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Processo n.º 443/07 
 
 1ª Secção
 Relator: Conselheiro José Borges Soeiro
 
  
 Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
 I – Relatório
 A., não se conformando com a decisão proferida pelo Governo Civil da Guarda de 
 
 25 de Agosto de 2005, exarada nos autos de contra-ordenação n.° 232324255, que o 
 condenou na sanção acessória de inibição da faculdade de conduzir pelo período 
 de 120 dias, por contra-ordenação ao disposto nos artigos 69.°, n.º 1 e 76.°, 
 alínea a) do Decreto Regulamentar n.° 22-A/98, de 1 de Outubro, e no artigo 
 
 146.° alínea i) do Código da Estrada, veio impugnar judicialmente a mesma para o 
 Tribunal Judicial da Guarda. Para tanto, alega que não foi o arguido o autor da 
 prática dos factos, mas sim a sua esposa, e que, não se entendendo assim, porque 
 necessita da carta de condução, deve ser suspensa a execução da sanção acessória 
 ou apreendida a viatura pelo tempo correspondente ou, ainda, ser aquela suspensa 
 com sujeição do arguido à frequência de acções de formação. O recurso foi 
 admitido, tendo vindo, a final, a ser julgado improcedente. 
 Inconformado veio interpor recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, onde 
 alegou, no que ora importa que: 
 
 “ (...) 
 E) No caso de se entender que é, formalmente, pelo facto de ser o proprietário 
 da viatura, o arguido o responsável, justifica-se, neste caso, uma de duas 
 situações: a suspensão da sanção acessória de inibição de conduzir, dado 
 encontrarem-se preenchidos os requisitos para tal (art. 142.° do Código da 
 Estrada); ou, a apreensão da viatura durante o período da suspensão, ou, por 
 faltado identificação do condutor, no prazo estabelecido, (artigo 162°, n° 1, 
 al. i), ex vi artigo 147°, n° 3 do C. Estrada). 
 F) O arguido é empresário, tendo ao seu serviço vários trabalhadores, que 
 conduzem os carros que se encontram registados em seu nome (7 carros) e que de 
 si dependem económico - profissionalmente. 
 G) Necessita de conduzir diariamente, para o pleno desempenho das suas funções, 
 na medida em que contacta, pessoalmente, com clientes, deslocando-se, para o 
 efeito, a vários pontos do país. 
 H) Aplicar ao Recorrente a sanção acessória de inibição de conduzir será colocar 
 em risco a actividade empresarial, bem como a manutenção do seu posto de 
 trabalho, e, consequentemente, a estabilidade económica do seu agregado 
 familiar, bem como a dos seus trabalhadores. 
 I) Assim, a aplicação efectiva da sanção acessória de inibição de conduzir, 
 implicará graves consequências, não só a nível profissional, mas, também a nível 
 financeiro e pessoal. 
 J) O facto de o arguido necessitar de conduzir diariamente, primordialmente por 
 interesses profissionais, sendo certo que não lhe é possível deslocar-se em 
 Transportes Públicos, constitui razão suficiente para suspender a execução da 
 sanção de inibição de conduzir. 
 K) Existe fundamento para a pretensão do arguido, no que diz respeito à 
 suspensão da sanção acessória de inibição de conduzir; verificando-se, os 
 pressupostos do artigo 50° do C. Penal, aplicável ex vi artigo 141°, n°3 do 
 Código da Estrada. 
 L) Nos termos do disposto no artigo 141° do Código da Estrada, a pena pode ser 
 suspensa mediante a prestação de uma caução de boa conduta, encontrando-se 
 preenchidos todos os requisitos para o efeito. 
 M) A interpretação do artigo 141°, n°1 do C. Estrada vertida na sentença 
 recorrida, no tocante às contra ordenações muito graves, viola as normas 
 constantes dos artigos 50º e 199º, n° 1 do C. P. Penal e, ainda os artigos 18° e 
 
 32°, n° 10 da CRP. Com efeito e, ao contrário do que se conclui na sentença 
 recorrida, nada impede que, casuisticamente, o julgador, quando a justiça o 
 impunha, possa suspender a sanção acessória, tanto no que se refere às contra 
 ordenações graves, como muito graves. 
 N) Sem prescindir, a condenação não é justa e adequada, sendo certo que os 
 critérios utilizados na escolha e medida da pena, não se coadunam com o caso sub 
 judice. 
 O) A sentença recorrida viola as normas dos artigos 141° do Código da Estrada, 
 artigo 50° C. Penal e artigos 18°, n°1 e 2, 47°, n°1 e 58° da C.R.P., artigo 
 
