 Imprimir acórdão
 Imprimir acórdão   
			
Processo n.º 562/08
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Mário Torres
 
 
 
      Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,
 
  
 
  
 
                         1. A., SA, apresentou reclamação para a conferência, ao 
 abrigo do n.º 3 do artigo 78.º‑A da Lei de Organização, Funcionamento e 
 Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de 
 Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 13‑A/98, de 26 de Fevereiro 
 
 (LTC), contra a decisão sumária do relator, de 14 de Julho de 2008, que 
 decidiu, no uso da faculdade conferida pelo n.º 1 desse preceito, não conhecer 
 do objecto do recurso.
 
  
 
                         1.1. A referida decisão sumária tem a seguinte 
 fundamentação:
 
  
 
             “1. A., SA, interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao 
 abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da [LTC], contra o acórdão do 
 Supremo Tribunal de Justiça (STJ), de 17 de Abril de 2008, que negou provimento 
 ao recurso de revista por ela interposto do acórdão do Tribunal da Relação de 
 Coimbra, que, concedendo provimento ao recurso de apelação deduzido por B., 
 SA, anulou, nos termos dos artigos 13.º, 19.º, n.ºs 1 e 4, e 27.º, n.º 1, 
 alínea b), da Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto (Lei de Arbitragem Voluntária – 
 LAV) [a decisão do Tribunal Arbitral]. De acordo com o respectivo requerimento 
 de interposição de recurso, a recorrente pretende ver apreciada a 
 inconstitucionalidade, por violação do artigo 20.º, n.ºs 1 e 4, da Constituição 
 da República Portuguesa (CRP), da «norma resultante da interpretação conjugada 
 do disposto nos n.ºs 2 e 4 do artigo 19.º e da alínea c) do artigo 13.º da Lei 
 da Arbitragem Voluntária (Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto), no sentido de que, 
 estando o Tribunal impossibilitado de decidir no prazo do artigo 19.º da LAV 
 por motivo de escusa do árbitro presidente e sendo nomeado um árbitro 
 substituto, não é aplicável, nem, por analogia, o regime de suspensão por 
 impedimento do mandatário (artigo 287.º do CPC), nem o regime de suspensão por 
 determinação dos árbitros (artigo 279.º, n.º 1, do CPC), por se tratar de um 
 prazo de caducidade que apenas se suspende nos casos em que a lei o determine e 
 não se considerar para tais efeitos as normas legais atrás referidas, nem 
 tão‑pouco é aplicável o regime da suspensão da caducidade convencional porque a 
 prorrogação, por acordo, daquele prazo de decisão (artigo 19.º, n.º 4, da LAV) 
 exclui a hipótese de se suscitarem dúvidas quanto à vontade das partes, no que 
 toca à possibilidade de suspensão», questão de inconstitucionalidade esta que 
 teria sido suscitada, perante o STJ, nas alegações de revista da recorrente, 
 mais concretamente na respectiva conclusão IX e fundamentada nos pontos 69 a 
 
 101 dessa alegação.
 
             O recurso foi admitido pelo Conselheiro Relator do STJ, decisão que, 
 como é sabido, não vincula o Tribunal Constitucional (artigo 76.º, n.º 3, da 
 LTC) e, de facto, entende‑se que o recurso em causa é inadmissível, o que 
 possibilita a prolação de decisão sumária de não conhecimento, ao abrigo do 
 disposto no n.º 1 do artigo 78.º‑A da LTC.
 
  
 
             2. No sistema português de fiscalização de constitucionalidade, a 
 competência atribuída ao Tribunal Constitucional cinge‑se ao controlo da 
 inconstitucionalidade normativa, ou seja, das questões de desconformidade 
 constitucional imputada a normas jurídicas (ou a interpretações normativas, 
 hipótese em que o recorrente deve indicar, com clareza e precisão, qual o 
 sentido da interpretação que reputa inconstitucional), e já não das questões de 
 inconstitucionalidade imputadas directamente a decisões judiciais, em si 
 mesmas consideradas.
 
