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Processo n.º 27/07
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Gil Galvão
 
  
 
  
 Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 I – Relatório.
 
  
 
 1. Por decisão do Tribunal Judicial da Comarca de Loures, de 31 de Março de 
 
 2005, foi A., ora reclamante, condenado, pela prática de um crime de tráfico de 
 estupefacientes, na pena de 6 anos e 6 meses de prisão.
 
  
 
 2. Inconformado com esta decisão, o arguido recorreu para o Tribunal da Relação 
 de Lisboa, que, por acórdão de 26 de Setembro de 2006, julgou o recurso 
 improcedente e confirmou, na íntegra, o acórdão da primeira instância.
 
  
 
 3. Inconformado com esta decisão, o ora reclamante pretendeu recorrer para o 
 Tribunal Constitucional, afirmando, nomeadamente, o seguinte:
 
 “[...]A norma cuja inconstitucionalidade material se pretende que o Tribunal 
 Constitucional aprecie é a norma do art° 188° do CPP e do art°32°, da CRP 
 segundo a interpretação perfilhada pelo Ac. do Tribunal da 1ª Instância, o 
 recorrente arguiu a nulidade das escutas telefónicas ao abrigo do art° 187°, 
 
 188° e 126° todos do CPP e no art° 32° n.º 8 da CRP por entender estarem feridas 
 de nulidade “O que envenena toda a prova delas constantes” porque não foram 
 
 “imediatamente” (no prazo de 15 dias) levadas ao conhecimento do Juiz de 
 Instrução Criminal”;“Há vários juízes a ordenar as escutas sem que seja quem 
 ordena a ouvir e decidir se as mesmas são ou não transcritas”. Decidiu o 
 Meritíssimo Juiz que se trata de uma “nulidade sanável” e que o recorrente” 
 teria que arguir a nulidade das intercepções até cinco dias após a notificação 
 do despacho de encerramento do inquérito’. 
 Em suma, o que o recorrente pretende é que o Tribunal Constitucional aprecie a 
 inconstitucionalidade material da norma do art° 188 art°s 188° e 189°ambos do 
 CPP e artºs 26°e 32°ambos do CRP na interpretação perfilhada pelo tribunal de lª 
 instância segundo a qual as nulidade arguida é sanável e portanto a sua arguição 
 extemporânea.
 O recorrente pretende ainda, que o Tribunal Constitucional aprecie a 
 inconstitucionalidade material da norma dos art°s 188° e 189° ambos do CPP por 
 violação dos artºs 26° e 32° ambos do CRP na interpretação perfilhada pelo Ac. 
 do Tribunal da Relação de Lisboa. 
 O recorrente arguiu a nulidade das escutas telefónicas e dos meios fotográficos 
 e videográficos, porque as escutas telefónicas não foram de “imediatamente” 
 apresentadas ao Juiz de Instrução Criminal; verificando-se um hiato de temporal 
 de 33 dias, 21 dias ..., prazos excessivamente latos, desde o momento em que 
 foram autorizadas e o momento em que foram levadas ao conhecimento do juiz da 
 Instrução, as quais foram desacompanhadas de um controle efectivo do juiz; assim 
 como, foram prorrogadas escutas telefónicas, sem que as anteriormente 
 autorizadas tivessem sido levadas ao conhecimento do juiz; as escutas que foram 
 sujeitas à audição do Juiz e ordenada à PSP a sua transcrição num curto prazo de 
 tempo (em dois dias) foram juntas um mês mais tarde; foram prorrogadas escutas 
 telefónicas em que o douto despacho não se encontra datado, desconhecendo-se a 
 partir de que data é autorizada e consequentemente quando terminam; foram 
 efectuadas um elevado número de escutas telefónicas entre muitas situações, um 
 dos caso em que das 1023 sessões nenhuma se revelou com de interesse, não tendo 
 sido levadas ao juiz para as ouvir e mandar transcrever ou destruir; as escutas 
 autorizadas em 20.08.03 pelo prazo de 60 dias e partir de 22.09.03, as restantes 
 sessões não foram levadas ao conhecimento do Juiz; foram autorizadas escuras 
 telefónicas pelo prazo 60 dias, e durante 8 meses não foram sujeitas a qualquer 
 controlo, só decorrido este prazo a PSP solicita a autorização para a 
 desmagnetização e destruição das escutas, e que o juiz autoriza sem contudo 
 tenham sido levadas ao conhecimento do mesmo; o recorrente arguiu ainda a 
 nulidade dos meios fotográficos e ideográficos com registo de voz e imagem, 
 porque o douto despacho que os autorizou não prescrever qualquer prazo para a 
 sua realização. 
 O recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a 
 inconstitucionalidade material da norma art. 188° e 189° ambas do CPP, por 
 violação do disposto no art° 26 e 34° da CRP na interpretação perfilhada pelo 
 TRL segundo a qual em que não é admissível que se interprete a expressão 
 