 374°, n° 2 do C. P. Penal e artigo 379°, n° 1, al. a) ambos do C. P. Penal.”
 A Relação de Coimbra veio a exarar acórdão que decidiu, no que ora nos importa, 
 o seguinte: 
 
 “ (...) Na improcedência da aludida nulidade, peticiona, (ainda) ora, a 
 suspensão ou, ao menos, a substituição daquela pela prestação de caução de boa 
 conduta. 
 Sobre tal tema já se decidiu e bem, a nosso ver, de modo a merecer a nossa 
 inteira concordância, na comarca e concretamente na recorrida sentença onde se 
 escreve: 
 
 ‘O arguido pretende apenas a suspensão da sanção acessória. 
 A execução da sanção acessória de inibição aplicada às contraordenações graves, 
 nos termos dos artigos 141°/1 do Código da Estrada e 50° do Código Penal, pode 
 ser suspensa se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, 
 
 à sua conduta anterior e posterior à contra-ordenação, às circunstâncias desta, 
 se puder concluir que a simples censura do facto e a ameaça da execução realizam 
 de foram [sic] adequada e suficientes as finalidades da punição. 
 Deste modo, estando em causa uma contra-ordenação muito grave, conclui-se que 
 não é legalmente admissível a suspensão da execução da sanção acessória e, em 
 consequência, que é de julgar improcedente o recurso, mantendo a decisão 
 recorrida’. 
 A possibilidade de suspensão da execução da sanção acessória prevista no n° 3, 
 do art. 141° do Código da Estrada, está condicionada pela norma do n.° 1, do 
 mesmo artigo, o qual refere, taxativamente, que apenas pode ser suspensa a 
 execução da sanção acessória aplicada a contra-ordenações graves e nas condições 
 previstas nos números seguintes. 
 Ora, tendo em conta que o arguido deve ser considerado reincidente, pelo facto 
 de ter averbada ao registo de condutor a prática de uma contra-ordenação grave 
 praticada e sancionada há menos de cinco anos, nos termos do disposto no art. 
 
 143° do Código da Estrada, o limite mínimo da sanção acessória é de 4 meses (120 
 dias) medida em que o arguido foi condenado pela autoridade administrativa. 
 E assim que se estranhe que o recorrente venha esgrimir com o argumento de que 
 
 ‘a condenação não é justa e adequada, sendo certo que os critérios utilizados na 
 escolha e medida da pena, não se coadunam com o caso sub judice’, invocando a 
 violação dos normativos ínsitos nos art°s 50° e 199° n° 1 do C. P. Penal e, 
 ainda os artigos 18° e 32° n° 10 da CRP. 
 Do que falecem, por inteiro, todos os itens aportados pelo recorrente. 
 Termos em que se acorda em rejeitar, por manifestamente improcedente, o recurso 
 
 - art° 417° n.° 3 c), 419° n.º 4 a) e 420° n° 1 CPP, todos”. 
 Ainda inconformado com o assim decidido, no que respeita à questão da 
 constitucionalidade levantada veio interpor recurso para este Tribunal, 
 invocando o seguinte: 
 
 “1- O requerente pretende que o Tribunal Constitucional julgue inconstitucional 
 a interpretação e aplicação do artigo 141°, n°1 do C. Estrada, vertida no 
 acórdão recorrido, na medida em que tal normativo legal estabelece que, nas 
 contra ordenações muito graves não se pode verificar a suspensão da sanção 
 acessória de inibição de conduzir e, por entender, por outro lado, que a 
 aplicação de tal sanção resulta automaticamente da lei. 
 
 2- Por se entender que a aplicação da sanção acessória de inibição de conduzir 
 não pode resultar automaticamente da lei, mas da apreciação casuística efectuada 
 pelo julgador face a cada caso concreto, entendemos que o supra referido 
 dispositivo legal (artigo 141°, n°1 do C. Estrada), não se conforma com as 
 normas constitucionais constantes dos artigos 18°, n°1 e 2 e 32°, n°10 da C.R.P. 
 
 
 
 3- Do mesmo modo, a interpretação e aplicação do mesmo dispositivo legal 
 conflitua, in casu, com as normas constitucionais constantes dos artigos 47°, 
 n°1 e 58° da C. R. P., porquanto denegam o direito fundamental ao exercício da 
 profissão e o direito ao trabalho. 
 
