.°, n.ºs 1 e 4, alínea b), do Código Penal, na pena de 
 quatro anos e seis meses de prisão; - um crime de burla agravada, previsto e 
 punido pelos artigos 217.°, n.º 1, e 218.°, n. ° 2, alínea a), do Código Penal, 
 na pena de cinco anos e seis meses de prisão; - um crime de falsificação de 
 documento particular, previsto e punido pelo artigo 256.°, n.º 1, alínea b), do 
 Código Penal, na pena de um ano de prisão; e de – um (único) crime de 
 falsificação de documentos, referente a três cheques, previsto e punido pelo 
 artigo 256°, n.ºs 1, alínea a), e 3, com referência ao artigo 30.°, n.º 1, do 
 Código Penal, na pena de dois anos e seis meses de prisão. 
 Em cúmulo jurídico destas penas, após realização de um cúmulo intercalar das 
 penas relativas aos crimes de falsificação de documentos, para aplicação do 
 perdão de 1 ano de prisão concedido pela Lei n.º 29/99, de 12 de Maio, foi 
 condenado na pena única de oito anos de prisão.
 Inconformado, o arguido recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por 
 acórdão de 15 de Dezembro de 2005, concedeu provimento parcial ao recurso, 
 condenando-o pela prática dos mesmos crimes, mas nas seguintes penas parcelares: 
 
 - de três anos e seis meses de prisão (para o crime de abuso de confiança); – de 
 quatro anos de prisão (para o crime de burla agravada); – de nove meses de 
 prisão (para o crime de falsificação de documento particular simples); e – de um 
 ano e seis meses de prisão (para o crime de falsificação de documentos 
 agravado). 
 Em cúmulo jurídico destas penas, após aplicação do perdão concedido pela Lei n.º 
 
 29/99, de 12 de Maio, em relação aos crimes de falsificação de documentos, foi a 
 pena única fixada em cinco anos de prisão.
 
 2. Ainda inconformado recorreu o arguido para o Supremo Tribunal de Justiça, 
 pedindo a revogação do acórdão da Relação e o reenvio dos autos para novo 
 julgamento, suscitando questões de constitucionalidade, com os fundamentos 
 constantes da respectiva motivação que condensou nas seguintes conclusões [segue 
 transcrição]:
 
 «1.ª Recorre-se do acórdão proferido pela Relação que não confirmou o acórdão 
 condenatório proferido pela primeira instância.
 
 2.ª O artigo 400°, n.º 1, alínea f), quando prevê que confirma decisão recorrida 
 acórdão que condena em pena diversa da proferida pela primeira instância 
 mediante acórdão que enferma de nulidades e desatende outras nulidades que 
 haviam sido suscitadas, além de modificar o adquirido quanto à matéria de facto, 
 e é por isso irrecorrível, é materialmente inconstitucional, por violação do 
 artigo32°, n.º 1 da CRP [direito ao recurso].
 
 3.ª O aresto recorrido enferma de omissão de pronúncia [artigo 379°, n.º 1, 
 alínea e) do CPP], ao não ter conhecido a questão concreta que o arguido 
 suscitara nas conclusões 31.ª e 32.ª, por remissão para os artigos 102° a 107 da 
 motivação, a qual é relevante para a decisão da causa, o que o faz enfermar de 
 nulidade.
 
 4.ª O acórdão recorrido enferma, salvo o merecido respeito, de erro de Direito, 
 por omissão de pronúncia, pois que não conheceu uma questão de 
 constitucionalidade material que foi submetida a julgamento em recurso e que é 
 relevante para a boa decisão da causa [a do artigo 127° do CPP em conjugação com 
 o artigo 163° do CPP], o que implica violação do artigo 379°, n.º 1, alínea c) 
 do CPP e concomitante nulidade.
 
 5.ª O aresto recorrido, ao ter considerado [página 35] que a valoração dos 
 documentos aqui em apreço [os de fls. 2471-2476] ser «viável (...) 
 independentemente da sua leitura ou expressa referência em audiência ao abrigo 
 do excepcionado no n.º 2 do art.° 355°» [do CPP], enferma de erro de Direito, 
 pois que o citado artigo 355° exige que a prova documental seja examinada em 
 audiência, através da sua menção individualizada e expressa, de modo a que possa 
 ser possibilitada aos sujeitos processuais a oportunidade de sobre ela se 
 poderem pronunciar.
 
 6.ª O aresto recorrido, ao ter considerado [página 35] que a valoração dos 
 documentos aqui em apreço [os de fls. 2471-2476] ser «viável (...) 
 independentemente da sua leitura ou expressa referência em audiência ao abrigo 
 do excepcionado no n.º 2 do art.° 355°» [do CPP], enferma de erro de Direito, 
 pois que o citado artigo 355° exige que a prova documental seja examinada em 
 audiência, através da sua menção individualizada e expressa, de modo a que possa 
 ser possibilitada aos sujeitos processuais a oportunidade de sobre ela se 
 poderem pronunciar.
 
 7.ª O aresto em recurso ao pura e simplesmente recusar-se a entrar em tal 
 questão [página 36], suscitada pelo recorrente, o do cumprimento do artigo 163°, 
 n.º 2 do CPP, enferma de erro de pronúncia, nos termos do artigo 379°, n.º 1, 
 alínea c) do CPP 
 
 8.ª O aresto recorrido enferma de erro de Direito quando interpreta e aplica o 
 artigo 163°, n.º 2 do CPP como se ele dispensasse os juízes de fundamentarem 
 especificadamente a sua divergência face às conclusões do juízo pericial só por 
 alcançarem conclusão diversa com o recurso a diversos meios de prova.
 
 9.ª [Reitera-se, por cautela que] é materialmente inconstitucional, por violação 
 do artigo 32°, n.º 1 da CRP o artigo 127° da CRP quando prevê que o princípio da 
 livre apreciação da prova permite a valoração dos depoimentos do assistente e 
 das testemunhas em sentido contrário ao declarado pêlos mesmos e posterga o 
 artigo 163° do CPP, ao infirmar a prova pericial.
 
 10.ª O aresto recorrido, mau grado se lhe reconhecer preocupação de 
 magnanimidade, enferma ainda de erro de Direito, por violação dos artigos 71°, 
 n.º 1, 72° e 40° do Código Penal, quando não valorou circunstâncias [dadas como 
 provadas] que militariam no sentido de uma pena concreta mais benigna, mais 
 perto do limite mínimo, dados os seguintes factos (i) ausência de antecedentes 
 por parte do arguido (ii) circunstância de ter a seu cargo filho de tenra idade 
 
 (iii) o banco para que trabalhava não haver apresentado queixa nem processo 
 disciplinar (iv) o arguido haver voluntariamente abandonado as funções que 
 exercia (v) desempenhar trabalho como professor (vi) ser funcionário respeitado. 
 
