 Imprimir acórdão
 Imprimir acórdão   
			
Processo n.º 785/97
 
 1ª Secção
 Relator: Conselheiro Pamplona de Oliveira
 
  
 
  
 
  
 Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
  
 
 1.    A., maior, solteira, propôs no Tribunal Judicial de Viana do Castelo 
 contra o CENTRO NACIONAL DE PENSÕES uma acção destinada a que o réu fosse 
 condenado a “reconhecer à autora o estado de cônjuge equiparado para os efeitos 
 do Decreto Regulamentar n.º 1/94 de 18 de Janeiro, bem como a pagar-lhe as 
 pensões de sobrevivência a que tem direito nessa qualidade, incluindo as que se 
 vencerem desde a morte do falecido (...)”.
 Para o efeito, alegou ter vivido com B., pensionista do réu, em condições 
 análogas às dos cônjuges desde “princípios de 1965” e – referindo-se aos 
 requisitos previstos no artigo 2020º do Código Civil, no artigo 8º do 
 Decreto-Lei n.º 322/90 de 18 de Outubro e no Decreto Regulamentar n.º 1/94 de 18 
 de Janeiro – afirmou necessitar da pensão por não ter rendimentos suficientes 
 para uma existência condigna e não poder propor a acção exigida pelo n.º 1 do 
 artigo 3º do referido Decreto Regulamentar porque o falecido “não tinha, à data 
 da sua morte, quaisquer bens ou rendimentos, ou qualquer herança nem, tão pouco, 
 qualquer pessoa de família”.
 Por sentença de 7 de Outubro de 1996 – fls. 38 – o réu foi absolvido da 
 instância, por ineptidão da petição inicial, com fundamento na falta de causa de 
 pedir por não alegação de “quaisquer factos tendentes a mostrar que não existem 
 as pessoas mencionadas nas alíneas a) a d) do n.º 1 do artigo 2009º [do Código 
 Civil] ou que existem mas não têm possibilidades económicas de prestar alimentos 
 
 à autora”.
 Inconformada, a autora recorreu para a Relação do Porto. Por acórdão de 25 de 
 Fevereiro de 1997, a fls. 42, a sentença foi revogada e a acção foi julgada 
 improcedente. A Relação considerou que a insuficiente alegação de factos, medida 
 
 à luz dos requisitos constantes dos preceitos legais acima indicados, conduzia à 
 improcedência da acção e não à ineptidão da petição inicial. 
 De novo inconformada, a autora recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça, 
 suscitando, tal como fizera sem êxito perante a Relação do Porto, a 
 inconstitucionalidade das normas contidas no artigo 8º do Decreto-Lei n.º 322/90 
 e nos artigos 2º e 3º do Decreto Regulamentar n.º 1/94.
 O Supremo Tribunal de Justiça confirmou, porém, a decisão de improcedência da 
 acção. 
 
  
 
 2.    A. recorreu então para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na 
 alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), 
 pretendendo a apreciação das normas do “artigo 3º n.º 1 do Decreto Regulamentar 
 n.º 1/94 de 18 de Janeiro e do artigo 8º do Decreto-Lei n.º 322/90 de 18 de 
 Outubro” por violação das “normas contidas nos artigos 13º, 63º, 67º e 115º da 
 Constituição da República”.
 
  
 Notificada para o efeito, a recorrente concluiu da seguinte forma a sua 
 alegação:
 
  
 
 1.        Os cônjuges sobrevivos têm direito a pensão de sobrevivência nos 
 termos do disposto no DL 322/90 de 18/10.
 
 2.        Estes, para obter tal pensão, não têm de provar a necessidade de tal 
 pensão, nem, tão pouco, de propor acção contra a herança do falecido ou 
 familiares para obter alimentos.
 
 3.        O “cônjuge sobrevivo” de facto, face ao disposto no art. 3º do DL 
 
 322/90 de 18/10, também tem direito à pensão de sobrevivência.
 
 4.        O legislador, através dessa norma, apenas exige ao “cônjuge” de facto 
 que proponha acção para fazer prova de que viveu durante mais de dois anos 
 consecutivos, antes da morte do/a companheiro/a.
 
 5.        A interpretação que os Tribunais de Instância e o STJ fizeram da norma 
 do art. 8º n.º1 do DL 322/90 é inconstitucional por violar o art. 13º, 63º n.º 1 
 e 3 e 67º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa.
 
 6.        O Governo ao regulamentar o art. 8º do DL 322/90 de 18/10, através do 
 art. 3º do Dec. Reg.1/94 de 18/01, excede em exigências o que aquela norma 
 estabelece.
 
