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Processo nº 579/06
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Gil Galvão
 
  
 
  
 Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 
  
 I – Relatório.
 
  
 
 1. Nos presentes autos, em que são ofendidos/arguidos A., B. e C., ora 
 reclamantes, o Ministério Público, por despacho de 29 de Março de 2006, 
 decidiu-se pela “dispensa de pena”, ordenando a apresentação dos autos ao Juiz 
 de Instrução. Este, por despacho de 31 de Março de 2006, concordou “com a 
 dispensa de pena – artigos 143º CP e 280º, n.º 1 do CPPenal”. Foi, então, 
 proferida pelo Procurador adjunto do Ministério Público, em 10 de Abril de 2006, 
 decisão de “arquivamento de inquérito, nos termos do art. 277º, n.º 1, e 280º, 
 ambos do Código de Processo Penal.”
 
  
 
 2. Na sequência, pretenderam os ora reclamantes recorrer para este Tribunal. O 
 juiz de instrução proferiu então o despacho de fls. 148, em que os mandou 
 notificar para que informassem qual a decisão de que recorriam e para 
 apresentarem novo requerimento, o que estes fizeram, juntando um do seguinte 
 teor:
 
 “[...] vêm [...] Interpor o presente RECURSO para o Tribunal Constitucional, Nos 
 termos e com os seguintes fundamentos: 
 
 1. O presente recurso é interposto ao abrigo do disposto na alínea b), n.° 1, do 
 artigo 70°, da Lei n.° 28/82, de 15 de Novembro (LTC), com as alterações 
 introduzidas pela Lei n.° 143/58, de 26 de Novembro, Lei n.º 85/89, de 7 de 
 Setembro, Lei n.° 88/95, de 1 de Setembro, Lei n.° 13-A/95, de 26 de Fevereiro 
 
 (Declaração de Rectificação 10/98, de 23 de Maio); 
 
 2. Pretendem os recorrentes ver apreciada a inconstitucionalidade da norma 
 constante dos números 1 e 3 do artigo 280°, do Código de Processo Penal, 
 
 3. Na interpretação de que a decisão de arquivamento nos termos do disposto no 
 n.º 1 do art. 280°, do diploma legal acima mencionado, não admite a 
 susceptibilidade de qualquer impugnação,
 
 4. Colocando os recorrentes à margem do processo decisório destes autos, já que 
 aos mesmos não foi dada hipótese de se pronunciarem, inibindo-se ainda os seus 
 direitos de recurso, 
 
 5. Constituindo uma grave violação do disposto no n.° 1 do artigo 32° da C.R.P, 
 na medida em que são garantida todas as garantias de defesa, incluindo o 
 recurso, no processo criminal; 
 
 6. De facto, a decisão de arquivamento dos presentes autos, tendo por base a 
 dispensa de pena proposta pelo Digno Magistrado do M.P, 
 
 7. Sem que aos ora recorrentes tenha sido dada qualquer hipótese de contraditar, 
 alegar ou discordar, constitui uma grave violação aos seus direitos e garantias 
 de defesa, inadmissíveis num estado de direito democrático; 
 
 8. A questão da inconstitucionalidade não foi previamente suscitada nestes autos 
 pelo facto de aos ora recorrentes não era exigível que antevissem a 
 possibilidade da interpretação e aplicação da norma referida em 2 supra, de modo 
 a impor-se-lhes o ónus de alegar tal questão antes da respectiva decisão, 
 
 9. Tratando-se de uma situação de natureza anómala e/ou excepcional em que os 
 recorrentes foram confrontados com uma situação de aplicação e interpretação 
 normativa de todo imprevista e inesperada, proferida pela decisão; [...]”
 
