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Processo n.º 44/09
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Vítor Gomes
 
 
 
             Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
 
 
 1. O relator proferiu a seguinte decisão, nos termos do n.º 1 do artigo 78.º-A 
 da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC):
 
  
 
 “1. No processo sumário n.º 552/07.4GTBRG do Tribunal Judicial da comarca de 
 Guimarães, por sentença datada de 7 de Dezembro de 2007, foi o arguido A. 
 condenado como autor material de um crime de condução de veículo em estado de 
 embriaguez, p. e p. pelo artigo 292.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 65 dias 
 de multa à taxa diária de € 7,00 (num total de € 544) e na sanção acessória de 4 
 meses e 14 dias de proibição de condução de veículos motorizados.
 O arguido, que requerera a suspensão provisória do processo e vira esse 
 requerimento indeferido no início da audiência, interpôs recurso, tendo 
 concluído, além do mais, o seguinte:
 
 “(…)
 
 9ª Aliás, a interpretação do disposto no artigo 281.º n.º 1 do Código de 
 Processo no sentido de que vindo ao arguido imputado um crime de condução em 
 estado de embriaguez, não tendo antecedentes criminais por crimes da mesma 
 natureza, nem haja sido aplicado o instituto da suspensão provisória do processo 
 anteriormente por crime de idêntica natureza e não sendo de aplicar a medida de 
 internamento, se pode negar a aplicação do instituto da suspensão provisória do 
 processo sem aquilatar e conhecer dos factos alegados pelo arguido, é 
 inconstitucional por violação das garantias de defesa, do princípio do 
 contraditório e do Estado de Direito ínsitos nos artºs. 2º, 32.º n.ºs 1 e 5 da 
 Constituição.
 
 (…)
 
        Por acórdão de 6 de Outubro de 2008, o Tribunal da Relação de Guimarães 
 negou provimento ao recurso com a seguinte fundamentação ( na parte que 
 interessa a esta questão):
 
 “(…)
 E assim se quando, como nos autos, se levantar a questão de eventual pedido de 
 suspensão do processo, pode e deve o juiz, face aos elementos já presentes nos 
 autos: 
 a) optar por aceitar tal sugestão ou pedido e passar de imediato a procurar 
 obter a(s) concordância(s) que falte(m). 
 b) proceder a diligência sugeridas ou requeridas mas desde que isso não brigue 
 com a tal simplificação processual, celeridade e mínimo indispensável para a 
 decisão. 
 c) entender que a gravidade da situação não é de molde a possibilitar a 
 suspensão do processo e assim, optar por, sem delongas, sujeitar o arguido a 
 julgamento. 
 De notar que um dos fins da suspensão do processo é precisamente evitar a 
 sujeição do arguido a julgamento, face ao estigma ou vexame que este constitui 
 por si mesmo, pelo que no processo sumário, optando-se pelo julgamento imediato, 
 fica tal desiderato prejudicado. 
 Nada que o legislador não tenha previsto, pois que decorre da natureza urgente e 
 simplificada que pretendeu dar a tal forma processual. 
 
 É na eterna procura entre os valores da celeridade e segurança, entendeu o 
 legislador dar aqui primazia à primeira, sem esquecer as garantias mínimas a dar 
 ao arguido. 
 No caso que ora cuidamos, foi o que se decidiu em 1ª instância de modo sintético 
 e simples (como é desígnio do processo sumário). O caso revelava contornos que, 
 sem mais, desaconselhavam à suspensão do processo, tanto mais que a 
 jurisprudência conhecida, em casos como o dos autos (crime de condução de 
 veículo em estado de embriaguez), se vai contra a suspensão da medida da pena e 
 da sanção acessória, por maioria de razão tem de rejeitar a suspensão de todo o 
 processo. 
 E proibindo a lei a prática de actos inúteis (artº 137º do CPC), não poderia o 
 tribunal a quo proceder a diligências prévias que já reputava supérfluas ou 
 inócuas para a decisão a tomar, e que sempre seria a mesma, independentemente da 
 prova que delas resultasse. 
 Assim e concluindo, a lei actual permite a suspensão do processo sumário em fase 
 do julgamento, já que a fase anterior, sob direcção do Ministério Público, por 
 razões de celeridade, dificilmente proporciona ao arguido a possibilidade ou 
 oportunidade de o requerer. Quanto ao assistente, só o será, em princípio, já 
 depois do processo autuado como sumário, “se assim o solicitarem, mesmo que 
 verbalmente, no início da audiência” (artº 389º do CPP), pelo que só em fase de 
 julgamento pode requerer a suspensão do processo. 
 No caso em apreço, dada a gravidade dos factos indiciados e pelos quais acabou 
 por ser condenado, bem andou o juiz ao indeferir quer as diligências, quer a 
 suspensão do processo.” 
 