 
 
 (...)»
 O Ministério Público respondeu, pugnando pela inadmissibilidade do recurso, com 
 os seguintes argumentos [segue transcrição das conclusões]:
 
 «1.ª Nos termos dos art°s 400°, n. 1, f) do CPP, não cabe recurso do acórdão da 
 Relação que confirma a sentença condenatória proferida em lª instância que 
 condena arguido pela prática de crime com moldura penal abstracta não superior a 
 
 8 anos de prisão (a “dupla conforme”).
 
 2.ª Configura situação de dupla conforme (para efeitos do segmento normativo 
 
 ínsito na alínea f) do n. 1 do art° 4000 CPP), o acórdão da Relação que mantém a 
 condenação do arguido por todos os crimes, limitando-se a proceder a uma redução 
 de cada uma das penas parcelares (in mellius) e, consequentemente, a igual 
 redução da pena unitária, por força do respectivo cúmulo jurídico. 
 
 3.ª Um recurso interposto para o STJ deve especificar as razões de discordância 
 com o decidido na Relação, não podendo circunscrever-se a renovação da 
 argumentação já aduzida inicialmente para aquele Tribunal, sem qualquer 
 novidade, sob pena de equivaler a falta de motivação, conducente à sua rejeição.
 
 4.ª O Acórdão recorrido não enferma de insuficiências (omissão de pronúncia), 
 nulidades ou irregularidades, pelo que não merece qualquer censura, devendo ser 
 mantido e confirmado nos seus precisos termos, assim negando-se provimento ao 
 recurso do arguido.»
 O Procurador-Geral Adjunto no Supremo Tribunal de Justiça, acompanhando a 
 posição expendida pelo Ministério Público junto da Relação, emitiu parecer no 
 sentido da rejeição do recurso, por inadmissibilidade, tendo sido ouvido o 
 recorrente, ao abrigo do disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo 
 Penal, que respondeu sustentando a recorribilidade do acórdão da Relação.
 
 3. O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 28 de Junho de 2006, decidiu 
 rejeitar o recurso com os seguintes fundamentos:
 
  
 
 «II. Está em causa a admissibilidade do recurso interposto do acórdão da Relação 
 de Lisboa com fundamento no disposto no artigo 400.°, n.° 1, alínea f), do 
 Código de Processo Penal.
 Nos termos deste preceito, não é admissível recurso de acórdãos condenatórios 
 proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão da primeira 
 instância, em processo por crime a que seja aplicável pena de prisão não 
 superior a 8 anos, mesmo em caso de concurso de infracções.
 O recorrente foi condenado pela prática de um crime de crime de abuso de 
 confiança punível com prisão de 1 a 8 anos, de um crime de burla agravada, 
 punível com prisão de 2 a 8 anos, de um crime de falsificação de documento 
 particular, punível com prisão até 3 anos ou com pena de multa, e de um crime de 
 falsificação de documentos agravado, punível com prisão de 6 meses a 5 anos ou 
 com multa de 60 a 600 dias.
 A Relação, confirmando a condenação pela prática dos crimes, reduziu as penas 
 parcelares e únicas.
 Não se levantam dúvidas de que se a Relação se limitasse a confirmar nos seus 
 precisos termos a decisão da a instância, não era admissível recurso para o 
 Supremo.
 O que o recorrente controverte, defendendo a posição contrária na resposta à 
 suscitação da questão prévia, é a interpretação do referido preceito no sentido 
 de se considerar que a confirmação da condenação in mellius, não constituindo 
 uma confirmação tout court da decisão da 1ª instância, conduz à 
 inadmissibilidade do recurso. A nossa posição sobre tal questão vai no sentido 
 da inadmissibilidade do recurso.
 O que subjaz à consagração da dupla conforme no preceito em causa como 
 impeditiva do recurso para o Supremo, é a circunstância de, em processos por 
 crimes puníveis com prisão até 8 anos, se ter alcançado com a decisão da relação 
 confirmativa da decisão da 1.ª instância um grau de certeza de uma boa decisão 
 da causa que não justifica o arrastamento do processo por via de um novo 
 recurso, na busca de outra solução.
 Tratando-se de um recurso interposto apenas pelo arguido da decisão condenatória 
 proferida na 1ª instância, a condenação do recorrente na relação em pena 
 inferior à aplicada nessa instância significa que, como aconteceria com a 
 manutenção da mesma pena, se realizou o objectivo do legislador ao estruturar o 
 referido regime de limitação da possibilidade de um novo recurso.
 Com efeito, se está vedado ao recorrente interpor recurso do acórdão da relação 
 que confirma a decisão da primeira instância em toda a sua extensão, em processo 
 por crime a que seja aplicável pena de prisão não superior a 8 anos, por maioria 
 de razão lhe estará vedada essa possibilidade no caso se a relação, mantendo a 
 condenação pela prática do mesmo crime, reduzir a pena aplicada na 1ª instância. 
 Seria um manifesto ilogismo admitir a solução contrária.
 Assim, é de considerar que a circunstância de ter havido uma redução de penas 
 não afasta a dupla conforme que o artigo 400.°, n.º 1, alínea f), do Código de 
 Processo Penal consagra.
 Neste sentido se tem pronunciado a uma só voz, segundo cremos, este Supremo 
 Tribunal — acórdãos de 30-10-2003, proc. n.º 2921/03, de 04‑05‑2005, proc. n.º 
 