             Por outro lado, tratando‑se de recursos interpostos ao abrigo [da 
 alínea b)] do n.º 1 do artigo 70.º da LTC – como ocorre no presente caso –, a 
 sua admissibilidade depende da verificação cumulativa dos requisitos de a 
 questão de inconstitucionalidade […] haver sido suscitada «durante o 
 processo», «de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu 
 a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» (n.º 2 
 do artigo 72.º da LTC), e de a decisão recorrida ter feito aplicação, como sua 
 ratio decidendi, das dimensões normativas arguidas de inconstitucionais […] 
 pelo recorrente.
 
             Acresce que, quando o recorrente questiona a conformidade 
 constitucional de uma interpretação normativa, deve identificar essa 
 interpretação com o mínimo de precisão, não sendo idóneo, para esse efeito, o 
 uso de fórmulas como «na interpretação dada pela decisão recorrida» ou 
 similares. Com efeito, constitui orientação pacífica deste Tribunal a de que 
 
 (utilizando a formulação do Acórdão n.º 367/94) «ao suscitar‑se a questão de 
 inconstitucionalidade, pode questionar‑se todo um preceito legal, apenas parte 
 dele ou tão‑só uma interpretação que do mesmo se faça. (...) [E]sse sentido 
 
 (essa dimensão normativa) do preceito há‑de ser enunciado de forma que, no caso 
 de vir a ser julgado inconstitucional, o Tribunal o possa apresentar na sua 
 decisão em termos de, tanto os destinatários desta, como, em geral, os 
 operadores do direito ficarem a saber, sem margem para dúvidas, qual o sentido 
 com que o preceito em causa não deve ser aplicado, por, deste modo, violar a 
 Constituição.»
 
                                    
 
             3. Nos n.ºs 69 a 101 e na conclusão IX da alegação do recurso de 
 revista da ora recorrente, locais onde, segundo ela, teria sido suscitada a 
 questão de inconstitucionalidade que pretende ver apreciada, consta o seguinte:
 
  
 
             «69 – Na verdade, a interpretação dos artigos 4.°, n.º 1, alínea c), 
 
 13.° e 19.°, n.ºs 2 e 4, da LAV levada a cabo pelo acórdão recorrido é, a nosso 
 ver, inconstitucional.
 
             70 – Efectivamente, a negação de efeito suspensivo do prazo de 
 decisão do Tribunal Arbitral (artigo 19.° da LAV) no caso de suspensão da 
 instância decorrente da impossibilidade definitiva e superveniente do árbitro 
 presidente substituído nos termos do artigo 13.º da LAV é, sem margem para 
 dúvidas, inconstitucional; senão vejamos:
 
             71 – A convenção de arbitragem é o acordo mediante o qual as partes 
 confiam a decisão de litígios actuais ou futuros, emergentes de uma 
 determinada relação jurídica, a um Tribunal Arbitral.
 
             72 – O principal efeito positivo da convenção de arbitragem 
 consiste em conferir competência ao Tribunal Arbitral para decidir sobre tais 
 pleitos, conferindo‑lhe a mesma força de uma decisão judicial.
 
             73 – O principal efeito negativo consiste em subtrair aos Tribunais 
 Judiciais a competência para decidir sobre esses mesmos pleitos abrangidos pela 
 convenção de arbitragem.
 
             74 – A LAV, no seu artigo 19.°, introduziu o prazo para a decisão 
 do Tribunal Arbitral por forma a garantir às partes que tal processo, que é 
 voluntário, não inviabilizaria a apreciação conclusiva dos seus direitos.
 
             75 – Tal permite também, dependendo do prazo acordado, garantir a 
 celeridade da arbitragem voluntária, mas essencialmente a lei visou garantir 
 que os árbitros não protelariam indefinidamente os processos sem chegar a 
 proferir decisão.
 
             76 – O interesse subjacente ao prazo da decisão do artigo 19.° é 
 assim um interesse particular das partes envolvidas: o de verem o seu litígio 
 decidido.
 
             77 – Para garantir esse mesmo fim o mesmo artigo 19.°, no n.º 5, 
 estipula que os árbitros são responsáveis pelos danos que a falta de decisão 
 dentro do prazo fixado cause às partes.
 
