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Processo nº 1031/08
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria João Antunes
 
 
 Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
 
 
 I. Relatório
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é 
 recorrente A. e é recorrido o Ministério Público, foi interposto recurso para o 
 Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei da 
 Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do 
 despacho daquele Tribunal de 3 de Dezembro de 2008.
 
  
 
 2. Em 7 de Janeiro de 2009 foi proferida decisão sumária, ao abrigo do nº 1 do 
 artigo 78º-A da LTC, com os seguintes fundamentos:
 
  
 
 «Segundo o disposto na parte final do nº 2 do artigo 75º-A da LTC, cabe ao 
 recorrente indicar a peça processual em que suscitou a questão de 
 inconstitucionalidade. Tal requisito não está satisfeito, mas não se justifica 
 convidar o recorrente a prestar a indicação em falta (artigo 75º-A, nº 6, da 
 LTC). Ainda que a viesse a prestar, justificar-se-ia sempre não tomar 
 conhecimento do objecto do recurso interposto.
 Constituem requisitos do recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do 
 nº 1 do artigo 70º da LTC a aplicação pelo tribunal recorrido, como ratio 
 decidendi, da norma cuja constitucionalidade é questionada pelo recorrente e a 
 suscitação da questão de inconstitucionalidade normativa durante o processo e 
 tais requisitos não podem dar-se como verificados.
 Com efeito, o despacho recorrido não interpretou e aplicou os artigos 400º, nº 
 
 1, alínea f), e 5º, nº 2, alínea b), do Código de Processo Penal, no sentido de 
 ser inadmissível o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de um acórdão do 
 tribunal de júri, organizado antes da entrada em vigor da Lei nº 48/2007, altura 
 em que esse recurso era obrigatório para esse Tribunal – artigo 432º, alínea c), 
 do mesmo Código. O tribunal recorrido interpretou e aplicou aquela alínea do 
 artigo 400º – afastando expressamente o “campo de intervenção do artigo 5º, nº 
 
 1, do CPP” –, no sentido de não ser admissível recurso para o Supremo Tribunal 
 de Justiça de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que 
 confirmem decisão de 1ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 
 anos. De resto, tendo sido já interposto recurso para o Tribunal da Relação de 
 Guimarães nem sequer fazia sentido mobilizar a redacção anterior do artigo 432º, 
 alínea c), do Código de Processo Penal, segundo a qual dos acórdãos finais do 
 tribunal de júri havia logo recurso para o Supremo Tribunal de Justiça. Valia 
 quanto a estas decisões o princípio do grau único de recurso.
 Por outro lado, durante o processo, ou seja, na reclamação do despacho do 
 Tribunal da Relação que não admitiu o recurso, o recorrente não suscitou, de 
 forma adequada, uma questão de inconstitucionalidade normativa reportada aos 
 artigos 400º e 5º do Código de Processo Penal (cf. artigo 72º, nº 2, da LTC). 
 Para além de ter sustentado a inconstitucionalidade da não admissão do recurso 
 
 (artigo 12º), o recorrente não identificou a interpretação que reputava 
 inconstitucional (artigos 4º e 5º da Conclusão)».
 
  
 
 3. A recorrente vem agora reclamar para a conferência (artigo 78º-A, nº 3, da 
 LTC), sustentando o seguinte:
 
  
 
 «(…) Contrariamente ao que vem exposto na douta decisão sumária ora objecto de 
 reclamação, a arguida suscitou de forma adequada, porque de harmonia com o que 
 dispõe o art° 72°, nº2 da LTC, a inconstitucionalidade normativa:
 a) Quanto à “peça processual”: 
 
 1. Fê-lo logo no requerimento de interposição de recurso junto do Tribunal da 
 Relação de Guimarães onde se escreveu: “A não admissão do presente recurso, por 
 interpretação contrária, viola o princípio constitucional da não retroactividade 
 da lei nova na medida em que, in casu, são restringidos direitos e garantias 
 fundamentais”
 
 2. Repetiu-o, palavra por palavra, na Reclamação que apresentou para o 
 Presidente do STJ no seu art. 5°, e expressou-o, também, em desenvolvimento, nos 
 artigos 10°, 11° e 12°. 
 b) Quanto à suscitação da questão da inconstitucionalidade normativa “durante o 
 processo”:
 
 1. Claramente se observa que a questão normativa da interpretação do art. 400, 
 n°1, al. f) do CPPenal só podia ser enunciada e anunciada aquando da 
 interposição do recurso do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação para o 
 STJ, pois só então a mesma se colocava.
 
