 Imprimir acórdão
 Imprimir acórdão   
			
Processo n.º 1142/07 
 
 1ª Secção
 Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira
 
 
 ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 1ª SECÇÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
 
 
 
  I.Relatório
 
  
 
 1. A. veio reclamar (fls. 682 e ss.), ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 
 
 78.º-A da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal 
 Constitucional – Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, alterada pela Lei n.º 
 
 13-A/98, de 26 de Fevereiro – da decisão sumária proferida nos autos a fls. 662 
 e ss., nos seguintes termos e fundamentos:
 
             
 
 1. O despacho de que ora se reclama entendeu, «ao abrigo do disposto no n.º 1 do 
 artigo 78-A LTC [...] não tomar conhecimento do objecto do presente recurso», 
 tendo invocado para o efeito o facto de a decisão recorrida não ter aplicado, 
 
 «enquanto sua ratio decidendi, as normas insertas nos artigos 61.º, n.º 1 alínea 
 b) e 495º, n.º 2, do Código de Processo Penal», tendo, alegadamente, resolvido 
 
 «a questão da nulidade arguida pelo recorrente, referente à sustentada violação 
 do seu direito de audição, apenas por aplicação das normas contidas no artigo 
 
 119.º alínea c), do Código Processo Penal e nos artigos 55.º e 56.º do Código 
 Penal. Foram estas normas que constituíram o fundamento normativo da decisão 
 proferida», 
 
 2. Concluindo com a afirmação de que o reclamante pretende, desta forma, 
 
 «sindicar o processo decisório do Tribunal», sendo «que o contencioso 
 constitucional não permite recorrer das decisões em si mesmas consideradas». 
 
 3. Ora, apesar do devido e merecido respeito que qualquer despacho proferido 
 pelo (...) Relator (...) nos mereça, não podemos senão manifestar uma profunda e 
 veemente discordância com o despacho de que ora se reclama, conforme 
 explanaremos de seguida. 
 
 4. Foi entendimento vertido no despacho recorrido aquele segundo o qual «a 
 decisão recorrida resolveu a questão da nulidade arguida pelo recorrente, 
 referente à sustentada violação do seu direito de audição, apenas por aplicação 
 das normas contidas no artigo 119.º alínea c), do Código Processo Penal e nos 
 artigos 55.º e 56.º do Código Penal». 
 
 5. Discordamos de tal entendimento. 
 
 6. O reclamante, aquando da interposição de recurso para o Tribunal da Relação 
 de Lisboa, enunciou determinadas questões que, no seu entender, deveriam ser 
 objecto de reapreciação, assacando-lhe diversos vícios que entendia e entende se 
 verificarem. 
 
 7. De entre as ilegalidades verificadas e invocadas, poder-se-á ler, nas 
 conclusões do recurso interposto, o que infra se transcreverá: 
 
  
 
 «14.º Ainda que V. Exas. assim não entendam, sem, de forma alguma, conceder, 
 sempre se diria que o despacho recorrido deverá ser declarado nulo, nos termos 
 do disposto nos arts. 119.º, al. c) e 120º., n.º 2, al. d), ambos do CPP, por 
 violação do estatuído nos arts. 495.º, n.º 2 e 61.º, n.º 1, al. b), todos do 
 CPP. 
 Porquanto, 
 
 15.2 Apesar do aí estatuído, o despacho recorrido, em violação do citado 
 preceito, entendeu inútil a audição do arguido, bastando-se com o equacionar de 
 um mero requerimento onde este expôs os motivos do seu incumprimento e requereu 
 a sua audição, bem como a inquirição de testemunhas como meio de prova do por si 
 alegado, 16.º Interpretando o dever de audição como uma prorrogativa de 
 verificação dependente do critério do julgador. 
 Ora, 
 
 17.º Tal interpretação, não só consubstancia violação expressa dos citados 
 preceitos, como contraria jurisprudência, senão unânime, pelo menos maioritária. 
 
 
 Porquanto, 
 
 18. Só “depois de recolhida a prova” e após “audição do condenado” (art. 495.º, 
 n.º 2 do CPP) é possível averiguar se tal incumprimento é ou não culposo, bem 
 como se a falta de observância desses mesmos deveres é ou não grosseira. 
 
 19.º Sendo, consequentemente, ilegítimos os juízos de valor e ilações retirados 
 da falta de cumprimento pelo arguido das obrigações impostas, sem o mesmo ter 
 sido ouvido e sem se ter procedido à inquirição das testemunhas por si 
 indicadas. 
 
 20.º Ainda que assim não fosse, tal dever de audição resulta do disposto no art. 
 
 61.º, n.º 1, al. b) do CPP, nos termos do qual constitui direito do arguido “ser 
 ouvido pelo tribunal ou pelo juiz de instrução sempre que eles devam tomar 
 qualquer decisão que pessoalmente o afecte”.
 Sendo que, 
 
 21.º“A decisão de revogar a suspensão da execução da pena é uma decisão que, 
 obviamente, o afecta” (cfr. Ac. TRL de 21-12-2004, proc. 6919/2004-5, in 
 
 (www.dgsi.pt). Pelo que, 
 
 22.º Padece o despacho recorrido de nulidade insanável, nos termos do art. 
 
 119.º, al. c) do CPP, por violação dos já citados preceitos e determina a 
 invalidade dos actos subsequentes, nos termos do art. 122.º, n.º 1 do CPP. 
 
 23.º Sendo que sempre constituiria nulidade “dependente de arguição (...) a 
 insuficiência do inquérito ou da instrução e a omissão posterior de diligências 
 que pudessem reputar essenciais para a descoberta da verdade” (nosso 
 sublinhado), nos termos do art. 120.º, n.º 2, al. d) do C.P.P.. 
 
 24.º Sendo, indubitavelmente, fulcral para a descoberta da verdade, não só a 
 audição do arguido, como a inquirição das testemunhas por este indicadas, as 
 quais têm conhecimento directo sobre os factos invocados no requerimento 
 apresentado. Ora, 
 
 25.º Os preceitos violados e supra citados constituem garantias de defesa do 
 arguido, constitucionalmente consagrado, constituindo a sua preterição violação 
 expressa do estatuído no art. 32., nºs 1 e 7 da C.R.P.» 
 
  
 
 8. Perante a fundamentação apresentada, o Tribunal da Relação de Lisboa, no 
 acórdão que proferiu, delimitou, e bem, as questões que cumpria apreciar, entre 
 elas, o facto de «o despacho recorrido [não se ter pronunciado] sobre todas as 
 questões suscitadas, ter sido proferido sem o arguido ser ouvido e sem a 
 inquirição das testemunhas indicadas [...]ocorreu ainda e por força disso ofensa 
 do art. 32. CRP» (nosso sublinhado). 
 
 9. Assim, delimitado o objecto do recurso, o Tribunal da Relação de Lisboa, nos 
 seus pontos 8, 9 e 10, analisou a invocada «omissão de audição do arguido», 
 concluindo não se verificar «a pretendida nulidade», considerando que «o facto 
 de o arguido não ter sido ouvido de viva voz ou de não se haverem inquirido as 
 testemunhas por ele indicadas não contraria tal conclusão», 
 
 10. Entendendo não violado o disposto nas citadas e invocadas disposições legais 
 
 (arts. 61.º, n.º 1, al. b) e 495.º, n.º 2, ambos do C.P.P.), na interpretação 
 que das mesmas faz, e, por esse motivo, inexistir a nulidade pretendida e 
 qualquer desrespeito por normas constitucionais, designadamente pelo art. 32.º 
 da C.R.P. 
 
 11. Ora, perante os fundamentos invocados e a resposta que aos mesmos o Tribunal 
 Recorrido lhes dirigiu, não se compreende como pode o Tribunal Constitucional 
 entender que as referidas disposições legais não foram aplicadas, quando as 
 mesmas, mesmo quando não expressas, estão subjacentes ao entendimento vertido na 
 decisão recorrida, ou seja, a ausência de qualquer nulidade [art. 119.º c) do 
 C.P.P.] por violação do estatuído nos artigos 495.º, n.º 2 e 61.º, n.º 1, al. 
 a), todos do C.P.P. 
 
