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Processo n.º 623/06
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Vítor Gomes
 
  
 
  
 
  
 
  
 Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
                  1. A. foi condenado, por acórdão de 28 de Novembro de 2005 
 
 (fls. 222-233) do Tribunal da Relação de Guimarães, pela prática de um crime 
 previsto e punido pelo n.º 2 do artigo 30.º da Lei n.º 173/99, de 21 de Setembro 
 
 (LBGC), por exercício de caça em zona de caça à qual não tinha legalmente 
 acesso, na pena de 70 dias de multa à taxa diária de €10. Arguiu nulidades do 
 acórdão condenatório, que foram indeferidas por acórdão de 6 de Fevereiro de 
 
 2006 (fls. 257-258). Interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, que 
 não foi admitido (despacho de fls 275). Reclamou da não admissão do recurso para 
 o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça. A reclamação foi indeferida por 
 despacho de 18 de Maio de 2006 (fls 349-351). 
 Por requerimento de 1 de Junho de 2006, o recorrente interpôs recurso para o 
 Tribunal Constitucional, que não foi admitido, por despacho de 7 de Junho de 
 
 2006, no entendimento de que “tendo o arguido optado pela via ordinária e 
 deixando, por isso de interpor recurso do acórdão [da ]Relação para o Tribunal 
 Constitucional, não pode agora fazê-lo, por já não estar em tempo”.
 
  
 
  
 
                  2. O recorrente reclamou deste despacho, ao abrigo do n.º 4 do 
 artigo 76.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), com fundamento em que:
 
 “(…) quer se entenda que o arguido renunciou ao recurso da inconstitucionalidade 
 suscitada perante o Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do disposto no, já 
 aludido, art.º 70.º, n.º 4 da LTC,
 quer se entenda que o poder jurisdicional se esgotou na data da notificação do 
 despacho de indeferimento da aludida reclamação, ou seja em 22 der Maio,
 quer, ainda, se entenda que não deve relevar a evocada renúncia, sempre 
 haveríamos de considerar que o arguido ainda estava dentro do prazo para 
 interpor recurso para o Tribunal Constitucional, em virtude de a decisão de 
 indeferimento da reclamação do Supremo Tribunal de Justiça só haver transitado 
 em Julgado em 06 de Junho do corrente.”
 
  
 
  
 
                  3. O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido 
 de que o recurso é tempestivo, nos termos do n.º 2 do artigo 75.º da LTC, uma 
 vez que foi interposto nos 10 dias seguintes ao trânsito em julgado da decisão 
 da reclamação da decisão que não admitiu o recurso para o Supremo Tribunal de 
 Justiça. Mas pronunciou-se no sentido do indeferimento da presente reclamação, 
 com os seguintes fundamentos:
 
  
 
 “A presente reclamação carece de fundamento. Assim – e partindo do pressuposto 
 de que a decisão que se pretendia impugnar era efectivamente o acórdão proferido 
 pela Relação sobre o mérito da causa ( no momento em que se mostravam 
 inelutavelmente exauridos os “recursos ordinários possíveis”, em consequência da 
 rejeição da reclamação apresentada ao Presidente do STJ) – verifica-se que:
 
 - tal acórdão não aplicou obviamente a norma constante do art.º 400.º do CPP (a 
 qual foi naturalmente aplicada por outra decisão, a proferida no procedimento de 
 reclamação);
 
 - é perfeitamente descabida a invocação do tipo acusatório previsto na alínea i) 
 do n.º 1 do art.º 70.º da Lei n.º 28/82.
 Relativamente às questões de inconstitucionalidade e de ilegalidade 
 
 “qualificada”, colocadas pelo recorrente nas alíneas A), B) e C) do seu 
 requerimento de fls. 284 e segs., é patente que – ao contrário do sustentado – o 
 recorrente não suscitou – em termos processualmente adequados e no momento 
 processual próprio (o da apresentação da contramotivação do recurso interposto 
 pelo MºPº da decisão absolutória e da resposta ao “visto” exarado pelo 
 representante do MºPº junto da Relação) qualquer questão de 
 inconstitucionalidade normativa, susceptível de servir de base ao recurso 
 ulteriormente interposto para este Tribunal Constitucional (cfr. fls. 184/192 e 
 
 215/216). Por outro lado – e não constituindo obviamente o acórdão da Relação de 
 Guimarães, que julgou procedente o recurso do MºPº da decisão absolutória, 
 proferida na 1ª instância, uma “decisão-surpresa”, de conteúdo insólito ou 
 imprevisível face à argumentação expendida pelo M.ºP.ª/recorrente – é obviamente 
 intempestiva e irrelevante a suscitação de questões de constitucionalidade 
 apenas no âmbito da arguição de pretensas nulidades do acórdão da Relação, num 
 momento em quer estava esgotado o poder jurisdicional daquele Tribunal.
 Nestes termos, somos de parecer que a presente reclamação deverá improceder, 
 embora por fundamento diverso do apontado na decisão reclamada.”
 
