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Processo n.º 911/08
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro João Cura Mariano
 
  
 Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 Relatório
 No processo especial abreviado que se encontrava pendente no 1º Juízo de Pequena 
 Instância Criminal (n.º 787/06.7 SFLSB, da 2ª Secção), em 9 de Janeiro de 2008, 
 foi proferido despacho que declarou a nulidade do processado, salvaguardando-se 
 os seus termos até à acusação, por força do disposto nos artigos 118.º, n.º 1, 
 
 119.º, alínea f), 122.º e 391.º - D, todos do Código de Processo Penal, com o 
 fundamento que já haviam decorrido 90 dias após a dedução da acusação sem que 
 se tivesse iniciado a audiência de julgamento.
 
  
 O Ministério determinou a remessa dos autos à distribuição como processo comum 
 singular.
 
  
 O processo foi distribuído ao 6.º Juízo Criminal de Lisboa (2.ª Secção), onde em 
 
 16-6-2008 foi proferido o seguinte despacho:
 
 “Questão Prévia: da inconstitucionalidade da interpretação dada à norma contida 
 no actual artigo 391.º‑D do Código de Processo Penal, no sentido de que a 
 inviabilidade da realização do julgamento no prazo de 90 dias constitui uma 
 nulidade insanável.
 Foi proferido despacho de acusação, no dia 13 de Fevereiro de 2007, imputando ao 
 arguido, por factos indiciariamente praticados no dia 10 de Fevereiro de 2007 e 
 enquadráveis no crime de condução sem habilitação legal, previsto no artigo 
 
 3.º, n.º 2, do Decreto‑Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, para julgamento em 
 processo abreviado.
 Os autos foram remetidos à distribuição no Tribunal de Pequena Instância 
 Criminal a 16 de Março de 2007 (fls. 32), tendo o M.mo Juiz titular do 2.º 
 Juízo, 2.ª Secção, do Tribunal de Pequena Instância de Lisboa recebido a 
 acusação e designado datas para a realização do julgamento, por despacho de 29 
 de Março de 2007.
 O processo foi, contudo, novamente concluso ao mesmo M.mo Juiz titular no dia 4 
 de Janeiro de 2008.
 O M.mo Juiz titular do 2.º Juízo, 2.ª Secção, do Tribunal de Pequena Instância 
 de Lisboa, em despacho de 4 de Janeiro de 2008, considerou existir, devido às 
 alterações legislativas introduzidas no Código de Processo Penal pela Lei n.º 
 
 48/2007, de 29 de Agosto, e, em especial, pela introdução do artigo 391.º‑D em 
 tal diploma, uma nulidade insanável, por emprego de forma de processo especial 
 fora dos casos previstos na lei (artigo 119.º, alínea f), do Código de Processo 
 Penal), proveniente, em síntese, do facto de a audiência de julgamento não 
 poder realizar‑se no prazo de 90 dias, conforme actualmente previsto no 
 mencionado normativo.
 Cumpre apreciar e decidir.
 Deixamos desde já consignado que não se pode concordar com a posição assumida no 
 aliás douto despacho do M.mo Juiz Titular do Tribunal de Pequena Instância de 
 Lisboa, que declarou existir uma nulidade insanável por emprego de forma de 
 processo especial fora dos casos previstos na lei (artigo 119.º, alínea f), do 
 Código de Processo Penal).
 Com efeito, a acusação deduzida nestes autos respeitou na íntegra o disposto 
 nos artigos 391.º‑A e 391.º‑B do Código de Processo Penal, que, salvo melhor 
 opinião, fixam de forma definitiva quando o uso do processo abreviado deve ter 
 lugar.
 Note‑se, antes do mais, que na recente alteração legislativa em causa não foi 
 alterado o disposto no artigo 119.º, alínea f), do Código de Processo Penal, 
 que prevê a existência de nulidade insanável em caso de emprego de forma de 
 processo especial fora dos casos expressamente previstos na lei.
 Por outro lado, é um facto que a actual lei, devido às alterações introduzidas 
 pela Lei n.º 48/2007, introduziu um preceito novo, o artigo 391.º‑D do Código de 
 Processo Penal, e é certo que tal dispositivo legal dispõe que «A audiência de 
 julgamento em processo abreviado tem início no prazo de 90 dias a contar da 
 dedução da acusação».
 Contudo, o desrespeito do prazo previsto em tal normativo inovador apenas pode 
 consubstanciar uma irregularidade sujeita ao regime do artigo 123.º do Código de 
 Processo Penal, conforme, aliás, se expressa o Venerando Conselheiro Maia 
 Gonçalves no Código de Processo Penal Anotado, na última edição.
 Com efeito, escreve aquele mui ilustre autor: «O início da audiência para além 
 de 90 dias a contar da dedução da acusação constitui irregularidade, sujeita ao 
 regime do artigo 123.º» (Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 
 Coimbra, Almedina, 2007, p. 824).
 Quanto a nós, tal conclusão resulta à evidência, desde logo, com vista a 
 salvaguardar as regras da competência, que são, diríamos nós, sagradas, em 
 termos jurídico‑criminais, e por isso merecedoras da mais alta tutela, ou seja, 
 constitucional, pelo preceituado no artigo 32.º, n.º 9, da Constituição da 
 República Portuguesa, onde se dispõe: «Nenhuma causa pode ser subtraída ao 
 tribunal cuja competência esteja fixada em lei anterior».
 Desta norma constitucional emana o princípio do juiz natural ou do juiz legal, 
 que é uma garantia do processo criminal.
 Neste âmbito, não pode ser assim descurado o facto de que, na Comarca de Lisboa, 
 a competência para o julgamento dos processos abreviados está expressamente 
 atribuída ao Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa (artigo 102.º, n.º 
 
