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Processo n.º 317/09
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Vítor Gomes
 
 
 
             Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
 
 
 1. O relator proferiu a seguinte decisão ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A da 
 Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC):
 
  
 
 “1. A., interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea c) 
 do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), do acórdão do 
 Supremo Tribunal Administrativo (Secção do Contencioso Administrativo) de 17 de 
 Novembro de 2007.
 Por esse acórdão foi decidido “rejeitar a aplicação do artigo 7.º, n.º 1, alínea 
 a), da Portaria n.º 936-A/99 por violação de norma de hierarquia superior, como 
 
 é a Base II, n.º 3, da Lei n.º 2125, e, em consequência, conceder provimento a 
 recurso contencioso interposto pela ora recorrida particular.
 
 2. O recurso foi admitido (vid. Fls. 717). Mas não pode prosseguir, o que 
 imediatamente se decide, nos termos do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC.
 Com efeito, ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC cabe recurso 
 para o Tribunal Constitucional das decisões dos demais tribunais que recusem a 
 aplicação de norma constante de acto legislativo, com fundamento na sua 
 ilegalidade por violação de lei com valor reforçado.
 Ora, a norma cuja aplicação o acórdão recorrido recusou com fundamento em 
 ilegalidade é uma norma regulamentar. Não consta de um acto legislativo, mas de 
 um acto do poder normativo da Administração. Com efeito, são actos legislativos 
 as leis, os decretos-leis e os decretos legislativos regionais (artigo 112.º, 
 n.º 1, da Constituição). E só estes o são (n.º 5 do cit. artigo 112.º da CRP) 
 também para efeito da competência do Tribunal Constitucional a que se refere o 
 fundamento de recurso invocado. 
 Assim, sendo manifesto que o recurso não pode ser admitido por esta primeira 
 razão, torna-se inútil qualquer outra averiguação, designadamente quanto a saber 
 se a disposição que fundou o juízo de ilegalidade a que o Supremo tribunal 
 Administrativo chegou é “lei de valor reforçado”.
 
 3. Decisão
 Pelo exposto, decide-se não tomar conhecimento do objecto do recurso e condenar 
 a recorrente nas custas, fixando a taxa de justiça em 7 (sete) UCs.”
 
 2. O recorrente reclamou para a conferência com os seguintes fundamentos:
 
  
 
 “A., recorrida particular no recurso interposto no processo à margem 
 referenciado pela recorrente B., e aqui recorrente no processo perante o 
 Venerando Tribunal Constitucional, tendo sido notificada da douta decisão 
 sumária que antecede, vem, nos termos do artº. 78º-B/3 da LTC, muito 
 respeitosamente DELE RECLAMAR PARA CONFERÊNCIA, o que faz louvando-se no 
 seguinte: 
 Foi decidido no douto antecedente despacho não tomar conhecimento do recurso 
 porque a norma cuja constitucionalidade se põe em causa é uma norma regulamentar 
 e não uma norma constante de acto legislativo. 
 Todavia está em causa, nos termos desenhados no requerimento de interposição do 
 recurso, a interpretação que dessa norma se fez e a sua adequação substancial 
 aos preceitos da Lei nº. 2125, designadamente ao nº. 3 da Base II dela. 
 Esta norma é uma norma constante de acto legislativo e a interpretação conjugada 
 dela com a Portaria 936-A/99, resultou numa decisão inconstitucional até por 
 violar também o disposto nos artigos 53º. e 58º. da Constituição porque retirar 
 o direito de propriedade de farmácia a farmacêutico há mais de 30 anos titular 
 de estabelecimento único é na prática vedar-lhe o acesso ao trabalho. 
 A douta decisão sumária não apreciou o tema decidendum nesta perspectiva pelo 
 que modestamente entende a recorrente assistir-lhe o direito de pronúncia nesse 
 sentido. 
 Termos em que, pede que no acolhimento desta reclamação, se sigam os ulteriores 
 termos designadamente os do art.º 78.º-B/5 da LTC.” 
 
  
 
  
 
             A recorrida sustenta que a decisão reclamada deve ser mantida, pelos 
 seus fundamentos.
 
  
 
 3. No recurso para o Tribunal Constitucional o recorrente tem o ónus de, logo no 
 requerimento de interposição, indicar a alínea do n.º 1 do artigo 70.º da LTC ao 
 abrigo do qual o recurso é interposto e a norma cuja inconstitucionalidade ou 
 ilegalidade se pretende que o Tribunal aprecie (n.º 1 do artigo 75.º-A da LTC).
 
             A recorrente procurou cumprir este ónus indicando a alínea c) do n.º 
 
 1 do artigo 70.º como fundamento (processual, “caso de abertura”) do recurso. E 
 como causa ou decisão-pretexto a recusa de aplicação do artigo 7.º, n.º 1, 
 alínea a) da Portaria n.º 936‑A/99, de 22 de Outubro, na interpretação que a 
 recorrente defendia, a que o acórdão recorrido procedeu com fundamento em “ 
 violação da norma de hierarquia superior, como é a Base II, n.º 3, da Lei n.º 
 
 2125 [de 20 de Março de 1965]”. 
 
 É manifesto que esta não é uma questão de ilegalidade de norma constante de acto 
 legislativo, primeira condição para que seja admissível a intervenção do 
 Tribunal Constitucional ao abrigo da citada alínea c) do n.º 1 do artigo 70.º, 
 pelo que a decisão recorrida não pode deixar de ser confirmada.
 
  
 
 4. Argumenta a reclamante que, da conjugação da norma do n.º 3 da Lei n.º 2125 
 com a Portaria n.º 939-A/99, a que o tribunal a quo procedeu, resultou “uma 
 decisão inconstitucional por violar também o disposto nos artigos 53.º e 58.º da 
 Constituição, porque retirar o direito de propriedade de farmácia a farmacêutico 
 há mais de 30 anos titular de estabelecimento único é na prática vedar-lhe o 
 acesso ao trabalho”. E que a decisão sumária não considerou esse thema 
 decidendum, justificando-se que o recurso prossiga para a sua apreciação.
 
  
 Esta pretensão não pode ser atendida, não só pelo que já se disse quanto ao 
 objecto do recurso que o requerimento de interposição define, mas também porque 
 não corresponde ao modelo de acesso ao Tribunal Constitucional instituído pelo 
 nosso sistema jurídico.
 Resulta da Constituição (artigo 280.º da CRP) e da Lei (artigo 70.º da LTC), que 
 a competência do Tribunal Constitucional, seja no controlo de 
 constitucionalidade, seja na apreciação de ilegalidade por violação de lei de 
 valor reforçado, versa sobre normas que os demais tribunais apliquem ou a que 
 recusem aplicação com qualquer desses fundamentos qualificados. O recurso de 
 constitucionalidade português não é meio ordenado ao escrutínio da 
 constitucionalidade da decisão do tribunal a quo, designadamente por violação de 
 direitos fundamentais como sucede na Espanha (recurso de amparo) ou na Alemanha 
 
 (Verfassungsbshwerde), mas à apreciação da conformidade à Constituição de uma 
 certa norma infraconstitucional que seja relevante para a decisão do caso. 
 
  
 
 5. Decisão
 
             
 Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação e condenar a recorrente nas 
 custas, fixando a taxa de justiça em 20 (vinte) UC.
 Lx, 8/6/2009
 Vítor Gomes
 Ana Maria Guerra Martins
 Gil Galvão