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Processo n.º 901/07
 
 1.ª Secção
 Relator: Conselheiro José Borges Soeiro
 
  
 Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
 
 I – Relatório
 
 1. A.  foi condenada pelas 3.ª e 4.ª Varas Criminais de Lisboa, em cúmulo 
 jurídico, pela prática de um crime de falsificação de documento, de um crime de 
 burla informática qualificada e de um crime agravado de uso de documento falso, 
 na pena de cinco anos e dez meses de prisão.
 Inconformada com o assim decidido, interpôs recurso para o Supremo Tribunal de 
 Justiça, invocando, no que ora importa, que, tendo o tribunal recorrido, para a 
 formação da sua convicção, utilizado as declarações prestadas pela recorrente no 
 primeiro interrogatório perante o juiz de instrução criminal, não o podendo 
 fazer porquanto não se encontravam preenchidos os requisitos legais para tanto, 
 tal constituía uma nulidade insanável que afectava todo o julgamento, devendo 
 portanto o mesmo ser repetido.
 Na perspectiva da Recorrente, outro entendimento que admitisse a valoração da 
 prova como produzida em audiência de discussão e julgamento e que não 
 considerasse que se estava perante uma nulidade insanável seria 
 inconstitucional, convocando, para tanto o artigo 32.º, n.ºs 1 e 5, da 
 Constituição da República Portuguesa (conclusão 10.ª da alegação de recurso, a 
 fls. 4482).
 
 2. O Supremo Tribunal de Justiça concedeu parcial provimento ao recurso, 
 considerando que o mencionado depoimento da recorrente não poderia ter sido 
 levado em conta para a formação da convicção do tribunal, consubstanciando tal 
 vício uma nulidade insanável.
 Contudo, como na audiência de julgamento não tinha sido feita a leitura daquele 
 depoimento, tendo este sido considerado apenas na deliberação, essa nulidade 
 afectaria tão-somente a decisão e já não o julgamento.
 Foi assim declarado nulo o Acórdão, tendo sido determinada a prolação de outro 
 que excluísse como meio de prova as declarações prestadas pela recorrente ao 
 juiz de instrução criminal.
 
 3. Veio, então, a mesma Recorrente interpor recurso do assim decidido, 
 pretendendo sindicar a constitucionalidade, por esta forma enunciada:
 
 “1 - Vem o presente recurso interposto do Acórdão de 27 de Junho de 2007 
 proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça que declarou nulo o acórdão de 21 de 
 Julho de 2006 produzido pelo tribunal de primeira instância e ordenou a prolação 
 de novo acórdão que exclua como meio de prova as declarações prestadas pela 
 recorrente e pelos co-arguidos ao Juiz de Instrução Criminal mas não ordenou a 
 repetição da audiência de julgamento, pretendendo a Recorrente ver apreciada a 
 inconstitucionalidade, por violação dos artigos 2°, 13°, 32° n°s 1 e 5, todos da 
 Constituição da República Portuguesa (nas suas dimensões de princípios da 
 igualdade, da imparcialidade e do contraditório, bem como, especialmente, de 
 direito ao recurso) das normas constantes dos n°s l e 3 do artigo 122°, artigo 
 
 355° e artigo 357°, todos do Código de Processo Penal, efectivamente aplicadas 
 pelo Supremo Tribunal de Justiça de Lisboa, com a interpretação de que a 
 valoração na deliberação da matéria de facto, pelo tribunal de julgamento, das 
 declarações dos arguidos prestadas perante o Juiz de Instrução Criminal, não 
 tendo os arguidos prestado declarações em audiência de julgamento nem mesmo 
 estado presentes na mesma, não afecta a fase de discussão da audiência de 
 julgamento, por nela não terem sido lidas essas declarações, mas apenas a fase 
 de deliberação e os actos a ela subsequentes, sem que assim se tenha de repetir 
 a audiência de julgamento mas apenas elaborar novo acórdão.” 
 O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto, na sua contra-alegação, veio invocar que a 
 questão de inconstitucionalidade, considerando o disposto no artigo 72.º, n.º 2, 
 da Lei do Tribunal Constitucional, não tinha sido processualmente suscitada de 
 modo adequado, pelo que o Tribunal Constitucional não deveria conhecer do 
 recurso.
 Notificada da questão prévia levantada, a Recorrente sustenta a falta de razão 
 do Exmo. Magistrado do Ministério Público, alegando que o Acórdão deste Tribunal 
 em que se sufraga a posição assumida pelo Ministério Público consubstancia 
 matéria inovadora, relativa ao modo como a questão de constitucionalidade deverá 
 ser suscitada, pelo que não seria exigível que a Recorrente, 
 
