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Processo n.º 201/09
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Mário Torres
 
 
 
       Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,
 
 
 
                         1. Relatório
 
                         A. interpõe recurso para o Tribunal Constitucional, ao 
 abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de Organização, 
 Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 
 
 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 13‑A/98, de 26 
 de Fevereiro (LTC), contra o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul 
 
 (TCAS), de 5 de Fevereiro de 2009, que negou provimento ao recurso 
 jurisdicional interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de 
 Lisboa, de 27 de Fevereiro de 2007, que, por seu turno, negara provimento ao 
 recurso contencioso de anulação por ele deduzido contra o despacho da Direcção 
 da Caixa Geral de Aposentações, de 18 de Junho de 2002, que lhe reconhecera o 
 direito à aposentação voluntária, mas lhe comunicara ser devedor da quantia de 
 
 € 24 464,73, por pretensa dívida resultante da contagem de tempo para a 
 aposentação.
 
                         No requerimento de interposição de recurso refere o 
 recorrente pretender ver apreciada a inconstitucionalidade das normas dos 
 artigos 1.º e 6.º do Decreto‑Lei n.º 278/82, de 20 de Julho, com a interpretação 
 com que foram aplicadas na decisão recorrida, inconstitucionalidade essa que 
 por ele teria sido suscitada nas alegações do recurso jurisdicional.
 
                         As alegações apresentadas pelo recorrente no aludido 
 recurso jurisdicional foram sintetizadas nas seguintes conclusões:
 
  
 
             “1.ª – O regime do artigo 6.º do Decreto‑Lei n.º 278/82, de 20 de 
 Julho, deve também ser aplicado aos subscritores que, como o recorrente, tendo 
 trabalhado em instituições de previdência, ingressaram na função pública antes 
 da entrada em vigor daquele diploma;
 
             2.ª – A sentença recorrida, ao perfilhar o entendimento de que o 
 referido normativo não é aplicável ao recorrente, faz do mesmo uma 
 interpretação meramente literal, ao total arrepio do estatuído n.º 1 do artigo 
 
 9.º do Código Civil;
 
             3.ª – Outrossim, tal interpretação jurídica restringe‑se a um 
 conceptualismo formalista, desprezando as consequências práticas que dele 
 advêm;
 
             4.ª – Sendo que a desaplicação da referida norma ao requerente 
 acarreta a este prejuízos relevantes, injustificáveis a todas as luzes;
 
             5.ª – Outrossim, a interpretação de que o regime do referido artigo 
 
 6.º do Decreto‑Lei n.º 278/82 não é aplicável ao recorrente viola o princípio da 
 igualdade consagrado na Constituição;
 
             6.ª – O recorrente transitou de uma instituição de previdência para 
 a função pública sem que tenha ocorrido qualquer hiato entre essas duas 
 situações profissionais;
 
             7.ª – Tendo‑lhe sido contado todo o tempo de serviço prestado no CNP 
 para o efeito de concessão de diuturnidades;
 
             8.ª – Nenhuma diferença relevante existe entre a situação do 
 recorrente e a dos restantes trabalhadores que só ingressaram na função pública 
 após a publicação do referido diploma;
 
             9.ª – Com efeito, esses trabalhadores ingressaram na função pública, 
 voluntariamente, e não compulsivamente, como se sugere na sentença recorrida;
 
             10.ª – Sendo assim, o tratamento desigual que, em matéria de 
 aposentação, é dado a essas duas situações é gritantemente inconstitucional, na 
 medida em que se trata de uma desigualdade de tratamento sem qualquer fundamento 
 razoável e sem qualquer justificação objectiva e racional.
 
             Mostram‑se, assim, violados os artigos 13.º da Constituição, 9.º do 
 Código Civil e 6.º do Decreto‑Lei n.º 278/82, de 20 de Julho, pelo que deve a 
 douta sentença recorrida ser revogada com as consequências legais.”
 
  
 
                         O acórdão do TCAS, de 5 de Fevereiro de 2009, ora 
 recorrido, fundamentou o improvimento do recurso jurisdicional nas seguintes 
 considerações:
 
  
 
             “2.2. O recorrente interpôs, no TAC, recurso contencioso de anulação 
 do acto, de 18 de Junho de 2002, da Direcção da Caixa Geral de Aposentações, 
 pelo qual lhe foi reconhecido o direito à aposentação, imputando‑lhe, no 
 entanto, uma dívida de € 24 464,73, de contagem de tempo relativa ao período 
 compreendido entre 26 de Setembro de 1964 a 30 de Setembro de 1979.
 
