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Processo n.º 714/07
 Plenário
 Relator: Conselheiro João Cura Mariano
 
                                                                
 Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional
 
  
 Relatório
 A. intentou no Tribunal do Trabalho de Lisboa a presente acção declarativa de 
 condenação, sob a forma comum, emergente de contrato individual de trabalho, 
 contra “Banco B., S.A.”, em que pediu, além do mais, que sejam julgadas 
 inconstitucionais e nulas as normas constantes do ACTV para o sector bancário 
 que estabeleceram o quantitativo de reforma do Autor, por violação dos direitos, 
 liberdades e garantias, direitos e deveres sociais garantidos nos artigos 63.º e 
 
 64.º, da Constituição da República Portuguesa (CRP), e no artigo 25.º da 
 Declaração Universal dos Direitos do Homem, com a consequente condenação da Ré 
 a pagar e a integrar na mensalidade de reforma as prestações mensais e 
 periódicas de isenção de horário de trabalho, de cartão de crédito para 
 utilização pessoal, senhas de gasolina, pagamento de telefone e telemóvel, 
 prémio de produtividade e mérito e o carro de serviço para uso pessoal, 
 incluindo todas as despesas inerentes ao uso que o Autor auferia à data da 
 cessação do contrato de trabalho.
 
  
 Na primeira instância a acção foi julgada improcedente, com a consequente 
 absolvição da Ré de todos os pedidos.
 
  
 Apelou o Autor para o Tribunal da Relação, o qual viria a confirmar a decisão 
 recorrida.
 
  
 Igualmente inconformado com esta última decisão, o Autor veio pedir a sua 
 revista, tendo a mesma sido totalmente negada por acórdão do Supremo Tribunal de 
 Justiça proferido em 6-6-2007.
 
  
 
 É desta decisão do Supremo Tribunal de Justiça que o Autor interpôs recurso para 
 o Tribunal Constitucional, no âmbito da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da 
 LTC, tendo por objecto a interpretação concretamente adoptada pelo referido 
 tribunal superior na aplicação das normas constantes das cláusulas 136.ª a 
 
 144.ª, do Acordo Colectivo de Trabalho Vertical para o Sector Bancário (versão 
 publicada no BTE 31/1992), bem como aquela que foi adoptada na aplicação da 
 norma constante do artigo 863.º do Código Civil.
 
  
 No respectivo requerimento de interposição de recurso, o Recorrente concretizou 
 as interpretações normativas que pretende ver sindicadas em sede de 
 constitucionalidade nos seguintes termos:
 
 «Em primeiro lugar, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de que ora se 
 recorre por inconstitucionalidade, foi considerado que o facto do Acordo 
 Colectivo de Trabalho do Sector Bancário (ACTV) consagrar que, para efeitos de 
 atribuição de pensão de reforma, apenas são levados em consideração os valores 
 correspondentes à retribuição base e diuturnidades, olvidando assim os restantes 
 valores recebidos a título de retribuição pelo ora Recorrente, enquanto no 
 activo, não viola nem a Constituição nem o previsto na Lei de Bases da Segurança 
 Social, que determina que, para efeitos de reforma, devem ser atendidos os 
 rendimentos realmente auferidos pelo trabalhador. 
 Ora, o Recorrente entende que esta interpretação é incorrecta, porquanto o ACTV, 
 no seu capítulo XI, fere a Constituição, nomeadamente quanto ao artigo 63º, nº 
 
 4, assim como viola a Lei de Bases da Segurança Social.
 
 (…) 
 Por outro lado, ainda, foi considerado no Acórdão do Supremo Tribunal de 
 Justiça, de que ora se recorre por inconstitucionalidade, que os créditos 
 reclamados na presente acção judicial se encontravam remitidos pela quitação 
 incluída no acordo. 
 
 (…)
 Será sempre, inconstitucional, por violação dos artigos 59º, 3º, e 1º e 4º do 
 art. 63º da Constituição, a interpretação que determina que sendo a mesma 
 entidade jurídica a tutelar o contrato de trabalho e a reforma (discricionária 
 quanto ao momento e montante), o trabalhador ainda assim pode renunciar, na 
 pendência da relação laboral, a créditos salariais no momento em que negoceia as 
 condições da sua reforma, sendo obviamente nulo e de nenhum efeito o acordo em 
 contrário.
 
 (…)
 Em relação às normas que se consideram inconstitucionais, as mesmas dizem 
 respeito à forma de cálculo da reforma pelo que se restringem as cláusulas 136º 
 a 144º do ACTV, porquanto a efectivação do direito à Segurança Social, prevista 
 no art. 63º da Constituição, não pode ser objecto de contratação colectiva.»
 
  
 O recorrente fundamentou o seu recurso nas seguintes alegações:
 
 “1) Em primeiro lugar, nem se diga que esta matéria (estas cláusulas do ACT não 
 têm dignidade de normas para o Tribunal Constitucional vir a conhecer da sua 
 natureza jurídica e da inconstitucionalidade destas normas por violação do 
 art.º 63º da CRP), como alguma corrente jurisprudencial hoje firmada nesse mais 
 alto Tribunal tem afirmado.
 
 2) Todavia, discorda-se desta corrente quando não conhece dos recursos 
 interpostos com esse fundamento sem atender na realidade à verdadeira natureza 
 desta problemática.
 
 3) Porquanto, não nos restam quaisquer dúvidas que as normas referentes a 
 segurança social constantes do ACT para o Sector Bancário são normas de carácter 
 híbrido, público-privado, por serem, concomitantemente, normas de regulação de 
 relações laborais cuja vigência se funda, apenas, em omissão de desenvolvimento 
 de preceito constitucional por parte do legislador.
 
 4) Normas de concretização de um direito subjectivo público, radicado na 
 Constituição, caracterizado como direito fundamental, exigível perante o Estado 
 ou, neste caso, perante quem o substitui na vinculação à prestação.
 
 5) De conteúdo concretizável através não só da Lei de Bases da Segurança Social 
 mas também da Constituição mediante normas directamente aplicáveis por 
 definição do conteúdo mínimo do direito.
 
 6) No que toca à vertente pública deste regime especial, temos, antes de mais, 
 que o campo da segurança social existe por imperativos de ordem pública, algo 
 que o Estado, na Constituição, assume como imprescindível para a sociedade e 
 que, por si, pretende assegurar – veja-se parecer elaborado pelo Professor 
 Doutor Jorge Miranda.
 
 7) Como consequência, temos que o direito à segurança social, previsto ao nível 
 constitucional e de lei de bases, é um direito que está fora do comércio 
 jurídico, não podendo ser alvo de regulação privada.
 
 8) O que também implica que as normas que definem o conteúdo do direito são 
 normas imperativas, inderrogáveis, e cujo standard mínimo que estabelecem não 
 pode ser preterido.
 
 9) Isto é, deve existir, obrigatoriamente, um standard mínimo – um regime 
 público mínimo –, que abranja todos os trabalhadores, incluindo os trabalhadores 
 bancários, como muito bem refere o Exmo. Senhor Professor Dr. Freitas do Amaral 
 no seu parecer, que se encontra junto aos autos, “É indiscutível, por isso, que 
 aos trabalhadores abrangidos pelo ACT para o Sector Bancário não pode ser negado 
 o direito à segurança social consagrado no art. 63º da Constituição. “Todos têm 
 direito à segurança social”, diz esse artigo. Ora, “todos” são todos: não são 
 todos menos os bancários.”
 
 10) É evidente que podem existir regimes especiais, a que alude a lei, mas são 
 complementares do regime obrigatório, que, por ser isso mesmo (obrigatório), não 
 permite que existam particulares afastados da sua concretização que, como tal, 
 não beneficiem do direito à segurança social.
 
 11) Pois, a aplicação dos regimes complementares pressupõe a satisfação do 
 direito fundamental.
 
 12) Veja-se o parecer do Prof. Doutor Jorge Miranda no seu brilhante parecer, 
 que se encontra junto aos autos, nomeadamente nas suas conclusões pág. 57.
 
 13) Por outro lado, a interpretação defendida pela Jurisprudência dominante 
 deste Tribunal, nomeadamente no Acórdão 172/93, afirma que: “…a lei regulamenta 
 a eficácia específica das convenções colectivas impondo a sua obrigatoriedade 
 unicamente quanto àqueles que devem considerar-se representados pela entidades 
 que as subscrevem, à luz dos princípios do direito do trabalho. As organizações 
 profissionais que as celebram não têm poderes de autoridade mas apenas poderes 
 de representação, isto é de defesa e de promoção da defesa dos direitos e 
 interesses dos respectivos filiados (cfr. Artigo 56º, n.º 1, da Constituição). 
 E, assim, o clausulado que elas incorporam não contém normas, entendidas como 
 padrões de conduta emitidos por entidades investidas em poderes de autoridade.”
 
 14) Ora, não se pode aceitar tal interpretação!
 
 15) As cláusulas do ACTV para o sector bancário, nomeadamente as clªs. 136ª a 
 
 144ª, que regulam a matéria respeitante à segurança social, são normas, na 
 verdadeira acepção da palavra e nos termos do disposto no art. 280º da CRP, 
 porquanto as mesmas resultam e decorrem de normas transitórias das Leis de Bases 
 da Segurança Social.
 
 16) Nessa medida, existe uma similitude entre as normas transitórias Leis de 
 Bases da Segurança Social e as portarias de extensão emanadas ao abrigo do jus 
 imperium e que estabelecem e impõem um regime especial para os trabalhadores 
 bancários, regime este constante das cláusulas 136ª a 144ª do referido ACTV.
 
 17) Pelo que, as cláusulas do ACTV, objecto do presente recurso, são normas 
 impostas por entidade investidas em poderes de autoridade, ou seja, através das 
 Leis de Bases da Segurança Social.
 
 18) Assim sendo, e conforme decorre da interpretação deste Tribunal quanto às 
 portarias de extensão, as Cláusulas 136ª a 144ª do ACTV para o sector bancário 
 são normas emanadas do imperium estadual porquanto decorrem das Leis de Bases da 
 Segurança Social, através das normas transitórias.
 
 19) Contrariamente ao decidido por este Tribunal, estas cláusulas, objecto de 
 fiscalização constitucional, não são provenientes da autonomia privada!
 
 20) São provenientes de poderes públicos – Lei de Bases da Segurança Social – 
 que estabeleceu e impôs um regime especial transitório relativamente aos 
 trabalhadores bancários, enquanto os mesmos não fossem integrados no regime 
 geral da segurança social.
 
 21) Regime especial e transitório que perdura há várias décadas!
 
 22) Além disso, veja-se a tese defendida na declaração de voto do Cons. José de 
 Sousa e Brito aposta no Acórdão nº 172/93, transcrita na declaração de voto do 
 Cons. Mário Torres aposta no Acórdão nº 224/05.
 
 23) Nesse sentido, e de acordo com o supra exposto, as cláusulas 136ª a 144ª do 
 ACTV para o sector bancário, enquanto normas emanadas e permitidas pelo poder 
 público, por força das sucessivas Leis de Bases da Segurança Social e a actual 
 Lei 4/2007, de 16/1 (art. 103º), que determinou a existência deste regime 
 especial e transitório, estão sujeitas à fiscalização concreta da 
 constitucionalidade, uma vez que integram o conceito de norma utilizado na 
 alínea b) do nº 1 do art. 280º da CRP e na alínea b) do nº 1 do art. 70º da Lei 
 do Tribunal Constitucional, pelo que o presente recurso deverá ser objecto de 
 conhecimento por parte deste Tribunal.
 