 1, da LOFTJ).
 Tal regra de competência, numa interpretação de acordo com a Constituição, não 
 pode ser, de forma alguma, violada.
 Recorde‑se que a norma constitucional em referência (artigo 32.º, n.º 9, da CRP) 
 tem outros reflexos na legislação ordinária.
 Neste âmbito, destacam‑se os artigos 22.º e 23.º da LOFTJ (Lei n.º 3/99, de 13 
 de Janeiro), onde se prevê:
 
 «Artigo 22.º (Lei reguladora da competência)
 
 1 – A competência fixa‑se no momento em que a acção se propõe, sendo 
 irrelevantes as modificações de facto que ocorram posteriormente.
 
 2 – São igualmente irrelevantes as modificações de direito, excepto se for 
 suprimido o órgão a que a causa estava afecta ou lhe for atribuída competência 
 de que inicialmente carecesse para o conhecimento da causa.
 Artigo 23.º (Proibição de desaforamento)
 Nenhuma causa pode ser deslocada do tribunal competente para outro, a não ser 
 nos casos especialmente previstos na lei.»
 A consequência mediata da declaração de nulidade insanável do processado, por 
 emprego de processo especial fora dos casos expressamente previstos na lei, é a 
 alteração do tribunal competente para proceder ao julgamento da causa, 
 porquanto, passando o processo a seguir a forma comum, na comarca de Lisboa (e 
 todas as outras comarcas onde se encontram instalados tribunais de pequena 
 instância criminal), o tribunal competente para o julgamento passa a ser um 
 Juízo Criminal (artigo 100.º da LOFTJ).
 Assim sendo, seguindo um entendimento onde a declaração de nulidade do 
 processado anterior conduz a uma alteração da forma do processo e, em 
 consequência, a uma alteração de competência do tribunal, neste caso, para o 
 julgamento do processo abreviado, fixada expressamente no já aludido artigo 
 
 102.º, n.º 1, da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro, afigura‑se que tal despacho 
 provoca um desaforamento que não está especialmente previsto na lei, em 
 violação expressa do artigo 23.º da LOTFJ e do próprio princípio do juiz 
 natural ou legal, constitucionalmente consagrado no artigo 32.º, n.º 9, da CRP.
 O princípio do juiz natural ou legal, conforme nos recordam J. J. Gomes 
 Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. 
 I, 4.ª edição revista, Coimbra Editora, 2007, p. 525, comporta várias dimensões 
 fundamentais, a saber:
 
 «... (a) exigência de determinabilidade, o que implica que o juiz (ou juízes) 
 chamado(s) a proferir decisões num caso concreto estejam previamente 
 individualizados através de leis gerais, de uma forma o mais possível 
 inequívoca; (b) princípio da fixação de competência, o que obriga à observância 
 das competências decisórias legalmente atribuídas ao juiz e à aplicação dos 
 preceitos que de forma mediata ou imediata são decisivos para a determinação 
 do juiz da causa; (c) observância das determinações de procedimento referentes 
 
 à divisão funcional interna (distribuição de processos), o que aponta para a 
 fixação de um plano de distribuição de processos ...»
 Resulta, pois, da exposta doutrina que a lei que fixa a competência deve estar 
 individualizada através de uma lei geral, de uma forma o mais possível 
 inequívoca, devendo tais regras ser respeitadas quer de forma mediata quer de 
 forma imediata, com tutela mesmo ao nível do plano de distribuição dos 
 processos.
 Ora, a interpretação que o despacho em causa realiza do disposto nos artigos 
 