             A sentença recorrida apreciou os vícios de violação de lei imputados 
 a esse acto (violação do princípio da igualdade e infracção dos artigos 34.º, 
 n.º 2, do Estatuto da Aposentação e 1.º e 6.º do Decreto‑Lei n.º 278/82, de 20 
 de Julho) e, considerando que eles não se verificavam, negou provimento ao 
 recurso contencioso.
 
             No presente recurso jurisdicional, o recorrente não contesta o 
 entendimento da sentença quanto à violação do artigo 34.º, n.º 2, do Estatuto 
 da Aposentação, mas continua a sustentar a alegada infracção do princípio da 
 igualdade e dos artigos 1.º e 6.º do Decreto‑Lei n.º 278/82.
 
             Vejamos se lhe assiste razão.
 
             O artigo 1.º do Decreto‑Lei n.º 278/82 estabelece o seguinte:
 
             «1 – O pessoal dos centros regionais de segurança social e do Centro 
 Nacional de Pensões oriundo das instituições de previdência de inscrição 
 obrigatória e suas federações e o pessoal da Comissão de Equipamentos Colectivos 
 da Segurança Social e da Federação das Caixas de Previdência e Abono de Família 
 fica abrangido pelo regime jurídico dos funcionários e agentes da Administração 
 Pública.
 
             2 – Exceptuam‑se do disposto no número anterior os agentes que 
 expressamente declarem que desejam manter o seu regime de trabalho.
 
             3 – (…)
 
             4 – Se à data da entrada em vigor algum agente se encontrar na 
 situação de licença sem vencimento ou de impedimento prolongado ou equiparado, 
 o prazo referido no número anterior conta‑se a partir do momento em que 
 reinicie funções.»
 
             Por sua vez, o artigo 6.º do mesmo diploma legal dispõe que:
 
             «1 – O pessoal sujeito, nos termos do presente diploma, ao regime 
 jurídico da função pública fica abrangido pelos Estatutos da Aposentação e da 
 Pensão de Sobrevivência.
 
             2 – O Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social assumirá a 
 responsabilidade pelo encargo com a parcela da aposentação e da pensão de 
 sobrevivência resultante da consideração do tempo de serviço prestado nas 
 instituições de previdência, bem como das diuturnidades que do mesmo resultem.
 
             3 – O regime decorrente do disposto no Decreto Regulamentar n.º 
 
 30/80, de 25 de Julho, à excepção do seu artigo 8.º, é aplicável às 
 aposentações e pensões de sobrevivência previstas neste artigo.»
 
             O recorrente, reconhecendo que apenas exerceu funções na ex‑Caixa 
 Nacional de Pensões num período – entre 26 de Setembro de 1964 e 30 de Setembro 
 de 1979 – em que as relações laborais eram regidas pelas disposições aplicáveis 
 ao sector privado, sustenta que o regime dos transcritos preceitos lhe deve ser 
 aplicável, por ter ingressado na função pública antes da sua entrada em vigor.
 
             Porém, o Decreto‑Lei n.º 278/82 não veio considerar como sendo 
 prestado na função pública todo o trabalho que antes da entrada em vigor desse 
 diploma tivesse sido prestado às instituições de previdência.
 
             Como nota o digno Magistrado do Ministério Público, esta tese, em 
 
 última análise, poderia levar à aplicação retroactiva da lei por forma a 
 abranger os próprios funcionários já aposentados, com consequências financeiras 
 que imporiam uma clara explicitação da lei quanto ao momento da sua eficácia, se 
 houvesse intenção do legislador em lhe atribuir efeitos retroactivos.
 
             Ora, se a lei nada estabelece quanto à sua aplicação no tempo, 
 vigora o princípio da não retroactividade (cf. artigo 12.º, n.º 1, do Código 
 Civil), devendo entender‑se que quando dispõe directamente sobre o conteúdo de 
 certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, abrange 
 as próprias relações já constituídas que subsistam à data da sua entrada em 
 vigor (cf. n.º 2 do referido artigo 12.º).
 