 24) O direito à segurança social vem previsto no art.º 63º da Constituição.
 
 25) Este artigo impõe um dever ao Estado, que este tem, obrigatoriamente, que 
 cumprir, sob pena de incorrer em inconstitucionalidade por omissão.
 
 26) “4.Todo o tempo de trabalho contribui, nos termos da lei, para o cálculo das 
 pensões de velhice e invalidez, independente do sector de actividade em que 
 tiver sido prestado.”
 
 27) Os nºs 1, 3 e 4 visam atribuir, definindo o respectivo conteúdo, o direito à 
 segurança social, tanto na vertente assistencialista como na vertente laborista, 
 estabelecendo um status mínimo e os termos de concretização do direito – o seu 
 objectivo é, efectivamente, atribuir um direito subjectivo aos cidadãos.
 
 28) O n.º 2, por seu lado, é uma norma programática, que estabelece as 
 características a que deve obedecer o sistema de segurança social, não só de 
 modo a que seja atribuído o direito in concreto, como também garantindo o 
 cumprimento de determinados cânones nessa atribuição.
 
 29) Tal conclusão tem apoio no texto constitucional: visa-se proteger todos os 
 cidadãos na velhice e na invalidez em situações de falta de capacidade para o 
 trabalho, através da atribuição de pensões de velhice e invalidez, 
 independentemente do sector de actividade em que o trabalho for prestado, 
 calculadas tendo em conta todo o tempo de trabalho prestado – vide Acórdão 
 
 411/99 do T.C., que se transcreve:
 
 30) 'Todo o tempo de trabalho contribui, nos termos da lei, para o cálculo das 
 pensões de velhice e invalidez, independentemente do sector de actividade em que 
 tiver sido prestado.'
 
 10.       Quando o texto constitucional remete para 'os termos da lei', fá-lo 
 para efeitos de concretização do direito, não a título de cláusula habilitativa 
 de restrições. A utilização da expressão 'todo o tempo de trabalho...' , em 
 conjugação com o segmento 'independentemente do sector de actividade em que 
 tiver sido prestado' impõe, nesta matéria, a obrigação, para o legislador 
 ordinário, de prever a contagem integral do tempo de serviço prestado pelo 
 trabalhador, sem restrições que afectem o núcleo essencial do direito.
 Como o direito à contagem do tempo de serviço para efeitos de aposentação tem 
 natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, aplica-se-lhe o regime 
 destes – constante do artigo 18º da Constituição da República Portuguesa –, por 
 força da extensão operada pelo artigo 17º da Constituição.
 A admitir-se a solução propugnada pela recorrida, a norma constitucional ficaria 
 esvaziada no seu sentido e o direito à contagem de todo o tempo de serviço seria 
 afectado no seu núcleo essencial. Tal consequência está vedada pelo nº 3 do 
 artigo 18º da Lei Fundamental. 
 Se a lei fraccionar o tempo de trabalho para efeitos de aposentação – assim 
 eliminando uma parte do tempo de trabalho prestado –, já não será todo o tempo 
 de trabalho a contribuir para o cálculo das pensões, mas apenas uma parte dele.
 Tal solução implicaria interpretar a Constituição de acordo com a lei e não 
 interpretar a lei de acordo com a Constituição, como se impõe.”
 
 31) O que manifestamente será contraditório com o teor do Acórdão do T.C., nº 
 
 171/04, o que, desde já, se chama à colação, porquanto este último Acórdão 
 afasta a melhor doutrina e jurisprudência, não devendo, consequentemente, ser 
 aceite o sentido deste.
 
 32) Neste sentido, toda a retribuição deve entrar no cálculo da reforma, 
 independentemente da fórmula de cálculo adoptada.
 
 33) Não se podendo excluir parte da retribuição e fixando a reforma, apenas, com 
 base em tabelas pré-fixadas – cláusulas do ACT que nada têm que ver com a 
 realidade.
 
 34) Ora, todo o tempo de trabalho contribui, nos termos da lei, para o cálculo 
 das pensões de reforma e invalidez.
 
 35) Concluindo que o montante da reforma será atribuído em função do tempo total 
 de trabalho e que será também atribuído em função da remuneração mensal, pois 
 esta é a compensação do trabalho prestado no período de um mês.
 
 36) E a ser assim, há que contabilizar todos os rendimentos do trabalhador 
 auferidos em função do seu trabalho.
 
 37) Pelo que, a pensão de reforma de invalidez e velhice, constitucionalmente, 
 tem por objectivo a garantia tendencial da manutenção dos rendimentos de 
 trabalho anteriormente auferidos sempre que o trabalhador veja reduzida ou 
 eliminada a sua capacidade de trabalho.
 
 38) Como concretização legal do conceito constitucional de retribuição, para que 
 remete o conceito do direito à segurança social adoptada pelo texto 
 constitucional, afirma-se no art.º 82º, n.os 1 e 2, da LCT (hoje art.º 249º do 
 Código do Trabalho), ser retribuição tudo aquilo a que o trabalhador tem direito 
 como contrapartida do seu trabalho, nomeadamente, a remuneração base e todas as 
 outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em 
 dinheiro ou em espécie.
 
 39) O legislador está adstrito a dois deveres: a) em primeiro lugar, deve dar 
 cabal desenvolvimento legislativo ao preceito, sob pena de incorrer em 
 inconstitucionalidade por omissão; b) em segundo lugar, não deve adoptar medidas 
 legislativas que, inseridas no âmbito de aplicação da norma programática, 
 contrariem, dificultem, ou, no caso do art.º 63º, n.º 2, por esta norma ser 
 imediatamente exequível, protelem a concretização legislativa desta, sob pena 
 de incorrer em inconstitucionalidade por acção, como é propugnado por diversa 
 doutrina.
 
 40) Para definir os correctos parâmetros constitucionais recortados por este 
 art.º 63º, referir a vertente garantística que assume a previsão de um sistema 
 de segurança social com as características supra enunciadas em relação ao 
 direito subjectivo de cada trabalhador à segurança social. Quando o legislador 
 constituinte procede à caracterização do direito subjectivo à segurança social, 
 caracteriza-o reforçando a igualdade e a universalidade como suas 
 características básicas, assumindo que cada trabalhador é, igualmente, 
 beneficiário e financiador do sistema. 
 
 41) No seguimento do já referido, podemos afirmar que só no âmbito de um sistema 
 universal se consegue assegurar a igualdade (não discriminação), a equidade 
 social (tratamento diferente na medida da diferença) e a diferenciação positiva 
 
 (avaliação de especificidades sociais de grupos de cidadãos), por só a inserção 
 num sistema uno permite colocar os trabalhadores em situação de igualdade e 
 prover pelo cumprimento do seu direito tendo como pano de fundo a totalidade 
 do sistema – vide Acórdão 517/98 e 634/98 e também 77/02 do T.C.
 
 42) A solidariedade (nos planos nacional, laboral e intergeracional) só consegue 
 ser cumprida se implicar um sistema uno, em que cada um é solidário com os 
 restantes, e o Estado, ao financiar o sistema, é solidário com todos exactamente 
 na mesma medida. 
 
 43) A complementaridade (articulação de várias formas de protecção social, 
 públicas, cooperativas e sociais) pressupõe que exista um sistema público 
 passível de ser complementarizado, e que assegura o mínimo constitucional de 
 segurança social. 
 
 44) A unidade (tendente à boa administração do sistema) e a eficácia (concessão 
 oportuna das prestações legalmente previstas) querem assegurar a ausência de 
 desperdícios na gestão do sistema, a não duplicação de funções, a não 
 sobreposição de atribuições e de competências e a existência da coordenação 
 necessária à boa gestão do sistema e do seu património. 
 
 45) Temos por assente que o sistema previsto constitucionalmente visa, 
 essencialmente, três fins, a saber: a) tutelar o interesse público de boa 
 organização e gestão do sistema, caracterizados pela eficiência e eficácia 
 deste; b) tutelar o interesse privado, de natureza difusa, de existência de um 
 sistema de concretização do direito à segurança social, que, por um lado, 
 garanta o direito a todos os cidadãos (adquirindo relevância a nível de ordem 
 pública), e, por outro, dê a garantia da concretização (actual ou eventual) do 
 direito à segurança social em relação a cada trabalhador individualmente 
 considerado (até por razões de solvência da pessoa colectiva organizadora do 
 fundo de pensões, mais garantida no caso do Estado); c) tutelar o direito 
 individual à justiça relativa na concretização do direito, assegurando que a 
 equidade e a diferenciação positiva, estabelecida nessa medida, são os limites 
 máximos de desvio à igualdade absoluta. 
 
 46) Como consequência destas conclusões, temos que a violação do art.º 63º, n.º 
 
 2, da Constituição, não acarreta apenas a possibilidade de declaração de 
 inconstitucionalidade por omissão, mas também violação dos direitos subjectivos 
 dos trabalhadores, nomeadamente do direito à segurança social, por o sistema, 
 tal como é caracterizado constitucionalmente, funcionar como garantia do direito 
 
 à segurança social.
 
 47) Afirmava o art.º 69º da Lei n.º 28/84, de 14 de Agosto, epigrafado de 
 
 “Subsistência transitória de regimes especiais”: “O regime especial de segurança 
 social dos trabalhadores agrícolas e os regimes especiais de segurança social 
 de outros grupos de trabalhadores serão gradualmente integrados no regime 
 geral”. 
 
 48) Afirma o art.º 109º da Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto, (hoje, 103º da Lei 
 
 4/2007, de 16/1) epigrafado de “regimes especiais”: “Os regimes especiais 
 vigentes à data da entrada em vigor da presente lei continuam a aplicar-se, 
 incluindo as disposições sobre o seu funcionamento, aos grupos de trabalhadores 
 pelos mesmos abrangidos, com respeito pelos direitos adquiridos e em formação” 
 
 49) Por tal norma, sistematicamente, se inserir nas disposições transitórias da 
 lei, conclui-se que tal aplicação será, também, a título transitório, e que o 
 Estado assume exactamente o mesmo que assumiu com o art.º 69º da Lei n.º 28/84, 
 de 14 de Agosto, ou seja, o reconhecimento da obrigatoriedade de 
 desenvolvimento do art.º 63º, n.º 2, da Constituição e a situação de 
 inconstitucionalidade por omissão por ausência concreta de desenvolvimento 
 legislativo. 
 
 50) Esta norma tem por efeito evitar a revogação, por superveniência da Lei de 
 Bases, de dois tipos distintos de normas que constituem os regimes de segurança 
 social.
 
 51) Estas normas despoletam, cada uma, duas estatuições, dado que têm por efeito 
 a manutenção do regime orgânico, a que se refere o art.º 63º, n.º 2, da 
 Constituição, e a manutenção do regime material de concretização do direito, a 
 que se referem os nºs 1, 3 e 4 do mesmo art.º 63º. 
 
 52) No que concerne ao regime orgânico, temos que a manutenção dos regimes 
 especiais é inconstitucional por acção, por violação do art.º 63º, n.º 2, da 
 Constituição. 
 
 53) Embora, seja o art.º 63º, n.º 2, uma norma programática, é possível a sua 
 violação por acção, desde que se adoptem medidas legislativas contrárias à 
 concretização do preceito. 
 
 54) O art.º 63º, n.º 2, também é violado na vertente garantística do direito 
 subjectivo à segurança social a que se aludiu, pois, ao manter a aplicabilidade 
 de regimes especiais, a prossecução de todos os objectivos, já referidos, 
 traçados e alcançáveis pelo sistema previsto na Constituição é protelada, 
 indefinidamente, no tempo. O que se verifica, com a entrada em vigor destas 
 normas, é que existe uma verdadeira tentativa de retirar eficácia ao disposto 
 na Constituição por meio de acto normativo de força hierárquica inferior. 
 