 391.º‑D e 119.º, alínea f), do Código de Processo Penal põe em causa, conforme 
 resulta da presente exposição, de forma mediata mas evidente, as regras da 
 competência expressamente consagradas no artigo 102.º, n.º 1, da LOFTJ.
 Sufragando a interpretação do despacho em causa, a forma do processo e, de forma 
 mediata, a competência para o julgamento dos processos fica, além do mais, 
 dependente das contingências particulares da vida humana, pois será a agenda do 
 juiz, o tempo na distribuição e conclusão do processo pela Secção de processos, 
 eventuais atrasos dos CTT, baixas por doença dos titulares do respectivo 
 tribunal, licenças de maternidade ou paternidade, que determinarão ou não a 
 possibilidade da realização do julgamento no prazo de 90 dias a contar da 
 dedução da acusação, conforme actualmente previsto no artigo 391.º‑D do Código 
 de Processo Penal, e assim o emprego da forma especial do processo e a 
 competência do Tribunal de Pequena Instância Criminal para o julgamento.
 Ora, deste modo, a competência do tribunal fica sujeito a uma evidente 
 indeterminabilidade e a regra da competência pré‑fixada na lei a uma notória 
 subjectividade, em clara violação do artigo 32.º, n.º 9, da CRP.
 Neste âmbito, recorde‑se o que os doutos constitucionalistas citados referem a 
 este respeito: «A escolha do tribunal competente deve resultar de critérios 
 objectivos predeterminados e não de critérios subjectivos» (ibidem). A lei é 
 geral e abstracta, e tais pressupostos, em matéria de competência, fazem‑se 
 sentir no mais elevado dos planos jurídicos, o constitucional.
 Devido à importância da generalidade e abstracção na fixação das regras da 
 competência, donde emana o já invocado princípio do juiz natural ou legal, o 
 Código de Processo Penal não podia deixar de enquadrar violações a tais regras 
 nos mais intensos vícios processuais, ou seja, nos que consubstanciam nulidades 
 insanáveis, em concreto previsto no artigo 119.º, alínea e), do Código de 
 Processo Penal.
 Nem se diga, contra a interpretação que aqui se expõe, que a alteração da forma 
 do processo e, em consequência, da competência dos tribunais, vem reforçar os 
 direitos dos arguidos inicialmente submetidos ao julgamento em processo 
 abreviado, porquanto, actualmente, devido às alterações introduzidas pela Lei 
 n.º 48/2007, de 29 de Agosto, esta forma de processo deixou de prever o debate 
 instrutório, anteriormente previsto para esta forma do processo no artigo 
 
 391.º‑C, n.º 2, do Código de Processo Penal, sendo certo que, com a passagem à 
 forma do processo comum, o arguido volta a ter direito à instrução.
 Tal argumento, desde logo, enferma de um vício de lógica, porquanto, no caso 
 concreto, tendo sido o arguido notificado do despacho de acusação, deduzido sob 
 a forma abreviada, foi‑o ao abrigo da lei antiga, ou seja, quando tinha o 
 direito de requerer debate instrutório, não tendo o arguido usado de tal 
 faculdade.
 Entendemos, pois, que o despacho em causa, além de violar as normas da LOFTJ e 
 a norma da CRP já acima citadas, viola ainda o princípio da aplicação da lei 
 processual no tempo, que dispõe que a lei processual penal não deve ser aplicada 
 aos processos iniciados anteriormente à sua vigência, quando da sua 
 aplicabilidade imediata possa resultar quebra da harmonia e unidade dos vários 
 actos do processo, sendo certo que ao abrigo da anterior lei não resultava 
 qualquer agravamento sensível e ainda evitável da situação processual do 
 arguido, nomeadamente a limitação dos seus direitos de defesa (artigo 5.º, n.º 
 
 2, alíneas a) e b), do Código de Processo Penal).
 Em suma, o despacho proferido pelo M.mo Juiz, salvo melhor entendimento, mais 
 não faz do que pronunciar‑se, através da declaração da nulidade do emprego do 
 processo abreviado, de forma mediata e inconstitucional, sobre as regras da 
 competência dos tribunais comuns, anteriormente fixadas pelo legislador, 
 violando diversas normas da legislação ordinária que mais não visam do que dar 
 corpo ao princípio constitucional do juiz legal, consagrado no artigo 32.º, n.º 
 
 9, da Constituição.
 Neste contexto, a interpretação dada à norma contida no actual artigo 391.º‑D do 
 Código de Processo Penal, no sentido de que a inviabilidade da realização do 
 julgamento no prazo de 90 dias constitui uma nulidade insanável, que conduz, 
 por sua, vez, à alteração da competência dos tribunais, neste caso, do Tribunal 
 de Pequena Instância Criminal e dos Juízos Criminais de Lisboa, é, salvo melhor 
 entendimento, inconstitucional, por violar o disposto no artigo 32.º, n.º 9, da 
 Constituição.
 Assim sendo, aceitar a aplicação das normas contidas nos artigos 119.º, alínea 
 f), e 391.º‑D do Código de Processo Penal, na interpretação que lhes foi dada no 
 despacho em causa, e aceitando, assim, em consequência, a competência para o 
 julgamento dos presentes autos, constitui, quanto a nós, uma 
 inconstitucionalidade, que nos é vedada pelo mais elevado dever do juiz de 
 respeito à Constituição da República Portuguesa.
 Terá de ser pelo estabelecido nos artigos 391.º‑A e 391.º‑B que se considera 
 fixada a possibilidade do uso do processo especial abreviado e, em consequência, 
 terá de ser pela verificação dos pressupostos aí previstos que se considera 
 fixada a competência do Tribunal de Pequena Instância Criminal e Juízos 
 Criminais de Lisboa, em respeito pelas normas de competência previstas nos 
 artigos 100.º, 102.º, n.º 1, 22.º e 23.º da LOFTJ.
 Recorde‑se, para terminar, que aqueles dispositivos do Código de Processo Penal 
 dispõem:
 