             Assim, atento ao disposto no citado artigo 12.º, ao facto de o 
 Decreto‑Lei n.º 278/82 não conter quaisquer disposições transitórias sobre a sua 
 aplicação no tempo, bem como ao teor dos n.ºs 1, 2 e 4 do transcrito artigo 1.º, 
 afigura‑se‑nos indubitável que aquele diploma não é aplicável a quem, como o 
 recorrente, já não faz parte do «pessoal» a que alude este preceito.
 
             Portanto, a sentença recorrida, ao julgar improcedente a violação 
 dos artigos 1.º e 6.º do Decreto‑Lei n.º 278/82, não merece a censura que lhe é 
 dirigida pelo recorrente.
 
             Quanto à inconstitucionalidade desta interpretação, o recorrente 
 invoca‑a com fundamento na violação do princípio da igualdade, por não existir 
 qualquer fundamento razoável para a desigualdade de tratamento entre a sua 
 situação e a dos restantes trabalhadores que só ingressaram na função pública 
 após a publicação do Decreto‑Lei n.º 278/82.
 
             Como se escreveu no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 39/88 (in 
 Boletim do Ministério da Justiça, n.º 374, págs. 114 e seguintes), «o princípio 
 da igualdade não proíbe, pois, que a lei estabeleça distinções. Proíbe, isso 
 sim, o arbítrio; ou seja, proíbe as diferenciações de tratamento sem fundamento 
 material bastante, que o mesmo é dizer sem qualquer justificação razoável, 
 segundo critérios de valor objectivo constitucionalmente relevantes».
 
             Porém, o Tribunal Constitucional também tem afirmado que só poderá 
 haver violação do princípio da igualdade quando da fixação do tempo de 
 aplicação de uma norma decorrerem tratamentos desiguais para situações iguais e 
 sincrónicas, ou seja, que o princípio da igualdade não opera diacronicamente 
 
 (cf. Acórdãos n.º 34/86, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 7.º, tomo 
 I, pág. 42, n.º 43/88, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 374, pág. 168, e 
 n.º 309/93, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 426, pág. 70).
 
             Assim, porque não se está perante situações sincrónicas, não pode a 
 situação referida pelo recorrente ser violadora do princípio da igualdade.
 
             Portanto, improcedem todas as conclusões da alegação do recorrente, 
 devendo, em consequência, julgar‑se improcedente o presente recurso 
 jurisdicional.
 
             3. Pelo exposto, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando 
 a sentença recorrida.”
 
  
 
                         O recorrente apresentou alegações neste Tribunal, 
 sintetizando a respectiva fundamentação nas seguintes conclusões:
 
  
 
 “1.ª – O regime do artigo 6.º do Decreto‑Lei n.º 278/82, de 20 de Julho, deve 
 também ser aplicado aos subscritores que, como o recorrente, tendo trabalhado 
 em instituições de previdência, ingressaram na função pública antes da entrada 
 em vigor daquele diploma;
 
 2.ª – O recorrente transitou de uma instituição de previdência para a função 
 pública sem que tenha ocorrido qualquer hiato entre essas duas situações 
 profissionais;
 
 3.ª – Tendo‑lhe sido contado todo o tempo de serviço prestado na CNP para o 
 efeito de concessão de diuturnidades;
 
 4.ª – A desaplicação da referida norma ao requerente acarreta a este prejuízos 
 relevantes, injustificáveis a todas as luzes;
 
 5.ª – O acórdão recorrido, ao perfilhar o entendimento de que o referido 
 normativo não é aplicável ao recorrente, faz do mesmo uma interpretação 
 meramente literal, ao total arrepio do estatuído n.º 1 do artigo 9.º do Código 
 Civil;
 
 6.ª – Tal interpretação jurídica restringe‑se a um conceptualismo formalista, 
 desprezando as consequências práticas que dele advêm e desinserindo a norma do 
 contexto;
 
 7.ª – A interpretação de que o regime do referido artigo 6.º do Decreto‑Lei n.º 
 
 278/82 não é aplicável ao recorrente viola o princípio da igualdade consagrado 
 na Constituição;
 
 8.ª – O princípio da igualdade acolhido no artigo 13.º, n.º 1, da Lei 
 Fundamental impõe que se trate como igual o que for essencialmente igual;
 
 9.ª – Nenhuma diferença relevante existe entre a situação do recorrente e a dos 
 restantes trabalhadores da previdência que só transitaram para a função pública 
 após a publicação do Decreto‑Lei n.º 278/82, sendo o único elemento distintivo a 
 simples fronteira no tempo, aleatoriamente traçada;
 
 10.ª – A interpretação contida no acórdão recorrido perfila‑se como 
 injustificadamente discriminatória, não lhe assistindo fundamento material 
 bastante.
 