 55) O que é impossível, devendo estas normas, quando interpretadas no sentido de 
 desvincular o legislador da obrigatoriedade imediata de dar exequibilidade, 
 mediante desenvolvimento legislativo, ser afastadas do bloco legal, por 
 inconstitucionalidade por acção por violação do art.º 63º, n.º 2, da 
 Constituição. 
 
 56) Há que interpretar esta norma no sentido de manutenção dos regimes especiais 
 na medida em que não prejudicam a concretização do direito subjectivo à 
 segurança social nos termos descritos e previstos constitucionalmente.
 
 57) O direito também deve ser satisfeito em condições de igualdade entre 
 beneficiários do regime geral e dos regimes especiais, sob pena de violação do 
 princípio da igualdade. 
 
 58) E que deve ser o direito assegurado a todos aqueles que, a estarem 
 abrangidos pelo regime geral, tivessem direito ao mesmo pela situação fáctica 
 em que se encontram, sob pena de violação do princípio da universalidade.
 
 59) Se conclui que, em termos de regime de concretização material do direito à 
 segurança social, os art.ºs 69º, 109º, 123º e 103º das Leis de Bases da 
 Segurança Social são inconstitucionais quando interpretados no sentido de 
 promoverem a manutenção em vigor de regimes especiais que concretizem o direito 
 em termos menos favoráveis quando comparados com o regime geral, por violação 
 do direito à segurança social, previsto nos nºs 1, 3 e 4 do art.º 63º, do 
 princípio da igualdade previsto no art.º 13º e do princípio da universalidade, 
 previsto no art.º 12º, todos da Constituição, 
 
 60) E que o art.º 69º e o art.º 109º e 123º hoje 103º das Leis 28/84, 17/2000, 
 
 32/2002 e 4/2007 vigoram na ordem jurídica no sentido de permitir que o direito 
 
 à segurança social seja concretizado por regimes especiais em relação ao regime 
 geral, desde que o direito seja concretizado por aqueles na mesma medida que o 
 seria por este.
 
 61) Também o Prof. Rui Medeiros e Prof. Freitas do Amaral, no seu parecer, a 
 fls. 44, concluem “O Legislador não pode furtar-se à universalização do direito 
 
 à segurança social com o argumento de que a questão é complexam e a articulação 
 com o regime em vigor se mostra problemática, podendo o Tribunal Constitucional, 
 quase trinta anos volvidos desde a entrada em vigor do artigo 63º da 
 Constituição, apreciar o incumprimento do mandato constitucional pelo legislador 
 e verificar a correspondente inconstitucionalidade por omissão;”
 
 62) Por outro lado, e tendo em conta a evolução que se seguiu, com a entrada em 
 vigor da Constituição de 1976 e a chamada “concepção laborista da segurança 
 social”, operou-se, fundamentalmente, pela via da negociação colectiva, 
 
 63) A generalidade dos trabalhadores bancários mantiveram-se fora do sistema 
 geral e público de segurança social aplicável aos demais trabalhadores por conta 
 de outrem, 
 
 64) Tendo as sucessivas Leis de Bases da Segurança Social consagrado um regime 
 especial e transitório para os trabalhadores bancários.
 
 65) Nos últimos quinze anos têm vindo a ser instituídas, no âmbito da Banca – 
 especialmente para os trabalhadores com funções de direcção, técnicas ou de 
 chefia -, componentes de retribuição (remunerações acessórias ou complementares) 
 que, nos regimes públicos de protecção social, influiriam no cálculo das 
 pensões, mas que, no âmbito do regime do ACT, não têm qualquer relevância para 
 este efeito.
 
 66) Chegou-se, pois, ao absurdo de, entre as diversas instituições bancárias, e 
 até no âmbito da mesma instituição, para carreiras remuneratórias similares, 
 existirem diferentes regimes de protecção social. 
 
 67) Os ex – trabalhadores do B. têm os seus vencimentos majorados, por forma a 
 cumprir o prescrito na Cláusula 92º, nº 5 do ACT, já que os descontos feitos 
 para a Segurança Social são superiores no regime geral, e, por isso, quando se 
 reformam, têm valores substancialmente maiores de pensão do que recebem os seus 
 colegas de carreira oriundos dos outros bancos. 
 
 68) Estas situações anómalas, configurando graves entorses ao sistema 
 constitucional vigente, foram objecto de estudo específico dos Professores 
 Doutores Diogo Freitas do Amaral e Rui Medeiros, cujo parecer se encontra junto 
 nos presentes autos. 
 
 69) Por um lado, a perversidade do sistema permite que os valores atribuídos a 
 título de isenção de horário de trabalho e demais complementos salariais, sejam 
 de montante substancialmente elevado face à retribuição base. 
 
 70) O regime especial de segurança social dos trabalhadores abrangidos pelo ACT 
 vem previsto no Capítulo IX, Secção I, do documento, nos art.ºs 136º a 144º, 
 fazendo também parte integrante do mesmo regime os anexos V e VI. 
 
 71) No que respeita a atribuição de pensões de reforma, temos que os 
 trabalhadores abrangidos por este regime têm direito, em suma, a uma pensão 
 mensal de reforma calculada de acordo com a aplicação das percentagens do anexo 
 V aos valores fixados no anexo VI, mais duas pensões por ano a título de 
 subsídio de Natal e 14º mês, a que acrescem os valores correspondentes a 
 diuturnidades a calcular nos termos definidos pela Cláusula 105ª do ACT. 
 
 72) Tal regime implica que o cálculo do montante devido ao trabalhador a título 
 de pensão de reforma é realizado não atendendo, minimamente, aos montantes 
 outrora devidos e efectivamente prestados a título de retribuição, o que 
 acarreta várias consequências.
 
 73) Com a superveniência das Leis de Bases da Segurança Social (já 
 identificadas), foram mantidos os regimes ditos “especiais” de segurança social, 
 através de normas transitórias (também já referidas). 
 
 74) Estas normas não podem ter, em relação ao direito subjectivo à segurança 
 social, definido constitucionalmente, de cada trabalhador abrangido por um 
 regime especial, outro conteúdo que não o que já foi referido, ou seja, a 
 garantia que, pese embora a existência de regimes especiais, estes regimes não 
 podem concretizar a atribuição deste direito em termos que prejudiquem os 
 trabalhadores por si abrangidos em relação aos trabalhadores abrangidos pelo 
 regime geral (que deveria ser único).
 
 75) As normas referentes a segurança social constantes do ACT são normas de 
 carácter híbrido, público-privado, por serem, concomitantemente, normas de 
 regulação de relações laborais cuja vigência se funda, apenas, em omissão de 
 desenvolvimento de preceito constitucional por parte do legislador.
 
 76) Normas de concretização de um direito subjectivo público, radicado na 
 Constituição, caracterizado como direito fundamental, exigível perante o Estado 
 ou, neste caso, perante quem o substitui na vinculação à prestação.
 
 77) De conteúdo concretizável através não só da Lei de Bases da Segurança Social 
 mas também da Constituição mediante normas directamente aplicáveis por definição 
 do conteúdo mínimo do direito.
 
 78) Essa prestação quer-se como substitutiva dos rendimentos do trabalho, e que 
 se caracteriza por ser um direito indisponível, por se reportar ao conceito, de 
 direito laboral, de remuneração.
 
 79) Temos que o direito à segurança social, previsto ao nível constitucional e 
 de lei de bases, é um direito que está fora do comércio jurídico, não podendo 
 ser alvo de regulação privada – veja-se parecer elaborado pelo Professor Doutor 
 Jorge Miranda.
 
 80) O que também implica que as normas que definem o conteúdo do direito são 
 normas imperativas, inderrogáveis, e cujo standard mínimo que estabelecem não 
 pode ser preterido.
 
 81) Não só a Ré surge como substituta do Estado na satisfação do direito à 
 segurança social, estando vinculada à prestação exactamente da mesma forma que o 
 Estado estaria, caso fosse ele a assegurar o direito.
 
 82) Como o regime traçado pelo ACT possui força de lei, por remissão da lei de 
 bases, assumindo, perante esta, o papel concretizador que está reservado aos 
 
 órgãos legislativos.
 
 83) Do que foi afirmado supra, podemos concluir que, organicamente, o regime de 
 segurança social previsto no ACT é inconstitucional, violando o art.º 112º, n.º 
 
 6, e o art.º 198º, n.º 1, al. c), da Constituição, para além de desrespeitar o 
 princípio constitucional de reserva de lei formal.
 
 84) Inexistem dúvidas quanto ao facto de ser o ACT, para efeitos de aplicação da 
 referida norma, um acto “de outra natureza”, pois não é, com certeza, um acto 
 legislativo (“outras categorias de actos legislativos”), que constitui o termo 
 de comparação para definição do conteúdo do conceito.
 
 85) Inexiste também qualquer tipo de dúvida que o regime do ACT possui eficácia 
 externa, ou seja, eficácia de lei, pois, por força da norma transitória/especial 
 da lei de bases, o estatuto dos trabalhadores abrangidos por este regime escapa 
 a toda a regulação legislativa de concretização do direito à segurança social, 
 valendo não só entre as partes, mas sim para toda a ordem jurídica.
 
 86) Do exposto conclui-se que o art.º 103º da Lei de Bases 4/2007, de 16/1, ao 
 manter em vigor os regimes especiais contidos em actos não legislativos, está a 
 violar o art.º 112º, n.º 6, da Constituição, conferindo força de lei a acto não 
 legislativo.
 
 87) O que acarreta a inconstitucionalidade do regime de segurança social 
 previsto no ACT de todos os actos e regimes que se lhe seguirem por efeito de 
 modificação do ACT.
 
 88) Ainda que não se conclua no sentido supra referido, o regime constante do 
 ACT será inconstitucional materialmente, por várias ordens de razão, 
 nomeadamente por ofensa ao conteúdo estabelecido na Constituição para o direito 
 
 à segurança social e por configurar ofensas intoleradas pela Constituição aos 
 princípios da igualdade e da universalidade.
 
 89) O direito à segurança social, da maneira como nos é prefigurado na 
 Constituição no art.º 63º, nºs 1, 3 e 4, constitui um direito fundamental 
 material que estabelece o seu conteúdo de uma forma precisa, conteúdo esse que 
 já foi também preenchido pelas sucessivas leis de bases da segurança social: o 
 direito a uma reforma que leve em linha de conta toda a carreira salarial 
 contributiva do trabalhador, não podendo excluir parcelas de retribuição para 
 efeitos de cálculo, independentemente do modo, em concreto, como é efectuado 
 esse mesmo cálculo.
 
 90) Ora, assumindo a Ré, no âmbito do ACT, o papel do Estado como entidade 
 prestadora do direito à segurança social, são-lhe imputáveis exactamente as 
 mesmas obrigações e os mesmos limites que são imputados ao Estado na 
 concretização do regime constitucional de segurança social.
 
 91) Deste modo, e contrapondo o regime de segurança social previsto no ACT e o 
 que supra foi referido como conteúdo do direito à segurança social, podemos 
 concluir que este regime peca por defeito, não assegurando a total satisfação do 
 direito.
 