 4- Tendo a violação das normas e princípios constitucionais citados sido 
 invocadas pelo recorrente nas peças processuais constantes dos autos, maxime na 
 alínea M das Conclusões da Motivação do Recurso apresentado para o Venerando 
 Tribunal da Relação de Coimbra, onde se invocou a inconstitucionalidade da norma 
 constante do artigo 141°, n°1 do C. Estrada, por violar as normas constantes dos 
 artigos 50° e 199°, n°1 do C. P. Penal e dos artigos 18° e 32°, n°10 da C.R.P. 
 
 5- Também na alínea O) das Conclusões se invoca tal inconstitucionalidade por 
 violação dos mesmos dispositivos legais e das normas constantes dos artigos 47°, 
 n°1 e 58° da C.R.P.” 
 Posteriormente, nas alegações produzidas viria a concluir pela seguinte forma: 
 
 “A) O artigo 141°, n°3 do C. Estrada prevê um regime específico para os 
 infractores que nos últimos cinco anos cometeram apenas uma contra ordenação 
 grave. 
 B) In casu, mostram-se reunidos os pressupostos que à luz da lei anterior 
 levariam a aplicar a suspensão da execução da sanção acessória, pelo que a 
 suspensão da sanção acessória de inibição de conduzir pode ser determinada pelo 
 período de um a dois anos, podendo ser aplicada ao Recorrente uma das medidas 
 previstas no artigo 141°, n°3 do mesmo Diploma legal. 
 C) Ao não decidir pela suspensão da sanção acessória de inibição de conduzir, o 
 douto Acórdão, de que ora se recorre, põe em causa o sucesso profissional do 
 Recorrente, colocando em risco a manutenção do seu posto de trabalho, o que 
 consubstancia uma evidente restrição de direitos fundamentais, 
 constitucionalmente consagrados, nomeadamente o de exercício de profissão ou 
 actividade, violando o disposto nos artigos 47° e 58° da CRP. 
 D) O artigo 141° do C. Estrada padece de inconstitucionalidade orgânica, nos 
 termos do artigo 204° da CRP, não podendo os tribunais aplicar normas que 
 infrinjam o disposto na C. R. P. ou os princípios nela consignados. 
 E) Ao limitar temporariamente a capacidade civil de exercício de direitos, pela 
 aplicação da sanção acessória de inibição de conduzir, sem atender às 
 gravíssimas repercussões económicas e profissionais que aquela implica, a douta 
 sentença viola ainda o disposto no artigo 18°, n° 2 da C.R.P. 
 E) O artigo 141° C. Estrada não se mostra conforme com o disposto nos artigos 
 
 205° e 32, n°10 da C. R. P., em conjugação com o disposto no artigo 50° do C. P. 
 Penal, na medida em que a suspensão de uma pena não resulta da automaticidade 
 legal, mas da ponderação casuística 
 G) A interpretação do artigo 141°, n°1 do C. Estrada vertida no Acórdão 
 recorrido, no tocante às contra ordenações muito graves, viola as normas 
 constantes dos artigos 50º e 199°, n° 1 do C. P. Penal e, ainda os artigos 18° e 
 
 32°, n° 10 da CRP. Com efeito e, ao contrário do que se conclui na sentença 
 recorrida, nada impede que, casuisticamente, o julgador, quando a justiça o 
 impunha, possa suspender a sanção acessória, tanto no que se refere às contra 
 ordenações graves, como muito graves. 
 H) A sentença recorrida viola as normas dos artigos 141° do Código da Estrada, 
 artigos 50° e 199° C. P. Penal e artigos 18°, n°1 e 2, 47°, n°1 e 58° da C.R.P. 
 e artigo 141°, n°3 C. Estrada.” 
 Por sua vez, na resposta, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto invocou, ao concluir 
 que: 
 
 “ 1°
 O regime constante do n.° 1 do artigo 141° do Código da Estrada, na versão 
 emergente do Decreto-Lei n.° 44/05, não padece de inconstitucionalidade 
 orgânica, como o Tribunal Constitucional vem reiteradamente decidido. 
 
 2°
 Tal norma, enquanto não permite a suspensão da sanção acessória de inibição de 
 conduzir ao arguido reincidente, que haja cometido contra-ordenação qualificada 
 como muito grave, não afronta o princípio constitucional da proporcionalidade. 
 