             78 – Ocorrendo impossibilidade superveniente e definitiva de um 
 
 árbitro, mormente do árbitro presidente, não podendo o processo prosseguir, o 
 prazo de decisão tem necessariamente de considerar‑se suspenso pelo período 
 necessário à referida substituição, desde que sejam iniciadas as diligências 
 necessárias para a sua nomeação em conformidade com o disposto no artigo 11.º, 
 ex vi artigo 13.°, da LAV.
 
             79 – Pois não se trata de mera dificuldade em proferir a decisão no 
 prazo supletivamente fixado por lei e prorrogado pelas partes, mas sim de 
 impossibilidade dos árbitros.
 
             80 – A suspensão da instância arbitral e portanto do prazo de 
 decisão é a única forma de salvaguardar os interesses de todas as partes 
 envolvidas, isto é, as partes que se comprometeram a aceitar a decisão do 
 tribunal arbitral e os árbitros que se comprometeram a proferir uma decisão 
 sobre o pleito no prazo fixado.
 
             81 – Mas, sobretudo, a suspensão da instância arbitral e portanto do 
 prazo de decisão é a única forma de salvaguardar o princípio do acesso ao 
 direito e aos tribunais e o direito das partes à decisão.
 
             82 – A defesa da interpretação oposta – que o prazo de decisão não 
 se suspende no caso de substituição do árbitro presidente impossibilitado – 
 não serve qualquer fim ou interesse, seja ele público ou privado.
 
             83 – E o resultado alcançado por esta interpretação (levada a cabo 
 pelo acórdão recorrido) é apenas um: a denegação de justiça.
 
             84 – No caso em apreço, tal interpretação é totalmente inadmissível 
 e inaceitável, porque gritantemente injusta.
 
             Senão, vejamos:
 
             85 – Conforme sumariamente ficou relatado supra na descrição dos 
 factos processuais relativos ao presente litígio (…), a autora recorrente, que 
 reclama um crédito sobre a ré recorrida, em 4 de Dezembro de 1996 deu início ao 
 processo de arbitragem (artigo 11.º da Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto), dando 
 cumprimento à obrigação assumida na convenção arbitral.
 
             86 – A ré recorrida incumpriu sucessivamente a convenção de 
 arbitragem – não pretendendo a conciliação, não aceitando o objecto do litígio, 
 não aceitando sequer a validade da convenção de arbitragem ou mesmo o contrato 
 de subempreitada em que ele se encontrava inserido – forçando a autora 
 recorrente a sucessivamente recorrer aos meios judiciais ao seu alcance para, 
 
 (só) em 30 de Junho de 2004, finalmente, lograr concluir a constituição do 
 Tribunal Arbitral.
 
             87 – Uma vez que não existem prazos de caducidade seja para a 
 constituição do Tribunal Arbitral, seja para a determinação do objecto do 
 litígio, para o cumprimento pelas partes da convenção de arbitragem, seja ainda 
 para a vigência global da convenção de arbitragem, durante aproximadamente 8 
 anos a autora recorrente viu‑se impossibilitada de obter uma decisão, arbitral 
 ou judicial, sobre a sua pretensão.
 
             88 – Com os inerentes prejuízos que tal delonga causou à autora 
 recorrente mas que esta suportou continuando a cumprir a convenção de 
 arbitragem com vista ao fim do litígio.
 
             89 – Uma vez concluído o julgamento pelo Tribunal Arbitral e 
 apresentadas as alegações das partes, quando faltavam apenas 33 dias para o 
 termo da prorrogação do prazo para proferir a decisão, o árbitro presidente 
 pediu escusa por motivo de impossibilidade física permanente, nos termos do 
 artigo 9.°, n.º 1, da LAV.
 
             90 – Foi ainda o árbitro presidente que, ciente dos prejuízos que 
 involuntariamente iria causar às partes – nomeadamente à autora recorrente que 
 desde 1996 reclama um crédito – diligenciou junto de partes e árbitros adjuntos 
 pela nomeação por acordo do Ex.mo Sr. Conselheiro Dr. C. para árbitro presidente 
 substituto, o que veio a acontecer por via da indigitação deste em 13 de Maio 
 de 2005.
 