 12. Aliás, quando o Mmo. Juiz Conselheiro Relator refere que o Tribunal 
 Recorrido, relativamente ao dever de audição, apenas aplicou as normas vertidas 
 no art. 119.º, al. c) do C.P.P. e nos arts. 55.º e 56.º do C.P., não teve em 
 conta o que subjaz à arguida nulidade, a violação do citados preceitos, 
 
 13. A qual terá, necessariamente, sido analisada, por não ser possível aferir da 
 prática de qualquer nulidade sem analisar o acto que pretensa ou invocadamente a 
 provocou. 
 
 14. Mais, tendo a decisão recorrida entendido não se verificar a pretendida 
 nulidade, por entender que o dever de audição do arguido previsto no n.º 2 do 
 art. 495.º do C.P.P. se bastaria com um requerimento escrito no qual o arguido 
 expunha os motivos do seu incumprimento e requeria que a audição de testemunhas 
 que havia indicado como meio de prova do aí alegado, natural e espectável seria 
 que procedesse à aplicação dos artigos 119.º, al. c) do C.P.P. e 55.º e 56.º do 
 C.P., os quais constituem, apenas e tão só, a consequência da analisada omissão 
 do dever de audição. 
 
 15. Assim, a ratio decidendi vertida no acórdão proferido pelo Tribunal de 
 Relação de Lisboa funda-se na inexistência da pretendida nulidade, por se terem 
 pretensamente cumprido todas as exigências legais relativas à prévia audição do 
 arguido antes de decidir pela revogação da suspensão da execução da pena a que o 
 mesmo foi condenado, ou seja, pela não violação dos supra citados preceitos 
 legais, os quais foram, indubitavelmente, aplicados e constituíram a essência da 
 decisão recorrida. 
 
 16. Nem outra coisa seria possível quando a fundamentação do recurso apresentado 
 para o Tribunal da Relação de Lisboa apenas em tais preceitos se funda, no que à 
 invocada omissão do dever de audição diz respeito. 
 
 17. Não exige a lei, nem se pode admitir que se imponha o dever de transcrição 
 expressa de todas disposições legais cuja estatuição o tribunal recorrido 
 entenda cumprida, para efeitos de não verificação da nulidade pretendida, quando 
 na fundamentação do recurso e na decisão proferida resulta clara e inequívoca a 
 apreciação do preenchimento do estatuído nas referidas disposições legais, o que 
 este Tribunal não pode ignorar e que uma leitura atenta do referido acórdão não 
 permite descurar. 
 
 18. Mais, nem se compreende como poderia o Tribunal recorrido analisar o 
 comprimento ou não do dever de audição do arguido aquando da revogação da 
 suspensão de execução de uma pena, sem que as citadas disposições legais fossem 
 tidas em conta ou analisadas, pois é nelas que se encontra previsto tal direito. 
 
 
 
 19. Sendo que, quando o Tribunal Recorrido analisou a questão da audição do 
 arguido, apenas e tão só a tais disposições, oportunamente invocadas e aqui 
 apreciadas, se poderia estar a referir, até porque, no que a esta matéria tange, 
 não foi invocada outra nulidade senão esta, a inobservância do dever de audição 
 nas mesmas previsto. 
 
 20. Assim sendo, e porque a decisão recorrida, ao resolver a questão da nulidade 
 arguida pelo recorrente, referente à sustentada violação do seu direito de 
 audição, não se limitou, nem se poderia ter limitado, a aplicar as normas 
 contidas no artigo 119.º, al. c) do C.P.P. e nos artigos 55º e 56.º do C.P., as 
 quais constituem a consequência jurídica do julgado cumprimento do dever de 
 audição do recorrente, não poderia o Mmo. Juiz Conselheiro Relator fundar a não 
 apreciação do presente recurso no facto de o Tribunal recorrido não ter, na 
 fundamentação jurídica da sua decisão, expressamente referido o n.º 2 do art. 
 
 495.º, quando o entendimento aí explanado constitui clara e inequivocamente a 
 analise do referido preceito legal, embora sem expressa menção ao mesmo, quando 
 a questão de determinar se o mesmo foi, ou não, cumprido, está convenientemente 
 delimitada no objecto do recurso e quando os preceitos legais em que o despacho 
 reclamado diz que se funda o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação mais não 
 são do que as conclusões do entendimento do Tribunal da Relação, nos termos do 
 qual a imposição de audição aí prevista foi cumprida, nos termos já supra 
 explanados. 
 
 21. Sendo certo que, através da análise contextualizada e articulada da 
 motivação e das conclusões do recurso interposto para o Tribunal da Relação de 
 Lisboa, constata-se, portanto, que a decisão do Tribunal Constitucional, ora 
 reclamada, não ponderou correctamente o sentido e alcance do recurso interposto, 
 a qual deverá ser alterada de forma a tomar-se conhecimento do objecto do 
 recurso, atendendo-se, deste modo, à legítima pretensão do reclamante. 
 
 22. E não se olvide aqui que a questão é mais que importante é mesmo essencial 
 para a correcta resolução de uma questão de constitucionalidade, não porque o 
 que está (e também está) em causa é a justiça (ou a injustiça) da decisão, mas 
 porque a decisão só foi tomada com base num entendimento normativo violador da 
 Lei Fundamental e numa interpretação jurisprudencial desconforme com a 
 Constituição da República Portuguesa, entendimento que não pode ser aceite e 
 interpretação que não pode ser sufragada por este Tribunal Constitucional. 
 
  
 
  
 
             2. 
 
 2.1.
 
 É este o teor da decisão sumária ora reclamada:
 
  
 
  
 Recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa A. da decisão de fls. 488 e ss. a 
 qual revogou a suspensão da pena de prisão que lhe foi imposta.
 Concluiu do seguinte modo as suas alegações de recurso:
 
  
 
 “1.ª Os deveres impostos como condição de suspensão de execução da pena “não 
 podem em caso algum representar para o condenado obrigações cujo cumprimento não 
 seja razoavelmente de lhe exigir”, nos termos do art. 51º, n.º 2 do CP, o qual 
 foi violado pela decisão recorrida; 
 Daí que, 
 
 2.ª Estes deveres possam “ser modificados até ao termo do período de suspensão 
 sempre que ocorrerem circunstâncias relevantes supervenientes’: em conformidade 
 com o disposto no art. 51.º, n.º 3 do mesmo Diploma, o qual foi também violado 
 pela decisão recorrida. 
 Razão pela qual, 
 
 3.ª o incumprimento dos deveres impostos como condição de suspensão da execução 
 da pena deva ser culposo para que se possa concluir pela eventual revogação da 
 mesma, 
 
 4.ª Sob pena de tal revogação consubstanciar uma evidente situação de “prisão 
 por dívidas” implicitamente proibida no art. 27.º da C.R.P., o qual foi ignorado 
 pela decisão recorrida 
 
 5.ª Ora, in casu, o arguido, ora recorrente, aquando da prolação da sentença que 
 decretou a suspensão da execução da pena, encontrava-se finalmente a trabalhar, 
 o que tomava exequíveis as condições impostas para a suspensão da execução da 
 mesma. 
 No entanto, 
 
 6.ª Desde finais de 2002 a Janeiro de 2005 o arguido esteve desempregado, 
 situação que certamente não desejava, e que em muito dificultou a subsistência 
 económica do seu agregado familiar, encontrando-se, dessa forma, impossibilitado 
 de proceder ao pagamento das prestações mensais a que estava obrigado, 
 Ora, 
 
 7.ª Resulta inequívoco que este incumprimento não foi culposo, em virtude de a 
 isso ter sido impelido por todo um circunstancialismo involuntário, que resultou 
 na sua situação de desemprego. 
 