 3º
 Termos em que deverá improceder o presente recurso.” 
 Decidindo. 
 II – Fundamentação 
 Há que delimitar o objecto do recurso. 
 Cotejando o requerimento em que o Recorrente interpôs o recurso para este 
 Tribunal verifica-se que balizou as suas asserções no que se refere à 
 problemática da constitucionalidade invocando os normativos constantes dos 
 artigos 18.º e 32.º, n.º 10 da Constituição da República Portuguesa e ainda das 
 normas constantes dos artigos 47.º, n.º 1 e 58.º do mesmo corpo de leis 
 fundamentais. 
 Já na alegação de recurso veio também invocar que o artigo 141.º do Código da 
 Estrada padece, para além da inconstitucionalidade material que vinha arguida, 
 de inconstitucionalidade orgânica, por “ (…) a lei de autorização legislativa 
 
 (Lei n.º 53/2004, de 04 de Novembro), não contempla[r] a alteração ao artigo 
 
 141º, nº1 C. Estrada” e “(…) do referido Decreto-Lei não consta[r] qualquer 
 referência que permita sustentar a actuação do Governo, nomeadamente afastando  
 a aplicação da suspensão da sanção acessória de inibição de conduzir às 
 contra-ordenações muito graves.”  
 Não obstante tal temática da inconstitucionalidade orgânica ter sido recente e 
 unanimemente decidida por este Tribunal Constitucional no sentido da não 
 existência daquele tipo de inconstitucionalidade (vide Acórdãos n.ºs 604/06, 
 
 629/06 – publicados, respectivamente, no Diário da República, II Série, de 29 de 
 Dezembro e 3 de Janeiro – 6/07, 32/07, 629/06 e 603/06 – disponíveis em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt) e, portanto não assistir razão ao Recorrente na 
 questão que levanta, sempre se diga que, em recurso de fiscalização concreta da 
 constitucionalidade previsto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b) da Lei do Tribunal 
 Constitucional, não pode o Recorrente vir indicar, em sede de alegações, 
 fundamento de inconstitucionalidade diverso daquele que havia explicitado no 
 requerimento de interposição da constitucionalidade ou na delimitação da 
 respectiva questão de constitucionalidade. 
 A questão foi tratada no Acórdão n.º 139/03 (publicado no Diário da República, 
 II Série de 3 de Outubro), relatado pelo Cons. Artur Maurício, com declaração de 
 votos dos Cons. Luís Nunes de Almeida e Cardoso da Costa, em sentido oposto ao 
 decidido no Acórdão n.º 32/87 (publicado no Diário da República, II Série, de 7 
 de Abril), relatado pelo Cons. Cardoso da Costa. 
 No mais recente aresto decidiu-se que:
 
 “Não pode, com efeito, conhecer-se do objecto do recurso na parte em que 
 sustenta a inconstitucionalidade daquela norma por violação do artigo 30.º n° 4 
 da Constituição. É que em parte alguma das alegações que produziu perante o 
 tribunal recorrido, o recorrente suscita esta questão de constitucionalidade (só 
 o fez no requerimento de interposição do presente recurso), razão até por que o 
 STJ se não pronuncia sobre ela — em sede de inconstitucionalidade material o 
 recorrente limita-se a suscitar a aludida questão da determinabilidade da norma, 
 questão que nada tem a ver com a primeira. Dir-se-á, em contrário, que em termos 
 de ónus de suscitação da questão, este se deve ter por cumprido com a alegação 
 de inconstitucionalidade da norma, ainda que com outro fundamento, e isto até 
 pelo poder que o artigo da LTC confere ao Tribunal Constitucional — o de julgar 
 inconstitucional a norma por fundamentos diferentes dos que vêm alegados. Mas a 
 objecção não colhe. Com efeito, tal construção anularia por completo o fim que 
 se visa com o ónus de suscitação da questão de constitucionalidade perante o 
 tribunal que proferiu a decisão recorrida — o de permitir que este tribunal se 
 aperceba da questão de constitucionalidade e a aprecie e resolva — devendo ainda 
 ter-se em conta o rigor com que a lei define aquele ónus no artigo 72° n° 2 da 
 LTC (suscitação ‘de modo processualmente adequado’). Por outro lado, o aludido 
 poder do Tribunal Constitucional previsto no artigo 79°- C da LTC apenas deve 
 ser exercido — e aqui oficiosamente — quando o Tribunal entender que se verifica 
 inconstitucionalidade, embora por outro fundamento, não tendo que hipotizar (ele 
 próprio ou por ‘sugestão’ do recorrente) todas as possíveis questões de 
 inconstitucionalidade da norma em causa, para lhe dar resposta negativa.” 
 Não vemos razão para alterar a posição mais recente deste Tribunal acabada de 
 transcrever, ainda que nem sequer no requerimento de interposição do recurso tal 
 questão tenha sido enunciada.
 Com efeito, o sistema português de fiscalização concreta da constitucionalidade, 
 no qual se inclui o meio impugnatório dos presentes autos, previsto nos artigos 
 