             91 – Apesar de a nomeação ter sido consensual e por isso não ser 
 necessário, como anteriormente, recorrer aos mecanismos do artigo 12.º da LAV, 
 o árbitro indigitado, para aceitar responsabilizar‑se pela decisão que viesse a 
 ser proferida pelo Tribunal Arbitral, necessitou obviamente de analisar o 
 processo, que é complexo e muito extenso.
 
             92 – Ora, o prazo necessário à substituição do árbitro presidente em 
 funções não pode, por obediência a um pretenso princípio de legalidade estrita 
 
 – de resto, sem sentido num processo de arbitragem voluntária – desconsiderar 
 todos os demais princípios enformadores do nosso sistema jurídico.
 
             93 – As partes têm direito a obter uma decisão sobre o seu litígio, 
 e tal direito vem expressamente consagrado na Constituição da República 
 Portuguesa, no seu artigo 20.º, n.º 4: ‘Todos têm direito a que uma causa em 
 que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo 
 equitativo’.
 
             94 – É esse justamente o direito que subjaz ao artigo 19.° da LAV, e 
 justamente por isso os árbitros têm a obrigação de proferirem uma decisão no 
 prazo fixado, sob pena de responderem pelos danos que tal omissão cause às 
 partes.
 
             95 – Porém, no caso de impossibilidade de o Tribunal Arbitral 
 decidir, estando expressamente prevista a substituição dos árbitros 
 impossibilitados (artigo 13.° da LAV) por forma a salvaguardar o interesse das 
 partes na obtenção de uma decisão sobre o litígio em conformidade com a sua 
 convenção de arbitragem, é essencial interpretar o mecanismo da substituição por 
 forma a torná‑lo exequível, sob pena de negar o próprio direito que lhe subjaz: 
 o direito à decisão.
 
             96 – Na substituição de árbitros o novo árbitro assume a 
 responsabilidade por proferir uma decisão (artigo 19.°, n.º 5, da LAV) e 
 também pela decisão que irá proferir.
 
             97 – Ora, se não forem concedidas as condições necessárias à 
 substituição, tal responsabilidade não será assumida, inviabilizando a 
 substituição e, consequentemente, ‘violando’ o direito das partes à decisão, 
 sem sequer existirem responsáveis pelos danos que tal cause às partes.
 
             98 – O direito à decisão é assim negado às partes por esta via, sem 
 qualquer justificação, obrigando‑as a iniciar um novo processo nos Tribunais 
 Judiciais para dirimir o respectivo litígio.
 
             99 – No caso em apreço, tendo decorrido 10 anos com a instância 
 arbitral, resta agora ter tempo e capacidade, financeira e moral, para suportar 
 um litígio desta envergadura por mais uns largos anos nos nossos Tribunais 
 Judiciais cuja disponibilidade é cada vez menor e cujas custas são cada vez 
 maiores.
 
             100 – Isto porque o processo arbitral, apesar de suspenso, 
 alegadamente não suspende o prazo de decisão do artigo 19.° da LAV pelo prazo 
 necessário à substituição do árbitro presidente em conformidade com o disposto 
 no artigo 13.° da mesma LAV.
 
             101 – Tal interpretação do disposto nos artigos 4.°, n.º 1, alínea 
 c), 13.º e 19.º da LAV, no caso concreto, consubstancia por isso uma clara 
 denegação de justiça, pelo que viola o disposto no artigo 20.°, n.ºs 1 e 4, da 
 Constituição da República Portuguesa, inconstitucionalidade que expressamente se 
 argúi.
 
             (…)
 
             Conclusões:
 
             (…)
 
             IX. A interpretação levada a cabo pelo acórdão recorrido dos 
 artigos 4.°, n.º 1, alínea c), 13.° e 19.°, n.ºs 2 e 4, da LAV, no caso 
 concreto, consubstancia uma clara denegação de justiça e violação do direito à 
 decisão, pelo que viola o disposto no artigo 20.°, n.ºs 1 e 4, da Constituição 
 da República Portuguesa, inconstitucionalidade que expressamente se argúi.»
 