 “imediatamente” como significando “logo que possível” — dado os valores e 
 direitos fundamentais postos em causa com a efectivação das escutas -, também 
 não é exigível nem pensável que o juiz que ordena as escutas, com carácter de 
 permanência, disponível para de imediato - no instante que se segue...” mas tão 
 rápido quanto possível” considerando que escutas telefónicas levadas ao 
 conhecimento do JIC após 33 dias e 21 dias são validas e devem de ser valoradas. 
 
 
 Bem como, considerou que o elevado número de escutas telefónicas, sem qualquer 
 relevância é “risco” inerente...; e ainda a interpretação perfilhada por este 
 tribunal relativamente ao seguinte: 
 
 «O art° 188º do CPP - cuja disciplina está submetido (ex vi do art.º 6, n°3, da 
 cit. Lei n.° 5/2002) registo, por qualquer meio, de imagem e de voz, sem 
 consentimento do visado - no exige propriamente o estabelecimento dum prazo 
 dentro do qual possa ter lugar a recolha de imagens ou registo de vozes....». 
 
 [...]”
 
  
 
 4. Por parte da Relatora do processo no Tribunal da Relação de Lisboa foi 
 proferido o seguinte despacho, não admitindo este recurso:
 
 “Nos termos do n° 2 do art° 70º da Lei n° 28/82 de 15/11, só cabe recurso para o 
 Tribunal Constitucional de decisões que não admitam recurso ordinário, seja por 
 a lei não os prever ou por já haverem sido esgotados todos os que no caso 
 cabiam. 
 No caso dos autos o Acórdão desta Relação do qual se pretende recorrer para o 
 Tribunal Constitucional é passível de recurso ordinário para o S.T.J.. 
 Como assim, não se admite por ora, o recurso interposto através do requerimento 
 de fls. 3424 a 3426..”
 
  
 
 5. Na sequência desta decisão, foi interposta a presente reclamação, do seguinte 
 teor:
 
 “[...] não se conformando vem apresentar nos termos do n.º 4 do art.º 76 da Lei 
 n.º 28/82 de 15 de Novembro 
 RECLAMAÇÃO PARA O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 
 Com os fundamentos seguintes: 
 
 1° O arguido interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, invocando que na 
 motivação de recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa suscitou a violação 
 pela decisão recorrida do tribunal de 1ª instância dos artigos 26°, n.°1 e 32°, 
 n.° 8 da Constituição da República Portuguesa segundo a interpretação do artigo 
 
 188° do CPP e dos artigos 187°, 189° e 126° do CPP perfilhada pelo tribunal “a 
 quo”.
 
 2° No seu recurso, o arguido não se conformando com o douto acórdão proferido 
 pelo Tribunal da Relação Lisboa em 26 de Setembro de 2006, considerou que não 
 foi feita a aplicação das normas dos art°s 26° e 32° da Constituição da 
 República Portuguesa, segundo a interpretação perfilhada pelo Ac. do Tribunal da 
 Relação dos art°s 188° e 189° ambos do CPP, é inconstitucional por violação aos 
 artigos 26° e 32° ambos do da Constituição da República Portuguesa 
 
 3° Com efeito, o arguido invocou a não aplicação dos art°s 26 e n.° 8 do art° 
 
 32° ambos da Constituição da Republica Portuguesa e considerou que o Tribunal da 
 Relação de Lisboa ao confirmar a decisão recorrida de 1ª instancia, não 
 acolhendo a invocada inconstitucionalidade, proferiu decisão que, no 
 entendimento do arguido, sofre da mesma inconstitucionalidade e, por isso, dela 
 interpôs recurso.
 