 7.        Um decreto regulamentar não pode exigir mais do que a lei 
 regulamentada.
 
 8.        Por isso, o art. 3º n.º1 do Dec. Reg 1/94, é inconstitucional por 
 violar o art. 115º da Constituição da República Portuguesa.
 
  
 
  
 O recorrido não alegou.              
 
  
 
  
 
  
 
  
 
 3.    Cumpre decidir.
 
  
 
 É o seguinte o texto da norma do artigo 8º do Decreto-Lei n.º 322/90 de 18 de 
 Outubro:
 
  
 Artigo 8º
 Situação de facto análoga à dos cônjuges
 
  
 
 1 – O direito às prestações previstas neste diploma e o respectivo regime 
 jurídico são tornados extensivos às pessoas que se encontrem na situação 
 prevista no n.º 1 do artigo 2020º do Código Civil.
 
 2 – O processo de prova das situações a que se refere o n.º 1, bem como a 
 definição das condições de atribuição das prestações, consta de decreto 
 regulamentar.
 
  
 
  
 Por seu turno, o artigo 3º do Decreto Regulamentar n.º 1/94 de 18 de Janeiro, a 
 que se refere  o artigo 8º n.º 2 que se acaba de citar, tem o seguinte texto:
 
  
 Artigo 3º
 Condições de atribuição
 
  
 
 1 – A atribuição das prestações às pessoas referidas no artigo 2º fica 
 dependente de sentença judicial que lhes reconheça o direito a alimentos da 
 herança do falecido nos termos do disposto no artigo 2020º do Código Civil.
 
 2 – No caso de não ser reconhecido tal direito, com fundamento na inexistência 
 ou insuficiência de bens da herança, o direito às prestações depende do 
 reconhecimento judicial da qualidade de titular daquelas, obtido mediante acção 
 declarativa interposta, com essa finalidade, contra a instituição de segurança 
 social competente para a atribuição das mesmas pensões.
 
  
 
  
 Consiste a presente questão em saber se são ou não inconstitucionais as normas 
 dos artigos 8º do Decreto-Lei n.º 322/90 e do artigo 3º, n.º 1 (aqui, apenas 
 este n.º 1) do Decreto Regulamentar n.º 1/94 quando interpretadas no sentido de 
 que a atribuição da pensão de sobrevivência (ou, em outros casos, do direito ao 
 subsídio por morte também previsto, nas mesmas condições, pelo Decreto-Lei n.º 
 
 322/90) por morte de beneficiário da segurança social a quem com ele convivia em 
 união de facto depende da obtenção de sentença judicial que lhe reconheça o 
 direito a alimentos da herança do falecido nos termos do n.º 1 do artigo 2020º 
 do Código Civil.
 Acontece que o Tribunal Constitucional já teve ocasião de apreciar a questão de 
 constitucionalidade que é colocada no presente recurso. Com efeito, escreveu-se 
 no Acórdão n.º 233/2005 (www.tribunalconstitucional.pt), o seguinte: 
 
                  
 
 «4. (...) no seu Acórdão n.º 195/2003 (Diário da República, II série, de 22 de 
 Maio de 2003), o Tribunal Constitucional decidiu “não julgar inconstitucional a 
 norma do artigo 8º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 322/90 (...) na parte em que faz 
 depender a atribuição da pensão de sobrevivência por morte do beneficiário da 
 segurança social a quem com ele convivia em união de facto de todos os 
 requisitos previstos no n.º 1 do artigo 2020º do CC'.
 Tal norma – na parte relativa à atribuição de pensões de sobrevivência – foi 
 então apreciada à luz da alegada violação dos direitos tutelados pelo artigo 26º 
 da Constituição e do princípio da igualdade, ao qual foi reconduzido o ultimo 
 dos direitos englobados pelo artigo 26º, que entendeu não violado, e do n.º 1 do 
 artigo 36º, conjugado com o princípio da proporcionalidade.
 No que toca à primeira questão, isto é, à alegada violação do princípio da 
 igualdade pela norma do artigo 8º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 322/90, afirmou-se 
 o seguinte:
 