  
 
             Da precedente transcrição resulta inequivocamente a 
 inadmissibilidade do presente recurso por uma dupla ordem de razões. Desde logo 
 porque os termos em que a recorrente coloca a questão não permitem 
 qualificá‑la como uma questão de inconstitucionalidade normativa, única que 
 seria idónea para integrar o objecto de um recurso de constitucionalidade; na 
 verdade, o que, em rigor, a recorrente questiona é a concreta decisão judicial 
 das instâncias que, perante as especificidades irrepetíveis do caso concreto, 
 não teriam efectuado correctamente a tarefa da sua subsunção ao quadro normativo 
 aplicável. Ora, a inconstitucionalidade do concreto juízo subsuntivo feito 
 pelas instâncias não integra uma questão de inconstitucionalidade normativa 
 susceptível de ser conhecida pelo Tribunal Constitucional. Depois, porque, mesmo 
 que fosse possível vislumbrar carácter normativo na questão colocada pela 
 recorrente, o certo é que ela, perante o tribunal recorrido, não suscitou a 
 questão de inconstitucionalidade nos termos em que agora a identificou no 
 requerimento de interposição de recurso, nenhum alusão constando nas passagens 
 por si assinaladas da alegação do recurso de revista à pretensa 
 inconstitucionalidade que derivaria da não aplicação analógica do regime de 
 suspensão por impedimento do mandatário (artigo 287.º do CPC) ou do regime de 
 suspensão por determinação dos árbitros (artigo 279.º, n.º 1, do CPC). Isto é: 
 não existe coincidência entre o «critério normativo» identificado no 
 requerimento de interposição de recurso de constitucionalidade e o «critério» 
 arguido de inconstitucional na alegação da revista, nem, logicamente, o 
 
 «critério» que teria sido aplicado no acórdão recorrido.
 
             Por estas razões, o presente recurso surge como inadmissível, o que 
 determina o não conhecimento do seu objecto.”
 
  
 
                         1.2. A reclamação da recorrente desenvolve a seguinte 
 argumentação:
 
  
 
             “1 – A Decisão Sumária antecedente não conheceu do objecto do 
 recurso por inadmissibilidade do recurso interposto pela recorrente com, em 
 síntese, os seguintes fundamentos:
 
             a) «A inconstitucionalidade do concreto juízo subsuntivo feito pelas 
 instâncias não integra um questão de inconstitucionalidade normativa 
 susceptível de ser conhecida pelo Tribunal Constitucional»;
 
             b) «A recorrente não suscitou a questão de inconstitucionalidade nos 
 termos em que agora a identificou no requerimento de interposição de recurso, 
 nenhuma alusão constando nas passagens por si assinaladas da alegação do recurso 
 de revista à pretensa inconstitucionalidade que derivaria da não aplicação 
 analógica do regime de suspensão por impedimento do mandatário (artigo 287.º do 
 CPC) ou do regime de suspensão por determinação dos árbitros (artigo 279.º, n.º 
 
 1,  do CPC)».
 
             2 – Salvo o devido respeito, a reclamante não concorda com a decisão 
 proferida.
 
             3 – Desde logo não concorda porque o recurso interposto pelo 
 recorrente visa a apreciação da constitucionalidade da «interpretação dos 
 artigos 4.º, n.º 1 alínea c), 13.º e 19.º, n.ºs 2 e 4, da LAV» (cf. ponto 69 das 
 alegações de revista), e não o concreto juízo subsuntivo levado a cabo pelas 
 instâncias.
 
             4 – Efectivamente o que está em causa e o que a recorrente pretendia 
 ver apreciado não era o facto do Supremo Tribunal de Justiça e as demais 
 instâncias considerarem excessiva a suspensão durante 5 meses do prazo de 
 decisão pelo Tribunal Arbitral para substituição do Árbitro Presidente 
 impossibilitado num processo que já leva 10 anos de litígio arbitral, pois tal 
 questão já foi definitivamente julgada por aquela instância.
 