 8.ª Pelo que, ao invés de revogada a suspensão da execução da pena, deveria ter 
 sido proferido despacho modificando as obrigações impostas. 
 No entanto, 
 
 9.ª O despacho recorrido, além de não o fazer, também não se pronunciou sobre a 
 requerida alteração dos deveres impostos, nomeadamente da possibilidade de a 
 esposa do arguido renunciar ao direito à herança da ofendida, entretanto 
 falecida, como forma de compensação integral pela dívida, meio de pagamento 
 aliás expressamente previsto e aceite pelo credor. 
 
 10.ª Possibilidade esta que já havia sido invocada pelo arguido e que foi 
 expressamente consignada suma escritura pública de confissão de divida, 
 celebrada entre o recorrente a sua esposa, herdeira da ofendida, e a própria 
 ofendida, nos termos da qual os primeiros se confessaram devedores, reconhecendo 
 a dívida, e onde consta que “se vier a morte da segunda outorgante antes do 
 pagamento total da dívida e respectivos juros de mora” a quota-parte da herança 
 que coubesse à esposa do arguido responderia pela mesma. 
 Apesar disso, 
 
 11.ª Ainda que inexistisse tal confissão de dívida e a previsão desta 
 possibilidade de compensação, sempre esta decorreria da natureza de última ratio 
 da revogação da suspensão da execução da pena. 
 No entanto, 
 
 12.ª E mesmo após esta possibilidade de modificação das obrigações impostas ter 
 sido, por diversas vezes, equacionada e invocada pelo recorrente, nomeadamente 
 no despacho recorrido, nunca o tribunal sobre ela se pronunciou. 
 
 13.ª Devendo o despacho recorrido ser substituído por outro que se pronuncie 
 dobre todas as questões suscitadas. 
 No entanto, 
 
 14.ª Ainda que V. Exas assim não entendam, sem, de forma alguma, conceder, 
 sempre se diria que o despacho recorrido deverá ser declarado nulo, nos termos 
 do disposto nos arts. 119.º, al. c) e 120.º, n.º 2, al . d), ambos do CPP, por 
 violação do estatuído nos arts. 495.º, n.º 2 e 61º, n.º 1, al b), todos do CPP.
 Porquanto, 
 
 15.ª Nos termos do art. 495.º, n.º 2 CPP, verificando-se “incumprimento das 
 condições de suspensão” o “tribunal decide por despacho, depois de recolhida a 
 prova e antecedendo parecer do Ministério Público e audição do condenado “. 
 No entanto, 
 
 16.ª Apesar do aí estatuído, o despacho recorrido, em violação do citado 
 preceito, entendeu inútil a audição do arguido, bastando-se com o equacionar de 
 um mero requerimento onde este expôs os motivos do seu incumprimento e requereu 
 a sua audição, bem como requereu a inquirição de testemunhas como meio de prova 
 do por si alegado, 
 
 16.º Interpretando o dever de audição como uma prerrogativa de verificação 
 dependente do critério do julgador. 
 Ora, 
 
 17 Tal interpretação, não só consubstancia violação expressa dos citados 
 preceitos, como contraria jurisprudência, senão unânime, pelo menos maioritária. 
 
 
 Porquanto, 
 
 18.º Só “depois de recolhida a prova” e após “audição do condenado” (art. 495.º 
 n.º 2 do CPP), é possível averiguar se tal incumprimento é ou não culposo, bem 
 como se a falta de observância desses mesmos deveres é ou não grosseira. 
 
 19.º Sendo, consequentemente, ilegítimos os juízos de valor e ilações retirados 
 da falta de cumprimento pelo arguido das obrigações impostas, sem o mesmo ter 
 ser ouvido e sem se ter procedido à inquirição das testemunhas por si indicadas. 
 
 
 
 20.º Ainda que assim não fosse, tal dever de audição resultaria do disposto no 
 art. 61.º, n.º 1, al. b) do CPP, nos termos do qual constitui direito do arguido 
 
 “ser ouvido pelo tribunal ou pelo juiz de instrução sempre que eles devam tomar 
 qualquer decisão que pessoalmente o afecte”
 Sendo que, 
 
 21.º “A decisão de revogar a suspensão da execução da pena é uma decisão que, 
 obviamente, o afecta” (cfr. Ac. TRL de 21-12-2004, proc. 6919/2004-5, in 
 
 www.dgsi.pt). 
 Pelo que, 
 
 22.º Padece o despacho recorrido de nulidade insanável, nos termos do art. 
 
 119.º, al. c) do CPP., por violação dos já citados preceitos e determina a 
 invalidade dos actos subsequentes, nos termos do art. 122º, n.º 1 do CPP. 
 
 23.º Sendo que sempre constituiria nulidade “dependente de arguição (...) a 
 insuficiência do inquérito ou da instrução e a omissão posterior de diligências 
 que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade “(nosso 
 sublinhado), nos termos do art. 120.º, n.º 2, al. d) do CPP, 
 
 24.º Sendo, indubitavelmente, fulcral para a descoberta da verdade, não só a 
 audição do arguido, como a inquirição das testemunhas por este indicadas, as 
 quais têm conhecimento directo sobre os factos invocados no requerimento 
 apresentado. 
 Ora, 
 
 25.º Os preceitos violados e supra citados constituem garantias de defesa do 
 arguido, constitucionalmente consagrado, constituindo a sua preterição violação 
 expressa do estatuído no art. 32.º, n.º 1 e 7 da C.R.P. (…)”.
 
  
 
 1.2.
 A Relação de Lisboa (fls. 585 e ss), por Acórdão de 20 de Junho de 2007, negou 
 provimento ao recurso, tendo fundamentado a decisão nos seguintes termos:
 
  
 
 “ (…)
 As questões a resolver no recurso consistem em saber se: 
 a) o despacho recorrido, não se pronunciou sobre todas as questões suscitadas 
 
 (“...a requerida alteração dos deveres impostos, nomeadamente da possibilidade 
 de a esposa do arguido renunciar ao direito à herança da ofendida”), foi 
 proferido sem o arguido ser ouvido e sem inquirição das testemunhas indicadas, 
 pelo que sofrerá da nulidade insanável do artº 119º- c) do CPP? 
 b) ocorreu ainda e por força disso, ofensa ao art. 32.º da CRP? 
 c) o despacho recorrido deveria ter optado, nos termos do art. 51.º, n.º 2 do 
 CP, pela modificação dos deveres impostos como condição de suspensão de execução 
 da pena? 
 
 6. O despacho recorrido (em transcrição do que interessa): 
 
  “Por acórdão proferido em 5 de Maio de 2000 foi A. condenado pela prática de um 
 crime de abuso de confiança previsto e punível pelo artigo 300.º 1 e 2, a) do 
 Código Penal na pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de prisão. 
 Esta pena foi suspensa na sua execução pelo período de 4 (quatro) anos sob 
 condição do arguido proceder ao pagamento à assistente Albertina Rodrigues do Ó 
 Silva de Medeiros do montante de 500.000$00 (quinhentos mil escudos) de três em 
 três meses, sendo que o valor do dano produzido foi de 22.080.516$00, em 1994 e 
 
 1995, 
 Quando foi proferido o acórdão condenatório o arguido havia devolvido à 
 assistente lesada a quantia de 500.000$00. 
 De acordo com a informação constante de fls. 316, em 2000, o arguido tinha 
 emprego permanente na firma “OPB, Lda.” com sede na Rua Cândido dos Reis, nº 6 
 em Odivelas, com viatura distribuída pela entidade patronal e auferia um 
 vencimento de montante variável composto por comissões. 
 Em 25 de Janeiro de 2001 o arguido foi notificado para fazer prova do pagamento 
 da 1.ª prestação (fls. 319), tendo comprovado o pagamento de 500.000$00 por 
 depósito em conta bancária da assistente lesada feito em 15 de Fevereiro de 2001 
 