 555/05, de 19-07-2005, proc. n.º 2643/05, de 21-12- 2005, proc. 3259/05, de 
 
 02-02-2006, proc. 2786/05, e de 18-05-2006, entre outros.
 E o Tribunal Constitucional já considerou conforme à Constituição a 
 interpretação da norma em causa «no sentido de que é inadmissível recurso para o 
 Supremo Tribunal de Justiça de acórdão condenatório proferido, em recurso pela 
 relações, que confirmem (mesmo que parcialmente, desde que in mellius) decisão 
 da 1ª instância, quando o limite máximo da moldura penal dos crimes, 
 individualmente considerados, por que o arguido foi condenado, não ultrapasse 8 
 anos de prisão» (ac. n.º 2/2006, de 03-O 1-2006, proc. 954/05).
 Argumenta o recorrente na resposta à suscitação da questão da inadmissibilidade 
 do recurso que está em causa também a existência de questões relacionadas com 
 nulidades cometidas pela Relação, matéria em que nem sequer houve ainda uma 
 convergência conforme das duas instâncias. Todavia, a lei não exige coincidência 
 em toda a linha do tratamento de todas as questões nos arestos em causa, mas 
 apenas coincidência na decisão propriamente dita 
 E, face à inadmissibilidade do recurso, poderia o recorrente arguir as nulidades 
 do acórdão, perante o Tribunal da Relação, nos termos do artigo 668.°, n.º 3, do 
 Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 4.° daquele diploma.
 Assim, a apreciação de nulidades de acórdão da Relação não impunha a necessidade 
 de existência de recurso para este Supremo Tribunal.
 E não é caso de violação de qualquer preceito constitucional, dado que a 
 Constituição, no seu artigo 32.°, não garante um terceiro grau de jurisdição. Em 
 suma, é de considerar que a Relação confirmou uma decisão da 1ª instância, 
 proferida em processo por crimes puníveis com pena de prisão não superior a 8 
 anos, numa situação de dupla conforme.
 Consequentemente, do acórdão da mesma não cabe recurso para este Supremo 
 Tribunal.
 A decisão que o admitiu não vincula este Tribunal – artigo 414.°, n.º 3, do 
 Código de Processo Penal.
 Por força do disposto no artigo 420.°, n.º 1, segunda parte, do Código de 
 Processo Penal, o recurso deve ser rejeitado.»
 
 4. É deste aresto que vem interposto pelo arguido o presente recurso para o 
 Tribunal Constitucional, com fundamento na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da 
 Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, tendo por objecto a apreciação da 
 constitucionalidade da norma do “artigo 400°, n.º 1, alínea f) [do Código de 
 Processo Penal], quando prevê que confirma decisão recorrida acórdão que condena 
 em pena diversa [ainda que mais benigna] da proferida pela primeira instância 
 mediante acórdão que enferma de nulidades e desatende outras nulidades que 
 haviam sido suscitadas, além de modificar o adquirido quanto à matéria de facto, 
 e é por isso irrecorrível”, que o recorrente entende violar o direito ao recurso 
 consagrado no artigo 32º nº1 da Constituição.
 
 5. O preceito do Código de Processo Penal do qual o recorrente extrai a norma 
 impugnada é do seguinte teor:
 
  
 ARTIGO 400.°
 
 (Decisões que não admitem recurso)
 
 1. Não é admissível recurso: 
 
      (…)
 f) De acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que 
 confirmem decisão de primeira instância, em processo por crime a que seja 
 aplicável pena de prisão não superior a oito anos, mesmo em caso de concurso de 
 infracções;
 
                  (…)»
 
  
 Considera o recorrente que o entendimento sufragado no aresto recorrido, no 
 sentido de que o acórdão da Relação que condena em pena diversa, ainda que mais 
 benigna do que a imposta na 1ª instância, que enferma de nulidades, desatende 
 nulidades que haviam sido suscitadas e que modificou o adquirido quanto à 
 matéria de facto, constitui uma decisão condenatória confirmativa da decisão da 
 
 1ª instância para os efeitos da alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do Código de 
 Processo Penal, é inconstitucional por violar o direito ao recurso consagrado no 
 artigo 32.º, n.º 1, da Constituição.
 No caso dos autos o acórdão da Relação condenou o recorrente pela prática dos 
 mesmos crimes com que aquele foi sentenciado na 1ª instância com alterações 
 pontuais da matéria de facto que considerou irrelevantes para o enquadramento 
 jurídico-penal e limitou-se a graduar a medida concreta da pena em termos mais 
 favoráveis ao arguido, reduzindo as penas parcelares aplicadas a cada um desses 
 crimes e a pena única, sem alterar a fundamentação essencial da condenação, por 
 concluir que apenas se impunha efectuar algum ajuste “no que concerne à fixação 
 do quantum das penas ...”
 E, foi neste contexto que o aresto recorrido entendeu aplicável ao caso a norma 
 em apreço, considerando que a circunstância de ter havido uma redução de penas 
 não afasta a dupla conforme que o artigo 400º, nº1, alínea f) do Código de 
 Processo Penal, consagra, não sendo, pois, admissível o recurso para o Supremo 
 Tribunal de Justiça.
 Deste modo o objecto do recurso deverá ser delimitado à norma da alínea f) do 
 nº1 do artigo 400º do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de que 
 não é recorrível o acórdão da relação (proferido em recurso em processo por 
 crime a que seja aplicável pena de prisão não superior a oito anos) que, 
 mantendo a qualificação jurídico-penal dos factos, reduz a medida concreta das 
 penas parcelares e unitária em que o arguido foi condenado em 1ª instância. 
 
 6. Justifica-se que, no caso, se profira decisão sumária, ao abrigo do n.º 1 do 
 artigo 78.º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, por se considerar a questão a 
 decidir como simples face à jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre a 
 matéria.
 Na verdade, não só é já vasta a jurisprudência constitucional Tribunal sobre a 
 questão da inadmissibilidade do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, em 
 aplicação da alínea f) [bem como da alínea e)] do n.º 1 do artigo 400.º do 
 Código de Processo Penal, embora noutras dimensões interpretativas que não a 
 questionada nestes autos (vejam-se, a este propósito, os acórdãos n.ºs 189/2001, 
 de 3 de Maio, 369/2001, de 19 de Julho, 435/2001, de 11 de Outubro, 451/2003, de 
 
 14 de Outubro, 490/2003, de 22 de Outubro, 102/2004, de 11 de Fevereiro, 
 
 610/2004, de 19 de Outubro, e 104/2005, de 25 de Fevereiro (disponíveis em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt), como também, mais recentemente, este Tribunal  
 se pronunciou sobre a constitucionalidade do artigo 400º, n.º 1, alínea f), do 
 Código de Processo Pena, numa dimensão normativa idêntica à dos presentes autos, 
 tendo decidido que este preceito, “interpretado no sentido de que o acórdão 
 proferido em recurso pelas relações confirma a decisão de 1.ª instância quando 
 mantém os factos provados e a qualificação jurídica, não obstante reduzir a 
 medida concreta das penas parcelares e unitária, revogando parcialmente a 
 decisão de 1.ª instância”, não era inconstitucional, o que sucedeu no acórdão nº 
 
 32/2006, de 11 de Janeiro (ainda inédito, mas disponível em  
 
 www.tribunalconstitucional.pt).
 