             5 – Nesta instância, na ausência de normas expressas na lei da 
 arbitragem voluntária sobre a suspensão da instância para efeitos de 
 substituição do árbitro impedido, a recorrente pretendia efectivamente que o 
 Tribunal Constitucional se pronunciasse sobre a constitucionalidade da 
 interpretação do disposto nos n.ºs 2 e 4 do artigo 19.º e na alínea c) do 
 artigo 13.º da Lei da Arbitragem Voluntária (Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto), 
 no sentido de que, estando o Tribunal impossibilitado de decidir no prazo do 
 artigo 19.º da LAV por motivo de escusa do árbitro presidente e sendo nomeado um 
 
 árbitro substituto, não é aplicável, nem, por analogia, o regime de suspensão 
 por impedimento do mandatário (artigo 278.º do CPC), nem o regime de suspensão 
 por determinação dos árbitros (artigo 279.º, n.º 1, do CPC), por se tratar de um 
 prazo de caducidade que apenas se suspende nos casos em que a lei o determine 
 e não se considerar para tais efeitos as normas legais atrás referidas, nem 
 tão‑pouco é aplicável o regime da suspensão da caducidade convencional porque 
 a prorrogação, por acordo, daquele prazo de decisão (artigo 19.º, n.º 4, da 
 LAV) exclui a hipótese de se suscitarem dúvidas quanto à vontade das partes, no 
 que toca à possibilidade de suspensão.
 
             6 – Ora a concreta subsunção feita pelas instâncias no processo 
 deixou de estar em causa para dar lugar a uma questão mais profunda e de maior 
 alcance: a da inconstitucionalidade da interpretação normativa subjacente às 
 precedentes decisões daquelas instâncias.
 
             7 – Em suma, trata‑se de saber se efectivamente a interpretação das 
 instâncias segundo a qual o prazo de decisão do tribunal arbitral em caso de 
 escusa de árbitro seguida de substituição não admite suspensão, viola ou não a 
 nossa Constituição, nomeadamente o artigo 20.º, n.ºs 1 e 4, da CRP.
 
             8 – Estando, pois, em causa uma determinada interpretação normativa 
 e não o concreto juízo de subsunção levado a cabo pelas instâncias no caso dos 
 autos, salvo o devido respeito, carece de fundamento a Decisão Sumária, ao 
 considerar o presente recurso inadmissível nos termos e para os efeitos no 
 disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro 
 
 (na versão actualmente em vigor).
 
             9 – A Decisão Sumária considerou o recurso inadmissível, em segundo 
 lugar, porque, no seu entendimento, apesar da questão da constitucionalidade ter 
 sido invocada perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, a 
 
 «interpretação normativa» identificada no requerimento de recurso, no seu 
 entender, não coincide com a «interpretação normativa» constante da alegação de 
 recurso.
 
             10 – Efectivamente, a recorrente invocou, fundamentou e concluiu a 
 questão da constitucionalidade em sede de alegações de revista, ou seja «durante 
 o processo», cumprindo assim o requisito de admissibilidade dos recursos 
 consagrado no artigo 72.º, n.º 2, da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro.
 
             11 – No entanto, não o fez com os mesmos termos que o veio a fazer 
 agora em sede de recurso para o Tribunal Constitucional.
 
             12 – A questão da constitucionalidade foi expressamente invocada 
 perante o Supremo Tribunal de Justiça no seguimento da arguição de diversas 
 interpretações normativas em prol da suspensão do prazo de decisão do tribunal 
 arbitral previsto pelo artigo 19.º da LAV.
 
             13 – Ora, foi nesse contexto que a recorrente arguiu a 
 inconstitucionalidade da decisão das instâncias que aplicou uma interpretação 
 normativa que excluía a suspensão do prazo de decisão do tribunal arbitral em 
 caso de escusa e substituição de árbitro.
 
             14 – Em sede de recurso para este Venerando Tribunal Constitucional, 
 a recorrente fez um esforço acrescido para de forma concisa mas abrangente 
 reproduzir as «interpretações normativas» da suspensão do prazo de decisão do 
 tribunal arbitral que as instâncias não aplicaram, sendo justamente essa recusa 
 das instâncias que a recorrente qualifica ou interpreta como sendo 
 inconstitucional.
 