 “(...) será que a distinção entre cônjuges (contemplados como titulares do 
 direito às prestações em questão no artigo 7º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei 
 n.º 322/90) e pessoas em situação de união de facto, para efeitos de fixação das 
 condições de atribuição da pensão de sobrevivência, requerendo para estas que 
 não possam exigir alimentos aos seus familiares mais próximos, é violadora do 
 princípio da igualdade?
 A perspectiva da recorrente parece ser a de que a distinção entre pessoas 
 casadas e pessoas em situação de união de facto, para efeitos de atribuição da 
 pensão de sobrevivência, viola o princípio da igualdade por ser destituída de 
 fundamento razoável, constitucionalmente relevante, considerando, 
 designadamente, que ‘sempre será necessário fazer prova da já referida vivência 
 há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges’.
 Cumpre, porém, reconhecer que este último argumento dá por pressuposto o 
 reconhecimento de uma imposição constitucional, por força do princípio da 
 igualdade, de um mesmo tratamento para cônjuges e pessoas que vivem em união de 
 facto (ainda que há mais de dois anos). Ora, numa certa perspectiva pode, é 
 certo, admitir-se que uma certa caracterização da situação de união de facto, 
 pela sua duração e por outras circunstâncias (por exemplo, a existência de 
 filhos comuns) a aproxima da situação típica dos cônjuges. No caso, porém, a 
 exigência de uma convivência há mais de dois anos em condições análogas às dos 
 cônjuges serve apenas para caracterizar de forma mínima a situação de união de 
 facto que poderá ser juridicamente relevante, para lhe serem reconhecidos – 
 embora, segundo o Código Civil, em medida bastante limitada e muito distinta da 
 relação entre os cônjuges – alguns efeitos jurídicos. É que, diversamente do que 
 acontece com a relação matrimonial, em que um acto revestido de uma forma 
 jurídica solene marca a criação de uma nova relação jurídica, no caso da 
 convivência entre pessoas não casadas, justamente por estar em causa uma 
 situação de união de facto, o tempo mínimo de convivência é considerado 
 relevante pelo legislador para o efeito de reconhecimento de efeitos jurídicos 
 
 (assim, por exemplo, o artigo 1º, n.º 1, das citadas Lei n.ºs 135/99 e 7/2001 
 condicionam ambos os efeitos jurídicos que reconhecem à circunstância de se 
 tratar de pessoas “que vivem em união de facto há mais de dois anos”).
 O problema não pode, pois, ficar resolvido logo com a mera invocação da 
 existência de uma convivência há mais de dois anos, em condições análogas às dos 
 cônjuges. Antes está, precisamente, em saber se uma situação de união de facto, 
 assim caracterizada, pode ser tratada de forma diversa do casamento, para o 
 efeito em causa.
 Ora, como este Tribunal tem reconhecido, existem diferenças importantes, que o 
 legislador pode considerar relevantes, entre a situação de duas pessoas casadas, 
 e que, portanto, voluntariamente optaram por alterar o estatuto jurídico da 
 relação entre elas – mediante um “contrato celebrado entre duas pessoas de sexo 
 diferente que pretendem constituir família mediante uma plena comunhão de vida, 
 nos termos das disposições deste Código”, como se lê no artigo 1577º do Código 
 Civil –, e a situação de duas pessoas que (embora convivendo há mais de dois 
 anos “em condições análogas às dos cônjuges”) optaram, diversamente, por manter 
 no plano de facto a relação entre ambas, sem juridicamente assumirem e 
 adquirirem as obrigações e os direitos correlativos ao casamento.
 Assim, como se salientou, por exemplo, também no referido Acórdão n.º 275/2002, 
 