 92) A conclusão a que chegamos aquando da concretização do conteúdo do direito 
 foi: “visa-se proteger todos os cidadãos na velhice e na invalidez em situações 
 de falta de capacidade para o trabalho, através da atribuição de pensões de 
 velhice e invalidez, independentemente do sector de actividade em que o trabalho 
 for prestado, calculadas tendo em conta todo o tempo de trabalho prestado”.
 
 93) Ou seja, refere-se que todo o tempo de trabalho contribui, nos termos da 
 lei, para o cálculo das pensões de reforma e invalidez, o que nos conduz a 
 várias conclusões: o montante da reforma será atribuído em função do tempo total 
 de trabalho; será também atribuído em função da remuneração mensal, pois esta é 
 a compensação do trabalho prestado no período de um mês; a ser assim, há que 
 contabilizar todos os rendimentos do trabalhador auferidos em função do seu 
 trabalho.
 
 94) Contrapondo estas conclusões com a realidade jurídica consagrada no ACT, 
 facilmente poderemos concluir que inexiste qualquer tipo de relação entre os 
 montantes indicados no Anexo II, relativo à tabela salarial, e o Anexo VI, 
 relativo às mensalidades atribuídas aos trabalhadores colocados nas situações de 
 invalidez ou invalidez presumível, ainda que tomando por base o exemplo do 
 trabalhador que tenha direito à totalidade das mensalidades aí previstas por 
 força da aplicação da tabela que constitui o Anexo V.
 
 95) Daqui se conclui que este regime não visa garantir a manutenção dos 
 rendimentos de trabalho anteriormente auferidos pelos trabalhadores, pelo que é, 
 materialmente, inconstitucional.
 
 96) Podemos, então, concluir que as prestações normativamente previstas como 
 devidas a título de reforma não satisfazem completamente o direito à segurança 
 social previsto na Constituição, pecando por defeito, sendo, por esta razão, 
 inconstitucionais as normas constantes do ACT que prevêem esses montantes, 
 nomeadamente as constantes dos art.ºs 137º, 137º-A, 138º e 140º, por violação 
 dos art.º 63º, nºs 1, 3 e 4, da Constituição.
 
 97) É peremptório o art.º 13º da Constituição: “1 – Todos os cidadãos têm a 
 mesma dignidade social e são iguais perante a lei”; “2 – Ninguém pode ser 
 privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de 
 qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de 
 origem, religião, convicções políticas e ideológicas, instrução, situação 
 económica ou condição social”.
 
 98) No que, especificamente, concerne ao princípio da igualdade, verificam-se 
 dois níveis de discriminação infundada dos trabalhadores abrangidos pelo ACT em 
 relação a demais trabalhadores, no que respeita a nível legal: a)Em relação aos 
 demais trabalhadores dependentes em geral, que podem descontar de acordo com o 
 regime geral da Segurança Social, garantindo que a sua reforma por velhice será 
 calculada atendendo ao conceito de retribuição vigente para a ordem jurídica 
 laboral em geral, não sendo calculado a partir de montantes abstractos 
 definidos numa tabela sem qualquer relação com o montante efectivamente 
 percebido pelo trabalhador, enquanto no activo, a título de retribuição, sem 
 que os trabalhadores do sector bancário tenham possibilidade de optar pelo 
 regime geral; b)Em relação a trabalhadores bancários, mas que não estão 
 integrados nos quadros, os quais, embora estejam colocados exactamente na mesma 
 posição que os trabalhadores efectivos (à excepção da intensidade da sua 
 vinculação laboral), têm uma protecção mais forte no que respeita a segurança 
 social, porquanto descontam para o regime geral da Segurança Social.
 
 99) Não se alegue como fundamento para a manutenção da discriminação dos 
 trabalhadores bancários inseridos nos quadros das respectivas entidades 
 patronais e abrangidos pelo ACT o facto de estes não efectuarem descontos para o 
 fundo de pensões, ou seja, por estarem abrangidos por um regime não 
 contributivo.
 
 100) Estamos perante uma falsa questão.
 
 101) A entidade patronal, no que respeita a estes trabalhadores, já contava com 
 a necessidade de provisionar adequadamente o Fundo de Pensões, levando tal facto 
 em consideração tanto na negociação do ACT como, especificamente, na fixação dos 
 montantes remuneratórios,
 
 102) O que implica que o regime, na prática, é contributivo, realizando a 
 entidade patronal “descontos ocultos” que incidiam sobre os trabalhadores.
 
 103) Desde 1 de Março de 1996 que os novos trabalhadores admitidos na Banca já 
 contribuem para o Fundo de Pensões, cláusula 137-A do ACT.
 
 104) Nos termos da cláusula 92º, nº 5 do ACT, os trabalhadores que descontam 
 para a Segurança Social têm os seus salários majorados, de modo que recebam 
 retribuição mínima mensal líquida igual à dos demais trabalhadores do mesmo 
 nível.
 
 105) É-nos lícito concluir que existe discriminação infundada, que atenta contra 
 o princípio da igualdade, dos trabalhadores bancários integrados nos quadros e 
 trabalhadores em entidades signatárias do ACT em relação aos demais 
 trabalhadores por conta de outrem, beneficiários de acordo com o regime geral, 
 pelo que aquele regime deve ter-se por inconstitucional por violação do art.ºs 
 
 13º e 63º, n.º 4, da Constituição.
 
 106) A existência do regime de segurança social do ACT também viola o princípio 
 da universalidade consagrado no art.º 12º da Constituição, que estatui que 
 
 “todos os cidadãos gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres consignados 
 na Constituição”, e, especificamente em relação ao direito à segurança social, 
 no art.º 63º, n.º 1, da Constituição, e no art.º 6º da Lei de Bases, que 
 
 “consiste no acesso de todos os cidadãos à protecção social assegurada pelo 
 sistema, nos termos definidos por lei”.
 
 107) O regime previsto no ACT para efeitos de concretização do direito à 
 segurança social é inconstitucional, tal como o art.º 103º da actual Lei de 
 Bases, por ofensa do princípio da universalidade previsto na Constituição, 
 consubstanciada no afastamento dos trabalhadores abrangidos pelo ACT das 
 regalias do regime geral de segurança social.
 
 108) Determina a Cláusula 137ª do ACT as prestações pecuniárias a que os 
 trabalhadores abrangidos têm direito no caso de doença ou invalidez, ou quando 
 tenham atingido 65 anos de idade (sendo esta situação enquadrável em “invalidez 
 presumida”).
 
 109) Analisando os quadros constantes dos anexos V e VI, referidos na al. a) do 
 n.º 1 da referida Cláusula, facilmente se conclui que estes foram decalcados do 
 conceito de remuneração mínima mensal, o qual abrange apenas a retribuição de 
 base acrescida das diuturnidades a que o trabalhador tenha direito, de acordo 
 com a Cláusula 93ª do ACT.
 
 110) Não são considerados, para efeitos de reforma, os montantes que os 
 trabalhadores, enquanto no activo, auferiam, por exemplo, a título de isenção de 
 horário de trabalho e/ou remuneração complementar e, bem assim, subsídio de 
 função, por exemplo.
 
 111) O direito à segurança social, da maneira como nos é prefigurado na 
 Constituição no art.º 63º, n.º 3, constitui um direito fundamental material que 
 estabelece o seu conteúdo de uma forma precisa, conteúdo esse que já foi também 
 preenchido no âmbito das sucessivas leis de bases da segurança social: o direito 
 a uma reforma calculada de acordo com critérios que abrange toda a remuneração 
 efectiva auferida pelo trabalhador. 
 
 112) Não pode alegar-se que o regime constante do ACT é salvaguardado pelo art.º 
 
 103º da Lei de Bases, que define que “os regimes especiais vigentes à data da 
 entrada em vigor da presente lei continuam a aplicar-se, incluindo as 
 disposições sobre o seu funcionamento, aos grupos de trabalhadores pelos mesmos 
 abrangidos, com respeito pelos direitos adquiridos e em formação”.
 
 113) Este preceito também viola o estatuído no art.º 63º, n.º 3, da 
 Constituição, por implicar a manutenção de um regime que não obedece ao conceito 
 material de direito à segurança social, pois permite que se conceba como 
 
 “reforma” uma quantia que nada tem a ver com a carreira salarial dos 
 trabalhadores, base e pressuposto do cálculo da pensão de reforma.
 
 114) Como consequência do supra concluído, temos que a ora inconstitucionalidade 
 das normas identificadas implica, de acordo com o art.º 204º da Constituição, 
 que não poderão as mesmas ser aplicadas e cabe ao Tribunal afastá-las.
 
 115) Ainda no âmbito das normas transitórias constantes de leis de bases que 
 mantenham a aplicabilidade dos regimes especiais de segurança social há que 
 referir o facto de estas serem inconstitucionais quando aplicadas no sentido de 
 manutenção do regime de segurança social constante do ACT, por “conferir[em] a 
 actos de outra natureza o poder de, com eficácia externa, interpretar, integrar, 
 modificar, suspender ou revogar qualquer dos seus preceitos”, nos termos já 
 descritos.
 
 116) Como consequência deste juízo, o conteúdo do ACT terá que ser adequado à 
 realidade imposta constitucionalmente, que passa pelo afastamento da ressalva 
 transitória e pela concretização por parte do fundo de pensões criado no âmbito 
 do ACT do direito à segurança social em termos análogos ao que vigora no âmbito 
 do regime geral.
 
 117) Ainda que assim não se entendesse, o próprio regime previsto no ACT viola 
 directamente a Constituição, por três ordens de razão: por não assegurar uma 
 cabal satisfação do direito à segurança social; por não assegurar uma igualdade 
 na concretização do direito à segurança social, e; por não permitir a 
 universalidade do direito à segurança social.
 
 118) Em suma, o regime que, em virtude das inconstitucionalidades supra 
 referidas, é aplicável aos trabalhadores do sector bancário é, quanto à 
 estrutura, orgânica e funcionamento, o que até hoje vigora, por o afastamento 
 das normas que atentam contra o art.º 63º, n.º 2, da Constituição, implicar 
 apenas inconstitucionalidade por omissão, enquanto que a concretização efectiva 
 do direito, por referência ao cálculo do montante da prestação devida a título 
 de reforma por invalidez ou velhice, terá que ser realizado de acordo com o 
 constante no regime geral, por afastamento das normas do ACT que, pela sua 
 aplicação, prevejam o cálculo de um montante inferior ao que resultaria da 
 aplicação das normas análogas do regime geral.
 
 119) Independentemente do iter jurídico que se percorra, a solução para esta 
 questão será sempre a mesma: por um lado, a equiparação material dos 
 beneficiários do regime especial previsto no ACT em relação aos beneficiários do 
 regime geral, quando este confira uma maior amplitude ao direito, e, por outro 
 lado, a assunção dos deveres de prestação da concretização individual do direito 
 por parte do Fundo de Pensões constituído ao abrigo do regime do ACT.
 
 120) O que acontece é uma novação subjectiva no âmbito da relação jurídica de 
 carácter público que tem por base o direito à segurança social, em que a Ré 
 assume os direitos e os deveres do Estado na medida em que este estaria 
 vinculado caso o sistema geral de segurança social abrangesse os trabalhadores 
 bancários.
 
 121) O regime de segurança social previsto no ACT tem uma natureza eminentemente 
 pública, como já supra ficou demonstrado, e como se depreende facilmente pela 
 necessidade que o legislador sentiu de ressalvar a sua vigência, pelo que a 
 função da entidade que o gere é uma função, também ela, eminentemente pública.
 