             Deve, assim, julgar‑se materialmente inconstitucional a norma 
 constante do artigo 6.º do Decreto‑Lei n.º 278/82, de 20 de Julho, quando 
 interpretada e aplicada nos termos constantes do acórdão recorrido, fazendo‑se 
 assim Justiça!”
 
  
 
                         A recorrida Caixa Geral de Aposentações apresentou 
 contra‑alegações, formulando a final as seguintes conclusões:
 
  
 
             “1.ª – O Decreto‑Lei n.º 278/82 não veio considerar como serviço 
 prestado na função pública todo o trabalho que antes da entrada em vigor desse 
 diploma tivesse sido prestado a instituições de previdência. Aliás, tal tese 
 levaria, em última análise, à aplicação retroactiva da lei por forma a abranger 
 os próprios funcionários já aposentados, com consequências financeiras que 
 imporiam uma clara explicitação da lei quanto ao momento da sua eficácia, se 
 houvesse intenção do legislador em lhe atribuir efeitos retroactivos.
 
             2.ª – A interpretação do Decreto‑Lei n.º 278/82, no sentido de que o 
 estabelecido nos seus artigos 4.º, n.º 1, e 6.º, n.ºs 1 e 2, não é aplicável ao 
 recorrente, não consubstancia qualquer violação do princípio da igualdade, na 
 medida em que a desigualdade resultante da sua aplicação ao pessoal que se 
 encontrava em exercício de funções nas instituições de previdência na altura em 
 que o tal diploma entrou em vigor e a sua não aplicação ao pessoal que tinha 
 exercido funções nessas instituições, mas que, na data de entrada em vigor desse 
 diploma, já aí não exercia funções e que, entretanto, foi admitido na função 
 pública, assenta em diferentes situações de facto.
 
             3.ª – Os artigos 4.º, n.º 1, e 6.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto‑Lei n.º 
 
 278/82 não se aplicam à generalidade dos trabalhadores que tinham exercido 
 funções nas instituições de previdência, mas que, na data de entrada em vigor 
 desse diploma legal, já aí não exerciam funções, pelo que, igualmente por esse 
 motivo, tal interpretação não pode ser considerada como violadora do princípio 
 da igualdade.
 
             4.ª – O período em causa apenas podia ser considerado para o regime 
 da CGA nos termos em que o foi, ou seja, por acréscimo ao tempo de subscritor, 
 nos termos do artigo 25.º do Estatuto da Aposentação, o que implicou o 
 apuramento da consequente dívida de quotas.
 
             5.ª – Como se escreveu no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 
 
 39/88 (in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 374, págs. 114 e seguintes), «o 
 princípio da igualdade não proíbe, pois, que a lei estabeleça distinções. 
 Proíbe, isso sim, o arbítrio, ou seja, proíbe as diferenciações de tratamento 
 sem fundamento material bastante, que o mesmo é dizer sem justificação razoável, 
 segundo critérios de valor objectivo constitucionalmente relevantes». Porém, a 
 jurisprudência do TC tem decidido que só pode haver violação do princípio da 
 igualdade quando da fixação do tempo de aplicação de uma norma decorrerem 
 tratamentos desiguais para situações iguais e sincrónicas, ou seja que o 
 princípio da igualdade não opera diacronicamente (cf. Acórdãos n.º 34/86, in 
 Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 7.º, tomo I, pág. 42, n.º 43/88, in 
 Boletim do Ministério da Justiça, n.º 374, pág. 168, e n.º 309/93, in Boletim do 
 Ministério da Justiça, n.º 426, pág. 70).
 
             6.ª – O que não é o caso, uma vez que não se está perante situações 
 sincrónicas, não pode a situação referida pelo recorrente ser violadora do 
 princípio da igualdade.”
 