  
 
 2. O arguido, depois de um pedido de aclaração e de uma arguição de nulidades, 
 interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 
 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), que foi admitido.
 Convidado, neste Tribunal, a fazer as especificações exigidas pelo artigo 75.º-A 
 da LTC, respondeu nos termos do requerimento de fls. 200, do qual, atendendo à 
 decisão a proferir, sobretudo interessa a definição do objecto do recurso.
 
 3. No sistema português de fiscalização de constitucionalidade, a competência 
 atribuída ao Tribunal Constitucional cinge‑se ao controlo da 
 inconstitucionalidade normativa, ou seja, das questões de desconformidade com 
 regras ou princípios constitucionais imputada a normas jurídicas ou a 
 interpretações normativas de que a decisão recorrida tenha feito efectiva 
 aplicação (como ratio decidendi) ou a que tenha recusada aplicação com 
 fundamento em inconstitucionalidade.
 Não lhe cabe apreciar questões de inconstitucionalidade imputadas directamente a 
 decisões judiciais, em si mesmas consideradas, ou que nisso, afinal, se 
 resolvam. A distinção entre os casos em que a inconstitucionalidade é imputada a 
 uma interpretação normativa daqueles em que não pode deixar de considerar-se 
 que o que está em causa, ainda que por desconformidade à Constituição, é a 
 decisão judicial em si mesmo, radica em que na primeira hipótese é discernível 
 na decisão recorrida a adopção de um critério normativo (ao qual depois se 
 subsume o caso concreto em apreço), com carácter de generalidade, e, por isso, 
 susceptível de aplicação a outras situações, enquanto na segunda hipótese está 
 em causa a aplicação dos critérios normativos tidos por relevantes às 
 particularidades do caso concreto.
 Por outro lado, tratando‑se de recurso interposto ao abrigo da alínea b), do n.º 
 
 1, do artigo 70.º, da LTC – como ocorre no presente caso –, a sua 
 admissibilidade depende da verificação cumulativa dos requisitos de a questão 
 de inconstitucionalidade haver sido suscitada «durante o processo», «de modo 
 processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão 
 recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» (n.º 2, do artigo 
 
 72.º, da LTC), e de a decisão recorrida ter feito aplicação, como sua ratio 
 decidendi, das dimensões normativas arguidas de inconstitucionais pelo 
 recorrente.
 
 4.  O recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a 
 constitucionalidade de uma norma assim construída:
 
 “O recurso vem interposto da interpretação do disposto no artº 281.º n.º 1 do 
 Código de Processo Penal no sentido de que vindo ao arguido imputado um crime de 
 condução em estado de embriaguez, não tendo antecedentes criminais por crimes da 
 mesma natureza, nem haja sido aplicado o instituto da suspensão provisória do 
 processo anteriormente por crime de idêntica natureza e não sendo de aplicar a 
 medida de internamento, se pode negar a aplicação do instituto da suspensão 
 provisória do processo sem aquilatar e conhecer dos factos alegados pelo 
 arguido, que se entende ser inconstitucional por violação das garantias de 
 defesa, do princípio do contraditório e do Estado de Direito ínsitos no artºs. 
 
 2º, 32º n.ºs 1 e 5 da Constituição.”
 
  
 Sucede que esta interpretação normativa não corresponde à ratio decidendi do 
 acórdão recorrido.
 A Relação decidiu duas substanciais coisas:
 
 - Que o caso revelava contornos que, sem mais, desaconselhavam a suspensão 
 provisória do processo, dada a gravidade dos factos indiciados e pelos quais o 
 arguido acabou por ser condenado (crime de condução de veículo em estado de 
 embriaguez);
 