 122) Não podia ignorar a entidade gestora do Fundo de Pensões (no caso concreto 
 dos autos a própria Ré) que a sua actividade não consubstanciava, nem 
 consubstancia, um negócio ou uma gestão tendente ao lucro; pelo contrário, 
 sabia, como sabe, que a sua função é dar cabal satisfação a um direito 
 fundamental dos trabalhadores previsto constitucionalmente, em regime de 
 substituição do Estado, a concretizar individualmente de acordo com as normas 
 que regulam a prestação desse direito no âmbito do regime geral.
 
 123) Tanto assim é que a Cláusula 136º do ACT, no pressuposto que o regime dele 
 constante é mais favorável que o regime geral, prevê que seja promovida a 
 igualdade entre os trabalhadores abrangidos pelo regime geral e os abrangidos 
 pelo regime especial do ACT, responsabilizando-se as Instituições de Crédito 
 pelo complemento devido aos trabalhadores também beneficiários do regime geral 
 que os coloque em posição de igualdade em relação aos beneficiários do regime do 
 ACT (regime, sem dúvida, legal).
 
 124) Logo, nunca foi objectivo do ACT diminuir o âmbito da protecção nas 
 eventualidades de velhice e de invalidez dos trabalhadores abrangidos pelo 
 regime dele constante em relação aos trabalhadores abrangidos pelo regime geral, 
 pois tal regulamentação seria, manifestamente, inconstitucional, como já se 
 demonstrou.
 
 125) Por outro lado, e na prática, a consciência da existência dessa ilegalidade 
 leva-nos a confirmar que a Ré viola, objectivamente, o princípio da igualdade e 
 tem a noção da ilicitude do seu comportamento ao determinar que no momento da 
 invalidez os seus quadros recebem a reforma não pelo nível a que lhe corresponde 
 no Anexo V do ACTV, mas atribuindo a seu belo prazer e com critérios casuísticos 
 o valor da reforma a cada um deles.
 
 126) Veja-se, nesse sentido, a matéria considerada como provada na 1ª Instância, 
 nomeadamente quesitos 18º, 44º e 45º.
 
 127) A existência deste regime especial de segurança social, previsto no ACT, 
 como já foi explicado, resulta de dificuldades de execução da integração, que 
 teriam de ser resolvidas tendo em consideração os interesses em causa, sendo que 
 o regime especial já remonta a período anterior à Constituição de 1976.
 
 128) Tal falta de integração no sistema geral de segurança social constituía um 
 comportamento tolerável enquanto da sua aplicação não resultasse um regime menos 
 favorável para os trabalhadores cuja eventualidade velhice ou invalidez fosse 
 tutelada, no âmbito do regime do ACT, de uma forma semelhante à tutela análoga 
 no âmbito do regime geral.
 
 129) Todavia, nos últimos quinze anos, têm vindo a ser instituídas, no âmbito da 
 Banca, especialmente para os trabalhadores com funções de direcção, técnicas ou 
 de chefia, outras componentes de retribuição (remunerações acessórias ou 
 complementares) que nos regimes públicos de protecção social influiriam no 
 cálculo das pensões, mas que no âmbito do regime do ACT não têm qualquer 
 relevância para este efeito.
 
 130) Este dever é reforçado pelo facto de as instituições bancárias estarem numa 
 posição de substituição do Estado na prestação da satisfação deste direito dos 
 trabalhadores, pois consubstancia má fé destas instituições uma actuação que se 
 paute pelo puro desrespeito das leis e pela aplicação literal do regime de 
 segurança social do ACT.
 
 131) O que ora motiva a presente acção é a não contabilização de complementos 
 salariais para efeitos de reforma, por o ACT não reportar ao cálculo do montante 
 desta pensão a efectiva retribuição mas sim valores estipulados numa tabela 
 
 (Anexo VI).
 
 132) Ao realizar a retribuição em complementos salariais, visaram as 
 instituições bancárias defraudar a aplicação da lei, que impõe uma 
 correspondência tendencial e indicativa entre o montante da retribuição auferida 
 no activo e o montante da pensão de reforma.
 
 133) Pretendendo a inexistência de um direito dos trabalhadores que impõe a 
 correspondência de montantes supra referida, por o regime do ACT ser 
 
 “pretensamente” especial, e considerar apenas os montantes que foram auferidos a 
 título de remuneração-base e diuturnidades como os futuramente devidos a título 
 de reforma, as instituições bancárias violam o direito consagrado na lei, em 
 desenvolvimento da Constituição, e atribuído a todos os trabalhadores, a uma 
 reforma que tenha carácter substitutivo dos rendimentos auferidos no activo,
 
 134) As instituições bancárias tinham perfeita noção que a sua conduta 
 implicava, em termos objectivos, um desrespeito pela lei, em termos 
 subjectivos, o desrespeito pelos direitos dos trabalhadores atribuídos por 
 lei,
 
 135) Os trabalhadores abrangidos pelo regime de segurança social previsto no ACT 
 sofrem danos perfeitamente quantificáveis advenientes da má aplicação da lei por 
 parte das instituições bancárias no que respeita à satisfação do direito à 
 segurança social.
 
 136) Podem e devem ser responsabilizadas as instituições bancárias pelos danos 
 que resultaram da sua conduta ilícita e culposa, violadora do direito à 
 segurança social, e que foram causados aos trabalhadores, por aplicação do art.º 
 
 483º do Código Civil.
 
 137) Existem várias referências à relevância jurídica dos usos no âmbito do 
 Direito do Trabalho, sendo que a remissão genérica é a realizada pelo art.º 12º, 
 n.º 2, da LCT, que afirma que “desde que não contrariem as normas acima [no n.º 
 
 1] indicadas e não sejam contrários aos princípios da boa fé, serão atendíveis 
 os usos da profissão do trabalhador e das empresas, salvo se outra coisa for 
 convencionada por escrito”.
 
 138) Mais específicas e atinentes ao caso em apreço, por se reconduzirem aos 
 conceitos de remuneração e de retribuição, e por a pensão de reforma ou de 
 invalidez se querer substitutiva desta, são os art.º 82º, n.º 1, 87º e 88º nº 1 
 da LCT.
 
 139) Desde que se implementou a política de atribuição dos já referidos 
 complementos salariais, dentro da aplicação do ACT, e até há poucos anos, houve 
 o hábito de contabilizar esses mesmos complementos para efeitos de 
 quantificação do montante da pensão de reforma, o que, em termos de facto, 
 consubstancia uma aproximação ao método de cálculo do montante da pensão no 
 
 âmbito do regime geral, e a devida obediência aos princípios constitucionais e 
 legais referentes a segurança social, por se aproximar o montante da pensão de 
 reforma ao montante auferido enquanto trabalhador no activo.
 
 140) No caso dos autos o Autor reclama na sua pensão de reforma o valor recebido 
 a título de IHT (aliás em similitude com casos de outros colegas seus reformados 
 da Ré – veja-se a al. d) da matéria assente.
 
 141) A Ré, ao atribuir o montante da prestação de reforma, no que respeita a 
 trabalhadores que beneficiavam de complementos salariais, está a violar o 
 princípio da igualdade, pois define o montante consoante o caso que tem perante 
 si com base em critérios tudo menos jurídicos.
 
 142) Há colegas do A., do mesmo grupo a que pertence a Ré, a auferir pensões de 
 reforma de montantes superiores aos que estabelece o ACTV, dado que a Ré lhes 
 paga além do estabelecido noutros montantes a título de isenção de horário de 
 trabalho e remuneração complementar, pelo menos! (quesitos 18º, 44º e 45º dados 
 como provados)
 
 143) Pelo que há que admitir que, nos casos indicados, foi respeitada a 
 materialidade do direito à segurança social, contabilizando-se para efeitos de 
 reforma tudo aquilo que é considerado retribuição, independentemente do facto de 
 tal respeito pelo conteúdo do direito advir de aplicação do regime de cálculo 
 vigente para o regime geral, do respeito pelos usos da empresa ou mesmo por 
 satisfação directa do direito conforme este está configurado constitucional e 
 legalmente.
 
 144) Daqui se infere que a Ré está ciente do regime aplicável e vigente, e que 
 se vinculou à efectiva prestação do direito à segurança social em moldes 
 constitucionalmente aceites, valendo o ACT, no que concerne ao regime de 
 segurança social, nos termos que fundaram estas decisões de cálculo do montante 
 da mensalidade de reforma.
 
 145) Se de outro modo fosse, estando a Ré na convicção que o cálculo das 
 mensalidades de reforma, nestes casos de existência de complementos salariais, 
 seria realizado do mesmo modo que o literalmente indicado no Capítulo XI do ACT 
 e Anexos V e VI, existiria um abuso de confiança da sua parte, por estar a 
 dispor ilegitimamente de coisa móvel que lhe havia sido entregue por título não 
 translativo da propriedade, o que, ao que parece, não acontece.
 
 146) A Ré está vinculada ao princípio da igualdade, não só pela vinculação que, 
 em geral, advém do regime constitucional, como também pelo facto de este 
 princípio ser basilar do bloco legal relativo a segurança social, tendo estado 
 previsto no art.º 5º, nºs 1 e 4, da Lei n.º 28/84, de 14 de Agosto, art.ºs 4º e 
 
 6º da Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto, e vigorando actualmente nos termos dos 
 art.ºs 5º e 7º da Lei 4/2007, de16/1.
 
 147) O que há a fazer para repor a justiça, no caso concreto, será proceder à 
 equiparação da situação de facto de todos os trabalhadores que, enquanto no 
 activo, beneficiavam de complementos salariais, pela obediência devida ao 
 princípio da igualdade, formulado nos termos descritos.
 
 148) Antes de mais, afirma o n.º 1 a obrigatoriedade de atribuição do direito a 
 todos os particulares, indiciando um reforço da natureza universal do direito em 
 relação ao estatuído no art.º 12º da Constituição.
 
 149) Em segundo lugar, visa-se garantir que uma situação de falta de capacidade 
 para o trabalho seja suprida, sendo de realçar que não se trata, aqui, de 
 garantir um mínimo para subsistência, pois a Constituição equipara à falta ou 
 diminuição de meios de subsistência a falta ou diminuição de capacidade de 
 trabalho, assumindo que se trata de realidades distintas e que ambas são, 
 igualmente, motivo de protecção dos particulares (nesta realidade, dos 
 trabalhadores).
 
 150) Em terceiro lugar, ao referir que o direito existe independentemente do 
 sector de actividade em que o trabalho tenha sido prestado, o que indicia que o 
 legislador constituinte não realiza qualquer tipo de distinção entre classes 
 profissionais na atribuição do direito, por um lado, e, por outro, afirma 
 peremptoriamente que a actividade profissional do trabalhador não releva para 
 efeitos de atribuição de reforma – tal reforça a ideia de igualdade prevista, na 
 generalidade, no art.º 13º da Constituição.
 
 151) Ou seja, o critério adoptado na reforma tem de abranger todos, mas todos os 
 trabalhadores, aliás como referem os Professores Doutores Freitas do Amaral e 
 Rui Medeiros, no seu parecer, que se encontra junto aos autos e que se 
 transcreve: “É indiscutível, por isso, que aos trabalhadores abrangidos pelo ACT 
 para o Sector Bancário não pode ser negado o direito à segurança social 
 consagrado no art. 63º da Constituição. “Todos têm direito à segurança social”, 
 diz esse artigo. Ora, “todos” são todos: não são todos menos os bancários.”
 