              
 
                         Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
                         2. Fundamentação
 
                         Apesar de o recorrente dedicar parte substancial das 
 suas alegações à tentativa de demonstração de que a interpretação mais correcta 
 do direito ordinário em causa seria a que considerasse o regime do artigo 6.º do 
 Decreto‑Lei n.º 278/82 também aplicável aos subscritores que, como ele, tendo 
 trabalhado em instituições de previdência, ingressaram na função pública antes 
 da entrada em vigor desse diploma, cumpre registar que não compete ao Tribunal 
 Constitucional pronunciar‑se sobre a correcção da interpretação e aplicação do 
 direito ordinário efectuado pelas instâncias, mas tão‑só, tomando o critério 
 normativo efectivamente aplicado como um dado da questão de 
 constitucionalidade, apreciar se tal critério viola, ou não, as normas ou 
 princípios constitucionais invocados (no caso, se viola o princípio da 
 igualdade). Esse critério normativo foi o de que o regime do artigo 6.º, n.ºs 1 
 e 2, do Decreto‑Lei n.º 278/82 só se aplica ao pessoal que se encontrava em 
 exercício de funções nas instituições de previdência à data em que esse diploma 
 entrou em vigor, e já não ao pessoal que cessara o exercício de funções nessas 
 instituições antes de tal data, designadamente por ter ingressado na função 
 pública (como ocorrera com o recorrente); quanto a este último universo de 
 pessoal o tempo de serviço prestado nas instituições de previdência apenas podia 
 relevar para a aposentação, nos termos do artigo 25.º do respectivo Estatuto, 
 como “acréscimo ao tempo de subscritor”, o que implicava o apuramento da 
 correspondente dívida de quotas. É este critério normativo que vem acusado de 
 violador do princípio da igualdade.
 
                         Ora, a respeito de pretensas violações do princípio da 
 igualdade derivadas da sucessão de regimes legais, o Tribunal Constitucional tem 
 sistematicamente sustentado que “a sucessão de leis no tempo, e concretamente a 
 existência passada ou futura de regimes mais favoráveis, não acarretavam ofensa 
 do princípio da igualdade, pela circunstância de originarem regimes diversos, 
 decorrentes dessa sucessão temporal de leis” (Acórdão n.º 99/2004).
 
                         Como já se afirmara no Acórdão n.º 580/99:
 
  
 
             “(...) o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da 
 Constituição, impede que uma dada solução normativa confira tratamento 
 substancialmente diferente a situações no essencial semelhantes. No plano 
 formal, a igualdade impõe um princípio de acção segundo o qual as situações 
 pertencentes à mesma categoria essencial devem ser tratadas da mesma maneira. 
 No plano substancial, a igualdade traduz‑se na especificação dos elementos 
 constitutivos de cada categoria essencial. A igualdade só proíbe, pois, 
 diferenciações destituídas de fundamentação racional, à luz dos próprios 
 critérios axiológicos constitucionais (…).
 
             (…) importa ter presente que o legislador tem uma ampla liberdade no 
 que respeita à alteração do quadro normativo vigente num dado momento 
 histórico. Na verdade, o legislador, de acordo com opções de política 
 legislativa tomadas dentro de uma ampla zona de autonomia, pode proceder às 
 alterações da lei que se lhe afigurarem mais adequadas e razoáveis, tendo 
 presente, naturalmente, os interesses em causa e os valores ínsitos na ordem 
 jurídica.
 
             Uma alteração legislativa pode operar, consequentemente, uma 
 modificação do tratamento normativo conferido a uma dada categoria de 
 situações. Com efeito, as situações abrangidas pelo regime revogado são objecto 
 de uma valoração diferente daquela que incidirá sobre as situações às quais se 
 aplica a lei nova. Nesse sentido, haverá situações substancialmente iguais que 
 terão soluções diferentes.
 
             Contudo, não se pode falar neste tipo de casos de uma diferenciação 
 verdadeiramente incompatível com a Constituição. A diferença de tratamento, 
 decorre, como resulta do que se disse, da possibilidade que o legislador tem de 
 modificar (revogar) um quadro legal vigente num determinado período. A intenção 
 de conferir um diferente tratamento legal à categoria de situações em causa é 
 afinal a razão de ser da própria alteração legislativa.
 
             O entendimento propugnado pela recorrente levaria à imutabilidade 
 dos regimes legais, pois qualquer alteração geraria sempre uma desigualdade. 
 Ora, tal posição não é reclamável pelo princípio da igualdade no quadro 
 constitucional vigente.”
 