 7. Conforme se escreveu neste aresto:
 
 « … há um ponto que ressalta dessa jurisprudência e que se afigura decisivo para 
 a resolução da presente questão de constitucionalidade, é que a Constituição não 
 garante, em processo penal, um terceiro grau de jurisdição, isto é, a 
 possibilidade de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, relativamente a 
 quaisquer questões. Sobre este aspecto, disse o Tribunal no mencionado Acórdão 
 n.º 189/2001:
 
  
 
 “[…]
 Embora o direito de recurso conste hoje expressamente do texto constitucional, o 
 recurso continua a ser uma tradução das garantias de defesa consagradas no n.º 1 
 do artigo 32º (O processo criminal assegura todas as garantias de defesa, 
 incluindo o recurso). Daí que o Tribunal Constitucional não só tenha vindo a 
 considerar como conformes à Constituição determinadas normas processuais penais 
 que denegam a possibilidade de o arguido recorrer de determinados despachos ou 
 decisões proferidas na pendência do processo (v.g., quer de despachos 
 interlocutórios, quer de outras decisões, Acórdãos n.ºs 118/90, 259/88, 353/91, 
 in Acórdãos do Tribunal Constitucional, n.ºs 15º, pg. 397; 12º, pg. 735 e 19º, 
 pg. 563, respectivamente, e Acórdão n.º 30/2001, sobre a irrecorribilidade da 
 decisão instrutória que pronuncie o arguido pelos factos constantes da acusação 
 particular quando o Ministério Público acompanhe tal acusação, ainda inédito), 
 como também tenha já entendido que, mesmo quanto às decisões condenatórias, não 
 tem que estar necessariamente assegurado um triplo grau de jurisdição, assim se 
 garantindo a todos os arguidos a possibilidade de apreciação da condenação pelo 
 STJ (veja-se, neste sentido, o Acórdão n.º 209/90, in Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional, 16º. V., pg. 553).
 Uma tal limitação da possibilidade de recorrer tem em vista impedir que a 
 instância superior da ordem judiciária accionada fique avassalada com questões 
 de diminuta repercussão e que já foram apreciadas em duas instâncias. Esta 
 limitação à recorribilidade das decisões penais condenatórias tem, assim, um 
 fundamento razoável.
 
 […]
 O artigo 400º do CPP foi alterado pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto, diploma 
 que veio introduzir modificações no processo penal e deu à alínea f) a redacção 
 que ainda mantém. De acordo com a proposta de revisão do processo penal (Lei n.º 
 
 157/VII, Diário da Assembleia da República, IIª Série-A, n.º 27, de 28 de 
 Janeiro de 1998), as modificações introduzidas na legislação processual penal 
 visavam obter melhorias nos objectivos de economia processual, de eficácia e de 
 garantia, que já informavam a anterior regulamentação.
 Assim, e nos termos da exposição de motivos daquela proposta de lei, 
 introduziram-se modificações destinadas a dar mais consistência e eficácia aos 
 meios disponíveis, de entre elas se assinalando as de maior relevo para o caso: 
 pretendeu-se restituir ao STJ a função de tribunal que apenas conhece de 
 direito, mas com excepções; manteve-se a tramitação unitária dos recursos, mas 
 sem haver um único modelo de recurso; faz-se um uso discreto do princípio da 
 
 «dupla conforme», harmonizando objectivos de economia processual com a 
 necessidade de limitar a intervenção do STJ a casos de maior gravidade; 
 retoma-se a ideia da diferenciação orgânica, apenas fundada no princípio de que 
 os casos de pequena e média gravidade não devem, por norma, chegar ao Supremo 
 Tribunal de Justiça, etc. (cf. Sobre esta matéria, Maia Gonçalves, Código de 
 Processo Penal Anotado, 12ª Edição, pg. 754).
 
 […]
 Como já se referiu, mesmo em processo penal, a Constituição não impõe ao 
 legislador a obrigação de consagrar o direito de recorrer de todo e qualquer 
 acto do juiz e, mesmo admitindo-se o direito a um duplo grau de jurisdição como 
 decorrência, no processo penal, da exigência constitucional das garantias de 
 defesa, tem de aceitar-se que o legislador penal possa fixar um limite acima do 
 qual não seja admissível um terceiro grau de jurisdição: ponto é que, com tal 
 limitação se não atinja o núcleo essencial das garantias de defesa do arguido.
 Ora, no caso dos autos, o conteúdo essencial das garantias de defesa do arguido 
 consiste no direito a ver o seu caso examinado em via de recurso, mas não 
 abrange já o direito a novo reexame de uma questão já reexaminada por uma 
 instância superior.
 Existe, assim, alguma liberdade de conformação do legislador na limitação dos 
 graus de recurso. No caso, o fundamento da limitação – não ver a instância 
 superior da ordem judiciária comum sobrecarregada com a apreciação de casos de 
 pequena ou média gravidade e que já foram apreciados em duas instâncias – é um 
 fundamento razoável, não arbitrário ou desproporcionado e que corresponde aos 
 objectivos da última reforma do processo penal.
 
 […].” 
 
  
 No também já referido Acórdão n.º 451/2003 reitera-se, com particular clareza, 
 que à questão de saber “[…] quais os limites de conformação que o artigo 32.º 
 n.º 1 da CRP impõe ao legislador ordinário, em matéria de recurso penal” deve 
 responder-se “no sentido de não haver vinculação a um triplo grau de jurisdição 
 e de ser constitucionalmente admissível uma restrição ao recurso se ela não for 
 desrazoável, arbitrária ou desproporcionada”. 
 Partindo, portanto, do pressuposto de que o artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, 
 quando estabelece que “o processo criminal assegura todas as garantias de 
 defesa, incluindo o recurso”, não consagra a garantia de um triplo grau de 
 jurisdição em relação a quaisquer decisões penais condenatórias, o que tem de 
 perguntar-se é se será desrazoável, arbitrário ou desproporcionado não admitir o 
 recurso para o Supremo nos casos, como o dos autos, em que a Relação mantém os 
 factos provados e a qualificação jurídica, não obstante reduzir a medida 
 concreta das penas parcelares e unitária (esta última para sete anos), revogando 
 parcialmente a decisão de 1.ª instância.
 Dito de outro modo: a questão de inconstitucionalidade colocada pelo recorrente 
 não pode ser resolvida com a mera invocação da garantia de um terceiro grau de 
 jurisdição, pois que, não podendo essa garantia ser reconhecida em todos os 
 casos, tal resolução exige necessariamente a ponderação da razoabilidade, 
 arbitrariedade ou desproporcionalidade da não admissão desse terceiro grau, no 
 caso concreto.
 Ora, realizando tal ponderação, dir-se-á que não é constitucionalmente 
 censurável que a exclusão do terceiro grau de jurisdição resulte de se 
 
 “qualificar como confirmatório da decisão condenatória, proferida em 1ª 
 instância, o acórdão da Relação que – sem qualquer alteração ou convolação dos 
 fundamentos essenciais ou substanciais – se limite, em mera «redução 
 quantitativa», a atenuar a medida concreta da pena aplicada ao arguido, 
 reduzindo a que lhe havia sido cominada na 1ª instância, por diversa 
 reponderação do quadro de circunstâncias atenuantes”.
 E dir-se-á também que não é desrazoável tratar do mesmo modo os casos em que a 
 Relação, aplicando pena não superior a oito anos, confirma totalmente a decisão 
 da 1.ª instância, e os casos em que a Relação, aplicando pena não superior a 
 oito anos, reduz a pena aplicada pela 1.ª instância.
 Como sublinha o Ministério Público nas contra-alegações:
 
