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Processo nº 800/06
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria João Antunes
 
  
 
  
 
  
 
  
 Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
  
 
  
 I. Relatório
 
 1. Nos presentes autos de recurso, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em 
 que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto recurso 
 para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70º, nº 1, 
 alínea b), da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal 
 Constitucional (LTC), da decisão daquele Tribunal de 10 de Julho de 2006.
 
  
 
 2. Em 18 de Outubro de 2006, foi proferida decisão sumária no sentido de que não 
 podia conhecer-se do objecto do recurso em causa, com os seguintes fundamentos:
 
  
 
 «Muito embora o requerimento de interposição de recurso não identifique a 
 interpretação que a decisão recorrida fez do artigo 678º, nº 1 do Código de 
 Processo Civil, não se justifica convidar o recorrente, ao abrigo do disposto no 
 nº 6 do artigo 75º-A da LTC, a suprir tal deficiência. Com efeito, subsistiria 
 sempre uma razão para não conhecer do objecto do recurso interposto: a não 
 suscitação prévia, durante o processo, da questão de inconstitucionalidade 
 normativa formulada no requerimento de interposição de recurso para este 
 Tribunal (cf. artigo 70º, nº 1, alínea b), da LTC).
 Das passagens acima transcritas (ponto 3. do Relatório) – e, em geral, da peça 
 processual em que se inserem – decorre que o recorrente não suscitou 
 previamente, durante o processo, qualquer questão de inconstitucionalidade 
 relativamente àquele artigo – ou sequer qualquer outra questão de 
 inconstitucionalidade normativa –, resultando antes que questionou a 
 constitucionalidade, isso sim, da decisão então objecto de reclamação. 
 Reportando-se à decisão de “rejeição do recurso”, conclui que esta lhe restringe 
 necessariamente a discussão livre e integral do seu direito (artigo 20º, nº 1, 
 da CRP), sendo patente a violação do dito princípio constitucional. Mais 
 acrescentando, quando conclui, que “a [decisão de] não admissibilidade do 
 recurso atenta contra o aludido princípio constitucional”. 
 
  
 
 3. Desta decisão vem agora o então recorrente reclamar para a conferência 
 
 (artigo 78º-A, nº 3, da LTC), fazendo-o nos seguintes termos:
 
  
 
 «1 – O recorrente interpôs recurso para o Tribunal Constitucional do douto 
 despacho do Exmo Senhor Presidente do Tribunal da Relação do Porto, confirmativo 
 de um outro da Mma Juíza do tribunal judicial de Vila Nova de Gaia (proc° n° 
 
 110/05. 8TBVNG da 2ª Vara Mista), que rejeitara um recurso, com fundamento no 
 art° 678-1 CPC.
 Por despacho naquele processo, o autor (que propôs uma acção emergente de 
 acidente de viação, no valor de € 322.003, 48) foi notificado para pagar a taxa 
 de justiça inicial no valor de € 1.068. A liquidação desta taxa de justiça 
 resultou do facto de a Segurança Social, a quem fora requerido o apoio 
 judiciário na modalidade de isenção de pagamento de taxa de justiça e preparos, 
 ter informado o tribunal de que havia sido concedido ao autor o pagamento 
 faseado da taxa de justiça.
 Todavia, o autor, que já havia proposto a acção e declarado na petição querer 
 prevalecer-se da formação do acto de deferimento tácito do apoio judiciário 
 requerido - cuja decisão não lhe foi notificada no prazo fixado na lei (sendo 
 mesmo largamente ultrapassado o prazo de 30 dias) – tendo entendido que tal 
 despacho violava o seu direito, deferido tacitamente, quis impugnar o douto 
 despacho. Não lhe foi admitido o recurso, com base na aplicação do art° 678-1 
 CPC.
 Foi pois desse despacho de não admissão do recurso que o recorrente reclamou 
 para o Exmo Senhor Presidente do tribunal da Relação do Porto e do douto 
 despacho deste para o tribunal Constitucional.
 
 2 – A ilustre subscritora da decisão sumária refere nesta que o “recorrente não 
 suscitou previamente, durante o processo, qualquer decisão de 
 inconstitucionalidade relativamente àquele artigo – ou sequer qualquer outra 
 questão de inconstitucionalidade normativa -, resultando antes que questionou a 
 constitucionalidade, isso sim, da decisão então objecto da reclamação”.
 Parece ao recorrente óbvio, salvo todo o respeito, que se questionou a 
 constitucionalidade da decisão objecto da reclamação, implicitamente, pelo 
 menos, questionou a norma com base na qual ela foi proferida. E por certo o 
 sentido com que foi interpretada.
 Resulta assim dos termos da douta decisão que a questão da inconstitucionalidade 
 da norma foi colocada, ainda que por via da decisão que a aplicou.
 