  
 
  
 
                  Ouvido, o recorrente sustenta que este parecer não deve ser 
 acolhido, argumentando que as questões suscitadas pelo Ministério Público 
 extravasam o objecto da presente reclamação.
 
  
 
  
 
 4. Relevam para decisão da reclamação os factos e ocorrências processuais 
 seguintes:
 a)        O recorrente foi acusado pelo M.º P.º no Tribunal Judicial da Comarca 
 de Esposende pela prática de “um crime de exercício ilegal de caça, p. e p. 
 pelas disposições conjugadas dos artºs. 30.º, nºs 1 e 2, da Lei n.º 173/99, de 
 
 21/09, e 52.º, n.º 2, do DL n.º 227-B/2000, de 15/09, na redacção do DL n.º 
 
 338/2001, de 26/12”.
 b)       Foi absolvido, por sentença de 27 de Abril de 2005;
 c)        O M.º P.º interpôs recurso desta sentença;
 d)       Na resposta à motivação do recurso do M.ºP.º, o recorrente concluiu, 
 além do mais:
 
 “1. A conduta do arguido, que se provou em sede de audiência e julgamento, não é 
 subsumível a quaisquer normas da natureza criminal prevista na Lei de Bases 
 Gerais da Caça
 
 2. As normas invocadas pelo representante do Ministério Público, e que 
 sustentaram a acusação, já se encontravam revogadas, à data da acusação, pelo 
 Dec.-Lei n.º 202/2004, de 18/08.
 
 3. A serem interpretadas as normas (revogadas) da acusação, não sentido que lhe 
 
 é conferido pelo Ministério Público, então teria de se concluir que face à 
 despenalização da conduta operada pelo legislador ordinário, estava extinta a 
 responsabilidade penal do arguido”.
 
  
 e)        Por acórdão de 28 de Novembro de 2005, o Tribunal da Relação de 
 Guimarães concedeu provimento a recurso interposto pelo MºPº e condenou o 
 recorrente pela prática de um crime previsto e punido pelo n.º 2 do artigo 30.º 
 da Lei n.º 173/99, de 21 de Setembro (LBGC), por exercício de caça em zona de 
 caça à qual não tinha legalmente acesso, na pena de 70 dias de multa à taxa 
 diária de €10, dizendo no acórdão, além do mais que “conduta do arguido integra 
 plenamente a previsão do art.º 30.º, n.º 2, parte final, pois exercia a caça 
 numa zona à qual não tinha legalmente acesso para o efeito e dizendo-se desde já 
 que é indiferente, em termos de benefício, a consideração do regime regulamentar 
 aplicável – o do Decreto-Lei n.º 227‑B/00, de 15 de Setembro, então em vigor, ou 
 o do Decreto-Lei n.º 202/04, de 18 de Agosto –, pois os regulamentos não criam 
 nem modificam tipos legais e, ao contrário do que parece defender o arguido, nem 
 aqueles em concreto o fazem”.
 
  
 f)          O reclamante arguiu nulidades deste acórdão, sustentando além do 
 mais:
 
 “II — Da inconstitucionalidade da interpretação da norma prevista no n.° 2 do 
 art. 30 da Lei de Bases Gerais da Caça.
 O acórdão ora posto em crise não acolheu a interpretação dada pelo Tribunal de 
 