  
 
 “[…]
 Seria, aliás, numa perspectiva teleológica ou funcional, aberrante que o arguido 
 pudesse aceder ao Supremo para rediscutir, v.g., uma possível atenuação da pena 
 de 5 anos de prisão que a Relação lhe aplicou, reduzindo a que lhe fora cominada 
 na 1ª instância – estando-lhe, todavia, vedado tal acesso se a Relação 
 
 [certamente por lapso, refere-se «se o Supremo»] se tivesse limitado a manter, 
 integral e estritamente, a sentença que o havia condenado, por exemplo, na pena 
 de 7 anos de prisão. Na verdade, tal solução legislativa, a existir, careceria 
 provavelmente de suporte material adequado, originando uma evidente e 
 inquestionável disfuncionalidade, traduzida em vedar injustificadamente o 
 acesso, em via de recurso, ao Supremo Tribunal de Justiça ao arguido que tivesse 
 sido condenado pelas instâncias em pena mais gravosa – permitindo tal acesso num 
 caso de «redução quantitativa» de tal pena privativa da liberdade, realizada em 
 seu benefício na 2ª instância.
 
 […].”».
 
  
 Estes fundamentos são, pois, inteiramente aplicáveis ao caso dos autos, em que, 
 
 à semelhança da situação decidida no acórdão nº 32/2006, a decisão da Relação 
 condenou o recorrente pela prática dos mesmos crimes, mas reduzindo as penas 
 parcelares e a pena única aplicadas.
 
 8. Resta acrescentar que a circunstância de o acórdão da Relação se pronunciar, 
 pela primeira vez, sobre a questão das nulidades da decisão de 1ª instância e de 
 se pretender discutir nulidades que se imputam a esse próprio acórdão, que o 
 recorrente inclui na dimensão normativa que considera violar o n.º 1 do artigo 
 
 32.º da Constituição, não impõe a abertura de recurso para o Supremo Tribunal de 
 Justiça.
 Como se disse no acórdão n.º 390/2004, publicado no Diário da República, II 
 Série, de 7 de Julho de 2004:
 
  
 
 “ […. ] não decorre forçosamente da garantia constitucional de um duplo grau de 
 jurisdição que haja de ser sempre admissível o recurso para o tribunal superior 
 nos casos em que o tribunal de recurso se pronuncie, pela primeira vez, sobre 
 questões que influam na decisão da causa (ressalvando-se o recurso de 
 constitucionalidade para o órgão jurisdicional específico não enquadrado na 
 hierarquia dos tribunais) ou nos de, ao proferir a decisão, incorrer na violação 
 de lei processual ou procedimental que seja sancionada com o estigma da 
 nulidade.
 Nada impõe que se leve a autonomização da questão da nulidade da decisão em 
 relação à questão de fundo tão longe que seja constitucionalmente exigível a 
 existência de um 2º grau de jurisdição especificamente para esta questão, 
 considerando o regime de arguição e conhecimento das nulidades em processo penal 
 por via de recurso, a possibilidade de arguir as nulidades perante o órgão que 
 proferiu a decisão, quando aquele recurso não existir, e, como no presente caso, 
 a existência de duas decisões concordantes em sentido condenatório (o Tribunal 
 da Relação confirmou a decisão da 1ª instância nesse sentido).
 
 É claro que o legislador poderia, na sua discricionariedade legislativa, admitir 
 esse recurso, mesmo nas hipóteses em que o fundamento deste resida na arguição 
 de nulidades processuais, assim ampliando o âmbito material do direito de 
 recurso, mas a sua inadmissibilidade não será constitucionalmente intolerável.
 Nesta perspectiva, poder-se-á dizer que, em caso de recurso relativo a decisão 
 condenatória, seja com fundamento em nulidades processuais, seja com fundamento 
 em erros de julgamento atinentes ao fundo da causa, o seu objecto apelante de um 
 terceiro grau de jurisdição será sempre o acórdão condenatório em si próprio. É 
 certo que, quando o fundamento do recurso se consubstancie em uma causa de 
 nulidade do acórdão condenatório, não poderá afirmar-se ter sido exercida a 
 garantia do duplo grau de jurisdição por uma forma definitiva. Mas uma tal 
 situação apenas demanda, numa perspectiva de garantia constitucional do acesso 
 aos tribunais que o recorrente convoca (art.º 20º da CRP), que esse mesmo grau 
 de jurisdição se possa (deva) pronunciar de modo formalmente válido sobre o 
 objecto do recurso. Nesta perspectiva ganha todo o sentido a possibilidade de o 
 tribunal recorrido poder suprir as nulidades e de o tribunal ad quem apenas 
 conhecer delas quando, sendo admissível o recurso, aquele o não tenha feito ou 
 não as haja atendido (art.º 379º, n.º 2, e 414º, n.º 4, do CPP; cf., no domínio 
 do processo civil, o art.º 668º, n.º 3 do Código de Processo Civil). Deste modo, 
 a apreciação de nulidades de acórdão condenatório não postula a necessidade de 
 existência de mais um grau de recurso. A reclamação perante o órgão 
 jurisdicional que exerce o segundo grau de jurisdição configura-se, assim, como 
 um instrumento jurídico adequado de garantir o acesso aos tribunais, na sua 
 dimensão de direito a obter uma decisão formalmente válida, que é a dimensão que 
 o recorrente aqui questiona. 
 Aliás, admitindo-se a constitucionalidade das normas que prevêem a existência 
 apenas de um duplo grau de jurisdição, mesmo quando está em causa a “bondade” do 
 julgamento efectuado, maiores razões existem para não se terem por desconformes 
 com a Lei Fundamental aquelas disposições que limitam o recurso ao mesmo segundo 
 grau de jurisdição em caso de existência de nulidades da decisão, que advêm 
 essencialmente da violação de regras processuais ou procedimentais, quando está 
 aí garantido o direito de reclamação para apreciação dessas nulidades para o 
 