 (fls. 322). 
 Em 9 de Abril de 2001 o arguido foi novamente notificado para fazer prova de 
 haver procedido ao pagamento das prestações devidas à assistente lesada, nada 
 tendo feito ou dito. 
 Note-se que em 22 de Julho de 2002, o arguido mantinha a situação laboral atrás 
 referida (fls. 342). 
 Durante o período de suspensão da pena A. foi condenado pela prática dum crime 
 de condução de veículo em estado de embriaguez na pena de 90 dias de multa e 
 pela prática de um crime de desobediência na pena de 60 dias de multa, crimes 
 que foram praticados em 29 de Maio de 2002, penas extintas pelo pagamento. 
 O assistente em 29 de Outubro de 2004 informou que o arguido apenas tinha 
 procedido ao pagamento duma prestação de 500.000$00. 
 Em 5 de Novembro de 2004, o arguido foi notificado por via postal com prova de 
 recepção do teor daquela informação e ainda para, no prazo de dez dias, 
 esclarecer porque razão não procedeu ao pagamento à assistente dos montantes 
 fixados como condição da suspensão da pena que lhe foi aplicada (fls. 368). 
 Acontece que o arguido não cumpriu esta intimação. 
 Em 7 de Fevereiro de 2005, na sequência de nova notificação, o assistente 
 renovou a informação antes prestada quanto ao pagamento das prestações de 
 
 500.000$00. 
 Em 22 de Fevereiro de 2005 o arguido foi notificado para, em 10 dias, esclarecer 
 porque razões não procedeu ao pagamento à assistente dos montantes fixados como 
 condição da suspensão da pena de 2 anos e 4 meses de suspensão com a advertência 
 de que poderia ser revogada a suspensão da execução daquela pena se nada 
 esclarecesse. 
 Em 7 de Março de 2005 o arguido veio esclareceu que “a interrupção dos 
 pagamentos fixados foi devido à retirada da queixa após sentença devida a acordo 
 tácito de liquidação da divida existente.” 
 Nessa sequência o ilustre mandatário do arguido veio, em contradição com o 
 esclarecimento precedente, alegar a impossibilidade de cumprimento dos deveres 
 que condicionaram a suspensão da pena porque ficou no desemprego desde finais de 
 
 2002 até Janeiro de 2005, adiantar que já conseguira emprego “o que lhe vai 
 permitir começar a recompor a sus vida em termos financeiros, embora ténue e 
 paulatinamente, o que faz temer não conseguir cumprir as obrigações a que está 
 adstrito com o condição da suspensão, do modo como se comprometeu” e rematar 
 
 “que se pode comprometer a pagar € 300,00 por mês a partir de do dia 31 de Maio 
 inclusive” (fls. 391). 
 Em 11 de Abril de 2005, a assistente lesada informou que o arguido estabeleceu 
 contacto e ficou de apresentar uma proposta de pagamento (fls. 396), mas nada 
 fez. 
 Por despacho de 18.04.2005, foi prorrogado por 1 ano o período de 4 anos da 
 suspensão da pena cujo início remonta a 20 de Maio de 2000 (fls. 397). 
 Tendo sido notificado para o efeito, em 4 de Outubro de 2005, a assistente 
 informou que o arguido não tinha pago qualquer outra prestação (flss. 414). 
 Novamente notificado para se pronunciar nos termos e para os efeitos do disposto 
 no artigo 495.º n.º 2 do Código de Processo Penal posto que não tinha cumprido 
 com a obrigação de indemnização fixada e tinha sofrido uma condenação por crimes 
 cometidos durante o período de suspensão da execução da pena, o arguido nada 
 disse flis. 425 e 426). 
 Apesar disso a assistente, em 2 de Dezembro de 2005, informou que o arguido se 
 havia comprometido a iniciar o pagamento da dívida em prestações mensais a 
 partir de Janeiro de 2006 (fls. 428). 
 Por despacho de 25 de Outubro de 2006 foi determinada a notificação do 
 assistente e do arguido para se pronunciarem sobre o cumprimento da condição 
 imposta ao arguido (fls. 433). 
 Em 21 de Dezembro de 2006, o arguido veio alegar que “se é certo que não cumpri 
 estrita e escrupulosamente os deveres fixados como condição da suspensão, menos 
 certo não é que tal só sucedeu por manifesta impossibilidade de reunir poupanças 
 face à escassez dos rendimentos que tenho auferido que nem sequer me permitem 
 fazer face às despesas diárias se simples subsistência da minha família” e 
 juntou documentos; por outro lado, admitiu pagar a mensalidade de € 300,00 
 mensais a partir de Janeiro de 2007 conforme muito antes o Ministério Público já 
 tinha sugerido (embora efectivamente nada tenha pago). 
 Considerando o período que o arguido teve para cumprir a condição a que se 
 subordinou a suspensão da execução da pena, bem como todas as oportunidades que 
 obteve para, com muito boa vontade, o fazer, entende este tribunal que a vontade 
 de não cumprir, de forma absolutamente displicente, não torna útil a audição do 
 arguido (que, de resto, já se pronunciou sobre a questão). 
 Nos termos do art. 56º nº 1 a) do Código Penal a suspensão da execução da pena é 
 sempre revogada quando, no seu decurso, o condenado infringir grosseiramente ou 
 repetidamente os deveres que lhe foram impostos, e revelar que as finalidades 
 que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançados. 
 Resulta claro que o arguido não pretende proceder ao pagamento da quantia em 
 dívida à ofendida apesar de todo o tempo que dispôs para o efeito, ficando, 
 assim, por assegurar as finalidades de paz social, prevenção especial, e 
 reintegração, que foram pretendidas com a suspensão da execução da pena de 
 prisão. 
 Igualmente não se verifica que a simples extensão da ameaça de prisão seja 
 suficiente para que o arguido não cometa mais crimes, nem que realize de forma 
 adequada e suficiente as finalidades da punição. 
 Pelo exposto e nos termos do art. 56.º n.º 1 a) do Código Penal, revogo a 
 suspensão da execução da pena de prisão a que o arguido A. foi condenado nestes 
 autos e, consequentemente, determino que o mesmo cumpra a respectiva pena. 
 Nos termos do art. 1º da Lei n.º 29/99, de 12 de Maio declaro perdoado um ano 
 desta pena de prisão (a condição a que se subordinou a suspensão da pena não 
 constitui tecnicamente uma condenação em indemnização), ficando por cumprir 1 
 
 (um) ano e 4 (quatro) meses de prisão”. 
 
 (…)
 Mas a verdade é que a ofendida, como cuidadosamente se refere no despacho 
 recorrido, repetidamente veio informar que os pagamentos trimestrais impostos 
 não estavam a ocorrer. 
 Pode pois concluir-se e sem qualquer dificuldade, que, por esta primeira via, a 
 alegada nulidade se não verifica. 
 
 8. A pretendida omissão de audição do arguido também inexiste. 
 Na verdade, o que ressalta é ter o arguido sido notificado 6 (seis) vezes, para 
 vir provar estar a cumprir a condição de suspensão da execução da pena, ou 
 esclarecer as razões do incumprimento. 
 Três dessas notificações ficaram sem resposta. 
 E em duas dessas notificações — as ordenadas a 16-11-05 e a 25-10-06 — foi-lhe 
 expressamente comunicado que se visava a eventual revogação do benefício. 
 