 «Do processo abreviado
 Artigo 391.º‑A (Quando tem lugar)
 
 1 – Em caso de crime punível com pena de multa ou com pena de prisão não 
 superior a 5 anos, havendo provas simples e evidentes de que resultem indícios 
 suficientes de se ter verificado o crime e de quem foi o seu agente, o 
 Ministério Público, em face do auto de notícia ou após realizar inquérito 
 sumário, deduz acusação para julgamento em processo abreviado.
 
 2 – São ainda julgados em processo abreviado, nos termos do número anterior, os 
 crimes puníveis com pena de prisão de limite máximo superior a 5 anos, mesmo em 
 caso de concurso de infracções, quando o Ministério Público, na acusação, 
 entender que não deve ser aplicada, em concreto, pena de prisão superior a 5 
 anos.
 
 3 – Para efeitos do disposto no n.º 1, considera‑se que há provas simples e 
 evidentes quando, nomeadamente:
 a) O agente tenha sido detido em flagrante delito e o julgamento não puder 
 efectuar‑se sob a forma de processo sumário;
 b) A prova for essencialmente documental e possa ser recolhida no prazo previsto 
 para a dedução da acusação; ou
 c) A prova assentar em testemunhas presenciais com versão uniforme dos factos.
 Artigo 391.º‑B (Acusação, arquivamento e suspensão do processo)
 
 1 – A acusação do Ministério Público deve conter os elementos a que se refere o 
 n.º 3 do artigo 283.º. A identificação do arguido e a narração dos factos podem 
 ser efectuadas, no todo ou em parte, por remissão para o auto de notícia ou para 
 a denúncia.
 
 2 – A acusação é deduzida no prazo de 90 dias a contar da:
 a) Aquisição da notícia do crime, nos termos do disposto no artigo 241.º, 
 tratando‑se de crime público; ou
 b) Apresentação de queixa, nos restantes casos.
 
 3 – Se o procedimento depender de acusação particular, a acusação do Ministério 
 Público tem lugar depois de deduzida acusação nos termos do artigo 285.º.
 
 4 – É correspondentemente aplicável em processo abreviado o disposto nos 
 artigos 280.º a 282.º.»
 A forma do processo e, consequentemente, a competência do Tribunal de Pequena 
 Instância Criminal e Juízos Criminais de Lisboa fixa‑se, pois, de acordo com 
 estes dispositivos e não de acordo com o preceituado no artigo 391.º‑D do mesmo 
 diploma.
 Pelo exposto e decidindo:
 A) Recusa‑se, por inconstitucional, a interpretação dada aos artigos 119.º, 
 alínea f), e 391.º‑D do Código de Processo Penal e a sua subsequente aplicação, 
 no sentido de que a inviabilidade da realização do julgamento no prazo de 90 
 dias a contar da dedução da acusação constitui uma nulidade insanável, 
 porquanto tal conduz à alteração da forma de processo abreviado para a forma de 
 processo comum e, assim, de forma mediata, à alteração das regras prévias e 
 expressas que fixam a competência dos tribunais, neste caso, do Tribunal de 
 Pequena Instância Criminal e dos Juízos Criminais de Lisboa, em violação dos 
 artigos 22.º, 23.º, 100.º e 102.º, n.º 1, da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro, 
 artigo 119.º, alínea e), do Código de Processo Penal, e artigo 32.º, n.º 9, da 
 Constituição da República Portuguesa;
 B) Em consequência, declara‑se este tribunal incompetente para a realização do 
 julgamento e recusa‑se o recebimento destes autos.”
 
  
 O Ministério Público interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo 
 da alínea a), do n.º 1, do artigo 70.º, da Lei de Organização, 
 Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 
 
 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 13‑A/98, de 26 
 de Fevereiro (LTC), contra o despacho de 16 de Junho de 2008 do Juiz do 6.º 
 Juízo Criminal de Lisboa, que recusou, por inconstitucionalidade, a aplicação 
 das normas dos artigos 119.º, alínea f), e 391.º‑ D do Código de Processo Penal 
 
 (CPP), na interpretação segundo a qual “a inviabilidade da realização do 
 julgamento no prazo de 90 dias a contar da dedução da acusação constitui uma 
 nulidade insanável, conducente à alteração da forma de processo abreviado para a 
 forma de processo comum”.
 
  
 Neste Tribunal, o representante do Ministério Público apresentou alegações, com 
 a seguinte conclusão: 
 
 “Tendo em conta que a fundamentação que subjaz ao despacho recorrido se abriga 
 na violação de normas legais ordinárias, relativas à aplicação da lei no tempo 
 quanto aos requisitos da forma especial de processo, há que concluir, assim, não 
 se estar perante uma verdadeira questão de inconstitucionalidade normativa, pelo 
 que não deve tomar‑se conhecimento do recurso”.
 