  
 
 3. Por parte do Juiz de Instrução foi proferido, em 29 de Maio de 2006, o 
 seguinte despacho, não admitindo este recurso:
 
 “Não se conformando com a decisão que determinou o arquivamento do inquérito vêm 
 os ofendidos/arguidos interpor recurso para o TRIBUNAL CONSTITUCIONAL. 
 O recurso em apreço tem por fundamento o previsto na al. b) do artigo 70° da Lei 
 n.° 28/82 de 15/11 - aplicação de norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada 
 durante o processo.
 Os recursos de “fiscalização concreta de constitucionalidade” previstos no 
 artigo 280° da Constituição da República Portuguesa e no artigo 70° da Lei do 
 Tribunal Constitucional — e, concretamente, o recurso previsto na alínea b) do 
 n.° 1 do artigo 70° da LTC, que os recorrentes pretendem interpor cabem de 
 decisões dos tribunais.
 A decisão de que se pretende recorrer no caso dos autos é uma decisão de um 
 Procurador Adjunto e, como tal, não está sujeita ao regime de “fiscalização 
 concreta de constitucionalidade” o que se referem os artigos 280° da 
 Constituição e 70° da Lei do Tribunal Constitucional.
 Por ser assim, ao abrigo do disposto no artigo 76° n.°1 e 2 da Lei n.° 28/82 não 
 admito o recurso ora interposto. [...].”
 
  
 
 4. Na sequência desta decisão, foi interposta a seguinte reclamação:
 
 “[...], vêm, ao abrigo do disposto no n.° 4 do artigo 76°, da Lei n.° 28/82, de 
 
 15 de Novembro (LTC), [...] Interpor a presente RECLAMAÇÃO, 
 Nos termos e com os seguintes fundamentos: 
 
 1. A douta decisão que rejeitou o recurso interposto assenta na consideração de 
 que a decisão recorrida foi proferida por um Procurador Adjunto e, como tal, não 
 estaria sujeita ao regime de «fiscalização concreta de constitucionalidade» a 
 que se referem os artigos 280°, da CRP, e 70º, da LTC; 
 
 2. Salvo o devido respeito, que é muito, falece razão à decisão assim tomada. 
 Vejamos:
 
 3. O recurso foi interposto ao abrigo do disposto na alínea b), n.° 1, do artigo 
 
 70°, da Lei n.° 28/82, de 15 de Novembro (LTC), com as alterações introduzidas 
 pela Lei n.° 143/58, de 26 de Novembro, Lei n.° 85/89, de 7 de Setembro, Lei n.° 
 
 88/95, de 1 de Setembro, Lei n.° 13- A/95, de 26 de Fevereiro (Declaração de 
 Rectificação 10/98, de 23 de Maio); 
 
 4. Pretendiam, como efectivamente pretendem, os recorrentes ver apreciada a 
 inconstitucionalidade da norma constante dos números 1 e 3, do artigo 280°, do 
 Código de Processo Penal, 
 
 5. Na interpretação de que a decisão de arquivamento nos termos do disposto no 
 n.° 1 do art. 280°, do diploma legal acima mencionado, não admite a 
 susceptibilidade de qualquer impugnação,
 
 6. Colocando os recorrentes à margem do processo decisório destes autos, já que 
 aos mesmos não foi dada hipótese de se pronunciarem, inibindo-se ainda os seus 
 direitos de recurso, 
 
 7. Constituindo uma grave violação do disposto no n.° 1 do artigo 32°, da C.R.P, 
 na medida em que são garantida todas as garantias de defesa, incluindo o 
 recurso, no processo criminal; 
 
 8. De facto, a decisão de arquivamento dos presentes autos, teve por base uma 
 proposta de dispensa de pena sugerida pelo Digno Magistrado do M.P; 
 
 9. Porém, tal proposta foi apresenta ao respectivo Juiz de Instrução Criminal, 
 tendo este proferido despacho de concordância;
 
 10. É precisamente deste despacho, desta decisão, que se recorreu, como de facto 
 se recorre, razão pela qual não assiste razão à decisão que rejeitou o 
 deferimento do recurso interposto;
 
 11. Aos ora recorrentes não foi dada, em qualquer fase do processo, qualquer 
 hipótese de contraditar, alegar ou discordar, constituindo uma grave violação 
 aos seus direitos e garantias de defesa, inadmissíveis num estado de direito 
 democrático; 
 
 12. A questão da inconstitucionalidade não foi previamente suscitada nestes 
 autos pelo facto de aos ora recorrentes não era exigível que antevissem a 
 possibilidade da interpretação e aplicação da norma referida em 3 supra, de modo 
 a impor-se-lhes o ónus de alegar tal questão antes da respectiva decisão, 
 
 13. Tratando-se de uma situação de natureza anómala e/ou excepcional em que os 
 recorrentes foram confrontados com uma situação de aplicação e interpretação 
 normativa de todo imprevista e inesperada, proferida pela decisão do Juiz de 
 Instrução, em conjugação com a do respectivo Procurador Adjunto do Ministério 
 público; 
 
 14. Neste sentido, entre outros, vide os Acórdão 61/92, 188/93, 181/96, 569/95 e 
 
 596/96, do TC; [...].”
 