 “não se pode excluir a liberdade do legislador de prever um regime jurídico 
 específico para os cônjuges, visando, por exemplo, a prossecução de objectivos 
 políticos de incentivo ao matrimónio”. Pelo que, “considerando desde logo a 
 existência de especiais deveres entre os cônjuges”, se pode dizer, como se 
 afirmou no citado Acórdão n.º 14/2000, que “(...) de harmonia com o nosso 
 ordenamento (ainda suportado constitucionalmente), o regime das pessoas unidas 
 pelo matrimónio confrontadamente com a união de facto não permite sustentar que 
 nos postamos perante situações idênticas à partida e, consequentemente, que 
 requeiram tratamento igual.” 
 Ora, um dos pontos em que o tratamento jurídico diverso entre ambas as situações 
 pode relevar é, justamente, o das condições, ora em causa, para o reconhecimento 
 do direito à pensão de sobrevivência no caso da união de facto.
 Importa, aliás, recordar que, por exemplo, quem vive em situação de união de 
 facto também não é herdeiro (nem legitimário, nem legítimo) do de cujus com quem 
 convivia, apenas tendo um direito a exigir alimentos da herança, se não os puder 
 obter das pessoas referidas no artigo 2009º, n.º 1, alíneas a) a d) do Código 
 Civil. E, se é certo poder sustentar-se que os fundamentos e a natureza dos 
 direitos à pensão de sobrevivência e a alimentos são distintos, não pode deixar 
 de notar-se o paralelo entre a situação sucessória do convivente em união de 
 facto – reduzida ao referido direito a exigir alimentos da herança – e a 
 situação decorrente da norma em causa, quanto à condição questionada para 
 atribuição da pensão de sobrevivência.
 Ora, nem esta diferenciação de tratamento pode considerar-se destituída de 
 fundamento razoável ou arbitrária, nem, por outro lado, se baseia num critério 
 que tenha de ser irrelevante, considerando o efeito jurídico visado. Na verdade, 
 trata-se, aqui, tal como na distinção da posição sucessória do cônjuge e do 
 convivente em união de facto, justamente de um daqueles pontos do regime 
 jurídico em que o legislador trata mais favoravelmente a situação dos cônjuges, 
 não só visando objectivos políticos de incentivo ao matrimónio – enquanto 
 instituição social que tem por criadora de melhores condições para assegurar a 
 estabilidade e a continuidade comunitárias –, mas também como reverso da 
 inexistência de um vínculo jurídico, com direitos e deveres e um processo 
 especial de dissolução, entre as pessoas em situação de união de facto.
 Tal diverso tratamento jurídico não pode considerar-se destituído de fundamento 
 constitucionalmente relevante, não podendo divisar-se na norma em apreço 
 violação do princípio da igualdade consagrado no artigo 13º da Lei Fundamental.”
 No que toca à segunda questão, isto é, à alegada violação do n.º 1 do artigo 36º 
 da Constituição, conjugado com o princípio da proporcionalidade, escreveu-se no 
 mesmo Acórdão n.º 195/03:
 
 “8. A conclusão a que chegámos é certamente sufragada também por quem não 
 considere que o legislador constitucional dispensa no artigo 36º, n.º 1, 
 protecção à família, enquanto 'elemento fundamental da sociedade', 
 distinguindo-a, no n.º 1 e no n.º 2 desse artigo, do casamento, incluindo 
 igualmente uma família não fundada no casamento – e que, portanto, pode 
 retirar-se desta imposição, em conjugação com o princípio da proporcionalidade, 
 um parâmetro autónomo, susceptível de conduzir a decisões de 
 inconstitucionalidade, como foi o caso do citado Acórdão n.º 275/2002.
 Mesmo, porém, à luz de outro entendimento do artigo 36º, n.º 1, da Constituição 
 conjugado com o princípio da proporcionalidade – como o que fundou o citado 
 aresto –, não se é, porém, conduzido a um juízo de inconstitucionalidade da 
 norma ora em causa. É que, no presente caso, não se está perante uma exclusão de 
 plano, e em abstracto, do direito do convivente, por contraposição ao direito do 
 cônjuge, e antes a norma em questão (que não trata de qualquer indemnização, ou 
 
 “compensação” de danos pessoais), o artigo 8º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 322/90, 
 de 18 de Outubro, visou justamente, pelo contrário, conceder também protecção, 
 pela extensão de prestações na eventualidade da morte dos beneficiários do 
 regime geral de segurança social, “às pessoas que se encontrem na situação 
 prevista no n.º 1 do artigo 2020.º do Código Civil”. Mesmo o condicionamento da 
 pensão à impossibilidade de obter alimentos (nos termos da norma em causa e do 
 citado artigo 3º do Decreto Regulamentar n.º 1/94) representa, ainda, a prova, 
 justamente, da necessidade de protecção da pessoa em causa, por não a poder 
 obter dos seus familiares directos.
 E já se viu que existe fundamento constitucionalmente relevante para a distinção 
 de tratamento em causa. Não pode, pois, afirmar-se que, desse condicionamento do 
 direito à pensão de sobrevivência (tal como, por exemplo, da não atribuição da 
 qualidade de herdeiro legítimo ou legitimário), resulte violação de um “dever de 
 não desproteger, sem uma justificação razoável, a família que se não fundar no 
 casamento”, que se afirmou no citado Acórdão n.º 275/2002, quanto àqueles pontos 
 do regime jurídico que directamente contendam com a protecção dos seus membros 
 
 “e que não sejam aceitáveis como instrumento de eventuais políticas de incentivo 
 
 à família que se funda no casamento” (itálico aditado).”
 
 5. Sobre esta questão, e referindo estes dois acórdãos do Tribunal 
 Constitucional, Rita Lobo Xavier, em “Uniões de Facto e Pensão de 
 Sobrevivência”, in Jurisprudência Constitucional, 3, Julho-Setembro 2004, págs. 
 