 152) O art.º 6º do Decreto-Lei n.º 519-C1/79, de 29 de Dezembro, na redacção que 
 lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 209/92, de 2 de Outubro, estabelece 
 limitações quanto ao conteúdo das convenções colectivas de trabalho nos 
 seguintes termos: “Os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho não 
 podem: a) Limitar o exercício dos direitos fundamentais constitucionalmente 
 garantidos; b) Contrariar normas legais imperativas; c) Incluir qualquer 
 disposição que importe para os trabalhadores tratamento menos favorável do que o 
 estabelecido por lei; d) (…); e) Estabelecer e regular benefícios 
 complementares dos assegurados pelo sistema de segurança social, salvo se ao 
 abrigo e nos termos da legislação relativa aos regimes profissionais 
 complementares de segurança social ou equivalentes, bem como aqueles em que a 
 responsabilidade pela sua atribuição tenha sido transferida para instituições 
 seguradoras; e) (…)”, hoje, art. 553º do Código do Trabalho, com conteúdo 
 similar.
 
 153) Assim, o regime geral da segurança social funciona como norma mínima de 
 garantia que deve ser cumprida.
 
 154) Chegamos então à violação do princípio da igualdade, previsto no art.º 13º 
 da Constituição.
 
 155) A violação do princípio da igualdade é uma alegação bastante séria, por 
 estar intimamente relacionada com um dos direitos fundamentais do homem. Aliás, 
 isso mesmo foi reconhecido ao longo dos tempos, e o direito à igualdade de 
 tratamento vem previsto não só no art.º 13º da Constituição, como também no 
 art.º 23º, 2 da Declaração Universal dos Direitos do Homem e ainda na Convenção 
 da OIT n.º 11, de 1958.
 
 156) Além de que a norma constante do ACTV – e que se considera ser apenas 
 relativa a um mínimo de garantia – não foi aplicada em relação a variadíssimos 
 outros casos semelhantes aos do A.. E aqui reside a violação do princípio da 
 igualdade.
 
 157) Pois o cálculo é arbitrário, e vários trabalhadores do mesmo grupo a que 
 pertence a Ré receberam complementos de retribuição de base – pelo que não é 
 verdade que os mesmos não contem para nenhum trabalhador.
 
 158) Assim, toda a interpretação feita sobre esta questão é claramente 
 inconstitucional, por violação do art.º 13º da Constituição, 
 inconstitucionalidade que ora se argúi, para os devidos efeitos legais.
 
 159) Pelo exposto, o Acórdão de que ora se recorre violou o disposto nos art.ºs 
 
 13º e art. 63º da Constituição e Lei de Bases da Segurança Social, pelo que deve 
 ser revogada, com as legais consequências, na medida em que as Cláusulas 136ª a 
 
 144ª do ACT para o sector bancário e Anexos VI são inconstitucionais.»
 
  
 
                              Por seu turno, a Recorrida contra-alegou nos 
 seguintes termos: 
 
 “(...) 1. Os recursos de decisões judiciais para o Tribunal Constitucional são 
 restritos à questão da aplicação, ou recusa de aplicação, de normas jurídicas 
 
 [Lei do Tribunal Constitucional (“LTC”), art. 71.º/1]. 
 
 1.1. Os preceitos constantes dos instrumentos de regulamentação colectiva de 
 natureza convencional, como o em causa nos autos, não revestem a natureza de 
 normas jurídicas, pelo que a respectiva apreciação se encontra vedada a este 
 Tribunal, 
 
 1.2. Como o mesmo Tribunal tem decidido, por diversas vezes, mesmo a propósito 
 de questões em tudo idênticas às que constituem o objecto do presente recurso 
 
 (cfr., v.g., Acórdão n.º 143/05, de 16 de Março de 2005). 
 
 1.3. Por isso, o Tribunal Constitucional não é competente para conhecer do 
 presente recurso. 
 
 2. Sem prejuízo destas considerações, tenha-se ainda em conta que o Recorrente 
 entende inconstitucionais as cláusulas 136ª a 144ª e os Anexos V e VI do Acordo 
 Colectivo de Trabalho do Sector Bancário. 
 
 2.1. O Recorrente não cumpre, como lhe competia, o ónus de delimitação do 
 objecto do recurso através da concreta definição do preceito entendido 
 inconstitucional. 
 
 2.2. Pois aquilo que o Recorrente verdadeiramente censura, à luz de critérios de 
 constitucionalidade, não é determinada norma ou certo preceito convencional, mas 
 o sentido que lhes deu a decisão judicial sob recurso. 
 
 2.3. Ou seja, verdadeiramente, o que o Recorrente entende ser inconstitucional é 
 a decisão proferida nos autos, de que os preceitos convencionais que cita são 
 apenas fundamentos. 
 
 2.4. É a correcção ou justeza da decisão proferida que o Recorrente põe em 
 crise. 
 
 2.5. Todavia, “é (...) jurisprudência pacífica e sucessivamente reiterada que, 
 estando em causa a própria decisão em si mesma considerada, não há lugar ao 
 recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade vigente em Portugal. 
 Assim, resulta do disposto no artigo 280.º da Constituição e no artigo 70.º da 
 Lei n.º 28/82 e assim tem sido afirmado pelo Tribunal Constitucional em 
 inúmeras ocasiões. Na verdade, ao contrário dos sistemas em que é admitido 
 recurso de amparo, nomeadamente na modalidade de amparo dirigido contra decisões 
 jurisdicionais que, alegadamente, violam directamente a Constituição, o recurso 
 de fiscalização concreta de constitucionalidade vigente em Portugal não se 
 destina ao controlo da decisão judicial recorrida, como tal considerada, como 
 sucede quando a discordância se dirige a esta última, mas, pelo contrário, ao 
 controlo normativo de constitucionalidade da norma aplicada” (Acórdão do 
 Tribunal Constitucional n.º 336/2004, de 14 de Maio de 2004, disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt). 
 
 2.6. Também por isso, o conhecimento do recurso deve ser rejeitado, uma vez que 
 o Recorrente não suscita questão de constitucionalidade normativa. 
 
 (…)
 
 3. Ainda que não procedam os argumentos invocados supra, a pretensão do 
 Recorrente nunca poderia proceder, por inexistência de qualquer desconformidade 
 constitucional. 
 
 4. O Recorrente pretende ver alterado o sentido da decisão das instâncias, com 
 fundamento em violação, em suma, do preceito contido no actual artigo 63º/4 da 
 Constituição da República Portuguesa, segundo o qual “todo tempo de trabalho 
 contribui, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e invalidez, 
 independentemente do sector de actividade em que tiver sido prestado”. 
 
 4.1. Preceito que, no entender do Recorrente, implica igualmente que toda a 
 retribuição auferida pelo trabalhador deve ser tida em conta para efeitos de 
 determinação do valor da sua pensão de reforma. 
 
 4.2. Porém e como o Tribunal Constitucional teve já oportunidade de decidir 
 
 (cfr. Acórdão n.º 675/05, de 6 de Dezembro de 2005), “não procede a leitura da 
 expressão «todo o tempo de trabalho» como tendo de incluir, em si, a expressão 
 
 «toda a remuneração mensal» realmente auferida pelo trabalhador durante todo o 
 tempo de trabalho”. 
 
 5. De resto – e colhendo argumento constante do mesmo aresto – a circunstância 
 da Constituição impor como critério de cálculo da pensão a antiguidade da 
 carreira contributiva (“todo o tempo de trabalho”), omitido qualquer alusão à 
 retribuição, obriga a considerar que o critério de cálculo da pensão não 
 incorpora necessariamente (todo) o valor da retribuição. 
 
 5.1. Ou seja, a inclusão na norma constitucional do tempo de trabalho constitui 
 argumento a contrario para excluir da exigência constitucional a presença de 
 outros parâmetros na formação do direito a determinada pensão da segurança 
 social. 
 
 5.2. Se assim não fosse, de resto, seriam inconstitucionais todos os modos de 
 cálculo de prestações previdenciais substitutivas do salário baseados em 
 critérios distintos do rendimento efectivamente auferido, como acontece nos 
 regimes que acolhem as designadas “remunerações convencionais” (cfr., v.g., 
 trabalhadores agrícolas indiferenciados, futebolistas e basquetebolistas 
 profissionais, trabalhadores do serviço doméstico, membros de Igrejas, 
 associações e confissões religiosas, “trabalhadores independentes”, advogados e 
 solicitadores), 
 
 5.3. Regimes em que a base de incidência das contribuições – isto é, a 
 contrapartida do trabalho considerada para efeitos de cálculo da obrigação 
 contributiva e, a partir dela, do direito a determinada pensão – não é 
 constituída pelo rendimento efectivamente auferido, mas por valor declarado 
 pelas partes. 
 
 6. Carece igualmente de sentido a imputação de eventual violação do princípio da 
 igualdade, decorrente da desconformidade entre as regras de cálculo das pensões 
 constantes da convenção colectiva de trabalho aplicável ao sector bancário e as 
 decorrentes do regime geral da segurança social. 
 
 6.1. Desde logo, este regime geral da segurança social contém, em si mesmo, 
 pluralidade de disciplinas, aplicáveis a grupos ou categorias de trabalhadores, 
 
 6.2. Pelo que a formulação de juízo de (des)igualdade sempre exigiria a prévia 
 determinação do subgrupo a comparar. 
 
 7. Por outro lado, é exactamente a igualdade de tratamento entre todos os 
 trabalhadores em situação idêntica que o regime convencional em apreço visa 
 alcançar. 
 
 7.1. Como regime especial, abrange todos os trabalhadores do mesmo sector de 
 actividade e submete à mesma disciplina o cálculo de todas as pensões de que 
 aqueles são titulares. 
 
 7.2. Pelo que, no que aos aspectos previdenciais diz respeito, a disciplina 
 constante da convenção colectiva de trabalho aplicável trata todos os 
 trabalhadores de forma idêntica, realizando – e não frustrando, como pretende o 
 Recorrente – o princípio da igualdade. 
 Nestes termos, deve ser negado provimento ao presente recurso, confirmando-se o 
 Acórdão recorrido.”
 
  
 Por decisão do Presidente do Tribunal Constitucional, tomada com a prévia 
 concordância deste Tribunal, foi determinado que o julgamento se fizesse com a 
 intervenção do plenário, nos termos do artigo 79.º - A, da LTC.
 