  
 Esta posição foi alicerçada nas seguintes considerações:
 
 “…1. Como bem resulta dos autos, o que ressalta sem dúvida alguma, é uma 
 divergência, entre dois juízes, sobre a interpretação a conferir a uma lei nova 
 e as consequências que daí podem advir dessas interpretações.
 
 2. Com efeito, enquanto que o Juiz a quo (Tribunal Criminal) entende que a lei 
 nova não afecta a forma de processo que se iniciou antes da entrada em vigor 
 desta, já o juiz do TPIC não o entendeu assim, considerando que a «nova fórmula» 
 quanto à possibilidade de uso da forma de processo abreviado se aplicava desde 
 logo, retroagindo o efeito dessa lei nova.
 
 3. O Juiz do TPIC, no fundo, considera que uma alteração legal superveniente 
 determina, ipso facto, «erro» na forma de processo! E o Juiz do Tribunal 
 Criminal entende que não!
 
 4. Assim sendo, o fundamento (essencial) para a decisão tomada pelo Juiz a quo, 
 e por este invocada expressamente, é o da violação de comandos legais relativos 
 quer à competência dos Tribunais (v. g. artigos 22.º, 23.º, 100.º e 102.º, n.º 
 
 1, da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro), quer à «qualificação» de eventuais 
 
 «irregularidades» ou «ilegalidades» (v. g. artigo 119.º, alínea e), do CPP).
 
 5. Decorre ainda que o que é logicamente anterior, no pressuposto 
 interpretativo que subjaz a ambos os Tribunais, é tão‑somente (mas crucial), a 
 perspectiva legal sobre a aplicação da lei no tempo quanto às novas normas 
 relativas ao processo abreviado.
 
 6. Ora, e se assim é, não estamos perante uma verdadeira questão de 
 
 «inconstitucionalidade normativa», mas sim de dirimição ordinária entre duas 
 decisões judiciais (como se aponta, aliás, no ponto n.º 7, em I), quanto a um 
 verdadeiro conflito negativo de competências. (Registe‑se, aliás, que caso 
 tivesse transitado em julgado o despacho a quo, e seria esse o mecanismo que 
 deveria usar‑se para uma tal dirimição).
 
 7. Este Tribunal tem vindo a solidificar uma jurisprudência no sentido de que, 
 nesses casos, não estamos perante uma «questão de constitucionalidade 
 normativa». Com efeito, e para além de outros (vide Acórdãos n.º 489/2004, n.º 
 
 710/2004 e n.º 128/2005, todos deste Tribunal Constitucional), veja‑se o que, no 
 Acórdão n.º 210/2006, se exarou a esse propósito, a página 8: «Mas, ainda em 
 relação àquelas, é legítimo concluir que, ou não está sequer colocada uma 
 questão de constitucionalidade normativa ou, como já se explicitou supra, não o 
 está nos termos claros e perceptíveis que é exigível. Com efeito, a violação de 
 normas constitucionais referida nas conclusões LXIII a LXV visa apenas 
 corroborar a tese de que as escutas são nulas. Acresce que o recorrente, em 
 tais conclusões, insiste em afirmar que o próprio preceito de direito 
 infraconstitucional cuja constitucionalidade pretende ver apreciada – o artigo 
 
 188.º, n.º 1, do Código de Processo Penal –, terá sido ele mesmo violado. Ora, 
 como se afirmou, nomeadamente, nos Acórdãos n.ºs 489/2004 e 710/2004 e, mais 
 recentemente, no Acórdão n.º 128/2005 (todos disponíveis na página Internet do 
 Tribunal, em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/), ‘se se utiliza 
 uma argumentação consubstanciada em vincar que foi violado um dado preceito 
 legal ordinário e, simultaneamente, violadas normas ou princípios 
 constitucionais, tem‑se por certo que a questão de desarmonia constitucional é 
 imputada à decisão judicial, enquanto subsunção dos factos ao direito, e não ao 
 ordenamento jurídico infra‑constitucional que se tem por violado com essa 
 decisão, pois que se posta como contraditório sustentar‑se que há violação desse 
 ordenamento e [que] este é desconforme com o Diploma Básico. Efectivamente, se 
 um preceito da lei ordinária é inconstitucional, não deverão os tribunais 
 acatá‑lo, pelo que esgrimir com a violação desse preceito, representa uma 
 
 óptica de acordo com a qual ele se mostra consonante com a Constituição. Isto é, 
 se se sustenta que determinada postura é, simultaneamente, violadora de 
 preceitos do ordenamento jurídico infra‑constitucional e de normas 
 constitucionais só se pode concluir que se está a questionar a própria decisão 
 judicial e não a constitucionalidade dos preceitos ordinários.’ Mas, nesse caso, 
 
