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Processo n.º 966/07
 
 2ª Secção
 Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro
 
 
 
        Acordam, em conferência, na 2ª secção do Tribunal Constitucional
 
             
 I - Relatório   
 
  
 
 1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos 
 do Tribunal da Relação de Lisboa, em que é recorrente A. e recorridos B. e C., o 
 relator proferiu decisão sumária de não conhecimento do objecto do recurso, nos 
 termos seguintes:
 
 «1. A. interpôs recurso, ao abrigo das alíneas b) e g) do n.º 1 do artigo 70.º 
 da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional 
 
 (LTC), para apreciação da inconstitucionalidade da aplicação da norma do artigo 
 
 456.º do CPC sem a tramitação prevista nos artigos 3.º e 3.º-A do CPC.
 
 2. É pressuposto específico do recurso de constitucionalidade que a decisão 
 recorrida tenha feito aplicação da norma ou interpretação normativa que o 
 recorrente reputa de inconstitucional (quanto ao recurso previsto na alínea b) 
 do n.º 1 do artigo 70.º) ou que foi anteriormente julgada inconstitucional pelo 
 Tribunal Constitucional (quanto ao recurso da alínea g) do mesmo preceito).
 Em qualquer dos casos não está aqui verificado esse pressuposto, o que justifica 
 a prolação de decisão sumária, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC.
 De facto, como é salientado no despacho do tribunal a quo que admitiu o presente 
 recurso (fls. 104 dos autos), o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 
 
 09.11.2006, não acolheu o entendimento do artigo 456.º que o recorrente lhe 
 imputa, mas precisamente o entendimento contrário, i.e., o de que a condenação 
 como litigante de má fé, prevista no artigo 456.º do CPC, exige, sob pena de 
 inconstitucionalidade, a prévia audição dos interessados quanto a essa matéria 
 
 (cfr. ponto II da decisão, a fls. 76/76v.). Tanto assim, que, com esse 
 fundamento, revogou a decisão de primeira instância na parte relativa à 
 condenação do mandatário do recorrente. Simplesmente, quanto ao próprio 
 recorrente, entendeu-se na decisão recorrida que o mesmo tinha sido «notificado 
 sucessivamente da arguição por parte das agravadas, da sua litigância de má fé», 
 pelo que, quanto a ele, não havia violação do princípio do contraditório.
 Não estão, por isso, reunidos os pressupostos de admissibilidade do recurso 
 interposto ao abrigo das alíneas b) e g) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.
 
 3. Pelo exposto, e nos termos do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, decide-se não 
 conhecer do objecto do presente recurso.
 Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 (sete) UC.»
 
  
 
 2. Notificado desta decisão, o recorrente veio reclamar para a conferência, ao 
 abrigo do artigo 78.º-A, n.º 3, da LTC, com fundamento no seguinte:
 
 «[…] 1. Nos termos previstos nos n.°s 1 e 2 do artigo 3.° do CPC, salvo os casos 
 excepcionais previstos na lei, o tribunal não pode resolver o conflito de 
 interesses que a acção pressupõe sem que a resolução lhe seja pedida por uma das 
 partes e a outra seja devidamente chamada a deduzir oposição. 
 
 2. As AAs nunca formularam qualquer pedido de condenação do R. como litigante de 
 má fé, ao contrário do que é aludido quer no Douto Despacho do Tribunal de 1.ª 
 Instância, a fls. 657, como no Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 
 
 09-11-2006. 
 
 (v. fls. 503 a 505 e fls. 617 a 620 da acção principal) 
 Por outro lado, 
 
 3. Conforme se encontra vertido no Douto Despacho do Tribunal de 1ª Instância o 
 R. foi condenado como litigante de má fé, por conhecimento oficioso, conforme 
 consta da respectiva apreciação a fls. 663 e seguintes da acção principal, 
 baseando-se tal condenação pelo exercício inadmissível de uma posição jurídica 
 que configura o abuso de direito de apoio judiciário (art.° 334.° CC). 
 