 1.ª instância às normas previstas no n.° 2 do art. 30.° da LBGC.
 Ao invés, considerou que «...a Mm.a Juíza cometeu diversas contradições … que 
 traduzem patentes erros de julgamento de facto e de direito e que poderiam 
 motivar a anulação do julgamentos.» (o sublinhado é nosso). 
 Contudo, em momento alguns no acórdão se vê em que ponto da interpretação dada à 
 norma pela Meritíssima Juíza se evidência o alegado erro de julgamento de 
 direito.
 Ora, temos para nós que a interpretação dada as normas previstas no n.° 2 do 
 art. 30.° da LBGC, pelo Tribunal de 1.ª instância, é uma interpretação conforme 
 a Constituição.
 Tanto mais que a decisão de 1ª instância faz uma concisa análise dos bens 
 jurídicos que a norma visa proteger, concluindo pela interpretação dessas normas 
 num determinado sentido. 
 No entanto, o acórdão agora proferido, além de apenas fazer uma mera referência 
 telegráfica à interpretação dada à norma pela Meritíssima Juíza, nada refere, 
 analisa, ou sequer invoca, sobre os bens jurídicos que a norma visa proteger;
 Mais, nem indica quaisquer outros bens jurídicos, com dignidade constitucional, 
 que pudessem prevalecer ou compatibilizar-se com aqueles que a Meritíssima Juíza 
 convoca. 
 Decorre, assim, por isso, duas consequências fundamentais para a validade e 
 justiça da decisão agora proferida: por um lado uma clara omissão de pronúncia, 
 sobre os fundamentos de direito, que inquina o acórdão de nulidade absoluta, nos 
 termos do art.º 379.° n.° 1, al. c), aplicado por força do art. 425.° do 
 C.P.Penal); por outro uma interpretação da norma manifestamente 
 inconstitucional, por violação do art. 1.º do C.Penal e do n.° 1, do art. 29.°, 
 da Constituição.
 Nestes termos, deve pois ser considerado nulo o acórdão agora proferido e, por 
 isso, revogado, e em decorrência ser repristinada a decisão proferida em 1.ª 
 instância.
 III - DA INCONSTITUCIONALIDADE E DA ILEGALIDADE DA NORMA DO ART. 52°, n.° 2, DO, 
 AGORA, DECRETO-LEI N.° 201/2005, DE 24/11.
 Invocou, também, o arguido na sua contestação à acusação do Ministério Público, 
 a inconstitucionalidade e a ilegalidade da norma do art.° 52.º, n.° 2 do, 
 Decreto que regulamenta a LBGC, na interpretação que lhe foi dada na acusação 
 pública.
 Porém, o acórdão agora em causa nada apreciou sobre a inconstitucionalidade e 
 ilegalidade do art.° 52.°, n.° 2, pois é evidente que, quanto a estes vícios da 
 norma, nada aí se refere.
 Contudo, o mesmo acórdão não deixa de referir que « A Mm.ª Juíza …concluiu 
 erradamente que às zonas de caça municipais a lei não impõe a necessidade de 
 consentimento...» retomando aqui, claramente, o argumento do Representante do 
 Ministério Público, segundo o qual haveria que se verificar o consentimento da 
 Entidade gestora para o exercício da caça na ZCM, nos termos do disposto no já 
 referido art. 52.° do Decreto que regulamenta a LBGC.
 Donde, convocada que foi essa norma, para a incriminação da conduta, importava 
 que o acórdão se pronunciasse sobre a alegada inconstitucionalidade e 
 ilegalidade suscitada pelo arguido na sua contestação.
 Tanto mais que, a decisão de 1.ª instância considerou que o n.° 2 do art.° 52.°, 
 não tinha que ser convocado para preencher a norma prevista no art.° 30.º n.° 2 
 da LBGC, nos termos em que o tinha efectuado o Representante do Ministério 
 Público.
 Tendo, ainda, considerado aquele Tribunal, nesta sede, pela razão que antecede, 
 que aquela norma não era ilegal por violação de lei de valor reforçado, 
 porquanto, segundo a interpretação da Meritíssima Juíza, a norma não tem 
 qualquer sanção e não esclarece qual a consequência jurídica em caso de violação 
 desta.
 Ora, sobre isto o acórdão em apreço nada nos diz, antes guarda um ensurdecedor 
 silêncio, apesar de, sem qualquer pudor, vir convocar o consentimento previsto 
 nessa mesma norma do Decreto-lei que regulamenta a LBGC, para fundamentar a 
 criminalização da conduta do arguido.
 Nestes termos, também aqui se observa uma clara omissão de pronúncia que inquina 
 o acórdão de nulidade absoluta, bem como uma interpretação da norma do art.° 
 
 52.° n.° 2, do Decreto-Lei que regula a LBGC, manifestamente inconstitucional e 
 ilegal, por violação dos artigos, 112.°, n.° 3, 165.° nº.1 al. c) e 280° n.° 2 
 al. d), da Constituição. 
 