 é jurisprudência pacífica e sucessivamente reiterada que, não estando em causa 
 uma dimensão normativa do preceito legal aplicado na decisão, mas sim a própria 
 decisão em si mesma considerada, não há lugar ao recurso de fiscalização 
 concreta de constitucionalidade vigente em Portugal. Assim resulta do disposto 
 no artigo 280.º da Constituição e no artigo 70.º da Lei n.º 28/82, e assim tem 
 sido afirmado pelo Tribunal Constitucional em inúmeras ocasiões. Na verdade, 
 ainda que se entenda que, suscitada uma concreta questão de 
 inconstitucionalidade da decisão judicial recorrida, não poderão as instâncias 
 deixar de se pronunciar sobre tal matéria, o facto é que uma tal suscitação, por 
 não se tratar da suscitação de uma questão de inconstitucionalidade normativa, 
 não abre via de recurso para o Tribunal Constitucional.
 Assim sendo, seja porque se entende que não foi colocada uma questão de 
 constitucionalidade normativa, seja porque se conclui que não foi suscitada de 
 modo processualmente adequado a exacta questão de constitucionalidade da 
 interpretação normativa em causa, não pode o Tribunal conhecer do recurso nesta 
 parte.”
 
  
 O recorrido não apresentou contra‑alegações.
 
  
 Fundamentação
 
 1. Do conhecimento do objecto do recurso.
 A possibilidade de conhecimento do objecto do recurso é negada pelo próprio 
 recorrente, com o argumento de que a questão em causa não é “uma verdadeira 
 questão de inconstitucionalidade normativa”, “tendo em conta que a fundamentação 
 que subjaz ao despacho recorrido se abriga na violação de normas legais 
 ordinárias, relativas à aplicação da lei no tempo quanto aos requisitos da forma 
 especial de processo” abreviado.
 Pelas razões que já constam do acórdão desta mesma secção proferido no processo 
 nº 913/08, em que se discutia precisamente a mesma questão de conhecimento, não 
 se acompanha este entendimento.
 Como aí se escreveu:
 
 “É inegável que o despacho recorrido manifesta a sua discordância com a 
 interpretação e aplicação de normas de direito ordinário efectuadas pelo 
 despacho do juiz do Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa, de 4 de 
 Janeiro de 2008, no que concerne à qualificação como nulidade insanável, e não 
 como mera irregularidade, da eventual realização de audiência de julgamento em 
 processo abreviado para além do prazo de 90 dias contado a partir da dedução da 
 acusação, mas a sua fundamentação não se limita a essa manifestação de 
 discordância, ao nível da interpretação do direito ordinário, antes se alicerça 
 
 – e de forma determinante – no entendimento de que tal interpretação, além de 
 errónea, é violadora de normas e princípios constitucionais, designadamente do 
 
 “princípio do juiz natural”.
 A jurisprudência do Tribunal Constitucional, citada pelo recorrente, é, salvo o 
 devido respeito, imprestável para o presente caso. Todas as decisões citadas 
 