 órgão jurisdicional que exerceu o último grau de jurisdição. 
 E para a conclusão que se assume não vale invocar como pretensos lugares 
 paralelos as hipóteses em que a lei processual admite que o fundamento de 
 nulidade possa constituir o único fundamento do recurso, como será seguramente o 
 caso contemplado no n.º 2 do art.º 310º do CPP (despacho que indefere a arguição 
 de nulidade traduzida em a decisão instrutória pronunciar o arguido por factos 
 que constituam alteração substancial dos descritos na acusação do Ministério 
 Público ou do assistente ou no requerimento da acusação), e poderá também 
 acontecer em recursos interpostos de decisão proferida em 1ª instância, conforme 
 decorre do art.º 379º do CPP.
 Em qualquer dessas situações a opção legislativa nada tem que ver com o 
 reconhecimento, no caso, de uma garantia de um duplo grau de jurisdição 
 relativamente ao fundamento de recurso traduzido na alegação de nulidades. Na 
 primeira situação, o que se verifica é apenas a admissibilidade de um duplo grau 
 de jurisdição relativamente a um despacho cujo conteúdo não deixa de coenvolver 
 uma restrição ou limitação aos direitos fundamentais do arguido, traduzido na 
 pronúncia por factos que constituem uma alteração substancial em relação aos 
 imputados na acusação, para além de uma ofensa ao direito de defesa. Na segunda 
 hipótese, a alegação da nulidade como fundamento eventualmente único do recurso 
 
 é feita dentro da admissibilidade geral do segundo grau de jurisdição sobre a 
 causa.”
 
 9. Em face do exposto, ao abrigo n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei nº 28/82, de 15 
 de Novembro, decide-se julgar improcedente o recurso.
 Custas a cargo do recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 unidades de 
 conta.”
 
  
 
  
 
                  2. O recorrente reclamou desta decisão, ao abrigo do n.º 3 do 
 artigo 7.º-A da LTC, em termos que as conclusões dessa reclamação sintetizam do 
 seguinte modo:
 
  
 
 1.ª O artigo 78°-A, números 1, 3 e 4 da Lei do TC é materialmente 
 inconstitucional quando prevê que o exame de legalidade da decisão sumária seja 
 efectuado por um colectivo de juízes que integre o juiz autor da decisão em 
 exame, por violação dos artigos 292°, n.° 2; 203°, 204°, 32°, n.° 1; 27°, n.° 1 
 e 20°, n.° 1 da CRP. 
 
 2.ª A argumentação da decisão sumária deve, salvo o merecido respeito, 
 improceder, improcede, pois (i) Se está em causa um «terceiro grau de 
 jurisdição» é porque a lei processual penal [através do citado artigo 400°, n.° 
 
 1, alínea f) do CPP] o permite [em nome das garantias de defesa e da segurança 
 jurídica] em caso de não haver dupla conforme nos anteriores julgamentos (ii) 
 argumentar com a ausência de garantia a esse exame pelo STJ no caso de 
 inexistência de dupla conforme significaria pura e simplesmente admitir que o 
 recurso seria um favor concedido aos recorrentes, uma graça excepcional que o 
 sistema jurídico lhes facultaria quando, na verdade, mais não se trata do que a 
 tradução de uma regra geral com assento constitucional, o da articulação do 
 direito à defesa [artigo 32°, n.° 1 da CRP] com a necessidade de segurança 
 
 [artigo 27°, n.° 1 da CRP], no quadro do direito de acesso aos tribunais [artigo 
 
 20°, n.° 1 da CRP] e (iii) não se invoque que toda a argumentação fica 
 descaracterizada ante o facto de a ausência de dupla conforme ficar prejudicada 
 ante o facto de a segunda decisão, emitida pela Relação, significar uma 
 atenuação da pena concreta, pois que, como se disse já nestes autos, tal sugere 
 precisamente a ausência de conformidade das instâncias em relação à própria 
 valoração da culpa e medida da pena, tudo questões de Direito que é lícito ao 
 STJ sindicar, porventura em medida mais benigna. 
 Nestes termos (i) deve ser declarada a inconstitucionalidade material do artigo 
 
 78°-A, números 1, 3 e 4 da Lei do TC e em consequência julgada a reclamação da 
 decisão sumária em conferência por colectivo de juízes no qual não tenha 
 intervenção o juiz que prolatou tal decisão (ii) caso assim se não entenda, deve 
 ser atendida a reclamação e revogada a mesma decisão, fazendo o recurso seguir 
 os seus termos até final.” 
 
  
 
  
 
                  O Ministério Público respondeu a esta reclamação nos termos 
 seguintes:
 
  
 
  
 
 “1- A questão de constitucionalidade formulada pelo recorrente é claramente 
 improcedente já que a participação do relator na conferência que dirimiu a 
 reclamação deduzida contra a decisão sumária não afronta os princípios 
 constitucionais elencados pelo recorrente. 
 
 2 - Na verdade, no nosso ordenamento adjectivo sempre se admitiu que o juiz que 
 participou em certa decisão possa integrar o órgão que irá reapreciar as 
 questões suscitadas – nomeadamente, que constituam objecto de incidentes 
 pós-decisórios, sem que tal procedimento traduza uma reapreciação, em via de 
 recurso, da matéria que constitui objecto do processo. 
 
 3 - E sendo evidente que a maioria de tal órgão jurisdicional colegial é que irá 
 dirimir as questões suscitadas pela parte. 
 
 4 - Por outro lado – e no que toca ao mérito da reclamação deduzida – as 
 considerações do reclamante em nada abalam os fundamentos da decisão reclamada, 
 assente em firme e reiterada jurisprudência acerca do âmbito, 
 constitucionalmente imposto, do acesso, em via de recurso, ao Supremo Tribunal 
 de Justiça. 
 
  
 
  
 
                  3. Cumpre começar por apreciar a “questão prévia” colocada pelo 
 recorrente da inconstitucionalidade do regime constante dos n.ºs 1, 3 e 4 do 
 artigo 78.º-A da LTC que, a proceder, levaria a que no julgamento da reclamação 
 
 (da substância da reclamação) não pudesse intervir o juiz que proferiu a decisão 
 reclamada. Apesar da referência ao regime daqueles três números do artigo 
 
 78.º-A,  a norma que o recorrente põe verdadeiramente em causa é, apenas,   a do 
 n.º 3 desse artigo 78.º-A na medida em que estabelece que o juiz que proferiu a 
 decisão sumária integre o colégio que vai apreciar a reclamação.  
 
  
 
                  A possibilidade de o relator proferir a decisão singular a que 
 se refere o artigo 78.º-A da LTC, pondo liminarmente termo ao recurso, quer por 
 falta dos pressupostos ou requisitos de que depende o seu prosseguimento, quer 
 por se tratar de questão simples ou manifestamente infundada, constitui um 
 importante instrumento de agilização dos recursos de constitucionalidade. Da 
 decisão do relator cabe reclamação para a conferência, constituída pelo 
 presidente ou pelo vice-presidente, pelo relator e por outro juiz da respectiva 
 secção (n.º 3 do artigo 78.º-A). Se não houver unanimidade dos três juízes 
 intervenientes quanto à decisão da reclamação, a decisão cabe ao pleno da secção 
 
 (composta pelo relator e mais quatro juízes (artigos 78.º-A, n.º 4 e 41.º da 
 LTC). 
 