  
 g)        O que foi indeferido por acórdão de 6 de Fevereiro de 2006.
 h)       O recorrente, dizendo não se conformar “com o douto acórdão proferido 
 em 06 de Fevereiro de 2006, onde se indefere a pedido de nulidades do acórdão 
 proferido em 28 de Novembro de 2005”, interpôs recurso para o Supremo Tribunal 
 de Justiça, recurso este que não foi admitido, por despacho de 8 de Março de 
 
 2006.
 i)          O recorrente reclamou deste despacho para o Presidente do Supremo 
 Tribunal de Justiça, tendo a reclamação sido indeferida por despacho do 
 Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Maio de 2006, do 
 seguinte teor:
 
  
 
 “O arguido A. interpôs recurso para este Supremo Tribunal de Justiça do acórdão 
 proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães que indeferiu a arguição de 
 nulidades imputadas ao acórdão condenatório contra ele proferido.
 Por despacho do Ex.mo Desembargador Relator, esse recurso não foi admitido, nos 
 termos do art. 400.°, n.° 1, alínea e), do CPP.
 Desse despacho reclama o recorrente sustentando, além do mais, que a não 
 admissão do recurso quando esteja em causa acórdão condenatório proferido pela 
 Relação, que não confirmou a decisão absolutória proferida em lª instância, onde 
 houve manifesto erro judiciário e o incumprimento de regras processuais e 
 procedimentais, viola os arts. 20.°, n.° 4, 32.°, 1, e 205.° da CRP e 6.º da 
 Convenção Europeia dos Direitos do Homem; termina invocando a 
 inconstitucionalidade do art. 400.°, n.° 1, alínea e), do CPP.
 II. Cumpre apreciar e decidir.
 Na hipótese em análise, está em causa um acórdão do Tribunal da Relação que 
 indeferiu a arguição de nulidades, deduzida pelo ora reclamante.
 Tal pedido reporta-se ao acórdão condenatório proferido pela Relação que alterou 
 a decisão da ia instância, condenando o arguido pela prática do crime p. e p. no 
 art. 30.º, n.° 2, da Lei de Bases Gerais da Caça, na pena de 70 dias de multa à 
 taxa diária de € 10,00. 
 O acórdão de 06.02.2006 da Relação, ora recorrido, conheceu das nulidades 
 imputadas a acórdão anterior da mesma Relação. E essa nulidade foi correctamente 
 arguida perante a Relação, atento o disposto no art. 668.°, n.° 3, do CPC, 
 aplicável ex vi do art. 4º do CPP, porque do acórdão da Relação não podia haver 
 recurso, nos termos do art. 400.º, n.° 1, alínea e), do CPP, (cf neste sentido o 
 Acórdão do S.T.J. de 19.01 2005, in CJ, Acórdãos do S.T.J, Ano XIII, Tomo 1, p. 
 
 173).
 E, respeitando a invocação das nulidades a um acórdão irrecorrível, não passa a 
 ser recorrível a decisão que as apreciou, porque se trata de um processo por 
 crime a que é aplicável pena de multa ou de prisão não superior a cinco anos.
 Quanto ao direito ao recurso, cabe dizer que o princípio da tutela jurisdicional 
 efectiva a que alude o art. 20º, n.° 1, da CRP se concretiza através da 
 instância única, só se impondo o direito ao recurso em processo criminal, nos 
 termos do n.º 1 do art.° 32° da CRP.
 E, mesmo neste caso, segundo o Acórdão do T.C. n.º 209/90, de 19-06-90, BMJ, 
 
 398, p. l52, “...o princípio constitucional das garantias de defesa apenas impõe 
 ao legislador que consagre a faculdade de os arguidos recorrerem das sentenças 
 condenatórias, e bem assim o direito de recorrerem de quaisquer actos judiciais 
 que, no decurso do processo, tenham como efeito a privação ou restrição da 
 liberdade ou de quaisquer outros dos seus direitos fundamentais”.
 Ora, não é desse tipo a decisão que se pretende seja apreciada por este S.T.J., 
 uma vez que se reporta a um problema de nulidades de acórdão. 
 E também a não admissão do recurso não viola o art. 6° da Convenção Europeia dos 
 Direitos do Homem, por a questão que o ora reclamante submeteu à apreciação 
 jurisdicional ter sido objecto de um processo equitativo, que, para o ser, não 
 impõe a intervenção do tribunal de revista.
 Por último, no respeitante à inconstitucionalidade imputada ao art. 400.°, n.° 
 
 1, alínea e) do CPP, em que se apoia o despacho reclamado, refere-se que 
 Tribunal Constitucional já apreciou esta questão, no acórdão n.° 49/2003, de 29 
 de Janeiro (DR, II Série, de 16.04.2003), concluindo pela não 
 inconstitucionalidade do art. 400.°, n.° 1, alínea e), do CPP.
 Diz-se neste acórdão, na parte que releva, que não desrespeita o n.° 1 do art. 
 