 8.1. Mas vejamos mais em pormenor o que resulta dos autos e vem referido 
 circunstanciada e fundadamente no despacho recorrido. 
 A) Primeiro, temos que: 
 
 - a condenação foi a 05-05-00, por crime de abuso de confiança (dano no valor de 
 
 22.080.516$00, em 1994 e 1995), em 2 anos e 4 meses de prisão, com execução 
 suspensa por 4 anos, sob condição de o arguido pagar à assistente Albertina 
 Rodrigues do Ó Silva de Medeiros 500.000$00, de três em três meses; 
 
 - aquando do despacho recorrido, quase sete anos haviam passado sobre tal 
 condenação; 
 
 - ao longo desse tempo, o arguido foi notificado para fazer prova dos pagamentos 
 a que estava obrigado, em Janeiro de 2001, em Abril de 2001, em Novembro de 
 
 2001, em Fevereiro de 2005, em Novembro de 2005 e em Outubro de 2006; 
 
 - deixou sem resposta 3 dessas solicitações do tribunal; 
 
 - além de uma entrega de 500.000$00, anterior à própria condenação, o arguido só 
 entregou à assistente mais 500.000$00, em 15-02-0 1; 
 
 - apesar do comprovado incumprimento da obrigação, o período da suspensão de 
 execução da pena foi prorrogado, em 18-04-05, por mais 1 ano (cfr. fls. 397); 
 
 - nas notificações ordenadas nos despachos de 16-11-05 e de 25-10-06, 
 expressamente se comunicou ao arguido visar-se a eventual revogação da suspensão 
 da execução da pena, incluindo-se na última a expressa e clara “...advertência 
 de que poderia ser revogada a suspensão da execução daquela pena se nada 
 esclarecesse”. 
 B) Depois, verifica-se que: 
 
 - a assistente, em 11-04-05, veio dizer ao processo que o arguido ficou de lhe 
 apresentar uma proposta de pagamento, mas nada fez; 
 
 - a assistente, em 02-12-05, veio dizer que o arguido se comprometera a pagar a 
 dívida em prestações mensais, a partir de Janeiro de 2006; 
 
 - no seu requerimento de fls. 445/447, apresentado em Juízo a 21-12-06, o 
 arguido propunha a aceitação pelo tribunal do pagamento da quantia de € 
 
 300,00/mês, a partir de Janeiro de 2007; 
 C) Finalmente, consta que: 
 
 - em 13-1 1-06, o próprio defensor do arguido veio renunciar ao mandato, porque 
 este não respondia às tentativas de contacto efectuadas (cfr. fls. 439); 
 
 - o arguido, “Durante o período de suspensão da pena”, sofreu uma condenação 
 
 “pela prática dum crime de condução de veículo em estado de embriaguez na pena 
 de 90 dias de multa e pela prática de um crime de desobediência na pena de 60 
 dias de multa, crimes que foram praticados em 29 de Maio de 2002, penas extintas 
 pelo pagamento” (cfr. certidão de fls. 355/360). 
 
 9. Desta longa mas necessária referência aos incidentes processuais pode 
 concluir-se, sem qualquer dúvida, que a omissão de audição do arguido se não 
 verifica. 
 O que se toma manifesto é que tribunal usou de toda a lealdade para com este, 
 lhe deu todas as possibilidades de cumprir e de se explicar, designadamente, 
 ouvindo-o sobre a eventual e previamente anunciada intenção de lhe poder ser 
 revogado o beneficio da suspensão de pena. 
 Não existe pois a pretendida nulidade. 
 
 9.1. O facto de o arguido não ter sido ouvido de viva voz ou de não se haverem 
 inquirido as testemunhas por ele indicadas não contraria tal conclusão. 
 A inutilidade dessas diligências decorria, com naturalidade, das anteriores 
 condutas processuais e extra-processuais do arguido, pois tudo demonstrava, à 
 saciedade, que ele não tinha a intenção de respeitar a solene advertência do 
 poder judicial, consubstanciada na decisão condenatória. 
 O arguido teve tempo mais que suficiente para organizar a sua vida de forma a 
 dar resposta minimamente responsável à mesma. 
 Não o fez. 
 Beneficiou de um prolongamento do período de suspensão de execução da pena, que 
 mais lhe facilitaria o cumprimento da obrigação imposta. 
 O tribunal sempre mostrou abertura para que o arguido pudesse cumprir esta de 
 outra forma, desde que consensual. 
 
 (…)
 Ora, isso analisa-se na infracção culposa — culpa esta que é “repetida” e até 
 
 “grosseira” — dos deveres impostos, nos termos e para os efeitos do art. 56º, nº 
 
 1 - a), do CP, razão pela qual o beneficio da suspensão da execução da pena 
 poderia ser revogado, como foi. 
 
 9.2. Acresce que o arguido, “Durante o período de suspensão da pena”, sofreu 
 condenação em pena de multa, que cumpriu, por crimes de condução de veículo em 
 estado de embriaguez e de desobediência. 
 E, ainda, o facto, atrás referido, de o próprio defensor do arguido ter vindo 
 renunciar ao mandato, porque o arguido não respondia às tentativas de contacto 
 efectuadas. 
 
 (…)
 
 9.3. A pretendida omissão de audição do arguido, repete-se, não existe. 
 Uma vez que, no caso concreto, ele foi ouvido e por diversas vezes sobre a 
 matéria e após os devidos e expressos avisos das eventuais consequências. 
 A pretendida inquirição das testemunhas indicadas no dito requerimento de fls. 
 
 445/447 não era acto que o tribunal devesse inelutavelmente praticar, antes se 
 afigura que seria acto inútil e como tal proibido — cfr. art.s 137.º do CPC e 
 
 4.º do CPP — dados os vários incidentes processuais descritos e as já referidas 
 condutas processuais e extraprocessuais do arguido. 
 Assim, não há ofensa ao disposto nos artºs 55º e 56º do C.P e nenhuma nulidade 
 existe. 
 
 10. De tudo quanto vem de ser dito decorre ainda que nenhum desrespeito por 
 normas constitucionais se vislumbra, designadamente pela do art. 32º da CRP. 
 
 (…)”.
 
  
 
 1.3.
 Inconformado, o arguido veio requerer a correcção de sentença e arguir a sua 
 nulidade (fls. 602 e ss.), tendo exposto:
 
  
 A) Da Correcção da Sentença 
 
 1. Dispõe o art. 380.º, n.º 1, al. b) do C.P.P., aplicável por remissão legal 
 prevista no art. 425.º, n.º 4 do mesmo Diploma que “O tribunal procede, 
 oficiosamente ou a requerimento, à correcção da sentença quando a sentença 
 contiver lapso, obscuridade ou ambiguidade cuja eliminação não importe 
 modificação essencial”. 
 Ora, 
 
 2. No Acórdão cuja correcção ora se requer refere-se que o Requerente terá sido 
 
 «notificado 6 (seis) vezes, para vir provar estar a cumprir a condição de 
 suspensão da pena, ou esclarecer as razões do incumprimento”, 
 
 3. Esclarecendo-se que “o arguido foi notificado para fazer prova dos pagamentos 
 a que estava obrigado, em Janeiro de 2001, em Abril de 2001, em Novembro de 
 
 2001, em Fevereiro de 2005, em Novembro de 2005 e em Outubro de 2006” (nosso 
 sublinhado). 
 Ora, 
 
 4. Embora corresponda à verdade que o Requerente foi, efectivamente, notificado 
 por 6 (seis) vezes, num lapso de tempo de 7 (sete) anos que mediaram entre a 
 prolação do despacho de que recorreu e a prolação da sentença condenatória e 
 consequente suspensão da pena a que fora condenado, em Janeiro e Abril de 2001, 
 em Fevereiro e Novembro de 2005 e em Outubro de 2006, 
 O mesmo já não sucede 
 
 5. Com a invocada notificação em Novembro de 2001, a qual inexistiu. 
 Senão vejamos, 
 
 6. Foi o Requerente notificado em 25 de Janeiro de 2001, em 09 de Abril de 2001, 
 em 05 de Novembro de 2004, em 22 de Fevereiro de 2005, 16 de Novembro de 2005 e 
 
 25 de Outubro de 2006, conforme é facilmente apreensível da leitura do despacho 
 recorrido, o qual, de forma exaustiva, enumera as notificações efectuadas ao 
 arguido. 
 Assim sendo, 
 
 7. No acórdão proferido, onde se lê «Novembro de 2001» deveria ler-se “Novembro 
 de 2004”. 
 
 8. A referência cuja correcção ora se requer, não obstante se reputar tratar-se 
 de um mero lapso de escrita, cuja correcção não importará modificação essencial, 
 no entender do Requerente assume importância na sua defesa, 
 Na medida em que, 
 
 9. A enumeração das sucessivas notificações ao arguido, com a referência 
 evidenciada, desde logo porque sublinhada, contrariamente ao restante texto do 
 acórdão, realizaram-se num longo lapso de tempo, 7 (sete anos), 
 