 - Que, proibindo a lei a prática de actos inúteis, não poderia o tribunal 
 proceder a diligências que já reputava de supérfluas ou inócuas para a decisão a 
 tomar, que sempre seria a mesma independentemente da prova que delas resultasse.
 São, efectivamente coisas distintas, susceptíveis de colocar problemas de 
 constitucionalidade autónomos e de ser confrontados com diferentes parâmetros, 
 saber quando se justifica a medida de suspensão provisória do processo e saber 
 se devem praticar-se as diligências requeridas para instrução de um pedido dessa 
 natureza mesmo quando se tenha concluído, em apreciação liminar, que o pedido é 
 manifestamente improcedente.
 Ora, esta segunda vertente da questão não pode ser absorvida pela enunciação 
 normativa a que o recorrente procede. Designadamente, o seu suporte legal não 
 reside (ou não reside isoladamente) no n.º 1 do artigo 281.º do Código de 
 Processo Penal. Encontra base legal – aliás expressamente invocada na decisão – 
 no princípio da proibição de actos processuais inúteis, que o acórdão funda no 
 artigo 137.º do Código de Processo Civil e de que fez aplicação subsidiária. 
 Portanto, tendo o recorrente omitido na identificação do objecto do recurso um 
 aspecto essencial da ratio decidendi não pode tomar-se conhecimento do objecto 
 do recurso, por não versar sobre a norma efectivamente aplicada.
 
 5. De todo o modo, há que ter presente que o acórdão recorrido chegou à 
 conclusão de que, face aos factos provados, nunca se justificaria a suspensão 
 provisória do processo, bem tendo andado o juiz de 1.ª instância em indeferir 
 
 “quer as diligências, quer a suspensão do processo”. Além disso, confirmou a 
 sentença condenatória julgando a pena e a sanção acessória adequadas à gravidade 
 do crime praticado, assim reafirmando implicitamente o juízo acerca da não 
 justificação da suspensão do processo. Vale por dizer que considerou a imediata 
 imposição de pena necessária para satisfazer as exigências de prevenção que no 
 caso se fazem sentir. 
 Ora, saber se as exigências de prevenção geral e especial toleram que se aplique 
 o instituto da suspensão provisória do processo, relativamente a um arguido que 
 não tenha antecedentes criminais nem tenha beneficiado dessa medida por crime de 
 idêntica natureza, é questão que respeita já à aplicação dos critérios legais ao 
 caso concreto. Implica uma valoração das particularidades do caso e um juízo de 
 prognose (alínea f) do n.º 1 do artigo 281.º do CPP) que extravaza da questão de 
 constitucionalidade normativa, a única para que o Tribunal detém competência.
 Mas, assim sendo, sempre seria inútil averiguar agora se é inconstitucional que, 
 no momento em que o arguido requer a suspensão provisória do processo, o 
 Tribunal deixe de praticar as diligências instrutórias requeridas para esse fim 
 com base numa apreciação liminar da inviabilidade de aplicação do instituto. 
 Pelo que, também nesta perspectiva, atendendo à natureza instrumental do recurso 
 de constitucionalidade, não deve conhecer-se do recurso interposto.
 
 6. Decisão
 Pelo exposto, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC decide-se não tomar 
 conhecimento do recurso interposto e condenar o recorrente nas custas, fixando a 
 taxa de justiça em 7 (sete) UCs.”
 
  
 
  
 
             2. O recorrente deduziu reclamação, ao abrigo do n.º 3 do citado 
 artigo 78.º-A da LTC, alegando o seguinte:
 
  
 
 “1.1. DA DESNECESSIDADE DA ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTº 137º DO 
 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL 
 Nos termos do disposto no artº 70º nº 1 al. b) da LTC cabe recurso para o 
 Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja 
 inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo. 
 Sendo que, nos termos do disposto no artº 72º nº 2 da LTC, a questão deve ser 
 suscitada de forma processualmente adequada, ou seja perante o Tribunal que 
 proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer. 
 Quanto a este último segmento do artº 72º nº 2 da LTC é jurisprudência corrente 
 do Tribunal Constitucional que não é admissível a invocação da questão de 
 constitucionalidade no requerimento de aclaração ou de arguição de nulidades. 
 Ora, a questão em causa foi suscitada atempadamente na motivação de recurso 
 apresentada, sendo que a invocação do artº 137º do Código de Processo Civil - 
 inusitada, aliás - consta do acórdão recorrido. 
 No entanto, é entendimento do recorrente que não tinha de suscitar a 
 inconstitucionalidade dessa norma citada pelo acórdão recorrido. 
 De facto, o recorrente interpôs recurso da interpretação do disposto no artº 
 