 280.°, n.° 1, alínea b) da Constituição e 70.°, n.° 1, alínea b) da Lei do 
 Tribunal Constitucional, apresenta um carácter difuso, ocorrendo a intervenção 
 deste Tribunal apenas em sede de recurso – o que se justifica na medida em que a 
 competência para julgar da inconstitucionalidade é cometida a todos os 
 tribunais, nos termos dos artigos 204.° e 280.°, n.º 1, alínea b) da 
 Constituição. Tal pressupõe, por conseguinte, a intervenção ou pronúncia prévia 
 da instância recorrida sobre a questão de constitucionalidade concretamente 
 formulada. Assim, o Tribunal Constitucional não poderá conhecer destas questões 
 ex novo e apenas em sede de recurso, sob pena de extravasar as suas competências 
 neste domínio. Na verdade, a questão de constitucionalidade normativa deve ser 
 arguida durante o processo, por forma a permitir à instância recorrida 
 pronunciar-se sobre aquela tal como se apresenta recortada pela parte que a 
 suscita o que, como se escreveu no Acórdão n° 560/94, publicado no Diário da 
 República, II Série, de 20 de Janeiro de 1995, “(...) exige que quem tem o ónus 
 de suscitação da questão de constitucionalidade a coloque de forma clara e 
 perceptível.” 
 Na mesma linha se pronuncia Amâncio Ferreira (in Manual dos Recursos em Processo 
 Civil, 3.ª Edição, Almedina, 2002, p. 416) quando sustenta que: 
 
 “Uma vez que os recursos das decisões judiciais para o TC são restritos à 
 questão da inconstitucionalidade ou da ilegalidade (arts° 280.°, n.º 6 da CRP e 
 
 71.°, n.° 1 da LTC), também o TC só pode julgar inconstitucionais ou ilegais as 
 normas que a decisão recorrida, conforme os casos, tenha aplicado ou a que haja 
 recusado aplicação (art. 79.°-C, 1ª parte da LTC), não lhe cabendo indagar da 
 exactidão dos factos fixados pelo tribunal recorrido nem das normas por ele 
 escolhidas para a resolução do pleito. 
 Mas ‘os poderes de cognição do TC não ficam limitados pela qualificação feita 
 pelo tribunal a quo dos factos jurídicos relevantes para a questão (ex.: o TC 
 pode qualificar como imposto para efeito de controlo o que o tribunal recorrido 
 considerara como taxa, ou como crime o que na decisão recorrida havia sido 
 considerado como simples contraordenação)’. 
 O TC, em conformidade com o princípio do pedido, só actua, em sede de 
 fiscalização concreta da constitucionalidade e da legalidade, a solicitação das 
 pessoas com legitimidade processual activa e não mediante a iniciativa dos 
 juízes que o integram.” (sublinhado nosso)
 Ora, tal não sucedeu, no caso em apreço, pois que conforme já se salientou, o 
 tribunal a quo não se pronunciou sobre a questão da inconstitucionalidade 
 orgânica que o recorrente colocou directamente a este Tribunal. 
 Assim, não deverá ser conhecido do recurso, no atinente à tardia invocação de 
 inconstitucionalidade orgânica. 
 No que se refere às invocações de inconstitucionalidade material fundadas na 
 situação da impossibilidade de ser suspensa a sanção acessória de inibição de 
 conduzir, no caso de contra ordenações “muito graves” (artigo 141.º n.º1 do 
 Código da Estrada), e uma vez que a aplicação automática da sanção acessória não 
 foi suscitada nos autos, temos por adequado de que, contrariamente ao que vem 
 por si propugnado, não foram beliscados os princípios constitucionais elencados, 
 como os constantes dos artigos 47.° e 58.°, 32.°, n.° 10 e 18.° n.° 1 da 
 Constituição da República. 
 Com efeito, a aplicação ao Recorrente da mencionada sanção acessória em nada 
 afronta com os direitos fundamentais ao exercício de profissão ou actividade e o 
 ao trabalho, já que como bem salienta o Exmo. Magistrado do Ministério Público, 
 junto deste Tribunal, na sua resposta:
 