 10. Assim como se efectivaram de forma dilatada no tempo, constatação esta que 
 fica prejudicada, em vários anos, com o lapso descrito. 
 Assim sendo, 
 
 11. Porque no entender do Recorrente tal facto constitui uma referência de assaz 
 importância para a sua defesa, ao qual não é atribuído qualquer relevo, nem a 
 ele feita qualquer referência (contrariamente ao número de vezes em que este 
 terá sido notificado), 
 Na medida em que, 
 
 12. Permite compreender e apreender que as alegadamente reiteradas e sucessivas 
 notificações ao Requerente, se concretizaram com largos meses entre as mesmas, 
 sendo que, por vezes, quase um ano mediou entre elas, 
 
 13. Bem como que, em 7 (sete) anos, para alguém sem um emprego certo e sem 
 remuneração fixa, e cujos proventos do seu trabalho constituíam e constituem 
 
 única fonte de rendimento do agregado, é expectável que, com as vicissitudes que 
 se sucederam ao nível laboral, a sua condição económica tenha oscilado e, 
 consequentemente, impor-se-ia a alteração das condições impostas, o que nunca 
 sucedeu, apesar de o ter requerido. 
 Nestes termos, 
 
 14. Requer-se a correcção do aludido lapso, nos termos dos artigos 425.º, n.º 4 
 e 380.º, n.º 1, al. b), ambos do C.P.P. 
 
 15. O qual, aliás, depois de corrigido, imporia uma decisão diversa da agora 
 impugnada. 
 
  
 B) Da Nulidade da Sentença 
 
 16. No despacho recorrido não foram apreciadas diversas questões suscitadas pelo 
 ora Requerente, nomeadamente a possibilidade de alteração dos deveres impostos, 
 em virtude da sua difícil situação económica. 
 Assim sendo, 
 
 17. Interpôs este recurso para esse Tribunal suscitando a omissão de pronúncia 
 sobre a requerida alteração dos deveres impostos, pedindo a substituição do 
 despacho recorrido «por outro que se pronuncie sobre todas as questões 
 suscitadas». 
 No entanto, 
 
 18. O acórdão proferido também não se pronuncia sobre a invocada omissão de 
 pronúncia, tendo-se limitado a invocar essa questão aquando da indicação das 
 
 «questões a resolver». 
 
 19. E tendo-se satisfeito com a referência de que «o despacho recorrido não 
 tinha que se pronunciar expressamente sobre a questão agora referida na 8.ª 
 conclusão da motivação do recurso: “possibilidade de a esposa do arguido 
 renunciar ao direito à herança da ofendida... como forma de compensação integral 
 pela dívida”» 
 Quando, 
 
 20. Independentemente do mérito de tal decisão, o então recorrente não se havia 
 limitado a invocar omissão de pronúncia relativamente a essa situação 
 específica, a qual constitui uma mera possibilidade de alteração das obrigações 
 impostas, já por diversas vezes equacionada, ou até de cumprimento da própria 
 obrigação. 
 Tendo, isso sim, 
 
 21. De uma forma genérica invocado a omissão de pronúncia relativamente à 
 possibilidade de alteração das obrigações impostas, em virtude de «todo um 
 circunstancialismo involuntário, que resultou na sua situação de desemprego» e 
 que o impediu de cumprir as obrigações a que estava obrigado, 
 
 22. Constituindo a possibilidade referida no ponto 19. do presente requerimento 
 uma outra circunstância que, no entender do requerente, deveria ou poderia 
 resultar numa alteração dos deveres impostos como condição de suspensão da pena.
 
  
 
      1.4.
 
      A Relação, por Acórdão de 3 de Outubro de 2007 (fls. 632 e ss.), na parte 
 que ora interessa considerar, teve por improcedente a arguida nulidade, dizendo:
 
  
 
             A pretensão de que existiu erro na referência à notificação de 
 Novembro de 2001 tem efectivamente razão de ser: quando se diz — a fls. 593 — 
 que “...ao longo desse tempo, o arguido foi notificado..., em Abril de 2001, em 
 Novembro de 2001, em Fevereiro de 2005...”, deveria ter-se dito “ao longo desse 
 tempo, o arguido foi notificado..., em Abril de 2001, em Novembro de 2004, em 
 Fevereiro de 2005...”.
 Assim sendo e nos termos do art. 280.º do CPP, deve proceder-se à correcção do 
 lapso material ocorrido e agora verificado, no local próprio e a vermelho. 
 
 4.1. Desta correcção não resultam contudo quaisquer consequências a nível da 
 decisão do recurso e, designadamente, que se verifique a pretendida nulidade. 
 Com efeito, como claramente resulta de fls. 592/593 e da nota de rodapé aí 
 inserida, o tratamento da questão referida não foi omitido por este TRL, esta 
 foi sim abordada e decidida em sentido diverso do que defendia o requerente. 
 III - Decisão. 
 
 5. Dado o exposto, defere-se parcialmente a pretensão deduzida, ordenando que a 
 fls. 593 onde consta “...ao longo desse tempo, o arguido foi notificado..., em 
 Abril de 2001, em Novembro de 2001, em Fevereiro de 2005...”, passe a constar 
 
 “...ao longo desse tempo, o arguido foi notificado..., em Abril de 2001, em 
 Novembro de 2004, em Fevereiro de 2005…”.
 
  
 
 2.
 Novamente inconformado, o arguido interpôs recurso para o Tribunal 
 Constitucional (fls. 637 e ss.).
 O relator veio, a fls. 656, e nos termos do disposto no artigo 75.º-A, n.º 5 da 
 LTC (Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, alterada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de 
 Fevereiro) convidar o recorrente a “enunciar o exacto sentido da norma aplicada 
 na decisão recorrida cuja conformidade constitucional pretende questionar”.
 
  
 O recorrente respondeu (fls. 658 e ss.):
 
  
 
 1. Entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa, em acórdão proferido em 20 de Junho 
 de 2007, pela inexistência do «desrespeito por normas constitucionais […] 
 designadamente pela do art. 32.º CRP», 
 Porquanto, 
 
 2. «Não existe pois a pretendida nulidade. O facto de o arguido não ter sido 
 ouvido de viva voz ou de não se haverem inquirido testemunhas por ele indicadas 
 não contrario tal conclusão». 
 Ora, 
 
 3. Dispõe o art. 495.º, n.º 2 do C.P.P. que, verificando-se o incumprimento das 
 condições de suspensão da execução da pena de prisão, «o tribunal decide, por 
 despacho, depois de recolhida a prova e antecedendo parecer do Ministério 
 Público e audição do condenado» (nosso sublinhado). 
 
 4. Por sua vez, proclama o art. 61., n. 1, al. b) do C.P.P. o direito de o 
 arguido «ser ouvido pelo tribunal ou pelo juiz de instrução sempre que eles 
 devam tomar qualquer decisão que pessoalmente o afecte». 
 Sendo certo que, 
 
 5. «A decisão de revogar a suspensão da execução da pena é uma decisão que, 
 obviamente, o afecta» (cfr. Ac. TRL de 21-12-2004, proc. 6919/2004-5, in 
 
 www,dgsi.pt). 
 
 6. Assim sendo, ao entender o tribunal recorrido que tal dever, previsto nas 
 citadas disposições legais, maxime no art. 495.º, n.º 2 do C.P.P., não obriga a 
 que o arguido seja ouvido «de viva voz», bastando-se com um requerimento escrito 
 em que o mesmo expõe os motivos do seu incumprimento e requer expressamente que 
 se proceda à sua audição, bem como à inquirição de testemunhas que indicou como 
 prova do por si alegado, viola expressamente uma das mais elementares garantias 
 de defesa no processo criminal, o dever de audição do arguido, ainda mais 
 patente quando indefere a requerida audição e produção de prova. 
 
 7. Mais, ainda que tal dever de audição se entendesse cumprido com um mero 
 requerimento, sempre se diria que nem tão pouco o tribunal recorrido permitiu 
 que o arguido fizesse prova do que havia alegado, conforme impõe o referido n.º 
 
 2 do art. 295. do C.P.P., não atendendo aos motivos invocados que, a serem 
 atendidos, obstariam certamente à decisão de revogação, decisão que se 
 compreende porque não se fez prova da “justa causa” invocada. 
 