 281º n.º1 do Código de Processo Penal no sentido de que vindo ao arguido 
 imputado um crime de condução em estado de embriaguez, não tendo antecedentes 
 criminais por crimes da mesma natureza, nem haja sido aplicado o instituto da 
 suspensão provisória do processo anteriormente por crime de idêntica natureza e 
 não sendo de aplicar a medida de internamento, se pode negar a aplicação do 
 instituto da suspensão provisória do processo sem aquilatar e conhecer dos 
 factos alegados pelo arguido, que se entende ser inconstitucional por violação 
 das garantias de defesa, do princípio do contraditório e do Estado de Direito 
 
 ínsitos nos artºs 2º, 32º n.º 1 e 5 da Constituição. 
 Ora, nos termos do disposto no nº1 do artº 281º do Código de Processo Penal se o 
 crime for punível com pena de prisão não superior a 5 anos ou com sanção 
 diferente da prisão, o Ministério Público, oficiosamente ou a requerimento do 
 arguido ou do assistente, determina, com a concordância do juiz de instrução, a 
 suspensão do processo, mediante a imposição ao arguido de injunções e regras de 
 conduta, sempre que se verificarem os seguintes pressupostos: 
 a) Concordância do arguido e do assistente; 
 b) ausência de condenação anterior por crime da mesma natureza; 
 c) ausência de aplicação anterior da suspensão provisória do processo por crime 
 da mesma natureza; 
 d) não haver lugar a medida de segurança de internamento; 
 e) ausência de um grau de culpa elevado; e 
 f) ser de prever que o cumprimento das injunções e regras de conduta responda 
 suficientemente às exigências de prevenção que no caso se façam sentir. 
 Todos os requisitos supra expostos se verificavam no caso dos autos, sendo que 
 relativamente ao da al. a) não havendo assistente, bastaria a concordância do 
 arguido. 
 Mas para se aquilatar do preenchimento das alíneas e) e f) do nº1 do artº 281º 
 do Código de Processo Penal tem, naturalmente, de ser ouvida a prova que o 
 arguido requereu e, designadamente, proceder-se à sua inquirição, o que não 
 aconteceu. 
 O Tribunal não pode, sem realizar qualquer diligência, aquilatar do grau de 
 culpa do arguido ou saber se é de prever que o cumprimento das injunções e 
 regras de conduta responda suficientemente às exigências de prevenção que no 
 caso se façam sentir. 
 De facto, indeferir-se liminarmente o requerido pelo arguido, independentemente 
 de se aplicar ou não o artº 137º do Código de Processo Civil, equivale, além de 
 tudo, a fazer-se um pré-juízo do elevado grau de culpabilidade por parte do 
 arguido, nada condizente com um Estado de Direito Democrático. 
 Com efeito, “O processo de aplicação do instituto no inquérito é o seguinte: 
 havendo indícios suficientes da prática de um crime, o M P. deve apurar in 
 concretu o pressupostos da suspensão do processo. 
 Caso não se verifiquem estes pressupostos, o M P. deduz acusação. 
 Caso se verifiquem os pressupostos da suspensão e, designadamente, o acordo do 
 arguido e do assistente sobre as injunções e regras de conduta, o M P. deve 
 colher a concordância do juiz de instrução para o efeito.” - cfr. Comentário do 
 Código de Processo Penal, de Paulo Pinto de Albuquerque, pág. 721 e 722. 
 Ora, aplicando estes ensinamentos ao processo sumário o M. P. e o juiz de 
 julgamento devem apurar em concreto se estão ou não preenchidos os pressupostos 
 de aplicação do instituto e para que esse apuramento seja feito “em concreto”, 
 estes não podem deixar de ouvir o arguido 
 Em face do que se alega, a Relação lançou apenas uma base legal para a 
 inexplicável decisão da 1ª instância. 
 E, com todo o respeito por opinião contrária, julgar-se um acto inútil a 
 inquirição do arguido e das testemunhas por si arroladas, em qualquer fase do 
 processo, ainda que em processo sumário, é inqualificável. 
 Assim, a invocação do artº 137º do Código de Processo Civil trata-se de um mero 
 fait divers que em nada altera o alegado pelo arguido e a questão de 
 constitucionalidade suscitada. 
 Dizer-se, antes de produzida a prova, que não estão preenchidos os requisitos da 
 suspensão provisória do processo, tendo em conta apenas a medição do “teste do 
 balão”, é dizer-se que o grau de culpa se afere ou mede por esse mesmo exame, 
 independentemente das circunstâncias que rodearam o eventual cometimento do 
 crime. 
 Quando muito, a base legal do entendimento que se sufragou enquadrar-se-ia no 
 artº 340º nº 4 al. a) do Código de Processo Penal, no entanto, ainda que se 
 citasse tal norma, sempre a mesma seria inócua para a questão de 
 constitucionalidade suscitada. 
 A questão que subjaz à do presente recurso é a de saber se o Tribunal pode ou 
 não concluir pelo indeferimento da suspensão provisória do processo, concluindo 
 que a gravidade dos factos o desaconselha, sem que confira o contraditório ao 
 arguido e conhecer dos factos por si alegados. 
 Com efeito, concluir-se como se concluiu na primeira instância e no acórdão 
 recorrido que o arguido, por ser portador de um determinado grau de alcoolemia, 
 desde logo lhe está vedada a suspensão provisória do processo, sem que este 
 possa contraditar tal prova e/ou alegar algo em sua defesa, é o mesmo que 
 afastar a possibilidade da aplicação do instituto da suspensão provisória do 
 processo ao crime de condução de veículo em estado de embriaguez. 
 E tal conclusão é ilegal nos dizeres da própria Relação de Guimarães no Acórdão 
 de 20 de Fevereiro de 2006, publicado in CJ, Ano XXXI, tomo 1, pág. 235, no qual 
 se diz “Sendo o instituto da suspensão provisória do processo admissível quanto 
 a todos os crimes puníveis com pena de prisão não superior a cinco anos, não 
 pode o julgador criar excepções onde o legislador não distinguiu, pelo que 
 aquela medida se aplica ao crime de condução em estado de embriaguez.” 
 Tendo em conta o supra exposto, deve entender-se que, atentos os princípios do 
 Estado de Direito, das garantias de defesa e do contraditório, não há lugar a 
 qualquer apreciação liminar do grau de culpa do arguido, sem que nenhuma prova 
 seja produzida para efeito da aplicação do instituto da suspensão provisória do 
 processo. 
 