        
 
                                                       *                      
 Fundamentação
 
 1. Do objecto do recurso
 Resulta do requerimento de interposição de recurso que o Recorrente pretendia 
 submeter à apreciação do Tribunal Constitucional as seguintes interpretações 
 normativas que reputava de inconstitucionais:
 a) as normas constantes das cláusulas 136.ª a 144.ª, do Acordo Colectivo de 
 Trabalho Vertical para o Sector Bancário (versão publicada no BTE 31/1992), 
 interpretadas no sentido de que para “efeitos de atribuição de pensão de 
 reforma, a calcular de acordo com o referido instrumento de contratação 
 colectiva, apenas são levados em consideração os valores correspondentes à 
 retribuição-base e diuturnidades, com desconsideração dos demais valores 
 recebidos no activo a título de retribuição”;   
 b) a norma do artigo 863.°, do Código Civil, interpretada no sentido de que  
 
 “sendo a mesma entidade jurídica a tutelar o contrato de trabalho e a reforma 
 
 (...), o trabalhador ainda assim pode renunciar, na pendência da relação 
 laboral, a créditos salariais no momento em que negoceia as condições da sua 
 reforma”. 
 Mas, em sede de alegações, o Recorrente veio alterar o objecto das questões de 
 constitucionalidade que pretendia ver analisadas pelo Tribunal Constitucional.
 Por um lado, o Recorrente deixou de apresentar quaisquer alegações na parte 
 respeitante à referida interpretação normativa do artigo 863.°, do Código Civil.
 Por outro lado, o Recorrente veio suscitar, pela primeira vez perante este 
 Tribunal, a inconstitucionalidade das normas constantes do artigo 69.º, da Lei 
 n.º 28/84, de 14 de Agosto, do artigo 109.º, da Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto, 
 e do artigo 123.º, da Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro.
 Estas alterações introduzidas nas alegações de recurso não são irrelevantes no 
 plano dos poderes de cognição do Tribunal Constitucional.
 Importa ter presente que o requerimento de interposição de recurso de 
 constitucionalidade é o acto idóneo para a fixação do objecto deste e, 
 consequentemente, se o recorrente nele especificar as normas ou interpretações 
 normativas a fiscalizar, já não pode ampliar a outras normas aquele objecto nas 
 peças processuais subsequentes, nomeadamente nas alegações.
 Acresce a isso que o recorrente pode restringir, expressa ou tacitamente, na 
 fase de alegações, a indicação das normas objecto do recurso, devendo, assim, a 
 situação de falta de apresentação de alegações, relativamente a parte das 
 questões de constitucionalidade anteriormente suscitadas no requerimento de 
 interposição de recurso, ser necessariamente encarada como uma desistência 
 parcial deste. 
 Em conformidade com o que se acaba de dizer, o objecto do presente recurso de 
 constitucionalidade é mais reduzido que o inicialmente configurado no 
 requerimento de interposição de recurso e não se pode estender às novas questões 
 de constitucionalidade introduzidas em sede de alegações.
 Assim sendo, em princípio, o objecto do presente recurso de constitucionalidade 
 deveria restringir-se à fiscalização da constitucionalidade das normas 
 constantes das cláusulas 136.ª a 144.ª, do Acordo Colectivo de Trabalho Vertical 
 para o Sector Bancário (versão publicada no BTE 31/1992), quando interpretadas 
 no sentido de que para “efeitos de atribuição de pensão de reforma, a calcular 
 de acordo com o referido instrumento de contratação colectiva, apenas são 
 levados em consideração os valores correspondentes à retribuição-base e 
 diuturnidades, com desconsideração dos demais valores recebidos no activo a 
 título de retribuição”.
 Contudo, a verdade é que nem todas as referidas normas do ACTV para o sector 
 bancário foram aplicadas como ratio decidendi na decisão recorrida para o efeito 
 que ora releva.
 Efectivamente, da leitura da decisão recorrida resulta inequívoco que o tribunal 
 a quo apenas aplicou as normas constantes da cláusula 137.ª, do ACTV para o 
 sector bancário, quando decidiu a revista e se debruçou sobre a questão de 
 constitucionalidade que ora ocupa o Tribunal Constitucional.
 Por isso, o objecto do presente recurso de constitucionalidade restringir-se-á à 
 fiscalização da constitucionalidade das normas constantes da cláusula 137.ª, do 
 Acordo Colectivo de Trabalho Vertical para o Sector Bancário, com a 
 interpretação já acima enunciada.
 
    
 
 2. Da idoneidade do objecto do recurso
 A natureza das cláusulas constantes do referido ACTV suscita, desde logo - mesmo 
 que não tivesse sido invocado pelas partes – que seja trazida à colação e 
 retomada a vexata quaestio da sindicabilidade constitucional das estatuições 
 constantes das convenções colectivas de trabalho.
 Trata-se de uma discussão que se tem arrastado no Tribunal Constitucional ao 
 longo dos últimos quase quinze anos e que – não obstante as parciais e 
 sucessivas alterações verificadas na composição dos juízes que integram este 
 tribunal – tem pendido maioritariamente para o lado dos partidários da tese que 
 nega às referidas disposições a qualidade de norma como objecto possível do 
 recurso de constitucionalidade.
 A divergência foi assumida igualmente no seio da doutrina constitucional.
 Efectivamente, segundo GOMES CANOTILHO (em “Direito Constitucional e Teoria da 
 Constituição”, pág. 937, da 7.ª Edição, da Almedina) “os contratos e acordos 
 colectivos de trabalho têm um valor normativo pelo menos equivalente ao das 
 portarias regulamentares (...) e (...) como actos normativos, e na parte em que 
 têm valor normativo, estão sujeitas ao controlo de constitucionalidade”. No 
 mesmo sentido pronunciaram-se VIEIRA DE ANDRADE (em “A fiscalização da 
 constitucionalidade de normas privadas pelo Tribunal Constitucional”, na R.L.J., 
 Ano 133.º, pág. 363), VITALINO CANAS (em “Introdução às decisões de provimento 
 do Tribunal Constitucional”, pág. 60, nota 54, da ed. de 1984 da Cognitio), 
 BARROS MOURA (em “A convenção colectiva entre as fontes de Direito de Trabalho”, 
 pág. 125 e seg. da ed. de 1984, da Almedina), e LICÍNIO LOPES MARTINS (em “O 
 conceito de norma na jurisprudência do Tribunal Constitucional”, no B.F.D.U.C., 
 vol. LXXV, pág. 616 e seg.).
 Diversamente, JORGE MIRANDA (em “Manual de Direito Constitucional”, tomo VI, 
 
 2001, pág. 176, da 2ª ed., da Coimbra Editora), sustenta que “a fiscalização da 
 constitucionalidade não abrange as normas provenientes da autonomia privada ou 
 colectiva, como as provenientes de convenções colectivas de trabalho”. No mesmo 
 sentido, BLANCO DE MORAIS (em “Justiça Constitucional”, vol. I, pág. 430-433, da 
 
 2ª ed., da Coimbra Editora).
 Foi a jurisprudência constitucional, porém, que intensificou este debate e levou 
 mais longe a discussão sobre esta questão.
 A tese até aqui maioritária foi adoptada, pela primeira vez, com a prolação do 
 acórdão n.º 172/93 (em “Acórdãos do Tribunal Constitucional”, 24.º vol., pág. 
 
 451) e, desde então, foi sendo sucessivamente sustentada e defendida pela 
 maioria dos juízes deste tribunal, tendo o acórdão do Plenário n.º 224/2005 (em 
 
 “Acórdãos do Tribunal Constitucional”, 61.º vol., pág. 777), reafirmado essa 
 posição. 
 Todavia, da discussão do memorando apresentado pelo relator verificou-se uma 
 inversão do sentido da opinião maioritária sobre esta questão, pelo que se 
 revela útil reler a declaração de voto do conselheiro JOSÉ DE SOUSA E BRITO, 
 precisamente aposta no já referido acórdão n.º 172/93, cuja sólida e exaustiva 
 argumentação aqui se transcreve e subscreve, na parte em que analisa a 
 normatividade das convenções colectivas de trabalho:
 
             “(...)
 
  Não é duvidosa a normatividade das convenções colectivas de trabalho, porque 
 regulam o comportamento dos membros das associações sindicais subscritoras, dos 
 membros das associações patronais subscritoras e ainda dos trabalhadores ao 
 serviço de empresas públicas ou de capitais públicos, cujo processo de 
 negociação foi autonomizado, sejam ou não membros das associações negociantes. 
 Não se aplicam aos membros actuais, mas também aos futuros e aos que não são 
 membros mas já alguma vez o foram durante o período da sua vigência (artigos 
 
 8º., 9º. e 3º., nº. 3, da Lei da Regulamentação Colectiva de Trabalho 
 
 (Decreto-Lei nº. 519-C1/79, de 29 de Dezembro)). Uma vez que a generalidade da 
 previsão normativa não é exigida pelo conceito funcional de norma, sempre seria 
 irrelevante para a normatividade que as convenções não se apliquem aos 
 trabalhadores não filiados nem às entidades patronais não subscritoras ou não 
 filiadas. Mas, dada a delimitação que a lei faz do âmbito de aplicação pessoal 
 das normas das convenções colectivas, é claro que elas não se aplicam a uma 
 classe fechada, mas a uma classe aberta de casos e de pessoas, são susceptíveis 
 de aplicação indefinidamente repetida, são, portanto, gerais e abstractas. 
 Aplicam-se, nomeadamente da forma indicada, a trabalhadores futuros e a futuras 
 entidades patronais.
 
 …
 
             11. As normas das convenções colectivas são potencialmente 
 heterónomas, vinculam as pessoas por elas abrangidas nos termos da lei 
 independentemente e eventualmente contra a vontade dos destinatários das 
 normas. Impõem-se aos contratos individuais de trabalho que lhes estão 
 subordinados como se fossem leis imperativas e mesmo contra leis imperativas: 
 ao alterarem mínimos legais de remuneração, por exemplo, proíbem cláusulas de 
 contratos individuais permitidas por lei (alínea c) do nº. 1 do artigo 6º. e 
 nº. 1 do artigo 14º. da Lei de Regulamentação Colectiva de Trabalho). As 
 convenções colectivas de trabalho têm, é certo, uma imperatividade em sentido 
 
 único, só enquanto estabelecem condições mais favoráveis para os 
 trabalhadores: impõem níveis mínimos e não tectos máximos, os quais só podem 
 ser estabelecidos por lei. Além disso, valem para trabalhadores e entidades 
 patronais que não se integram em associações ou entidades subscritoras no 
 momento da celebração da convenção ou que deixaram de as integrar. É certo que 
 para as partes outorgantes, as normas das convenções colectivas são autónomas, 
 são resultado de um processo negocial de criação normativa, regulam de acordo 
 com a sua vontade os seus interesses, mas impõem-se depois aos seus 
 destinatários por força e nos termos da lei, independentemente da contribuição 
 destes para a sua criação.
 
             Dizer que os destinatários são representados pelas associações 
 outorgantes só faz sentido relativamente aos que são associados ao tempo da 
 celebração. Mas mesmo quanto a estes cumpre acentuar que a filiação numa 
 associação sindical ou patronal não tem o sentido de um mandato de 
 representação em futuras convenções colectivas nem é um acto de submissão 
 voluntária a prévias ou futuras convenções colectivas - do mesmo modo que a 
 aquisição de cidadania por naturalização, por exemplo, não é um acto de 
 submissão voluntária às leis do Estado. A sua submissão às convenções colectivas 
 
 - como além, no caso de naturalização - não deriva normativamente da vontade 
 mas da lei (assim, Ferdinand Kirchhof, ob. cit., p. 184 ss).
 
             Decisiva é, porém, a questão de saber se as convenções colectivas 
 de trabalho têm pretensão de 'generalidade', isto é, se se integram no sistema 
 do direito objectivo, se prosseguem ao fim e ao cabo os fins da Constituição, 
 não obstante o espaço da autonomia na sua negociação. De tal depende 
 justificar-se ou não, quanto a elas, o controlo específico de 
 constitucionalidade pelo Tribunal Constitucional. O mesmo é dizer, na 
 terminologia adoptada (supra nº. 6), que de tal depende serem ou não 
 heterónomas no sentido funcional relevante.
 