             15 – Não é, pois, rigoroso afirmar que não existe coincidência entre 
 o critério normativo invocado nas alegações de revista e o constante do recurso 
 para o Tribunal Constitucional.
 
             16 – O que houve foi uma formulação mais concisa e rigorosa da 
 interpretação normativa reputada de inconstitucional em sede de recurso para o 
 Tribunal Constitucional.
 
             Nestes termos,
 
             Deve ser dado provimento à presente reclamação e a final ser 
 revogada a Decisão Sumária ora reclamada e ordenado o prosseguimento do recurso 
 interposto para apreciação da constitucionalidade da interpretação do disposto 
 nos n.ºs 2 e 4 do artigo 19.º e da alínea c) do artigo 13.º da Lei da Arbitragem 
 Voluntária (Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto), no sentido de que, estando o 
 Tribunal impossibilitado de decidir no prazo do artigo 19.º da LAV por motivo 
 de escusa do árbitro e sendo nomeado um árbitro substituto, não é aplicável, 
 nem, por analogia, o regime de suspensão por impedimento do mandatário (artigo 
 
 278.º do CPC), nem o regime de suspensão por determinação dos árbitros (artigo 
 
 279.º, n.º 1, do CPC), por se tratar de um prazo de caducidade que apenas se 
 suspende nos casos em que a lei o determine e não se considerar para tais 
 efeitos as normas legais atrás referidas, nem tão‑pouco é aplicável o regime da 
 suspensão da caducidade convencional porque a prorrogação, por acordo, daquele 
 prazo de decisão (artigo 19.º, n.º 4, da LAV) exclui a hipótese de se suscitarem 
 dúvidas quanto à vontade das partes, no que toca à possibilidade de suspensão.”
 
  
 
                         1.3. A recorrida B., SA, não apresentou resposta.
 
                         Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
                         2. O objecto da reclamação de decisão sumária de não 
 conhecimento do recurso cinge‑se à apreciação da correcção das razões pelas 
 quais na decisão reclamada se entendeu não se verificarem os pressupostos do 
 conhecimento do recurso de constitucionalidade. No presente caso, essas razões 
 consistiram: (i) por um lado, no entendimento de que os termos em que a 
 recorrente definiu a questão ao longo do processo não permitem qualificá‑la 
 como uma questão de inconstitucionalidade normativa (única que seria idónea para 
 integrar o objecto de um recurso de constitucionalidade), uma vez que a 
 recorrente questiona directamente a concreta decisão judicial das instâncias 
 que, perante as especificidades irrepetíveis do caso concreto, não teriam 
 efectuado correctamente a tarefa da sua subsunção ao quadro normativo 
 aplicável; (ii) por outro lado, na constatação de que, mesmo que fosse possível 
 vislumbrar carácter normativo na questão colocada pela recorrente, o certo é 
 que ela, perante o tribunal recorrido, não suscitou a questão de 
 inconstitucionalidade nos termos em que agora a identificou no requerimento de 
 interposição de recurso, nenhuma alusão constando nas passagens por si 
 assinaladas da alegação do recurso de revista à pretensa inconstitucionalidade 
 que derivaria da não aplicação analógica do regime de suspensão por impedimento 
 do mandatário (artigo 287.º do CPC) ou do regime de suspensão por 
 determinação dos árbitros (artigo 279.º, n.º 1, do CPC), o que determina que 
 não haja coincidência entre o “critério normativo” identificado no 
 requerimento de interposição de recurso de constitucionalidade e o “critério” 
 arguido de inconstitucional na alegação da revista.
 
                         Entende‑se que nenhum destes fundamentos foi abalado 
 pela reclamação da recorrente.
 