  
 
                         Na verdade, como se sublinhou no citado Acórdão n.º 
 
 99/2004, quando estão em causa as diferenças de regime decorrentes da normal 
 sucessão de leis, há que reconhecer ao legislador uma apreciável margem de 
 liberdade no estabelecimento do marco temporal relevante para aplicação do novo 
 e do velho regime. Aliás, numa outra decisão (Acórdão n.º 467/2003), este 
 Tribunal, referindo‑se igualmente a uma situação de comparação de regimes de 
 aposentação de um ponto de vista dinâmico da sucessão no tempo, vistos – tal 
 como aqui sucede – na perspectiva do princípio da igualdade, considerou não 
 funcionar este princípio, enquanto exigência do texto constitucional, “em termos 
 diacrónicos”.
 
                         Retomando o discurso do Acórdão n.º 99/2004, há que 
 reconhecer que, também no caso ora em análise, “a determinação da fronteira 
 entre os dois regimes ocorreu, na interpretação da decisão recorrida, por 
 referência a um critério geral, previamente definido no artigo 12.º, n.º 1, do 
 Código Civil (e como tal perfeitamente previsível), segundo o qual a lei só 
 dispõe para o futuro, quando lhe não seja atribuída eficácia retroactiva pelo 
 legislador”, prosseguindo:
 
  
 
             “Não se verificando neste domínio normativo qualquer exigência 
 constitucional de retroactividade da lei nova, a opção pela disposição só para 
 o futuro – que confirma o entendimento intuitivo de «que em todo o preceito 
 jurídico está implícito um ‘de ora avante’, um ‘daqui para o futuro’» (J. 
 Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Coimbra, 
 
 1983, pág. 225) – apresenta‑se como uma solução racional e, de qualquer forma, 
 situada dentro da margem de liberdade concedida ao legislador.”
 
  
 
                         Conclui‑se, assim, que não viola o princípio da 
 igualdade, antes se insere na liberdade de conformação do legislador, a opção 
 deste de passar a ficar abrangido pelo regime jurídico da função pública apenas 
 o pessoal que, sendo oriundo das instituições de previdência de inscrição 
 obrigatória, estivesse a exercer funções em centros regionais de segurança 
 social ou no Centro Nacional de Pensões à data da publicação do Decreto‑Lei n.º 
 
 278/82, não contemplando idêntica solução para aqueles que, em data anterior, 
 houvessem cessado o exercício dessas específicas funções. Quanto a estes, mesmo 
 que, como o ora recorrente, houvessem passado a integrar a função pública, o 
 período em que exerceram funções nas instituições de previdência, só poderia 
 relevar para efeitos de aposentação, por acréscimo ao tempo de subscritor, nos 
 termos do artigo 25.º do Estatuto da Aposentação, o que implicou o apuramento da 
 consequente dívida de quotas – como o entendeu a Administração e as instâncias o 
 confirmaram. A natureza mais desfavorável deste regime não determina 
 necessariamente que se dê por verificada a violação do princípio da igualdade. A 
 sucessão de regimes legais determina, em regra, variações no carácter mais ou 
 menos favorável dos mesmos na perspectiva dos interessados, mas a não 
 desconformidade constitucional desse resultado deriva, desde logo, da 
 diversidade das situações de facto contempladas, e, depois, da inexigibilidade 
 de atribuição de eficácia retroactiva a todas as alterações que o legislador 
 decida empreender. Repete‑se: o princípio da igualdade não opera 
 diacronicamente.
 
                         Não colhendo a argumentação do recorrente, resta 
 confirmar a decisão impugnada.
 
  
 
                         3. Decisão
 
                         Em face do exposto, acordam em:
 
                         a) Não julgar inconstitucionais as normas dos artigos 
 
 1.º e 6.º do Decreto‑Lei n.º 278/82, de 20 de Julho, interpretados no sentido de 
 que o estabelecido no artigo 6.º, n.ºs 1 e 2, apenas abrange o pessoal que se 
 encontrava em exercício de funções nas instituições de previdência à data em que 
 esse diploma entrou em vigor; e, consequentemente,
 
                         b) Negar provimento ao recurso, confirmando o acórdão 
 recorrido, na parte impugnada.
 
                         Custas pelo recorrente, fixando‑se a taxa de justiça em 
 
 25 (vinte e cinco) unidades de conta).
 Lisboa, 22 de Junho de 2009.
 Mário José de Araújo Torres
 Joaquim de Sousa Ribeiro
 João Cura Mariano
 Benjamim Silva Rodrigues
 Rui Manuel Moura Ramos