 “o exercício de profissão ou actividade económica não constituem um valor 
 constitucional absoluto, tendo de ser contabilizados ou articulados com outros 
 interesses constitucionalmente relevantes. No que respeita ao exercício da 
 condução de veículos na via pública, deve o interessado, deles detentor, exercer 
 a condução segundo as regras estradais em vigor e com a diligência devida, de 
 modo a acautelar a eventual lesão de outros valores constitucionalmente 
 tutelados, como a vida e integridade física dos demais utentes das vias públicas 
 
 — não podendo o sancionamento das infracções cometidas perspectivar-se como 
 limite ou constrição aos direitos de profissão ou de livre actuação económica.” 
 Não resulta, ainda, dos autos que tenham sido postergados os direitos de defesa 
 do arguido em processo contra-ordenacional, já que nada inculca a ideia de que o 
 seu direito de audiência e de oposição com vista a poder esgrimir os seus 
 argumentos de defesa tivessem sido afectados, nem essa factualidade foi, de 
 resto, invocada na alegação para este Tribunal. 
 No que se refere ao princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso 
 que veio também invocado, alicerçado no artigo 18.° n.° 2 da Constituição da 
 República, temos que sobre este princípio fundamental existe já uma vasta e 
 consolidada jurisprudência do Tribunal Constitucional, dela se podendo inferir 
 que, tal princípio constitucionalmente consagrado – desde logo enquanto 
 princípio decorrente do Estado de Direito (artigo 2.° CRP) –, foi erigido como 
 cânone aferidor da constitucionalidade ou inconstitucionalidade das normas. O 
 Acórdão n.° 526/06 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt) retoma uma 
 síntese das decisões deste Tribunal na matéria em apreço, onde se assinala que:
 
 “o princípio da proporcionalidade, em sentido lato, pode (...) desdobrar-se 
 analiticamente em três exigências da relação entre as medidas e os fins 
 prosseguidos: a adequação das medidas aos fins; a necessidade ou exigibilidade 
 das medidas e a proporcionalidade em sentido estrito, ou ‘justa medida’. Como se 
 escreveu no (...) Acórdão n.° 634/93, (...): ‘o princípio da proporcionalidade 
 desdobra-se em três subprincípios: princípio da adequação (as medidas 
 restritivas de direitos, liberdades e garantias devem revelar-se como um meio 
 para a prossecução dos fins visados, com salvaguarda de outros direitos ou bens 
 constitucionalmente protegidos); princípio da exigibilidade (essas medidas 
 restritivas têm de ser exigidas para alcançar os fins em vista, por o legislador 
 não dispor de outros meios menos restritivos para alcançar o mesmo desiderato); 
 princípio da justa medida, ou proporcionalidade em sentido estrito (não poderão 
 adoptar-se medidas excessivas, desproporcionadas para alcançar os fins 
 pretendidos). [...]” 
 Este princípio “coloca a tónica na ideia de que o cidadão tem direito à menor 
 desvantagem possível (...). O princípio da exigibilidade não põe em crise, na 
 maior parte dos casos, a adopção da medida (necessidade absoluta) mas sim a 
 necessidade relativa, ou seja, se o legislador poderia ter adoptado outro meio 
 igualmente eficaz e menos desvantajoso para o cidadão” (J.J. Gomes Canotilho, 
 Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Coimbra, 2003, p. 270). 
 No caso em apreço, não se descortina fundamento material bastante, do ponto de 
 vista constitucional, para a discrepância assinalada pelo Recorrente, já que não 
 colocará em crise este comando constitucional o normativo que interdita a 
 suspensão da sanção acessória da inibição de conduzir, aplicável a quem cometer 
 infracção catalogada e considerada como “muito grave”. 
 Não merece, pois, provimento o recurso. 
 
 
 
 
 III – Decisão 
 Nestes termos, acordam, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional, em não dar 
 provimento ao recurso de inconstitucionalidade interposto. 
 Custas pelo Recorrente, fixando a taxa de justiça em 25 (vinte e cinco) UC. 
 Lisboa, 24 de Julho de 2007
 José Borges Soeiro
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Maria João Antunes
 Gil Galvão
 Rui Manuel Moura Ramos