 32.°da CRP a norma da alínea e) do n.° 1 do art. 400.° do CPP, quando 
 interpretada no sentido de não admitir o recurso para o STJ a decisão 
 condenatória proferida pela Relação em recurso de decisão absolutória da 1ª 
 instância, por o acórdão da Relação consubstanciar a garantia do duplo grau de 
 jurisdição, tendo em conta que perante ela o arguido tem a possibilidade de 
 expor a sua defesa.
 III. Pelo exposto, indefere-se a presente reclamação. Custas pelo reclamante, 
 com a taxa de justiça de 3 UC.
 Notifique. “
 
  
 j)          O recorrente foi notificado deste despacho por carta registada de 19 
 de Maio de 2006.
 k)       Em 1 de Junho de 2006, o recorrente interpôs recurso para o Tribunal 
 Constitucional, por requerimento do seguinte teor:
 
  
 
 “A., recorrente nos autos do processo crime comum identificado em epígrafe, vem 
 ao abrigo do disposto nas als. b), f) e i), n.° 1, do Art.° 70.°, da Lei do 
 Tribunal Constitucional — Lei n.° 28/82, de 15/11, com as sucessivas alterações 
 
 –, interpor recurso para este Venerando Tribunal, da interpretação de normas, no 
 sentido acolhido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, em sede de decisão 
 condenatória, que desconsiderou decisão de absolvição em primeira instância 
 emanada do Tribunal Judicial da Comarca de Esposende, no âmbito do processo n.° 
 
 1068/03.3GAEPS, 1.° Juízo.
 A interpretação das normas cuja inconstitucionalidade e ilegalidade se pretende 
 que o Tribunal Constitucional aprecie e declare é as seguintes:
 A – A norma contida na al.b) do art. 137.°, do Decreto-Lei n.° 202/2004, de 
 
 18/08, que revogou o Decreto-Lei n.° 227-B/220, de 15/09, quando interpretada no 
 sentido acolhido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, segundo o qual não tem a 
 virtualidade de descriminalizar a conduta a que se refere o Artigo 30.º, n.º 2, 
 da Lei n,º 173/99, de 21/09 – Leis de Bases Gerais (LBGC).
 Normas violadas: art. 2°, n.° 2, do Código Penal e art. 29°, n.° 4, da 
 Constituição. B- A norma contida no Artigo 30.°, n.° 2, da Lei n.° 173/99, de 
 
 21/09, da LBGC, quando interpretado no sentido, segundo o qual um caçador 
 arrendatário de terrenos, inseridos em zona de caça municipal, reunindo todos os 
 requisitos de acesso, não tem legalmente acesso a caçar nessa mesma zona de 
 caça, sem prévio “consentimento” da Entidade Gestora da respectiva Zona de Caça 
 Municipal. Normas violadas: art. 17.°, n.° 1, da LBGC, art. 1.º do Código Penal 
 e art. 29.°, n.° 1, da Constituição.
 C - A norma compreendida no artigo 52.°, n.° 2, do Dec. Lei n.° 227- B/2000, de 
 