 1.2 - A EVENTUAL INSTRUMENTALIDADE DA DECISÃO DO PRESENTE RECURSO 
 Acrescenta ainda a decisão impugnada que seria inútil averiguar agora se é 
 inconstitucional que, no momento em que o arguido requer a suspensão provisória 
 do processo, o Tribunal deixe de praticar as diligências instrutórias requeridas 
 para esse fim com base numa apreciação liminar da inviabilidade de aplicação do 
 instituto. 
 E diz-se isto porque no acórdão recorrido se “considerou a imediata imposição de 
 pena necessária para satisfazer as exigências de prevenção que, no caso, se 
 fazem sentir.” 
 Quanto à análise deste passo da decisão reclamada convém referir que o arguido 
 em processo sumário tem de requerer perante o juiz de julgamento a aplicação do 
 instituto da suspensão provisória do processo, uma vez que este tipo de processo 
 não conhece qualquer outra fase (inquérito ou instrução) que não seja a de 
 julgamento. 
 Assim, indeferida a requerida suspensão provisória do processo, seguir-se-á o 
 julgamento e a sentença, pelo que, necessariamente, se se interpuser recurso da 
 decisão da aplicação do instituto da suspensão provisória do processo, este virá 
 ser decidido, também necessariamente, depois da prolação da sentença. 
 Por outro lado, não é impeditivo do conhecimento do recurso de 
 constitucionalidade - nem pode ser - o facto de a sentença condenatória ter sido 
 confirmada pelo acórdão recorrido. 
 Isto porque aquele a quem possa vir a ser aplicada o instituto da suspensão 
 provisória do processo é, necessariamente, culpado e, portanto, em abstracto, 
 merecedor de uma pena. 
 O que está em causa na aplicação do supra aludido instituto é o grau de culpa, 
 ou seja, o juízo de censura que não se pode aquilatar tendo por base apenas um 
 mero “teste de balão”, sem que produza qualquer prova, ainda que requerida. 
 E já agora, como se diz na sentença recorrida (cfr. fls. 33), era média a 
 ilicitude da conduta... 
 Este juízo de censura que há-de ser de menor grau, seria sempre passível, em 
 abstracto, da aplicação de uma pena. 
 Assim, saber se as exigências de prevenção geral e, principalmente, especial, 
 toleram que se aplique o instituto da suspensão provisória do processo, há-de 
 ser sempre um juízo que se há-de fazer em momento posterior à produção da prova 
 por banda do arguido, se requerida. 
 De facto, a prevenção especial é indissociável do indivíduo, devendo entender-se 
 que se aquilata das exigências de prevenção especial quando se pondera se uma 
 pena actua sobre o condenado, quer no sentido seja segregador, afastando-o da 
 sociedade, quer seja educativo, adaptando-o à vida social - cfr. Dicionário de 
 Direito Penal e Processo Penal, Quid Juris, 2005, de Henrique Eiras e 
 Guilhermina Fortes, pág. 322, citando Eduardo Correia. 
 Por fim, dir-se-á que “o dever de privilegiar a aplicação da suspensão 
 provisória do processo, nos termos do art. 12º, n.º 1 al. b) da Lei n.º 51/2007, 
 de 31/08, consubstancia uma opção democrática de política criminal do legislador 
 Português”, pelo que negar-se a sua aplicação sem se ouvir o arguido sobre o que 
 crime que lhe vem imputado, é olvidar essa directiva do legislador violando o 
 princípio do contraditório, das garantias de defesa e do Estado de Direito. - 
 cfr. itálico in Comentário do Código de Processo Penal, de Paulo Pinto de 
 Albuquerque, pág. 726. 
 Assim, não se pode sufragar também, nesta parte, a decisão reclamada, porquanto 
 o conhecimento dos factos alegados pelo arguido em sede de requerimento de 
 suspensão provisória do processo tem de ser anterior à decisão desse mesmo 
 requerimento e, designadamente, à verificação do preenchimento das alíneas e) e 
 f) do n.º 1 do art.º 281º do Código de Processo Penal. 
 E, assim sendo, a eventual revogação do despacho que indefere a suspensão 
 provisória do processo, determinaria também a revogação da sentença recorrida. 
 