 (Acórdãos n.ºs 489/2004, 710/2004, 128/2005 e 210/2006) foram proferidas em 
 recursos interpostos ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC e 
 visavam aferir do correcto cumprimento, por parte dos recorrentes, do ónus de 
 adequada suscitação de uma questão de inconstitucionalidade normativa, 
 distinguindo‑a das situações em que a violação da Constituição é directamente 
 imputada a decisões judiciais, em si mesmas consideradas. E o que nesses 
 acórdãos se entendeu foi que, atento o específico condicionalismo que rodeou, em 
 cada um dos casos, a suscitação da questão de inconstitucionalidade, havia que 
 concluir que, ao acusar determinada decisão de violar o direito ordinário e 
 simultaneamente violar a Constituição, não se estava a suscitar uma questão de 
 inconstitucionalidade normativa, mas antes uma questão de 
 inconstitucionalidade da própria decisão judicial, inidónea a integrar o 
 objecto do recurso para o Tribunal Constitucional.
 O que, em rigor, distingue as situações em que se suscita uma questão de 
 inconstitucionalidade normativa das situações em que se suscita uma questão de 
 inconstitucionalidade de decisão judicial é que, naquelas, a violação da 
 Constituição é imputada a uma norma de direito ordinário, na sua directa 
 estatuição ou numa sua determinada interpretação, desde que dotada de 
 generalidade e abstracção, e, nestas, a desconformidade com a Lei Fundamental é 
 directamente reportada ao juízo concreto subsuntivo feito pela decisão judicial 
 em causa. Nesta perspectiva, nada obsta – e são incontáveis os casos que têm 
 sido decididos pelo Tribunal Constitucional – a que o recorrente repute errónea 
 a interpretação de determinada norma de direito ordinária, face às regras 
 hermenêuticas tidas por mais correcta, e simultaneamente questione a 
 constitucionalidade dessa interpretação, desde que dotada de generalidade e 
 abstracção. O que seria ilógico seria o recorrente dizer que a decisão judicial 
 não adoptou a correcta interpretação da norma e simultaneamente sustentar a 
 inconstitucionalidade dessa interpretação tida por correcta; mas já nenhuma 
 contradição intrínseca existe em sustentar‑se que a decisão judicial acolheu uma 
 interpretação (geral e abstracta) da norma que se considera incorrecta e que 
 essa incorrecta interpretação (desde que – repete‑se – dotada de abstracção e 
 generalidade) viola a Constituição, situação esta última em que não se 
 descortina qualquer obstáculo a que se repute adequadamente suscitada uma 
 questão de inconstitucionalidade normativa, cognoscível pelo Tribunal 
 Constitucional, mesmo no âmbito de recurso interposto ao abrigo da alínea b) do 
 n.º 1 do artigo 70.º da LTC.
 No presente caso, assume claramente natureza normativa o critério decisório cuja 
 aplicação foi recusada pela decisão recorrida com fundamento em 
 inconstitucionalidade. Trata‑se de um critério dotado de generalidade e 
 abstracção, susceptível de ser invocado perante uma multiplicidade de casos: em 
 todos os processos em que hajam decorrido mais de 90 dias sobre a dedução da 
 acusação em processo abreviado, devem os autos ser remetidos para processo 
 comum, sob pena de, com a realização da audiência de julgamento após esse prazo, 
 se cometer nulidade insuprível.
 Foi este critério normativo que o despacho ora recorrido se recusou a aplicar, 
 não apenas por o considerar incorrecto, ao nível da interpretação do direito 
 ordinário, mas por o reputar inconstitucional.
 Considera‑se, assim, que a questão que integra o objecto do presente recurso 
 assume carácter normativo, ao contrário do defendido pelo recorrente.
 O não conhecimento do recurso poderia ainda basear‑se no entendimento de que o 
 despacho recorrido assenta num duplo fundamento – incorrecção da interpretação 
 acolhida no despacho do Tribunal de Pequena Instância Criminal e 
 inconstitucionalidade do correspondente critério –, pelo que não existiria 
 interesse processual no conhecimento do recurso, dado que, mesmo que este 
 obtivesse provimento (julgando‑se não padecer de inconstitucionalidade o 
 apontado critério), o sentido da decisão manter‑se‑ia o mesmo, embora reduzido 
 ao primeiro fundamento.
 Também se julga improcedente esta questão prévia, quer por se entender que este 
 juízo de inutilidade é inaplicável aos recursos interpostos ao abrigo da alínea 
 a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, designadamente quando seja cabível (ou 
 inclusivamente já haja sido interposto) recurso ordinário na parte relativa ao 
 fundamento alternativo, quer por ser questionável que o primeiro “fundamento” 
 seja suficiente para sustentar a decisão final.
 
 ….
 Independentemente destas considerações, acresce que, no caso, é extremamente 
 duvidoso que o “fundamento” relativo à discordância quanto à interpretação do 
 direito ordinário fosse, por si só, suficiente para sustentar a decisão 
 recorrida. Na verdade, nada, no discurso desenvolvido ao longo dessa decisão, 
 permite dar por assente que o desfecho do caso seria o mesmo se a interpretação 
 tida por incorrecta não fosse também considerada inconstitucional. Pelo 
 contrário, a expressa alusão ao dever, ele também com assento constitucional, 
 de o juiz recusar a aplicação de normas inconstitucionais, inculca que foi essa 
 a razão determinante da recusa de aplicação do referido critério normativo. 
 Isto é: o autor da decisão recorrida não recusou acatar o critério normativo 
 seguido na anterior decisão por o considerar errado, face às regras de 
 interpretação do direito ordinário, mas por o reputar inconstitucional, 
 concluindo: “aceitar a aplicação das normas contidas nos artigos 119.º, alínea 
 f), e 391.º‑D do Código de Processo Penal, na interpretação que lhes foi dada no 
 despacho em causa, e aceitando, assim, em consequência, a competência para o 
 julgamento dos presentes autos, constitui, quanto a nós, uma 
 inconstitucionalidade, que nos é vedada pelo mais elevado dever do juiz de 
 respeito à Constituição da República Portuguesa”. Em coerência com este 
 entendimento, a parte decisória do despacho ora recorrida explicitamente se 
 centra na recusa de aplicação, por inconstitucionalidade, da aludida 
 interpretação.
 Refira‑se, por último, que não se afigura possível fundar o não conhecimento do 
 recurso em considerações relativas à maior ou menor adequação dos preceitos 
 legais a que a decisão recorrida reportou o critério normativo tido por 
 inconstitucional.
 Sendo inequívocos o sentido e alcance deste critério e os fundamentos da sua 
 recusa de aplicação, a discutibilidade da pertinência da invocação dos artigos 
 