 17 e segs, observou que  «em ambos os casos o problema é similar, decorrendo da 
 circunstância de os textos legais, embora admitindo a pessoa que vivia em união 
 de facto com o beneficiário falecido no conjunto das pessoas com direito a 
 pensão de sobrevivência, parecerem exigir para o reconhecimento desse direito a 
 verificação de determinadas condições que não são impostas quando se trata da 
 habilitação do cônjuge sobrevivo a semelhante pensão. Para o cônjuge sobrevivo, 
 a sua habilitação à pensão de sobrevivência basta-se com a prova da qualidade de 
 cônjuge. O companheiro sobrevivo só é “herdeiro hábil” se estiver nas “condições 
 do artigo 2020º do Código Civil” (artigo 40º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei 
 n.º 142/73, de 31 de Março), se se encontrar “na situação prevista no n.º 1 do 
 artigo 2020º do Código Civil” (artigo 8º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 322/90)» 
 
 (cfr. “Uniões de Facto...”, cit., pág. 18). 
 O que está em causa é, pois, saber se, com esta remissão para o artigo 2020º do 
 Código Civil, não será discriminatório ou desproporcionado exigir ao companheiro 
 sobrevivo, para além da prova da convivência em condições análogas às dos 
 cônjuges por mais de dois anos, o reconhecimento judicial do direito a receber 
 alimentos. 
 Posta a questão nestes termos, não pode deixar de se reconhecer que “uma união 
 de facto não implica forçosamente solidariedade patrimonial, logo não basta a 
 prova dessa relação para se considerar verificada a diminuição da capacidade 
 económica que é pressuposto da atribuição da pensão”. Pelo contrário, no caso do 
 cônjuge sobrevivo esta diminuição é pressuposta (cfr. “Uniões de Facto...”, 
 cit., pág. 21).»
 
                  
 Consequentemente, e tal como o Acórdão n.º 195/2003, também o Acórdão n.º 
 
 233/2005 concluiu no sentido da não inconstitucionalidade das ditas normas.
 
  
 
 É certo que no Acórdão n.º 88/2004 (DR, II série, de 16 de Abril de 2004), 
 apreciando não estas, mas normas semelhantes relativas ao funcionalismo público, 
 constantes do Estatuto das Pensões de Sobrevivência aprovado pelo Decreto-Lei 
 n.º142/73 de 31 de Março, o Tribunal julgou inconstitucional, “por violação do 
 princípio da proporcionalidade, tal como resulta das disposições conjugadas dos 
 artigos 2º, 18º, n.º 2, 36º, n.º 1, e 63º, n.ºs 1 e 3, todos da Constituição da 
 República, a norma que se extrai dos artigos 40º n.º 1 e 41º n.º 2 do Estatuto 
 das Pensões de Sobrevivência no funcionalismo público, quando interpretada no 
 sentido de que a atribuição da pensão de sobrevivência por morte de beneficiário 
 da Caixa Geral de Aposentações, a quem com ele convivia em união de facto, 
 depende também da prova do direito do companheiro sobrevivo a receber alimentos 
 do companheiro falecido, com o prévio reconhecimento da impossibilidade da sua 
 obtenção nos termos das alíneas a) a d) do artigo 2009º do Código Civil”. 
 
  
 Todavia, posteriormente (Acórdão n.º 159/2005), o Tribunal reiterou o julgamento 
 de não inconstitucionalidade da norma do artigo 41º n.º 2, 1ª parte, do mesmo 
 Estatuto das Pensões de Sobrevivência, nestes termos: 
 
  
 
 «[...] na óptica do princípio da igualdade, a situação de duas pessoas que 
 declaram a intenção de conceder relevância jurídica à sua união e a submeter a 
 um determinado regime (um específico vínculo jurídico, com direitos e deveres e 
 um processo especial de dissolução) não tem de ser equiparada à de quem, 
 intencionalmente, opta por o não fazer. O legislador constitucional não pode ter 
 pretendido retirar todo o espaço à prossecução, pelo legislador 
 infra-constitucional, cujo programa é sufragado democraticamente, de objectivos 
 políticos de incentivo ao matrimónio enquanto instituição social, mediante a 
 formulação de um regime jurídico próprio – por exemplo, distinguindo entre a 
 posição sucessória do convivente em união de facto (reduzida ao referido direito 
 a exigir alimentos da herança) e a do cônjuge.
 A diferenciação de tratamento em causa na presente norma não pode, assim, ser 
 considerada como destituída de fundamento razoável ou arbitrária, 
 verificando-se, por outro lado, um indiscutível paralelo entre ela e o 
 tratamento sucessório de ambas as situações (introduzido pela reforma de 1977 e 
 cuja conformidade com a Lei Fundamental não é aqui questionada). 
 