 15-09, com as alterações efectuadas pelo Dec. –Lei n.° 338/2001, de 26-12, 
 quando interpretado no sentido acolhido no acórdão recorrido, segundo o qual a 
 violação do consentimento de quem de direito para caçar nas zonas de caça 
 previsto no artigo 30.°, n.° 2, da Lei n.° 173/99, de 21/09, da LBGC, é 
 aplicável às zonas de caça municipais.
 Normas violadas: art. 17°, n° 1 e art. 30.°, da LBGC, art. 1.º do C. Penal e 
 art. 29.°, n.° 1, 112.°, n.° 2 e 3, 165.° n.1 al.c), da Constituição.
 D – A norma compreendida, na al. e), do art. 400.° do C.P.Penal, quando 
 interpretada no sentido acolhido pelo do Supremo Tribunal de Justiça, em sede de 
 reclamação para o seu Juiz Presidente, segundo o qual não é admissível recurso 
 de acórdãos proferidos, em recurso pelas relações, em processo por crime a que 
 seja aplicável pena de multa ou pena de prisão não superior a cinco anos, mesmo 
 em caso de concurso de infracções, ou em que o Ministério Público tenha usado da 
 faculdade prevista no art.° 16.°, n.° 3, mesmo nos casos de acórdãos 
 condenatórios que não confirmem a decisão proferida em 1.º instância, em que 
 haja reapreciação da prova, e havendo lugar à arguição das nulidades previstas 
 nos artºs, 379.º e 425.º, n.º 4 do C.P.Penal.
 Normas Violadas: Art. 20.°, n.° 4, art. 32.°, n.° 1 e art. 205.° da 
 Constituição, e art. -6.°, da Convenção Europeia dos Direito do Homem, aplicável 
 ex vi art. 8.°, n.1 e 2, art. 16.°, n.° 1 e 2, da Constituição.
 Invocação de inconstitucionalidade e ilegalidade da interpretação de normas que 
 foram suscitadas, -nas seguintes peças processuais:
 A – em sede de resposta a recurso interposto pelo Ministério Público da decisão 
 absolutória proferida em primeira instância, e em requerimento de pedido de 
 nulidade de Acórdão perante o Tribunal da Relação de Guimarães.
 B – em requerimento de pedido de nulidade de Acórdão perante o mesmo Tribunal da 
 Relação de Guimarães.
 C – em sede de contestação à acusação pública proferida no Tribunal Judicial de 
 Esposende, e em requerimento de pedido de nulidade de Acórdão perante o mesmo 
 Tribunal da Relação de Guimarães.
 D – em requerimento de pedido de nulidade de Acórdão perante o Tribunal da 
 Relação de Guimarães, em sede admissão de recurso para o Supremo Tribunal de 
 Justiça e em sede de reclamação perante o Juiz Presidente do Supremo Tribunal de 
 Justiça. 
 
  
 l)          Sobre este requerimento recaiu o seguinte despacho [ ora reclamado] 
 
 :
 
  
 
 “A fls. 222 e ss. com data de 28-11-05, foi proferido o acórdão correspondente 
 ao recurso interposto pelo arguido e que lhe foi notificado em 29-11-05. 
 Desse acórdão, veio o arguido, em 13-12-05, arguir nulidades, as quais foram 
 conhecidas pelo acórdão de fls. 257 e ss, de 06-02-06, notificado em 07-02-06. 
 A fls. 262 e ss., o arguido veio interpor recurso para o Supremo Tribunal de 
 Justiça, o qual, como se vê de fls. 275, não foi recebido. 
 Desse não recebimento está interposta reclamação, a correr termos perante o 
 Venerando Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, para onde foi remetida em 
 
 15-05-06. 
 Agora, em 01-06-06, o arguido diz que não se conformando com o douto acórdão 
 proferido a fls. ..., que o condenou pela prática, de um crime de caça ilegal 
 p.p. pelo art° 30°, n° 2, da Lei no 173/99, de 21/09 (..) vem interpor recurso 
 para o Tribunal Constitucional.
 Nos termos do artigo 70º da LTC: 
 
 1. Cabe recurso para o Tribunal Constitucional, em secção, das decisões dos 
 tribunais: 
 
 (…)
 b) Que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o 
 processo;
 
 (...) 
 
 2. Os recursos previstos nas alíneas b) e f) do número anterior apenas cabem de 
 decisões que não admitam recurso ordinário, por a lei o não prever ou por já 
 haverem sido esgotados todos os que no caso cabiam, salvo os destinados a 
 uniformização de jurisprudência. 
 
 3. São equiparadas a recursos ordinários as reclamações para os presidentes dos 
 tribunais superiores, nos casos de não admissão ou de retenção do recurso, bem 
 como as reclamações dos despachos dos juízes relatores para a conferência. 
 E nos termos do artigo 75º da mesma Lei: 
 
 1. O prazo de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional á de 10 
 dias e interrompe os prazos para a interposição de outros que porventura caibam 
 da decisão, os quais só podem ser interpostos depois de cessada a interrupção. 
 