 4. O que é confirmado e explicitado no Douto Acórdão do Tribunal da Relação de 
 Lisboa de 09-11-2006, o qual na respectiva Fundamentação de Direito considera 
 que em causa está questão de conhecimento oficioso. 
 
 5. O Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 09-11-2006 também realça 
 que o artigo 3.° do CPC, que consagra o princípio do contraditório, impõe que o 
 tribunal não pode resolver o conflito de interesses e decidir questão de direito 
 ou de facto, mesmo de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham a 
 possibilidade de sobre elas se pronunciarem. 
 
 6. O R. nunca foi notificado que o Douto Tribunal de 1.ª Instância considerava 
 que o aludido R. estaria a exercer a sua posição jurídica de forma que entendia 
 como inadmissível, que configuraria um abuso de direito e punível oficiosamente 
 como litigante de má fé.
 Consequentemente,
 
 7. Em causa está Decisão sobre questão de conhecimento oficioso em que haveria 
 de observar-se o princípio do contraditório. 
 
 8. O Tribunal de 1ª Instância, antes de tomar a Decisão de condenar o R. como 
 litigante de má fé, não notificou o agora Reclamante, a alertá-lo de uma 
 eventual tomada de posição condenatória no tocante à sua conduta, pelo que não 
 foi dada, ao agora Reclamante, a possibilidade de dizer o que se lhe oferecesse 
 a esse propósito e explanar as razões que teriam dado lugar a tal conduta, o que 
 constitui violação do principio do contraditório. 
 
 9. Constituiu, assim, uma “decisão surpresa” a condenação oficiosa, pelo 
 Tribunal de 1ª Instância, como litigante de má fé imposta, ao agora Reclamante. 
 
 10. Este é o entendimento perfilhado pelo Tribunal Constitucional e pela demais 
 jurisprudência. 
 
 11. O Tribunal Constitucional no seu Ac. n° 440/94 (DR II série, n.° 202 de 
 
 01.09.94) não julgou inconstitucional o artigo 456.° do CPC na parte relativa à 
 condenação em multa por litigância de má fé, desde que interpretado no sentido 
 de tal condenação estar condicionada pela prévia audição dos interessados sobre 
 tal matéria. 
 
 12. No mesmo sentido vai o Ac. do Tribunal Constitucional n.° 105/95 (DR II 
 série, n.° 138 de 17.06.95) quando refere que a condenação por litigância de má 
 fé só deve obviamente ter lugar, dando-se à parte, antes de assim ser condenado, 
 a oportunidade de se defender, para o que tem de ser previamente ouvida. 
 
 13. De igual modo vai o Ac. do Tribunal Constitucional n.° 357/98 de 12.05.98, 
 Proc. 135/97, onde se diz que este respeito do princípio do contraditório, que 
 está ao serviço da igualdade das partes e se conjuga com a ideia da proibição da 
 indefesa, estava e está reflectido no artigo 84.°, n.ºs 5 e 6 da Lei 28/82 ………e 
 está presentemente explicitado no artigo 3.°, n.°s 2 e 3, do CPC. 
 
 14. Veja-se, também o Ac. do S.T.J. de 28.02.2002, CJ 2002, 1, 111 — Relator 
 Garcia Marques. 
 Nestes termos requer-se a V. Exas. se dignem admitir a presente Reclamação, com 
 efeito próprio, seguindo-se os demais termos legais.»
 
  
 
 3. Os recorridos não responderam.
 
  
 Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II – Fundamentação
 
  
 
 4. A presente reclamação é manifestamente improcedente
 
 É evidente que, como referido na decisão sumária reclamada, o acórdão recorrido 
 não acolheu a interpretação do artigo 456.º do Código de Processo Civil que o 
 recorrente argúi de inconstitucional e, consequentemente, não se encontram 
 verificados os pressupostos necessários ao conhecimento do objecto do recurso, 
 interposto ao abrigo das alíneas b) e g) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.
 
  
 III. Decisão
 
  
 
 6. Pelo exposto, acordam em indeferir a presente reclamação.
 Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 Lisboa, 4 de Março de 2008
 Joaquim de Sousa Ribeiro
 Benjamim Rodrigues
 Rui Manuel Moura Ramos