 119.º, alínea f), e 391.º‑D do CPP, ou a eventualidade da existência de outros 
 preceitos legais cuja convocação surgisse como mais rigorosa (designadamente as 
 normas definidoras da repartição de competências dos tribunais como as dos 
 artigos 100.º, 102.º, n.º 1, 22º e 23º, da LOFTJ) não justificam uma decisão de 
 não conhecimento do recurso. Como se referiu no recente Acórdão n.º 92/2009 
 desta 2.ª Secção, “não é (…) da competência deste Tribunal alterar, em via 
 recursiva, os juízos aplicativos ao caso concreto, ratione materiae, do direito 
 ordinário, levados a cabo pelas instâncias”, pelo que, também no presente caso, 
 
 “o juízo de constitucionalidade que nos cabe emitir recairá sobre (…) as normas 
 acima referidas, declaradas inconstitucionais pela [decisão] recorrida e, em 
 conformidade, inaplicadas, especificamente mencionadas como objecto do recurso 
 pelo Ministério Público, no requerimento da sua interposição”.
 
  
 Importa, pois, apreciar o mérito da recusa de aplicação de interpretação 
 normativa efectuada pelo tribunal recorrido, com fundamento em 
 inconstitucionalidade.
 
  
 
 2. Do mérito do recurso
 A decisão recorrida considerou inconstitucional, por violar o princípio do juiz 
 natural (artigo 32.º, n.º 9, da C.R.P.), o entendimento perfilhado pelo Juiz do 
 Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa, segundo o qual a realização 
 da audiência de julgamento em processo especial abreviado com desrespeito do 
 prazo de 90 dias implicaria nulidade insuprível, e não mera irregularidade, pelo 
 que a ultrapassagem daquele prazo determinaria a alteração da forma de processo 
 abreviado para a forma de processo comum, com a consequente remessa dos autos 
 para julgamento, do Tribunal de Pequena Instância Criminal para o Tribunal 
 Criminal.
 O artigo 32.º, n.º 9, da C.R.P., determina que nenhuma causa pode ser subtraída 
 ao tribunal cuja competência esteja fixada em lei anterior.
 Esta proibição visa garantir que nenhuma causa seja julgada por um tribunal 
 designado ad hoc para esse efeito, devendo a sua competência resultar da 
 aplicação de leis gerais e abstractas (vide, sobre o alcance do princípio do 
 juiz natural, FIGUEIREDO DIAS, em “Sobre o sentido do princípio 
 jurídico-constitucional do “juiz-natural”, na R.L.J., Ano 111.º, pág. 83-88, e o 
 Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 614/2003, em “Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional”, 57.º vol., pág. 1223).
 Neste caso, a remessa dos autos para julgamento do Tribunal de Pequena Instância 
 Criminal de Lisboa para o Tribunal Criminal de Lisboa, resultou duma alteração 
 da respectiva forma do processo. Tendo seguido inicialmente a forma de processo 
 abreviado, cujo julgamento nos termos da L.O.F.T.J. (artigo 102.º, n.º 1) 
 compete aos Tribunais de Pequena Instância Criminal, por razões cuja validade 
 infra-constitucional não cabe a este tribunal apreciar, determinou-se que os 
 mesmos deveriam seguir a forma do processo comum, cujo julgamento nos termos da 
 L.O.F.T.J. (artigo 100.º) compete aos Tribunais Criminais. 
 A alteração do foro competente para o julgamento foi consequência, pois, da 
 aplicação das regras gerais e abstractas definidoras da competência funcional 
 dos diversos tribunais criminais que integram a organização judiciária 
 portuguesa, e não de uma qualquer determinação discricionária de um tribunal 
 para julgar este processo, pelo que não se mostra violada a proibição contida no 
 artigo 32.º, n.º 9, da C.R.P..
 A igual conclusão se chegou em caso idêntico no acórdão proferido por este 
 Tribunal no processo n.º 913/08.
 Por este motivo deve ser julgado procedente o recurso interposto pelo Ministério 
 Público, não se julgando inconstitucional o critério normativo recusado pela 
 decisão recorrida e determinando-se a sua consequente reformulação.
 
  
 
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 Decisão
 Pelo exposto, julga-se procedente o recurso e, em consequência decide-se:
 a) Não julgar inconstitucional o critério normativo extraído dos artigos 119.º, 
 alínea f), e 391.º‑ D, do Código de Processo Penal, segundo o qual a 
 inviabilidade da realização do julgamento em processo abreviado no prazo de 90 
 dias a contar da dedução da acusação constitui uma nulidade insanável, 
 conducente à alteração da forma de processo abreviado para a forma de processo 
 comum, com a consequente remessa dos autos, para julgamento, do Tribunal de 
 Pequena Instância Criminal para o Tribunal Criminal.
 b) Determinar a reformulação da decisão recorrida, em conformidade com o 
 precedente juízo de constitucionalidade.
 
  
 
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 Sem custas.
 Lisboa, 25 de Março de 2009
 João Cura Mariano
 Benjamim Rodrigues
 Mário José de Araújo Torres
 Joaquim de Sousa Ribeiro
 Rui Manuel Moura Ramos