                         Nas passagens, atrás transcritas, da sua alegação de 
 revista, a recorrente imputa a violação da Constituição directamente ao modo 
 como a decisão judicial então impugnada (o acórdão do Tribunal da Relação de 
 Coimbra) fizera aplicação das normas dos artigos 4.º, n.º 1, alínea c), 13.º e 
 
 19.º da LAV ao caso concreto, atentas as especificidades deste, designadamente 
 as demoras havidas na constituição do tribunal arbitral e as vicissitudes 
 ocorridas com a substituição do árbitro presidente e o tempo consumido pelo 
 indigitado substituto em aceitar a indigitação. Por isso, não logrou a 
 recorrente enunciar, nessa peça processual, uma formulação, dotada das 
 necessárias generalidade e abstracção, do critério normativo tido por 
 inconstitucional, que habilitasse o Tribunal Constitucional, caso o presente 
 recurso fosse admissível e obtivesse provimento, a emitir uma decisão “em termos 
 de, tanto os destinatários desta, como, em geral, os operadores do direito 
 ficarem a saber, sem margem para dúvidas, qual o sentido com que o preceito em 
 causa não deve ser aplicado, por, deste modo, violar a Constituição”.
 
                         Por outro lado, a própria reclamante reconhece, na 
 presente reclamação (cf. n.ºs 10 e 11), que não suscitou a questão de 
 inconstitucionalidade em sede de alegações de revista “com os mesmos termos em 
 que o veio a fazer agora em sede de recurso para o Tribunal Constitucional”. 
 Aduz a reclamante que utilizou apenas “uma formulação mais concisa e rigorosa da 
 interpretação normativa reputada de inconstitucional”, o que não afectaria a 
 existência de coincidência entre o critério normativo invocado nas alegações de 
 revista e o constante do recurso para o Tribunal Constitucional. Não é, porém, 
 assim. Naquelas alegações foi suscitada a inconstitucionalidade da aplicação, ao 
 caso concreto, do entendimento de que a suspensão da instância arbitral não 
 suspende o prazo de decisão do tribunal arbitral. No requerimento de 
 interposição de recurso foi identificado como constituindo seu objecto a questão 
 da inconstitucionalidade da «norma resultante da interpretação conjugada do 
 disposto nos n.ºs 2 e 4 do artigo 19.º e da alínea c) do artigo 13.º da Lei da 
 Arbitragem Voluntária (Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto), no sentido de que, 
 estando o Tribunal impossibilitado de decidir no prazo do artigo 19.º da LAV 
 por motivo de escusa do árbitro presidente e sendo nomeado um árbitro 
 substituto, não é aplicável, nem, por analogia, o regime de suspensão por 
 impedimento do mandatário (artigo 287.º do CPC), nem o regime de suspensão por 
 determinação dos árbitros (artigo 279.º, n.º 1, do CPC), por se tratar de um 
 prazo de caducidade que apenas se suspende nos casos em que a lei o determine 
 e não se considerar para tais efeitos as normas legais atrás referidas, nem 
 tão‑pouco é aplicável o regime da suspensão da caducidade convencional porque a 
 prorrogação, por acordo, daquele prazo de decisão (artigo 19.º, n.º 4, da LAV) 
 exclui a hipótese de se suscitarem dúvidas quanto à vontade das partes, no que 
 toca à possibilidade de suspensão». Trata‑se, manifestamente, de questão 
 diferente da suscitada nas alegações da revista, e não de mera reformulação 
 mais concisa da então enunciada. São questões distintas a da 
 inconstitucionalidade do entendimento de que a suspensão da instância arbitral 
 não suspende o prazo de decisão do tribunal arbitral e a da 
 inconstitucionalidade do entendimento da inaplicabilidade, por analogia, a uma 
 situação de substituição do árbitro presidente, do regime de suspensão por 
 impedimento do mandatário e de suspensão por determinação dos árbitros. Esta 
 questão, identificada no requerimento de interposição de recurso, não foi 
 suscitada perante o tribunal recorrido, o que determina a inadmissibilidade do 
 presente recurso, como entendeu a decisão sumária ora reclamada, que, assim, 
 merece confirmação.
 
  
 
                         3. Termos em que acordam em indeferir a presente 
 reclamação, confirmando a decisão sumária reclamada.
 
                         Custas pela recorrente, fixando‑se a taxa de justiça em 
 
 20 (vinte) unidades de conta.
 Lisboa, 23 de Setembro de 2008.
 Mário José de Araújo Torres
 João Cura Mariano
 Rui Manuel Moura Ramos