 3 – Deve reconhecer-se que o que estava em causa era a aplicabilidade do art° 
 
 678-1 CPC, cuja interpretação feita serviu de fundamento à rejeição do recurso 
 de 1ª instância.
 Por outro lado, importa considerar que a questão da constitucionalidade, ainda 
 que de modo um tanto simplicista – tratava-se de uma simples reclamação para 
 admissão do recurso – parece decorrer do requerimento de reclamação. Nesta o 
 reclamante alega que a falta de apoio judiciário (resultante da aplicação da 
 dita disposição) restringe-lhe necessariamente a discussão livre e integral do 
 seu direito (de reparação). Queria pois significar que a interpretação dada à 
 dita disposição legal constituía um entrave no acesso ao direito.
 
 4 – A questão foi posta, e o facto é que o Presidente do Tribunal da Relação 
 compreendeu-a e deu-lhe resposta.
 No 6° parágrafo da decisão, aí é afirmado que
 
 “a existência de limitações de recorribilidade ... funciona como mecanismo de 
 racionalização do sistema judiciário, permitindo que o acesso à justiça não 
 seja, na prática, posto em causa pelo colapso do sistema . . . (v. Ac Trib. 
 Const. de 29/7/03, Proc. 623/23002, 3ª Sec)” Tendo a suscitação da questão 
 constitucional, como finalidade, poder o tribunal “a quo” debruçar-se sobre a 
 mesma (Breviário de Direito Processual Constitucional, Coimbra editora, 1997, pg 
 
 50), e considerando que a mesma recebeu resposta, deve aquela, salvo todo o 
 respeito, ser tida como minimamente cumprida.
 Conclusões:
 
 1ª – A douta decisão de 1ª instância fundara a rejeição do recurso na aplicação 
 estrita da norma 678-1 CPC, cuja interpretação o recorrente considerou errada e 
 violadora do princípio constitucional do acesso ao direito, designadamente art° 
 
 20 CRP;
 
 2ª — Na reclamação feita para o Excelentíssimo Presidente da Relação, resulta 
 que o ora reclamante questionou a constitucionalidade da decisão objecto de 
 reclamação; ainda que nela não tenha referido expressamente a norma, deve 
 aceitar-se que a norma que lhe subjaz é a que foi aplicada pela decisão, com a 
 interpretação feita.
 
 3ª – A questão foi bem compreendida e respondida na douta decisão.
 
 4ª – Concluindo, o recorrente deu cumprimento, ainda que reconheça de forma 
 simplicista, ao preceituado no disposto do art° 70-1 alª b) LTC».
 
  
 
 4. Notificado desta reclamação para a conferência, o Ministério Público junto 
 deste Tribunal respondeu nos termos que se seguem:
 
  
 
 «1 – A presente reclamação é manifestamente improcedente.
 
 2 – Na verdade, a argumentação do reclamante em nada abala os fundamentos da 
 decisão reclamada, no que toca à evidente inverificação dos pressupostos do 
 recurso».
 
  
 II. Fundamentação
 Do conteúdo da presente reclamação não resulta nada que possa pôr em causa o 
 anteriormente decidido, podendo mesmo afirmar-se que o respectivo teor vem 
 confirmar o entendimento de que não podia conhecer-se do objecto do recurso de 
 constitucionalidade.
 Na verdade, tal resulta de o reclamante afirmar agora, expressamente, que lhe 
 parece óbvio “que se questionou a constitucionalidade da decisão objecto da 
 reclamação, implicitamente, pelo menos, questionou a norma com base na qual ela 
 foi proferida. E por certo o sentido com que foi interpretada”. 
 Na medida em que há que distinguir questões de inconstitucionalidade normativa 
 de questões de inconstitucionalidade das decisões – distinção absolutamente 
 consolidada na jurisprudência deste Tribunal, face ao disposto nos artigos  280º 
 e 281º da Constituição e 70º da LTC –, é manifesto que importa concluir pelo 
 indeferimento da presente reclamação, mantendo a decisão de não conhecimento do 
 objecto do recurso. 
 
  
 III. Decisão
 Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, 
 confirmar a decisão reclamada no sentido do não conhecimento do objecto do 
 recurso.
 Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte ) unidades de 
 conta.
 Lisboa, 28 de Novembro de 2006
 Maria João Antunes
 Rui Manuel Moura Ramos
 Artur Maurício