 8. Sucede que tal prova simplesmente não foi produzida porque o Tribunal não a 
 admitiu, o que se traduz num castrar do direito de defesa do arguido. Por mais 
 que dissesse, a decisão seria sempre a mesma, simplesmente porque não foi 
 admitida a prova do alegado. Não se pode admitir tal arbitrariedade!
 
 9. Constituindo o seu dever de audição, nos termos supra expostos, garantia de 
 defesa no processo criminal, prevista no n.º 1 do art. 32.º da Constituição da 
 República Portuguesa; quando o tribunal recorrido decidiu pela não audição do 
 Recorrente e indeferiu a audição das testemunhas indicadas, conforme a lei impõe 
 e este expressamente o requereu, interpretou e aplicou o art. 61., n. 1, al. b) 
 e o art. 495.º, n.º 2 ambos do C.P.P deforma inconstitucional. 
 
 10. Nestes termos, e respondendo ao convite doutamente formulado, «o exacto 
 sentido da norma aplicada na decisão recorrida cuja conformidade constitucional 
 pretende [o Recorrente] questionar» é aquele segundo o qual a imposição de 
 audição do arguido quando deva ser tomada uma decisão que pessoalmente o afecte, 
 e a recolha da prova, mormente quando se decida pela revogação da suspensão da 
 execução da pena de prisão a que foi condenado, prevista nos já citados artigos 
 
 61.º, n.º 1, al. b) e 495.º, n.º 2, ambos do C.P.P., se basta com um 
 requerimento escrito em que o mesmo expõe os motivos do seu incumprimento e 
 requer expressamente que se proceda à sua audição, bem como à inquirição de 
 testemunhas que indicou como prova do por si alegado, ainda que seja indeferida 
 a sua audição e a inquirição das testemunhas por si indicadas, interpretação 
 esta que se considera inconstitucional, por violação do n.º 1 do art. 32. da 
 C.R.P., nos termos já supra expostos e que nesta sede esperamos que seja 
 declarada. 
 
  
 
 3.
 Resulta da resposta ao convite formulado que o recorrente visa a apreciação da 
 norma que resulta da conjugação do disposto nos artigos 61.º, n.º 1 alínea b) e 
 
 495.º, n.º 2, ambas do Código de Processo Penal, no sentido de que a imposição 
 de audição do arguido quando deva ser tomada uma decisão que pessoalmente o 
 afecte, e a recolha da prova, mormente quando se decida pela revogação da 
 suspensão da execução da pena de prisão a que foi condenado, prevista nos já 
 citados artigos 61.º, n.º 1, al. b) e 495.º, n.º 2, ambos do C.P.P., se basta 
 com um requerimento escrito em que o mesmo expõe os motivos do seu incumprimento 
 e requer expressamente que se proceda à sua audição, bem como à inquirição de 
 testemunhas que indicou como prova do por si alegado, ainda que seja indeferida 
 a sua audição e a inquirição das testemunhas por si indicadas, viola o n.º 1 do 
 art. 32. da C.R.P..
 
  
 Esta formulação constitui, (ou pretende constituir) a decisão recorrida em si 
 mesma considerada, pois o que o recorrente, no fundo, pretende sindicar é o 
 processo decisório do Tribunal, na medida em que considera que a não audição de 
 determinadas testemunhas o prejudicou, defendendo pois que o tribunal poderia 
 ter decidido num outro sentido se tivesse procedido à audição solicitada.
 
  
 Ora, tal forma de pôr a questão não é uma forma adequada de suscitar uma questão 
 de constitucionalidade, na medida em que o contencioso constitucional não 
 permite recorrer das decisões em si mesmas consideradas.
 
  
 Acresce que, a própria decisão, ao contrário do defendido pelo recorrente, não 
 considerou que houve qualquer preterição ou violação do direito de audição do 
 arguido. Efectivamente, refere o Tribunal recorrido que “(…) o tratamento da 
 questão referida não foi omitido por este TRL, esta foi sim abordada e decidida 
 em sentido diverso do que defendia o requerente”. 
 
  
 De todo o modo, sempre a questão de constitucionalidade intentada suscitar 
 improcederia na medida em que a decisão recorrida não aplicou, enquanto sua 
 ratio decidendi, as normas insertas nos artigos 61.º, n.º 1 alínea b) e 495.º 
 n.º 2, do Código de Processo Penal questionados pelo recorrente na resposta ao 
 convite formulado.
 Na verdade, a decisão recorrida resolveu a questão de nulidade arguida pelo 
 recorrente, referente à sustentada violação do seu direito de audição, apenas 
 por aplicação das normas contidas no artigo 119.º alínea c), do Código de 
 Processo Penal e nos artigos 55.º e 56.º do Código Penal. 
 Foram estas as normas que constituíram o fundamento normativo da decisão 
 proferida (…)”.
 
  
 
  
 
 2.2.
 O Ministério Público, notificado da reclamação deduzida, veio (fls 691) pugnar 
 pela improcedência da mesma.
 
  
 Cumpre decidir.
 
  
 
  
 II.
 Fundamentação:
 
  
 
 3.
 
 3.1.
 
             O facto concreto que deu origem ao presente processo e à questão que 
 o recorrente submeteu à apreciação deste Tribunal relaciona-se com a revogação 
 da suspensão da pena aplicada ao arguido, ora recorrente, por violação dos 
 deveres que lhe foram impostos.
 
             
 Nos termos do artigo cuja interpretação sindica – artigo 495.º, n.º 2 do Código 
 de Processo Penal –, verificando-se “incumprimento das condições de suspensão” o 
 
 “tribunal decide por despacho, depois de recolhida a prova e antecedendo parecer 
 do Ministério Público e audição do condenado “.
 Sustenta o recorrente que “Apesar do aí estatuído, o despacho recorrido, em 
 violação do citado preceito, entendeu inútil a audição do arguido, bastando-se 
 com o equacionar de um mero requerimento onde este expôs os motivos do seu 
 incumprimento e requereu a sua audição, bem como requereu a inquirição de 
 testemunhas como meio de prova do por si alegado (…)”.
 
  
 Ora, desde logo importa esclarecer que não é sindicável por este Tribunal a 
 questão que se consubstancia num juízo sobre a utilidade ou necessidade da 
 inquirição e audição de testemunhas arroladas pelo arguido no âmbito do processo 
 que averigua das condições de revogação da suspensão da pena que lhe tinha sido 
 aplicada, nem é, igualmente, sindicável impor, como pretende o reclamante, que 
 direito de audição do arguido, apenas se realiza mediante a audição pessoal do 
 mesmo: o facto de a decisão recorrida ter entendido inútil a audição do 
 reclamante e ter apenas considerado suficiente para ajuizar do incumprimento dos 
 deveres impostos o requerimento escrito apresentado pelo mesmo (no qual o 
 arguido expôs os motivos do seu incumprimento e requereu os meios de prova a 
 produzir para confirmação, na sua óptica, das causas de não cumprimento dos 
 deveres impostos) não reveste as características de uma questão de 
 constitucionalidade normativa que possa ser submetida à apreciação deste 
 Tribunal.
 Na verdade, não cabe na competência do tribunal Constitucional sindicar o juízo 
 de determinação do direito infraconstitucional que constituiu o fundamento 
 normativo da decisão levado a cabo pelo acórdão recorrido. Se o melhor direito, 
 em face dos preceitos legais, é aquele a que se arrimou a decisão recorrida ou é 
 aquele que a recorrente defende é questão que o Tribunal Constitucional não pode 
 resolver.
 