 2. Assim procedeu, nos termos já expostos na precedente alínea a).
 c) Quanto à suscitação da questão da inconstitucionalidade normativa daquela 
 norma “durante o processo ... de forma adequada” na Reclamação para o Presidente 
 do STJ:
 
 1. O art. 5° da reclamação em causa é expressão do entendimento da arguida sobre 
 a questão da inconstitucionalidade da norma em causa;
 
 2. Os arts. 10° e 12° da reclamação elabora, ainda mais, aquele entendimento, 
 sendo este último de decisivo relevo nele se escrevendo: “Por isso mesmo, a não 
 admissão do presente recurso por interpretação contrária do art. 5, n°2, al. a) 
 do CPPenal, aplicando em consequência a al. f) do art. 400 do CPPenal na 
 redacção da lei n° 48/2007 de 29/08, viola o princípio constitucional da lei 
 nova, formalmente previsto no art. 29, n°4 da CRP, dado tratar-se dum segmento 
 normativo de natureza substantiva, ou quase substantiva, na medida em que o 
 direito de defesa do arguido integra um complexo de direitos e garantias 
 parcelares que constituem em última análise o seu estatuto processual, entre os 
 quais se destaca o direito ao recurso que assume uma das garantias 
 jurídico-constitucionais das garantias do processo criminal, conforme advém do 
 art. 32, n°1 da CRP”. 
 A alusão feita pela arguida ora reclamante à questão da intervenção do Tribunal 
 de Júri requerida antes de ter sido recebida a acusação, prende-se tão só como 
 explicitação duma precisa e evidente circunstância que estava a passar em claro 
 pelos decisores, sendo a clarificação argumentativa da questão de fundo invocada 
 e cujo núcleo essencial é o direito ao recurso para o STJ por imposição do art. 
 
 5°, n° 2 do Código Processo Penal; na medida em a norma do art.° 400 ° do Código 
 de Processo Penal na versão da Lei n° 48/2007 de 02/08 apesar de processual tem 
 uma natureza substantiva ou quase substantiva e daí por se tratar de Lei Nova a 
 sua aplicabilidade não retroactiva de harmonia com o que dispõe o art.° 29°, n° 
 
 4 da CRP».
 
  
 
 4. Notificado desta reclamação, o Ministério Público respondeu-lhe nos termos 
 seguintes: 
 
  
 
 «1º
 A presente reclamação é manifestamente improcedente. 
 
 2º
 Na verdade, a argumentação do reclamante em nada abala os fundamentos da decisão 
 reclamada, no que toca à evidente inverificação dos pressupostos do recurso».
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II. Fundamentação
 A decisão reclamada concluiu pelo não conhecimento do objecto do recurso com 
 fundamento na não verificação de dois requisitos do recurso interposto: a 
 aplicação pelo tribunal recorrido, como ratio decidendi, da norma cuja 
 constitucionalidade é questionada pela recorrente e a suscitação prévia, de 
 forma adequada, de uma questão de inconstitucionalidade normativa reportada aos 
 artigos 400º e 5º do Código de Processo Penal.
 A reclamante põe em causa apenas esta última razão. Tanto basta para que a 
 reclamação seja indeferida. 
 Para pôr em causa aquela razão, a reclamante invoca os artigos 5º, 10º, 11º e 
 
 12º da reclamação para o Supremo Tribunal de Justiça, transcrevendo este último, 
 por ser de “decisivo relevo”.
 Relativamente a este último artigo, importa apenas reiterar que é aqui 
 questionada a constitucionalidade da não admissão do recurso e não propriamente 
 a constitucionalidade de uma qualquer interpretação daqueles artigos. Quanto aos 
 outros artigos (fl. 8 e ss.), é por demais evidente a não suscitação de qualquer 
 questão de inconstitucionalidade normativa.
 
 É certo que no artigo 5º da “Conclusão” é dito que “as normas jurídicas citadas 
 na interpretação vertida no despacho de inadmissibilidade do recurso, 
 interpretadas na forma que o foram, não estão conformes com a Constituição da 
 República Portuguesa”. Porém, é entendimento reiterado deste Tribunal que quando 
 
 “se suscita a inconstitucionalidade de uma determinada interpretação de certa 
 
 (ou de certas) normas jurídicas, necessário é que se identifique essa 
 interpretação em termos de o Tribunal, no caso de a vir a julgar 
 inconstitucional, a poder enunciar na decisão, de modo a que os destinatários 
 delas e os operadores do direito em geral fiquem a saber que essa (ou essas) 
 normas não podem ser aplicadas com um tal sentido” (Acórdão nº 106/99, 
 disponível em www.tribunalconstitucional.pt). 
 Impõe-se, pois, indeferir a presente reclamação.
 
  
 III. Decisão
 Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, 
 confirmar a decisão reclamada.
 Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 Lisboa, 27 de Janeiro de 2009
 Maria João Antunes
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Gil Galvão