 7.    Superada a objecção que se pudesse pretender extrair do princípio da 
 igualdade, e admitida a presente diferenciação à luz da política legislativa que 
 o legislador democrático entenda dever prosseguir, não ficam, porém, dissipados 
 todos os argumentos conducentes a uma conclusão de inconstitucionalidade. Aliás, 
 o acórdão recorrido baseou o seu julgamento de inconstitucionalidade, 
 decisivamente, na invocação do princípio da proporcionalidade (conjugado com o 
 reconhecimento constitucional da “família não fundada no casamento”), tal como o 
 havia feito (e invocando) o citado acórdão n.º 88/2004.
 Também neste plano se considera, porém, que é de reiterar a fundamentação 
 transcrita, do acórdão n.º 195/2003.
 Com efeito, o que está em causa no confronto de uma solução normativa com o 
 princípio da proporcionalidade não é simplesmente a gravidade ou a dimensão das 
 desvantagens ou inconvenientes que pode acarretar para os visados (com, por 
 exemplo, a necessidade da prova da carência de alimentos, ou, mesmo a exclusão 
 total de certos direitos). O recorte de um regime jurídico – como o da 
 destruição do vínculo matrimonial ou o dos seus efeitos sucessórios – pela 
 hipótese do casamento, deixando de fora situações que as partes não pretenderam 
 intencionalmente submeter a ele, tem necessariamente como consequência a 
 exclusão dos respectivos efeitos jurídicos. O que importa apurar é se tal 
 recorte é aceitável – se segue um critério constitucionalmente aceitável – tendo 
 em conta o fim prosseguido e as alternativas disponíveis – sem deixar de 
 considerar a ampla margem de avaliação de custos e benefícios e como de escolha 
 dessas alternativas, que, à luz dos objectivos de política legislativa que ele 
 próprio define dentro do quadro constitucional, tem de ser reconhecida ao 
 legislador (e que este Tribunal reconheceu, por exemplo, no acórdão n.º 187/01, 
 publicado no Diário da República, II série, de 26 de Junho de 2001).
 Ora, como revela o paralelo da solução normativa em causa com a posição 
 sucessória do cônjuge sobrevivo e da união de facto – não equiparada, aliás, 
 pelas Leis n.ºs 135/99 e 7/2001 –, o tratamento post mortem do cônjuge é, 
 justamente, um daqueles pontos do regime jurídico em que o legislador optou por 
 disciplinar mais favoravelmente o casamento.
 Esta distinção entre a posição post mortem do cônjuge e a do companheiro em 
 união de facto – que, aliás, podem concorrer entre si depois da morte do 
 beneficiário – é adequada à prossecução do fim de incentivo à família fundada no 
 casamento, que não é constitucionalmente censurável – e antes recebe até (pelo 
 menos numa certa leitura) particular acolhimento no texto constitucional. A 
 conveniência de tal distinção de tratamento post mortem, com os concomitantes 
 reflexos patrimoniais, pode ser, e será com certeza, diversamente apreciada a 
 partir de diversas perspectivas, no debate político-legislativo – em que poderão 
 vir a encontrar acolhimento argumentos como o da distinção entre o direito a 
 alimentos e a pensão de sobrevivência, a existência e o sentido dos descontos 
 efectuados pelo companheiro falecido, à luz do regime então vigente e da sua 
 situação pessoal, ou a maior ou menor conveniência em aprofundar consequências 
 económicas específicas de uma relação familiar como o casamento. Mas a 
 Constituição não proscreve essa distinção, ainda quando ela tem como 
 consequência deixar de fora do regime estabelecido para a posição sucessória do 
 cônjuge o companheiro em união de facto.
 
 8.    Entende-se ser justamente isto o que se passa com a interpretação em 
 causa, segundo a qual os requisitos para o direito à pensão de sobrevivência são 
 diversos, dependendo, no caso de união de facto, e tal como em geral para o 
 direito a alimentos nos termos do artigo 2020º do Código Civil, de aquele ter 
 direito a obter alimentos da herança, por não os poder obter das pessoas 
 referidas no artigo 2009º do mesmo Código.
 Aliás, não é só para o companheiro sobrevivo que existem condições específicas 
 para ser reconhecido o direito à pensão: o ex-cônjuge ou cônjuge separado de 
 pessoas e bens só dela beneficia se tiver sido casado com o beneficiário pelo 
 menos um ano e se na data da morte tiver direito a uma pensão de alimentos; os 
 pais e os avós têm de  estar “a cargo” do contribuinte à data da morte para 
 terem direito a pensão, etc.. E a pensão cessa quando os titulares do direito 
 obtiverem outras fontes de rendimento. Apenas ao cônjuge não são exigidas 
 condições adicionais, pois os cônjuges estão ligados por específicos deveres de 
 solidariedade patrimonial – o dever de assistência e, na constância do 
 casamento, o dever de contribuir para os encargos da vida familiar (artigos 
 