 4º O arguido interpôs recurso para Tribunal Constitucional por entender que a 
 decisão recorrida no admite recurso ordinário. “Não é admissível recurso: De 
 acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem 
 decisão de 1a instância, em processo por crime a que seja aplicável pena de 
 prisão não superior a oito anos, mesmo em caso de concurso de infracções” 
 conforme o disposto na al. f), n.°1 do art° 400º do CPP. 
 Tem sido, entendimento da Jurisprudência, conforme decidiu o Ac. do STJ de 
 
 26.06.03 que não é admissível recurso para o STJ quando “A decisão da Relação 
 confirmou um acórdão condenatório da 1ª instância que aplicado ao arguido a pena 
 de 7 anos de prisão é irrecorrível, se o recurso for interposto pela defesa ou 
 no seu exclusivo interesse, nos termos da al.f), n.º.l do art° 400º do CPP, pois 
 as penas aplicáveis não podem ser superiores a estas, ainda que a previsão legal 
 do crime o admitisse, dada a proibição de «reformatio in pejus» “ 
 
 5º Ora, nos presentes autos o arguido foi julgado na 1ª instância por um crime 
 punível com pena de prisão superior a 8 anos de prisão. E, condenado na pena de 
 
 6 anos e seis meses, como só a defesa recorreu para o Tribunal da Relação, a 
 pena aplicável ficou com um limite máximo coincidente com a pena efectivamente 
 aplicável, por impossibilidade de agravamento. 
 Neste tipo de situações, o STJ no citado acórdão entende que “a decisão da 
 Relação é irrecorrível, nos termos da al. f, n.°1 do art° 400° do CPP, ... pois 
 
 é um acórdão confirmativo de decisão que condenou estes arguidos por crime cuja 
 pena aplicável não é superior a 7 anos de prisão, dada a proibição da 
 
 «reformatio inpejus» 
 Termos em que a presente reclamação deve ser deferida, prosseguindo o recurso, 
 nos seus precisos termos.”
 
  
 
 6. Já neste Tribunal foram os autos com vista ao Ministério Público, que se 
 pronunciou nos seguintes termos:
 
 “Independentemente da questão da recorribilidade do acórdão, proferido pela 
 Relação, para o STJ, é evidente a inverificação dos pressupostos do recurso de 
 fiscalização concreta interposto.
 Assim – e desde logo – tal recurso nunca poderia incidir sobre interpretações 
 normativas realizadas pelo tribunal de 1ª instância, cuja decisão se mostra 
 naturalmente “consumida” pelo acórdão proferido pela Relação.
 Relativamente às interpretações imputadas a este acórdão, verifica-se que o 
 recorrente não suscitou, durante o processo e em termos processualmente 
 adequados, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, susceptível de 
 constituir objecto idóneo do controlo normativo, cometido a este Tribunal 
 Constitucional: percorrida a motivação do recurso, dirigido à Relação, e 
 respectivas conclusões, verifica-se que o recorrente se limitou a pugnar pela 
 
 “nulidade” das escutas e registos de imagem e voz realizados pelas entidades 
 policiais, sustentando que o tribunal de instrução teria, ele próprio, “violado” 
 certas disposições legais do processo penal, sem questionar adequadamente a 
 constitucionalidade de quaisquer normas ou critérios normativos, devidamente 
 identificadas e especificadas.
 Termos em que deverá naturalmente improceder a presente reclamação, por 
 inverificação dos pressupostos do recurso interposto.”
 
  
 Dispensados os vistos, cumpre decidir.
 
  
 
  
 II. Fundamentação.
 
  
 
 7. O recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal 
 Constitucional pressupõe, designadamente, que a decisão de que se recorre seja 
 definitiva, que o recorrente tenha suscitado, de modo processualmente adequado 
 perante o Tribunal que proferiu a decisão recorrida, a inconstitucionalidade de 
 determinada norma jurídica - ou de uma sua dimensão normativa - e que, não 
 obstante, a decisão recorrida a tenha efectivamente aplicado, como ratio 
 decidendi, no julgamento do caso.
 