 2. Interposto recurso ordinário, mesmo que para uniformização de jurisprudência, 
 que não seja admitido com fundamento em irrecorribilidade da decisão, o prazo 
 para recorrer para o Tribunal Constitucional conta-se do momento em que se toma 
 definitiva a decisão que não admite recurso. 
 A ratio deste preceito parece facilmente alcançável corno sendo a de dilatar (ou 
 acrescentar) 10 dias o prazo de interposição de outros recursos quando se 
 recorra também para o Tribunal Constitucional, pois se compreende o acréscimo 
 substancial de trabalho nessas circunstâncias e se pretende obviar a que um 
 sujeito processual fique limitado ao prazo normal nessa situação especial. 
 Não se trata de efeitos do recurso - que, esses, vêm no art° 78° - nem, 
 consequentemente, de se dizer que as decisões que não são objecto de recurso 
 para o Tribunal Constitucional esperam o resultado da decisão desse Tribunal, 
 pois a esta segue-se o que vem disposto no art° 800, n°s2, 3 e 4 da citada Lei. 
 Ora, tendo o arguido optado pela via ordinária, e deixando, por isso, de 
 interpor recurso do acórdão desta Relação para o Tribunal Constitucional, não 
 pode agora fazê-lo por já não estar em tempo. Por consequência, não recebo o 
 recurso. 
 Notifique.” 
 
  
 
  
 
  
 
  
 
                  5. O n.º 2 do artigo 75.º da LTC dispõe que:
 
  
 
 “2. Interposto recurso ordinário, mesmo que para uniformização de 
 jurisprudência, que não seja admitido com fundamento em irrecorribilidade da 
 decisão, o prazo para recorrer para o Tribunal Constitucional conta-se do 
 momento em que se torna definitiva a decisão que não admite recurso.”
 
  
 
  
 Com esta regra, o legislador preveniu os riscos da incerteza, resultantes da 
 conjugação do princípio da exaustão dos recursos ordinários com discrepâncias 
 sobre a admissibilidade de recurso ordinário. Se o recurso ordinário não for 
 admitido, o recorrente estará sempre a tempo de interpor o recurso de 
 constitucionalidade, reabrindo-se o prazo para interposição deste a partir do 
 momento em que se torne definitivo que a decisão não admitia o recurso 
 ordinário, que se interpôs.
 
                  Deste modo, o despacho reclamado não pode ser confirmado pelo 
 fundamento nele invocado (extemporaneidade de interposição). Com efeito, o 
 recurso de fls. 283 e segs. (alínea k) do n.º 4) foi seguramente interposto 
 antes de decorridos 10 dias sobre o trânsito em julgado do indeferimento da 
 reclamação pelo Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça (alínea i) do n.º 
 
 4), que considerou inadmissível o recurso ordinário. Estaria em tempo, de acordo 
 com o n.º 2 do artigo 75.º da LTC.
 
  
 
                  5. Todavia, no julgamento das reclamações a que se refere o 
 artigo 77.º da LTC, o Tribunal Constitucional não se limita a examinar o 
 fundamento de rejeição acolhido pelo despacho reclamado. É entendimento uniforme 
 que, fazendo a decisão que revogar o despacho de indeferimento caso julgado 
 quanto à admissibilidade do recurso (n.º 4 do artigo 77.º da LTC), mesmo que o 
 Tribunal não confirme esse fundamento, a reclamação deve ser indeferida se 
 qualquer outra razão obstar ao conhecimento do recurso.
 
  
 
                  Ora, como sustenta o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, outras 
 razões concorrem para que o requerimento de interposição do recurso devesse ser 
 indeferido e, portanto, para que a reclamação improceda.
 
  
 
  
 
 5.1. É manifestamente descabida a invocação da hipótese de recurso prevista na 
 alínea i) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, uma vez que não houve recusa de 
 aplicação de qualquer norma constante de acto legislativo com fundamento em 
 convenção internacional ou a sua aplicação em desconformidade com  anterior 
 decisão – que o recorrente não identifica  (cfr. n.º 4 do artigo 75.º-A da LTC) 
 
 –  do Tribunal Constitucional.
 
  
 
  
 
                  5.2. O acórdão recorrido não aplicou qualquer norma extraída da 
 alínea e) do  n.º 1 do artigo 400.º do Código de Processo Penal, pelo que é 
 manifesto que o recurso não pode ser admitido quanto à norma referida na alínea 
 D) do requerimento de interposição (alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC). A 
 não admissão de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça foi definitivamente 
 decidida pelo despacho do Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça que 
 indeferiu a reclamação, decisão esta que no presente recurso não está em causa.
 
  
 
  
 
                  5.3. Constitui pressuposto do recurso previsto nas alíneas b) e 
 f) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC que a questão de inconstitucionalidade ou de 
 ilegalidade por violação de lei com valor reforçado tenha sido suscitada, de 
 modo processualmente adequado, perante o tribunal que proferiu a decisão 
 recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer (n.º 2 do artigo 
 
 72.º da LTC). 
 