 1672º e 1675º do Código Civil). Diversamente, a união de facto não implica 
 forçosamente, por opção das partes, deveres patrimoniais, ou uma geral 
 solidariedade patrimonial, admitindo-se mesmo que quem vive em união de facto 
 continue a ter direito a alimentos do ex-cônjuge ou, até, mantenha uma pensão de 
 sobrevivência (e podendo, mesmo ser este o motivo para continuar na situação de 
 união de facto, e não casar). Recorde-se, aliás, que os próprios diplomas que 
 introduziram medidas de protecção das pessoas que vivem em união de facto (Leis 
 
 135/99, de 28 de Agosto e 7/2001, de 11 de Maio) não obrigaram os membros da 
 união de facto a deveres de assistência recíprocos ou a deveres de alimentos em 
 caso de ruptura, ou, sequer, alteraram os preceitos do Código Civil sobre 
 alimentos em caso de morte.
 Por outro lado, e como se notou no acórdão n.º 195/2003, na solução normativa em 
 apreço não se verifica qualquer “exclusão de plano, e em abstracto, do direito 
 do convivente, por contraposição ao direito do cônjuge”. Antes a norma em 
 questão (que não disciplina qualquer ressarcimento, ou “compensação” de danos 
 pessoais) “visou justamente, pelo contrário, conceder também protecção, pela 
 extensão de prestações na eventualidade da morte dos beneficiários do regime 
 geral de segurança social, ‘às pessoas que se encontrem na situação prevista no 
 n.º 1 do artigo 2020.º do Código Civil’”. O sentido da remissão para o artigo 
 
 2020º do Código Civil, com a exigência de provar os requisitos exigidos neste 
 normativo, como “condicionamento da pensão à impossibilidade de obter 
 alimentos”, mais não é do que “a prova, justamente, da necessidade de protecção 
 da pessoa em causa, por não a poder obter dos seus familiares directos”, sendo, 
 portanto, coerente com o objectivo visado pela prestação social em causa: para o 
 cônjuge, considerando os deveres de solidariedade patrimonial e a obrigação de 
 alimentos em caso de ruptura, presume-se essa situação; para o caso da união de 
 facto, é necessário fazer prova da necessidade de protecção, tal como quando se 
 pretende obter alimentos.
 Da exigência daqueles requisitos (tal como, por exemplo, do não reconhecimento 
 da qualidade de herdeiro legítimo ou legitimário) não resulta, pois, qualquer 
 violação do princípio da proporcionalidade – sendo de notar, aliás, que, para 
 além da possível conveniência em distinguir a posição do cônjuge, pode 
 verificar-se também, no caso concreto, um problema de concurso entre aquele e o 
 companheiro em união de facto.»
 
  
 Este julgamento foi posteriormente confirmado pelo Acórdão n.º 614/2005 do 
 Plenário deste Tribunal.
 
  
 
 5.    Ora bem: no presente recurso, o Tribunal reitera o julgamento de não 
 inconstitucionalidade proferido nos citados arestos. Tal como se disse no 
 Acórdão n.º 233/2005, cabe aqui assinalar o seguinte:
 
  
 
 “Em primeiro lugar, e no que toca ao princípio da igualdade, também em relação 
 
 às normas desaplicadas se verifica um indiscutível paralelo com a diferenciação 
 entre o tratamento sucessório do companheiro e do cônjuge sobrevivos; quanto ao 
 princípio da proporcionalidade, e atendendo à circunstância de à união de facto 
 ser alheia a existência de um dever de solidariedade patrimonial entre os 
 companheiros, não se afiguram excessivas as condições específicas previstas nas 
 normas agora desaplicadas para ser reconhecido o direito à pensão ao companheiro 
 sobrevivo. Diferentemente, tais condições específicas são uma simples 
 decorrência da circunstância de a união de facto não implicar forçosamente, por 
 opção das partes, deveres patrimoniais, ou uma geral solidariedade patrimonial, 
 como sucede com o casamento. 
 Em segundo lugar, e como se referiu no acórdão n.º 159/05, e apesar de este 
 argumento ser menos relevante, não é só quanto ao companheiro sobrevivo que 
 existem condições específicas para ser reconhecido o direito à pensão: o próprio 
 cônjuge sobrevivo, não havendo filhos do casamento, só tem direito à pensão se 
 tiver casado com o beneficiário pelo menos um ano antes do falecimento deste, 
 salvo se a morte tiver resultado de acidente ou doença contraída ou manifestada 
 depois do casamento (artigo 9º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 322/90); o ex-cônjuge, 
 em caso de casamento declarado nulo ou anulado, só tem direito à pensão se à 
 data da morte do beneficiário recebesse pensão de alimentos decretada ou 
 homologada judicialmente (artigo 9º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 322/90); os 
 ascendentes têm de  estar “a cargo” do beneficiário falecido, não podendo 
 existir cônjuges, ex-cônjuges e descendentes com direito às mesmas prestações 
 