                  Está, assim, assegurada, seja pela unanimidade em conferência, 
 seja pela maioria de vencimento se tiverem de intervir todos os juízes da 
 secção, a possibilidade de o interessado obter a mesma expressão concordante de 
 votos no sentido da decisão que seria necessária para julgar o recurso se não 
 existisse este expediente de decisão singular pelo relator. Neste aspecto, as 
 expectativas das partes, designadamente quanto a ver o recurso colegialmente 
 examinado pelo verdadeiro titular do poder jurisdicional  estão perfeitamente 
 tuteladas.
 
                  Com efeito, a reclamação para a conferência é o meio normal de 
 reacção contra os despachos do relator, sendo corolário da ideia de que o 
 verdadeiro titular do poder jurisdicional nos tribunais superiores é o órgão 
 colegial (cfr. ARMINDO RIBEIRO MENDES, Recursos em Processo Civil, pág. 135). E, 
 entre nós, o juiz designado como relator é sempre membro da formação de 
 julgamento e intervém no acórdão em que a conferência aprecia a reclamação de 
 decisões por si proferidas, quer a decisão singular que é objecto desse pedido 
 de reapreciação resulte dos tradicionais poderes de preparar o processo para 
 julgamento, quer consista no exercício dos mais alargados poderes que, após a 
 reforma de 1995-1996 do Código de Processo Civil, se lhe reconhecem de decidir 
 quaisquer questões prévias ou incidentais, bem como o próprio julgamento do 
 recurso quando este seja manifestamente infundado ou verse sobre questões 
 simples ou repetitivas. Neste aspecto, a norma do n.º 3 do artigo 78.º-A da LTC 
 nada tem de anómalo ou de novo no panorama do direito processual, 
 designadamente, de configuração dos meios de impugnação e de organização e 
 funcionamento dos órgãos judiciais de natureza colegial. 
 
  
 
                  Esta intervenção do relator não contende com nenhuma das normas 
 e princípios constitucionais que o recorrente invoca.                  
 
                  Designadamente, é manifestamente improcedente a afirmação de 
 que o regime jurídico em causa atenta contra a missão fundamental assinalada aos 
 tribunais pelo n.º 2 do artigo 202.º da Constituição de “assegurar a defesa dos 
 direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos”.         Chamados a 
 reexaminar a questão que foi objecto de decisão do relator, os juízes que 
 intervêm na conferência, decidem segundo a lei e a sua consciência, sem 
 obediência a ordens ou instruções e sem outro objectivo ou finalidade senão a 
 aplicação do direito ao caso concreto. 
 
                  Por outro lado, não vem a propósito falar de violação do artigo 
 
 204.º da Constituição, que é norma atributiva de poder de apreciação da 
 constitucionalidade nos feitos submetidos a julgamento, não parâmetro de 
 aferição de legitimidade constitucional das soluções normativas postas em 
 confronto com a Constituição no exercício desse poder (salvo, obviamente, se se 
 tratar de norma que disponha sobre os poderes de apreciação da 
 inconstitucionalidade nos feitos submetidos a julgamento). E não se vislumbra a 
 que venha a referência ao n.º 2 do artigo 292.º da Constituição, suspeitando-se 
 que se trate de lapso, para o qual não se encontram, porém, no contexto do 
 requerimento elementos de superação.
 
                  Também é inadequada a invocação do n.º 1 do artigo 27.º da 
 Constituição a propósito do que agora se discute, porque a norma em causa não 
 contende com o direito à liberdade ou segurança. E também não restringe ou de 
 qualquer modo afecta o direito de acesso aos tribunais (n.º 1 do artigo 20.º da 
 CRP), nem colide com a imposição constitucional de que o processo criminal 
 assegure todas as garantias defesa, incluindo o recurso. Está em causa uma norma 
 relativa ao processo de recurso de constitucionalidade, não matéria respeitante 
 
 à “constituição penal” ou às garantias constitucionais do processo criminal.
 
                                  
 
                  É incontestável que a imparcialidade dos juízes é um princípio 
 constitucional, quer se conceba como uma dimensão da independência dos tribunais 
 
 (artigo 203.º da CRP), quer como elemento da garantia do “processo equitativo” 
 
 (n.º 4 do artigo 20.º da CRP). Importa que o juiz que julga o faça com isenção e 
 imparcialidade e, bem assim, que o seu julgamento, ou o julgamento para que 
 contribui, surja aos olhos do público como um julgamento objectivo e imparcial. 
 E também é certo que a intervenção decisória sucessiva do mesmo juiz integra o 
 universo das hipóteses abstractamente susceptíveis de lesar esse princípio e, 
 por isso, de configurar um impedimento objectivo.
 
  
 Não é porém qualquer intervenção decisória anterior que pode objectivamente pôr 
 em crise a confiança numa decisão imparcial. Como se salientou no acórdão n.º 
 
 324/2006, www.tribunalconstitucional.pt.:
 
  
 
 “Em diversos casos a lei de processo civil prevê que se peça essa nova 
 ponderação ao juiz que decidiu. Assim sucede, por exemplo, quando se admitem 
 reclamações, em geral; ou, em particular, quando se arguem nulidades perante o 
 tribunal que julgou, quando se requer a reforma da decisão, ou quando se 
 interpõe recurso de agravo. Em todos estes casos a lei quer essa reponderação, 
 considerada vantajosa por comparação com a hipótese de ser um juiz alheio ao 
 processo a tomar a nova decisão. 
 
  Por um lado, pretende-se que seja o mesmo juiz porque é ele que conhece 
 globalmente o processo, o que beneficia, quer a adequação da decisão sobre a 
 questão parcelar, quer a celeridade processual; por outro lado, não se considera 
 que o juiz possa ser determinado na sua nova decisão por pré-juízos formados 
 quando proferiu a primeira, já que não há mudança de qualidade na intervenção 
 que possa fazer duvidar da independência na segunda intervenção.
 Não há manifestamente razão para lançar sobre os juízes a dúvida sobre a sua 
 imparcialidade quando são chamados a reponderar uma decisão”. 
 