                  Ora, independentemente de saber se a Lei n.º 173/99, de 21 de 
 Setembro é, para este efeito, lei de valor reforçado –  questão que teria de 
 colocar-se relativamente à alínea C) do requerimento de interposição – é seguro 
 que o recorrente não cumpriu este ónus.
 
  
 
  
 
                  5.3.1. Em primeiro lugar não é exacto que reclamante tenha 
 suscitado a questão referida na alínea A) na resposta ao recurso interposto pelo 
 Ministério Público. Nessa peça processual (fls 184 e segs.) o ora reclamante, aí 
 na posição de recorrido, contrapôs que o Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de 
 Agosto viera despenalizar a conduta pela qual o Ministério Público o tinha 
 acusado e pretendia que fosse condenado pela Relação, revogando a sentença 
 absolutória do tribunal de comarca. Mas limita-se a argumentar, no plano do 
 direito ordinário, com a sucessão de leis, sustentando que, quer se conclua que 
 a falta de eventual “autorização” da entidade gestora de Zona de Caça Municipal 
 pode subsumir-se à contra-ordenação prevista na alínea a), quer à prevista na 
 alínea b) do n.º 1 do artigo 137.º do Decreto‑Lei n.º 202/2004, a conduta pela 
 qual foi acusado deixou de constituir crime e a concluir que “nos termos 
 constitucionais e legais (cfr. n.º4, artigo 29.º da CRP e n.º 2 artigo 2.º do 
 Código Penal) ter-se-ia de concluir que a responsabilidade penal, se a ela 
 houvesse lugar, do ora respondente encontrava-se extinta, por força da entrada 
 em vigor de lei despenalizadora” (fls. 187). A mera invocação do princípio da 
 aplicação da lei penal modo diverso, não é modo adequado de suscitar qualquer 
 questão de inconstitucionalidade, em termos de abrir a via de recurso para o 
 Tribunal Constitucional.
 
  
 
  
 
                  5.3.2. Quanto ao mais, os momentos em que o reclamante diz ter 
 suscitado as questões que agora quer ver apreciadas pelo Tribunal Constitucional 
 não são processualmente idóneos para efeito das disposições conjugadas da alínea 
 a) do n.º 1 do artigo 70.º e do n.º 2 do artigo 72.º da LTC. 
 
  
 
                   Com efeito, não basta ter colocado a questão “em sede de 
 contestação à acusação pública” perante o tribunal de 1ª instância para dar por 
 cumprida essa exigência. Com a nova redacção do n.º 2 do artigo 72.º da LTC, 
 emergente da Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, consagrou-se o entendimento, 
 que já antes correspondia a uma das correntes jurisprudenciais, de que, naqueles 
 casos em que o recorrente tenha suscitado a questão e obtido ganho de causa por 
 fundamento diverso da inconstitucionalidade, ainda tem o ónus de suscitar a 
 questão perante o tribunal superior, em caso de recurso interposto pela parte 
 vencida (cfr. acórdãos n.º 114/2000 e 292/2002,disponíveis em 
 http://www.tribunalconstitucional.pt).
 
  
 
  
 
                  E, como constitui jurisprudência pacífica, para colocar uma 
 questão do género daquelas que o recorrente quer ver apreciadas, também não é 
 processualmente adequada a arguição de nulidade da decisão que fez aplicação das 
 normas em causa. Com efeito, a aplicação das normas identificadas nas alíneas 
 A), B) e C) do requerimento de interposição, com o sentido que veio a ser 
 adoptado pelo acórdão da Relação – sem necessidade de precisar aqui se este 
 sentido é rigorosamente coincidente com o indicado pelo recorrente, em especial 
 quanto à alínea B) do requerimento de interposição – , era perfeitamente 
 previsível face aos termos da causa, designadamente, perante a acusação e o 
 recurso do Ministério Público. O recorrente dispôs de inequívoca oportunidade 
 processual de levantar essas questões na contra‑motivação de recurso, para a 
 hipótese de vir a ser acolhida a pretensão de enquadramento jurídico-penal 
 proposto pelo Ministério Público, como, no essencial, veio a ser. 
 
  
 
  
 
                  6. Decisão
 
  
 
                  Pelo exposto, embora por razões não coincidentes com as do 
 despacho reclamado, decide-se indeferir a reclamação do despacho que não admitiu 
 o recurso.
 
                  Custas pelo reclamante, fixando a taxa de justiça em 20 (vinte) 
 unidades de conta.
 Lisboa, 22 de Setembro de 2006
 Vítor Gomes
 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
 Artur Maurício