  
 Ora, destinando-se “as reclamações sobre não admissão dos recursos intentados 
 para o Tribunal Constitucional a verificar a eventual preterição da devida 
 reapreciação, pelo Tribunal Constitucional, de uma questão de 
 constitucionalidade, em sede de recurso”, como se afirma no Acórdão n.º 641/99 
 
 (disponível na página Internet do Tribunal em 
 http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/), “mais que apreciar a 
 fundamentação do despacho de indeferimento do recurso, há, pois, que verificar o 
 preenchimento dos requisitos do recurso de constitucionalidade que se pretendeu 
 interpor”, sendo certo que, ao decidir a reclamação, a decisão do Tribunal 
 Constitucional faz caso julgado quanto à admissibilidade do recurso, nos termos 
 do artigo 77º, n.º 4, da Lei n.º 28/82.
 
  
 Assim, no presente caso, em primeiro lugar, há que afastar a hipótese de 
 apreciação da inconstitucionalidade da “interpretação perfilhada pelo Ac. do 
 Tribunal da 1ª Instância”, já que o mesmo se encontra “consumido” pelo acórdão 
 do Tribunal da Relação. Por outro lado, no que se refere a este último, 
 independentemente da questão de saber até que ponto estão ou não esgotados os 
 recursos ordinários que no caso caberiam e da questão de saber em que medida 
 terão os preceitos referidos pelo reclamante sido aplicados, como ratio 
 decidendi da decisão recorrida, nos termos por ele indicados, o facto é que, ao 
 contrário do que o reclamante sustenta, nenhuma questão de constitucionalidade 
 normativa, reportada aos preceitos questionados, foi suscitada durante o 
 processo, nos termos exigidos pelas disposições conjugadas dos artigos 70. n.º 
 
 1, al. b) e 72.º, n.º 2, ambos da Lei do Tribunal Constitucional. Na verdade, 
 nas 81 folhas da motivação do recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, 
 nunca o ora reclamante questiona qualquer norma ou interpretação normativa, 
 limitando-se, apenas, a alegar a nulidade de escutas telefónicas e a citar, em 
 seu abono, acórdãos deste Tribunal, o que é manifestamente insuficiente para que 
 lhe esteja aberta uma via de recurso para este Tribunal. De facto, como se 
 afirmou no acórdão n.º 232/2006 (disponível na página Internet do Tribunal em 
 http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/),
 
 “[...] lida a motivação do recurso, verifica-se que o recorrente, embora refira 
 anteriores decisões do Tribunal Constitucional sobre a matéria das escutas 
 telefónicas, nunca enuncia uma interpretação normativa dos preceitos agora em 
 causa que seja inconstitucional, visando com tal menção corroborar apenas a sua 
 tese de que tais preceitos teriam sido violados, o que, por sua vez, implicaria 
 a nulidade daquelas escutas. Ora, como se afirmou na decisão sumária n.º 
 
 163/2005, tirada no processo n.º 299/2005, também “tal modo de proceder - mera 
 citação de acórdãos do Tribunal Constitucional para corroborar teses sobre a 
 alegada violação, pela Juíza de Instrução Criminal, de normas de direito 
 infraconstitucional e para sustentar a nulidade de determinadas diligências 
 processuais -, não constitui, manifestamente, o cumprimento do ónus previsto no 
 n.º 2 do artigo 72º da Lei do Tribunal Constitucional, de suscitar a questão de 
 inconstitucionalidade da norma que pretende ver apreciada, de modo 
 processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em 
 termos de este estar obrigado a dela conhecer”.
 
  
 Ora, não tendo sido suscitada pelo agora reclamante, de modo processualmente 
 adequado perante o Tribunal da Relação de Lisboa, a questão de 
 constitucionalidade que pretende ver apreciada, não pode o recurso ser admitido.
 
  
 
  
 III. Decisão.
 
  
 Nestes termos, decide-se desatender a reclamação, confirmando-se a decisão de 
 não admissão do recurso para este Tribunal.
 Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 Lisboa, 15 de Janeiro de 2007
 Gil Galvão
 Bravo Serra
 Artur Maurício