 “premonitoriamente”, tivesse de seguir tal caminho. Por outro lado, alega ainda 
 que a lei processual não prevê a forma como um recorrente possa dar resposta à 
 posição assumida pelo Ministério Público na contra-alegação do recurso para o 
 Supremo Tribunal de Justiça.
 Razão pela qual invoca a inconstitucionalidade do artigo 72.º, n.ºs 1 e 2 da Lei 
 do Tribunal Constitucional, na interpretação que subjaz à contra-alegação do 
 Ministério Público.
 Conclui, assim, pelo conhecimento do recurso.
 Decidindo.
 II – Fundamentação
 
 4. Verifica-se que a decisão recorrida não surge, de forma inovadora, nos 
 presentes autos, de molde a constituir uma decisão-supresa para efeitos de 
 dispensa do ónus de suscitação atempada da questão de constitucionalidade.
 No Acórdão n.º 542/2007, de 31 de Outubro, disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt, este Tribunal decidiu, na linha de jurisprudência 
 reiterada, conforme no mesmo se refere, contrariamente ao sustentado pela 
 Recorrente.
 Assim, relativamente à questão de saber se o problema de constitucionalidade foi 
 ou não suscitado ainda durante o processo, pode-se ler naquele aresto: 
 
 “O Tribunal Constitucional tem-se pronunciado amiúde no sentido de, em certos 
 casos-limite, não ser exigível a arguição durante o processo de tal questão 
 nomeadamente quando não fosse possível ao interessado antever a possibilidade de 
 aplicação de norma ou dimensão interpretativa ao caso concreto. São as situações 
 em que o Recorrente não teve ‘oportunidade processual’ para arguir a questão 
 antes que tivesse esgotado o poder jurisdicional do Tribunal recorrido por não 
 lhe ser, de todo, exigível a antecipação ou juízo de prognose de tal decisão na 
 dimensão normativa que pretende impugnar.
 De igual modo, também o Tribunal Constitucional se tem pronunciado no sentido de 
 que ‘cabe às partes considerar antecipadamente as várias hipóteses de 
 interpretação razoáveis das normas em questão e suscitar antecipadamente as 
 inconstitucionalidades daí decorrentes antes de ser proferida a decisão (…)’ 
 
 (cfr. Acórdão n.º 489/94, publicado no Diário da República, II Série, de 16 de 
 Dezembro de 1994).”
 Ora, na situação em apreço, o Ministério Público junto do Supremo Tribunal de 
 Justiça, na resposta apresentada às alegações da Recorrente, sustentou que:
 
 “…a unidade decorrente da violação do exposto no artigo 355.º n.º 1, do Código 
 de Processo Penal, invalidou a deliberação do Tribunal colectivo e o Acórdão que 
 lhe deu forma, mas não inquinou a audiência que o precedeu.”
 Assim sendo, a Recorrente sabia desde logo, após a devida notificação do 
 conteúdo desta resposta, nos termos do artigo 413.º, n.º 2 do Código de Processo 
 Penal, que tal interpretação existia e poderia vir a ser acolhida pelo Supremo 
 Tribunal de Justiça. Não lhe assiste, portanto, a faculdade de alegar falta de 
 oportunidade processual para efeito de suscitação atempada da questão de 
 constitucionalidade na medida que o poderia ter feito, quer mediante 
 requerimento ao processo quer em sede de alegações perante aquele Tribunal, 
 razão pela qual a inconstitucionalidade imputada ao artigo 72.º, n.ºs 1 e 2 da 
 Lei do Tribunal Constitucional, é manifestamente infundada na linha do decidido 
 pelo Acórdão 548/2003, disponível www.tribunalcontitucional.pt. 
 Como se decidiu, nomeadamente, nos Acórdãos n.ºs 397/97, publicado no Diário da 
 República, II Série, a 17 de Julho, e 230/2003, disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt, a suscitação da inconstitucionalidade pode 
 ocorrer numas alegações orais, que se traduzem num momento anterior à decisão.
 Porém, nesta hipótese, sobre a parte interessada nessa suscitação impende o ónus 
 de fazer consignar na acta, ditando no pertinente requerimento a aludida 
 invocação.
 Este mesmo entendimento foi também perfilhado no Acórdão n.º 637/96, publicados 
 no Diário da República, II Série, de 9 de Julho de 1996.
 Nestes termos, é obvio que, considerando o disposto no artigo 72.º, n.ºs 1 e 2, 
 da Lei do Tribunal Constitucional, a Recorrente não detinha a faculdade de 
 arguir apenas no momento em que o fez a questão de constitucionalidade acabada 
 de referenciar. 
 
 5. Face à ausência de pressuposto essencial à admissibilidade do recurso – isto 
 
 é, a suscitação atempada da questão de constitucionalidade – não se pode tomar 
 conhecimento do mesmo.
 III – Decisão
 Nestes termos, acordam no Tribunal Constitucional, em não tomar conhecimento do 
 recurso de constitucionalidade.
 Custas pela Recorrente, fixando a taxa de justiça em 12 (doze) UCs.
 Lisboa, 4 de Março de 2008
 José Borges Soeiro
 Maria João Antunes
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Gil Galvão
 Rui Manuel Moura Ramos