 (artigo 14º do Decreto-Lei n.º 322/90). 
 Atendendo, pois, à necessidade de diferenciar entre o estatuto das diferentes 
 classes de pessoas com direito às prestações previstas no Decreto-Lei n.º 
 
 322/90, com base no grau de “solidariedade patrimonial” verificado entre essas 
 pessoas e o beneficiário, não parece excessivo exigir ao companheiro sobrevivo o 
 reconhecimento judicial do direito a alimentos da herança do falecido, nos 
 termos do n.º 1 do artigo 2020º do Código Civil, ou da qualidade de titular 
 daquelas prestações, em caso de insuficiência ou inexistência de bens da 
 herança, em acção proposta nos termos do disposto no artigo 3º do Decreto 
 Regulamentar n.º 1/94”.
 
  
 
 6.            No presente recurso, a recorrente acusa ainda o n.º 1 do artigo 3º 
 do Decreto Regulamentar n.º 1/94 de inconstitucionalidade por violação do artigo 
 
 115º da Constituição (actual artigo 112º) por exigir 'mais' do que o referido 
 artigo 8º, que apenas consideraria necessário que provasse que viveu com o seu 
 companheiro durante mais de 2 anos, antes da morte dele. Alega que ao impor a 
 necessidade de 'propor uma acção contra a herança ou herdeiros do falecido', o 
 Governo 'excedeu em exigências o que o legislador não quis'.
 
  
 Trata-se, no entanto, de alegação totalmente infundada.
 
  
 Na verdade, e em primeiro lugar, a recorrente não esclarece que norma do artigo 
 
 115º (correspondente ao actual artigo 112º), na redacção vigente à data da 
 aprovação do Decreto Regulamentar n.º 1/94, é que seria violada; apenas afirma 
 que 'um decreto regulamentar não pode exigir mais do que a lei regulamentada'.
 Em todo o caso, e porque neste recurso apenas se podem analisar questões de 
 constitucionalidade – e não de simples ilegalidade, se a mesma ocorresse –, 
 admite-se que a recorrente se refira ao n.º 5 do mesmo artigo 115º, segundo o 
 qual 'nenhuma lei pode (…) conferir a actos de outra natureza o poder de, com 
 eficácia externa, interpretar, integrar, modificar, suspender ou revogar 
 qualquer dos seus preceitos'.
 Sucede, todavia, que o Decreto Regulamentar n.º 1/94 se limitou a regular 'o 
 processo de prova das situações a que se refere o n.º 1' do artigo 8º do 
 Decreto-Lei n.º 322/90 e as 'condições de atribuição das prestações', nos termos 
 previstos no respectivo n.º 2. Ora, não excedendo a habilitação que lhe foi 
 conferida pelo mesmo n.º 2 do artigo 8º, respeitando a forma ali imposta, e não 
 incorrendo em nenhuma das proibições enunciadas no n.º 5 do referido artigo 115º 
 da Constituição, não se encontra qualquer razão que permita acolher a referida 
 acusação de inconstitucionalidade.
 
  
 Nestes termos, e sem necessidade de outras considerações, julga-se improcedente 
 esta alegação. 
 
  
 
  7.          Assim, decide-se negar provimento ao recurso, confirmando a decisão 
 recorrida no que respeita à questão de inconstitucionalidade. Custas pela 
 recorrente, fixando-se a taxa de justiça, sem prejuízo do apoio judiciário 
 concedido, em 20 UC.
 
  
 Lisboa, 26 de Setembro de 2006
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Rui Manuel Moura Ramos
 Maria Helena Brito (vencida, tal como no Acórdão n.º 614/2005, pelos fundamentos 
 do Acórdão n.º 88/2004)
 Maria João Antunes (vencida pelos fundamentos do Acórdão n.º 88/2004 – 
 cfr.,ainda, parte final da declaração de voto aposta ao Acórdão n.º 614/2005).
 Artur Maurício