  
 A argumentação do recorrente parece assentar no equívoco de identificar a 
 reclamação dos despachos do relator para a conferência com um recurso, hipótese 
 que a alínea e) do n.º 1 do artigo 122.º do Código de Processo Civil inclui na 
 lista dos impedimentos porque, aí sim, a solução diversa contrariaria, 
 manifestamente, a razão de ser da admissibilidade do recurso.
 Esta razão não está presente relativamente ao meio processual que agora está em 
 causa. A reclamação das decisões do relator para a conferência, anda que numa 
 classificação que use como critério a identidade orgânica do decisor se 
 apresente como meio impugnatório (estruturalmente) híbrido, é funcionalmente bem 
 diferente do recurso, sendo um verdadeiro pedido de reponderação, a que se 
 procede na mesma instância e com a mesma latitude de apreciação da decisão 
 reclamada. Como começou por referir-se, a reclamação para a conferência 
 destina-se a obter que a decisão final sobre a questão provenha do verdadeiro 
 titular do poder jurisdicional nos tribunais superiores. Que essa decisão se 
 atinja pela via de reapreciação de uma decisão anterior, em vez de ser produto 
 de uma deliberação primária do colégio judicante na base de um projecto de 
 acórdão (ou memorando) apresentado pelo relator, em nada se apresenta como 
 susceptível de colidir com a exigência de que a decisão da questão submetida a 
 apreciação resulte da consideração de todos os aspectos processualmente 
 relevantes e apenas desses. Não há objectivamente razão para considerar que o 
 relator não procede, na preparação dessa decisão e na subsequente deliberação, 
 com a mesma disposição de aplicar o direito ao caso concreto que teria se 
 estivesse a exercer a sua competência de apresentar um projecto para decisão 
 primária pelo órgão colegial. Nem que os demais juízes que intervêm deixem de 
 possuir a disposição ou capacidade necessárias para proceder a um exame autónomo 
 das razões aduzidas pelo reclamante. Como todos os pedidos de reponderação, aí 
 onde as disposições processuais a admitam (e note-se a tendência para o 
 alargamento dessa via de realização da justiça  – n.º 2, do artigo 669.º do 
 CPC), a reclamação para a conferência repousa no pressuposto, indispensável ao 
 funcionamento dos tribunais num Estado de Direito em que o estatuto dos juízes 
 está dotado das necessárias  garantias de independência e organização, de que  o 
 juiz  possui em permanência a humildade e fortaleza de ânimo necessárias para 
 examinar novos argumentos ou  argumentos apresentados de modo mais convincente. 
 Pode até dizer-se que, por esta via, o interessado sai beneficiado porque dispõe 
 de uma oportunidade mais de convencer a formação de julgamento das suas razões. 
 Aliás, no caso é suficiente que as razões do reclamante convençam um dos juízes 
 que integram a conferência para intervir o pleno da secção.
 
  
 
                  Tanto basta, por não se considerar infringida nenhuma das 
 normas constitucionais indicadas pelo reclamante, para julgar improcedente a 
 questão de constitucionalidade suscitada, não recusando aplicação às normas dos 
 n.ºs 1, 3 e 4 do artigo 78.º-A da LTC (cfr., no mesmo sentido, acórdãos n.º 
 
 486/2006 e n.º 616/2006).
 
  
 
  
 
                  4. Quanto ao fundo, o reclamante alega, em síntese, que se a 
 lei permite um terceiro grau de jurisdição em caso de não haver 'dupla conforme' 
 
 é porque entendeu que, embora com limitações cognitivas, a incerteza e 
 insegurança jurídicas decorrente de uma ausência de uniformidade valorativa das 
 instâncias exigiria um novo exame pelo Supremo Tribunal de Justiça. Seria isso 
 imposto pela articulação do direito à defesa (artigo 32.º, n.º 1, da CRP), com a 
 necessidade de segurança (artigo 27.º, n.º 1, da CRP), no quadro do direito de 
 acesso aos tribunais (artigo 20.º, n.º 1 da CRP).
 
                  Esta argumentação é improcedente. 
 
                  Salientando que não lhe cabe a apreciação do acerto da decisão 
 no plano da mera interpretação da alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do Código 
 de Processo Penal, o Tribunal lembra que, em conformidade com a jurisprudência 
 posta em evidência na decisão reclamada, toda no sentido de que o artigo 32.º, 
 n.º 1, da Constituição, quando estabelece que “o processo criminal assegura 
 todas as garantias de defesa, incluindo o recurso”, não consagra a garantia de 
 um triplo grau de jurisdição em relação a quaisquer decisões penais 
 condenatórias, o que tem de perguntar-se é se será desrazoável, arbitrário ou 
 desproporcionado não admitir o recurso para o Supremo nos casos, como o dos 
 autos, em que a Relação mantém os factos provados e a qualificação jurídica, não 
 obstante reduzir a medida concreta das penas parcelares e unitária (esta última 
 para sete anos), revogando parcialmente a decisão de 1.ª instância.
 
  
 Ora a menor certeza na aplicação do direito ao caso que possa imputar-se à 
 inexistência de uma rígida 'dupla conforme' nas instâncias não tem 
 constitucionalmente que ser superada pelo acesso ao Supremo Tribunal de Justiça. 
 Não podendo essa garantia ser reconhecida em todos os casos, tal resolução exige 
 necessariamente a ponderação da razoabilidade, arbitrariedade ou 
 desproporcionalidade da não admissão desse terceiro grau, na hipótese normativa 
 considerada. E, repete-se, não é constitucionalmente censurável que a exclusão 
 do terceiro grau de jurisdição resulte de se “qualificar como confirmatório da 
 decisão condenatória, proferida em 1ª instância, o acórdão da Relação que – sem 
 qualquer alteração ou convolação dos fundamentos essenciais ou substanciais – se 
 limite, em mera «redução quantitativa», a atenuar a medida concreta da pena 
 aplicada ao arguido, reduzindo a que lhe havia sido cominada na 1ª instância, 
 por diversa reponderação do quadro de circunstâncias atenuantes. Não é 
 desrazoável, quer reservar a possibilidade de recurso para Supremo para os casos 
 mais graves em função da medida da pena quer, num sistema assim concebido, 
 tratar do mesmo modo os casos em que a Relação, aplicando pena não superior a 
 oito anos, confirma totalmente a decisão da 1.ª instância e os casos em que a 
 Relação, aplicando pena não superior a oito anos, reduz a pena aplicada pela 1.ª 
 instância.
 
  
 
                  Improcede, pois, a reclamação, confirmando-se a decisão 
 reclamada que corresponde a jurisprudência firme e reiterada acerca do recurso 
 para o Supremo Tribunal de Justiça em terceiro grau de jurisdição em matéria 
 penal.
 
  
 
  
 
  
 
                  5. Decisão
 
  
 
                  Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação e condenar o 
 reclamante nas custas, fixando-se a taxa de justiça em 25 (vinte e cinco) 
 unidades de conta.
 
  
 Lisboa, 17 de Janeiro de 2007
 Vítor Gomes
 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
 Artur Maurício