  
 
  
 
 3. O Ministério Público responde que a reclamação é manifestamente improcedente, 
 em nada sendo os fundamentos da decisão reclamada abalados pela argumentação do 
 recorrente.
 
             
 
             4. A decisão de não conhecimento do objecto do recurso assentou em 
 dois fundamentos: 
 
  
 
             - Não corresponder a norma identificada pelo recorrente à efectiva 
 ratio decidendi do acórdão recorrido (n.º 4 da “Decisão Sumária”);
 
             - Inutilidade do recurso de constitucionalidade, atendendo à sua 
 natureza instrumental e a que, face ao sentido da decisão final, se tornou certo 
 que as exigências de prevenção geral e especial que no caso se fazem sentir não 
 se compadecem com a suspensão provisória do processo (n.º 5 da “Decisão 
 Sumária”).
 
  
 
             Tratando-se de uma decisão com fundamentos alternativos, cada um 
 deles capaz, por si só e sem nexo de precedência necessária entre si, de 
 suportar a opção pelo não conhecimento do objecto do recurso, bastará que um 
 deles se confirme para manter o sentido da decisão e julgar a reclamação 
 improcedente.
 
  
 
             Ora, a falta de razão do reclamante é manifesta quanto ao primeiro 
 fundamento.
 
             Na verdade, o que está em causa não são os requisitos da suspensão 
 provisória do processo, mas a possibilidade de rejeição liminar do respectivo 
 incidente, possibilidade essa que o acórdão recorrido foi buscar à proibição da 
 prática de actos inúteis, como justificação determinante e não como mero “fait 
 divers” como pretende o arguido, ora reclamante. Com efeito, o acórdão recorrido 
 decidiu que não se justificava que o tribunal de 1.ª instância tivesse efectuado 
 quaisquer diligências em ordem a aquilatar da realidade dos factos alegados pelo 
 arguido para requerer a suspensão provisória do processo uma vez que “proibindo 
 a lei a prática de actos inúteis (artigo 137.º do CPC), não poderia o tribunal a 
 quo proceder a diligências prévias que já reputava supérfluas ou inócuas para a 
 decisão a tomar, e que sempre seria a mesma, independentemente da prova que 
 delas resultasse”. E é inquestionável que a norma que o recorrente pretende ver 
 apreciada não contempla esta dimensão normativa essencial e a respectiva base 
 legal, pelo que o recurso não pode prosseguir por não ter como objecto a norma 
 efectivamente aplicada, como é exigido pela alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da 
 LTC.
 
  
 
             Foi o que na decisão reclamada se decidiu e agora se confirma, sem 
 necessidade de examinar o outro fundamento da reclamação, cuja apreciação fica 
 prejudicada. 
 
  
 
 5. Decisão
 
             
 Pelo exposto, decide-se julgar a reclamação improcedente e condenar o recorrente 
 nas custas, com 20 (vinte) UCs de taxa de justiça.  
 Lisboa, 24/3/2009
 Vítor Gomes
 Ana Maria Guerra Martins
 Gil Galvão