  
 
 5. Já neste Tribunal foram os autos com vista ao Ministério Público, que se 
 pronunciou nos seguintes termos:
 
 “Ao delimitar o objecto do recurso, o recorrente fê-lo em termos de pretender 
 impugnar “a decisão de arquivamento”, a qual, na situação prevista no n.º 1 do 
 art.º 250º, é efectivamente da competência do M.º P.º, limitando-se o juiz a 
 concordar com a dispensa da pena proposta pelo magistrado do M.ºP.º(cf. despacho 
 de fls. 5 dos autos).
 Mesmo que se admita, porém, que apesar de tal deficiência na formulação do 
 requerimento de interposição do recurso – o que o recorrente pretendia 
 controverter era a irrecorribilidade – não do despacho de arquivamento, 
 proferido pelo M.ºP.º - mas a prévia decisão judicial em que se concordava com a 
 dispensa da pena proposta pelo M.º P.º - sempre o recurso seria de configurar 
 como o manifestamente infundado, face à reiterada jurisprudência constitucional 
 sobre o âmbito do direito ao recurso exercitado no interesse do ofendido (ao 
 qual obviamente se não pode aplicar o parâmetro referenciado, quanto às 
 
 “garantias de defesa”, no n.º 1 do art.º 32º da CRP[)]: do princípio do acesso 
 ao direito não se pode inferir uma irrestrita necessidade de instituir o duplo 
 grau de jurisdição relativamente a todas as decisões proferidas pelo juiz, 
 nomeadamente sem que se deva ter em consideração a gravidade das infracções 
 penais cometidas.
 Termos em que deverá improceder a presente reclamação.”
 
  
 Dispensados os vistos, cumpre decidir.
 
  
 
  
 II. Fundamentação.
 
  
 
 6. O recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal 
 Constitucional pressupõe, designadamente, que a decisão seja recorrível e que a 
 questão de constitucionalidade não seja manifestamente infundada.
 
  
 No presente caso, verifica-se que os recorrentes não indicaram, no requerimento 
 inicial de interposição do recurso, qual a decisão de que interpunham recurso. 
 Convidados pelo juiz a fazê-lo, vieram apenas aditar ao anterior requerimento o 
 seguinte:
 
 “6. De facto, a decisão de arquivamento dos presentes autos, tendo por base a 
 dispensa de pena proposta pelo Digno Magistrado do M.P, 
 
 7. Sem que aos ora recorrentes tenha sido dada qualquer hipótese de contraditar, 
 alegar ou discordar, constitui uma grave violação aos seus direitos e garantias 
 de defesa, inadmissíveis num estado de direito democrático;” (itálico aditado).
 
  
 Ora, a decisão de arquivamento foi proferida pelo Procurador Adjunto, não sendo, 
 obviamente, recorrível. Nem tão pouco é possível aos ora reclamantes, tendo 
 decidido interpor recurso de uma tal decisão, vir na reclamação para este 
 Tribunal procurar modificar a indicação da decisão recorrida. Assim sendo, como 
 indubitavelmente o é, tanto basta para que se não possa admitir o recurso para 
 este Tribunal.
 
  
 Aliás, a questão de constitucionalidade reportada à norma do artigo 280.º, n.ºs 
 
 1 e 3, do Código de Processo Penal - interpretada - num caso paralelo - como não 
 admitindo recurso para o Tribunal da Relação das decisões do Ministério Público 
 de arquivamento de inquérito, em caso de dispensa da pena, não foi julgada 
 inconstitucional pelo Acórdão n.º 397/2004 deste Tribunal, por remissão para a 
 fundamentação da decisão sumária n.º 208/2003, de 15 de Setembro de 2003, que 
 julgara a questão de inconstitucionalidade manifestamente infundada.
 
  
 III. Decisão.
 
  
 Nestes termos, decide-se desatender a reclamação, confirmando-se a decisão de 
 não admissão do recurso para este Tribunal.
 Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 Lisboa, 13 de Julho de 2006
 Gil Galvão
 Bravo Serra