  
 
 3.2.
 Como se deixou já sublinhado na decisão sumária proferida o que o reclamante 
 pretende, ao formular a questão intentada interpor, é sindicar o próprio 
 processo decisório, por discordar da decisão concreta efectivamente tomada – ter 
 esta entendido como suficiente, para decidir da revogação da pena imposta, a 
 prova junta aos autos pelo próprio arguido, não tendo recorrido, 
 consequentemente, à “audição pessoal” do mesmo.
 Foi esta decisão que a primeira instância tomou. E é dessa decisão que o 
 reclamante recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa, invocando uma nulidade 
 decorrente da omissão de audição do arguido que seria violadora das garantias de 
 defesa do mesmo, plasmadas no artigo 32.º da Constituição da República. 
 
  
 Ora, o contencioso constitucional não permite recorrer das decisões em si mesmas 
 consideradas: o objecto da fiscalização jurisdicional da constitucionalidade são 
 apenas normas jurídicas, não podendo o Tribunal Constitucional pronunciar-se 
 sobre uma (eventual) “inconstitucionalidade da decisão judicial”, como, de 
 resto, tem sido unanimemente acentuado pela jurisprudência deste Tribunal – cf. 
 nesse sentido o Acórdão n.º 199/88 (publicado no Diário da República II Série, 
 de 28 de Março de 1989), onde se afirmou que “este Tribunal tem decidido de 
 forma reiterada e uniforme que só lhe cumpre proceder ao controle da 
 constitucionalidade de ‘normas’ e não de ‘decisões’ –, o que exige que, ao 
 suscitar-se uma questão de inconstitucionalidade, se deixe claro qual o preceito 
 legal cuja legitimidade se questiona, ou no caso de se questionar certa 
 interpretação de uma determinada norma, qual o sentido ou a dimensão normativa 
 do preceito que se tem por violador da lei fundamental”.
 Nestes termos, em face da delimitação dos poderes assinalados a este Tribunal, 
 urge reconhecer, semel pro semper, que os recursos de constitucionalidade, 
 embora interpostos de decisões de outros tribunais, visam controlar o juízo que 
 nelas se contém sobre a violação ou não violação da Constituição por normas 
 mobilizadas na decisão recorrida como sua ratio decidendi, não podendo visar as 
 próprias decisões jurisdicionais qua tale, identificando-se, nessa medida, o 
 conceito de norma jurídica como elemento definidor do objecto do recurso de 
 constitucionalidade, daí resultando, pois, que apenas as normas e não já as 
 decisões judiciais podem constituir objecto de tal recurso – cf., nestes exactos 
 termos, o Acórdão n.º 361/98 e, entre muitos outros, os Acórdãos nºs 286/93, 
 
 336/97, 702/96, 336/97, 27/98 e 223/03, todos disponíveis para consulta em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt/.
 E isto porque a Constituição não configurou o recurso de constitucionalidade 
 como um recurso de amparo no âmbito do qual fosse possível sindicar qualquer 
 lesão dos direitos fundamentais, aí se incluindo a possibilidade de conhecer, 
 nesse âmbito, do mérito da própria decisão judicial sindicanda, antes tendo 
 recortado a competência do Tribunal Constitucional em torno do conhecimento de 
 questões de constitucionalidade de normas, sendo perante tal conformação do 
 sistema jurídico-constitucional de recursos que o Tribunal pode actuar em termos 
 de avaliar da bondade constitucional de critérios normativos aplicados pelos 
 demais tribunais, pelo que a “violação da Constituição”, imputada directamente 
 ao acto de concreta aplicação do direito, e não aos preceitos legais aplicados 
 pelas instâncias, não densifica nem traduz um problema de constitucionalidade 
 normativa susceptível de ser apreciado por este Tribunal.
 Esta é, pois, a principal razão pela qual a decisão sumária ora reclamada 
 entendeu não ser de conhecer do recurso, fundamento que, aliás, o reclamante não 
 chega verdadeiramente a impugnar na sua reclamação.
 
  
 
  
 
 4.
 Para além disto, a verdade é que, como também se deixou explícito, a questão 
 formulada com base nas normas constantes dos artigos 61.º, n.º 1, alínea b) e 
 
 495.º, n.º 2, ambas do Código de Processo Penal, sempre improcederia, pois a 
 decisão recorrida não as aplicou enquanto fundamento normativo do juízo 
 formulado, tendo, antes, concluído que não ocorreu nenhuma omissão de audição do 
 arguido, violadora das suas garantias de defesa, nem a consequente e invocada 
 nulidade da decisão, por aplicação dos artigos 55.º e 56.º do Código Penal - 
 Falta de cumprimento das condições de suspensão e Revogação da suspensão - e 
 
 119.º, alínea c) - Nulidades insanáveis - do Código de Processo Penal, como 
 resulta do seguinte excerto do Acórdão da Relação:
 
  
 
 “ (…)
 
 9. Desta longa mas necessária referência aos incidentes processuais pode 
 concluir-se, sem qualquer dúvida, que a omissão de audição do arguido se não 
 verifica. 
 O que se toma manifesto é que tribunal usou de toda a lealdade para com este, 
 lhe deu todas as possibilidades de cumprir e de se explicar, designadamente, 
 ouvindo-o sobre a eventual e previamente anunciada intenção de lhe poder ser 
 revogado o beneficio da suspensão de pena. 
 Não existe pois a pretendida nulidade. 
 
 9.1. O facto de o arguido não ter sido ouvido de viva voz ou de não se haverem 
 inquirido as testemunhas por ele indicadas não contraria tal conclusão. 
 A inutilidade dessas diligências decorria, com naturalidade, das anteriores 
 condutas processuais e extra-processuais do arguido, pois tudo demonstrava, à 
 saciedade, que ele não tinha a intenção de respeitar a solene advertência do 
 poder judicial, consubstanciada na decisão condenatória. 
 O arguido teve tempo mais que suficiente para organizar a sua vida de forma a 
 dar resposta minimamente responsável à mesma. 
 Não o fez. 
 Beneficiou de um prolongamento do período de suspensão de execução da pena, que 
 mais lhe facilitaria o cumprimento da obrigação imposta. 
 O tribunal sempre mostrou abertura para que o arguido pudesse cumprir esta de 
 outra forma, desde que consensual. 
 
 (…)
 Ora, isso analisa-se na infracção culposa — culpa esta que é “repetida” e até 
 
 “grosseira” — dos deveres impostos, nos termos e para os efeitos do art. 56º, nº 
 
 1 - a), do CP, razão pela qual o benefício da suspensão da execução da pena 
 poderia ser revogado, como foi. 
 
 9.2. Acresce que o arguido, “Durante o período de suspensão da pena”, sofreu 
 condenação em pena de multa, que cumpriu, por crimes de condução de veículo em 
 estado de embriaguez e de desobediência. 
 E, ainda, o facto, atrás referido, de o próprio defensor do arguido ter vindo 
 renunciar ao mandato, porque o arguido não respondia às tentativas de contacto 
 efectuadas. 
 
 (…)
 
 9.3. A pretendida omissão de audição do arguido, repete-se, não existe. 
 Uma vez que, no caso concreto, ele foi ouvido e por diversas vezes sobre a 
 matéria e após os devidos e expressos avisos das eventuais consequências. 
 A pretendida inquirição das testemunhas indicadas no dito requerimento de fls. 
 
 445/447 não era acto que o tribunal devesse inelutavelmente praticar, antes se 
 afigura que seria acto inútil e como tal proibido — cfr. art.s 137.º do CPC e 
 
 4.º do CPP — dados os vários incidentes processuais descritos e as já referidas 
 condutas processuais e extraprocessuais do arguido. 
 Assim, não há ofensa ao disposto nos artºs 55º e 56º do C.P e nenhuma nulidade 
 existe. 
 
 10. De tudo quanto vem de ser dito decorre ainda que nenhum desrespeito por 
 normas constitucionais se vislumbra, designadamente pela do art. 32º da CRP 
 
 (…)”.
 
  
 Nada há, pois, a censurar à decisão sumária reclamada.
 
  
 
 5.
 Decisão:
 Em face do exposto, improcede a presente reclamação. Custas pelo recorrente, 
 fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
 
  
 Lisboa, 27 de Março de 2008
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Maria João Antunes
 Gil Galvão