             São úteis a este respeito os contributos constitucionalistas alemão 
 e italiano, não obstante o contexto constitucional e legal seja parcialmente 
 diferente. Na Alemanha é discutida e ainda não foi decidida pelo Tribunal 
 Constitucional Federal a questão de saber se as convenções colectivas são 
 actos de criação de direito e se, por isso, é possível contra eles um 
 
 'Verfassungsbeschwerde' (recurso de agravo constitucional). Benda (Benda, Klein, 
 Lehrbuch des Verfassungsprozessrechts, 1991, p. 1835) põe, em minha opinião, o 
 dedo na ferida, embora as suas considerações estejam afinal em contradição com 
 toda a evolução do direito do trabalho para a sua plena integração na ordem 
 constitucional, com paralelas consequências no entendimento das relações entre 
 o Estado e a sociedade como relações jurídicas subordinadas à Constituição. 
 Benda começa por expor a opinião contrária nos seguintes termos: 'A opinião 
 que, além do mais, vê nos contratos colectivos objectos possíveis de um agravo 
 constitucional, invoca não por acaso a função objectiva do agravo 
 constitucional. A sua função não é simplesmente esgotar-se na protecção da 
 esfera dos direitos fundamentais do indivíduo. Antes deve preencher também 
 uma 'função geral' dentro da ordem jurídica na medida em que defende o direito 
 constitucional e promove a sua interpretação e desenvolvimento. Daqui resulta 
 a tarefa de conceber o conceito de poder público de modo tão amplo que não 
 fique limitado ao exercício da autoridade estatal, mas abranja outras relações 
 de autoridade, que se tivessem estabelecido a par do poder estatal e 
 subsistissem por força do reconhecimento estatal'. Passando a expor a sua 
 própria opinião escreve: 'tais considerações têm, porém, consequências para o 
 entendimento da liberdade no domínio da liberdade sindical (artigo 9º., secção 
 
 3, da Lei Fundamental), que é uma parte importante da liberdade dos cidadãos. A 
 liberdade sindical e a autonomia das convenções colectivas não são expressão 
 de uma divisão de trabalho entre Estado e partes convencionais ou da assunção 
 pelas forças sociais de funções públicas. Elas devem, ao contrário, respeitar 
 um espaço livre do Estado. Nisso tem-se em conta que as decisões tomadas neste 
 domínio independentemente do Estado, tais como a conclusão de contratos 
 colectivos podem ter reflexos muito importantes, mas também prejudiciais, sobre 
 a política económica e financeira. Se as partes convencionais fossem 'poder 
 público', estariam nas suas convenções vinculadas ao bem comum. É certo que a 
 consciência de ser corresponsável pelo todo é um pressuposto essencial também 
 da autonomia convencional. Mas se associações, que representam interesses 
 parciais legítimos, são vinculadas juridicamente ao bem comum ou se lhes é 
 imposta uma 'vinculação social', então não só se limita o carácter liberal da 
 autonomia convencional, como também o Estado se desonera da sua obrigação de 
 actuar no interesse do bem comum, no caso de derivarem perigos da actividade 
 de associações livres e não incorporadas no Estado'. Quanto à avaliação que 
 Benda faz dos argumentos dos que defendem que as convenções colectivas são 
 fontes de direito, já aqui se mostrou que o reconhecimento estatal das normas 
 não implica o carácter de poder público das partes convencionais como entidades 
 criadoras de direito. Por outro lado, se é verdade que é a vinculação ao bem 
 comum que fundamenta o reconhecimento das convenções colectivas como direito 
 objectivo e não o invés, não é menos que se trate de uma questão a responder na 
 base do direito positivo, e aí as várias manifestações do reconhecimento podem 
 ser outras tantas provas do carácter jurídico e não de novas regras da autonomia 
 privada, das normas das convenções colectivas. A ser assim, como se pretenderá 
 para o direito português, haverá que concluir-se que as regras achadas por 
 concordância de empregadores e trabalhadores na prossecução dos seus 
 interesses parciais são, em princípio, as mais conformes com o bem comum a que 
 estão não obstante vinculadas e que o Estado não está desonerado de promover 
 através da legislação económica financeira e da legislação laboral de 
 enquadramento e suprimento que lhe competem. Uma orientação relevante, apesar 
 das críticas, parece, aliás, ser a do Tribunal Constitucional Federal Alemão, 
 embora formulada em contextos diferentes do objecto do processo 
 constitucional. Assim aquele Tribunal disse que 'a convenção colectiva contém 
 na sua parte normativa regras jurídicas, isto é, disposições imperativas - nos 
 termos do § 4, secção 3ª da Lei da Convenção Colectiva - gerais-abstractas sobre 
 o conteúdo das relações jurídicas de trabalho por ela abrangidas '(BVerfGE 34, 
 
 3O7 [317]. Na criação de normas pelas partes convencionais trata-se de 
 legislação no sentido material que produz normas em sentido técnico-jurídico 
 
 (acórdão de 24 de Maio de 1977: BVerfGE 44, 341)'.
 
             Em Itália existia a prática de obter a eficácia erga omnes das 
 normas dos contratos colectivos de âmbito limitado através de decretos 
 legislativos delegados de recepção daquelas normas. Estes decretos tinham a 
 natureza de uma lei transitória, provisória e excepcional, mas podiam ser 
 reiterados, obtendo-se assim um efeito semelhante às portarias de extensão do 
 direito português. A Corte Costituzionale (sentença 70/1963) considerou 
 inconstitucionais as leis de reiteração, por serem uma forma de estabilizar um 
 sistema de eficácia erga omnes das convenções colectivas diverso do previsto no 
 artigo 39º da Constituição Italiana que prevê a possibilidade de convenções 
 colectivas de trabalho com eficácia obrigatória para todos os que pertencem às 
 categorias profissionais a que as convenções se referem.  Mas a jurisprudência 
 passou a entender que as convenções colectivas assumiam indirectamente uma 
 eficácia geral por aplicação imediata do artigo 36º da Constituição Italiana, 
 na parte relativa aos direitos retributivos do trabalhador.  Em síntese da 
 descrição que faz desta solução, conclui Zagrebelsky (Manuale di Diritto 
 Costituzionale, I, 1984, p. 252 ss.) que 'o direito efectivo triunfou sobre o 
 direito formal.  Se bem que de modos indirectos, a contratação actual chega a 
 valer de um modo que se assemelha bastante mais ao que é típico das fontes de 
 direito do que dos actos de autonomia privada '.
 
             12. Passando finalmente ao exame do direito português, deverá 
 dizer-se que ele claramente reconhece as convenções colectivas de trabalho como 
 fontes de direito e que as integra na unidade sistemática do direito objectivo 
 subordinado à Constituição, pelo que as normas das convenções colectivas não 
 são só reconhecidas como heterónomas.
 
  Desde logo, o nº. 4 do artigo 56º da Constituição tem o sentido de reconhecer 
 como 'normas' jurídicas as das convenções colectivas de trabalho. Quando dispõe 
 que 'a lei estabelece as regras respeitantes à legitimidade para a celebração 
 das convenções colectivas de trabalho, bem como à eficácia das respectivas 
 normas', a Constituição não deixa ao arbítrio do legislador ordinário a própria 
 existência das convenções colectivas como normas jurídicas, mas apenas as 
 modalidades do seu regime. De qualquer modo, a lei tem de respeitar a garantia 
 constitucional às associações sindicais do direito de contratação colectiva 
 
 (nº. 3 do mesmo artigo 56º.). A redacção do nº. 4 é altamente significativa na 
 medida em que atribui à lei e não à vontade das partes a determinação da 
 legitimidade das partes e do âmbito da eficácia pessoal das convenções 
 colectivas. Se se tratasse de autonomia privada, essa legitimidade e esse 
 
 âmbito estariam predeterminados pela natureza das coisas: as convenções só 
 poderiam obrigar as partes contratantes. A redacção revela assim que a 
 Constituição teve em vista a manutenção das características essenciais do 
 instituto jurídico no direito português da altura, que se mantêm hoje (artigo 
 
 12º. da Lei do Contrato Individual de Trabalho, ainda em vigor; artigos 4º., 
 
 5º. e 9º. da Lei nº. 169-A/76, de 28 de Fevereiro, correspondentes aos artigos 
 
 6º, 14º. e 7º. do Decreto-Lei nº. 519-C1/79), dando justificadamente uma base 
 constitucional à heteronomia, como fonte de direito, das convenções colectivas.
 
             Isto é confirmado, de forma decisiva, pelo confronto entre o nº. 3 
 e o nº. 4 do artigo 56º. Na verdade, a Constituição não reconhece as normas das 
 convenções colectivas como consequência da atribuição de um poder público ou 
 sequer normativo a certas entidades ou órgãos. Apenas ressalva o direito de 
 contratação colectiva de cada associação sindical, como uma possível parte 
 contratual, direito que terá que ser respeitado pela lei definidora das regras 
 respeitantes à legitimidade para a celebração das convenções, além de que 
 implica desde logo um espaço de autonomia reservado à contratação colectiva. O 
 reconhecimento das normas das convenções colectivas é feito pela Constituição 
 através da criação da forma jurídica da convenção colectiva, cujas normas, por 
 revestirem essa forma, têm a eficácia que a lei, não a vontade das partes, 
 determinar.
 
  13. O regime legal veio desenvolver e reafirmar as determinações 
 constitucionais. Além do que já se disse sobre o âmbito da eficácia pessoal das 
 convenções colectivas, importante é a inserção das convenções colectivas no 
 sistema de fontes do direito do trabalho. Do artigo 12º. da Lei do Contrato 
 Individual de Trabalho e dos artigos 5º, 6º, e 14º., nº. 1 da Lei da 
 Regulamentação Colectiva do Trabalho deriva, nomeadamente, que as convenções 
 colectivas se situam hierarquicamente abaixo das normas jurídicas de origem 
 estatal, mas que regulam os direitos e deveres recíprocos dos trabalhadores e 
 das entidades patronais reconhecido por contrato individual de trabalho, não 
 podendo ser afastadas por estes salvo para estabelecer condições mais 
 favoráveis aos trabalhadores. As normas convencionais que estabelecem condições 
 mais favoráveis aos trabalhadores prevalecem nessa parte sobre as normas 
 estatais que derrogam relativamente às entidades patronais e aos trabalhadores 
 abrangidos pela convenção. Nestas as normas que impõem limites mínimos não são 
 dispositivas mas imperativas, contêm uma proibição de limites contratuais 
 abaixo dos mínimos e uma permissão de limites contratuais superiores. As normas 
 mais favoráveis dos contratos individuais movem-se dentro do permitido, não 
 derrogam parcialmente a norma que as permite. Quanto às normas estatais 
 dispositivas, são derrogadas parcialmente pelas convenções colectivas mais 
 favoráveis, e são afastadas pelos contratos individuais em todos os casos. Ora 
 a derrogação parcial de normas estatais só pode ser feita por outras normas 
 jurídicas igualmente heterónomas.
 
             O argumento também vale, por maioria de razão, quando não há 
 subordinação hierárquica, mas identidade de nível, entre a norma estatal e a 
 convenção colectiva. É o que se passa entre as portarias de regulamentação e as 
 convenções colectivas. Estas últimas fazem cessar automaticamente a vigência 
 das portarias em cujo âmbito são aplicáveis, relativamente aos trabalhadores e 
 identidades patronais abrangidas pelas convenções (artigo 38º. da Lei da 
 Regulamentação Colectiva do Trabalho).
 
             O mesmo se diga das decisões arbitrais em conflitos colectivos que 
 resultem da celebração ou revisão de uma convenção colectiva, decisões que têm 
 os mesmos efeitos das convenções colectivas (nº. 8 do artigo 34º. da mesma 
 Lei). Ora, segundo a doutrina do Acórdão nº. 150/86, as decisões arbitrais 
 contêm normas sujeitas ao controlo de constitucionalidade do Tribunal. É 
 inadmissível que deste ponto de vista as normas das convenções colectivas tenham 
 natureza diferente das normas das decisões arbitrais.
 
             14. O âmbito da eficácia pessoal das convenções colectivas pode ser 
 estendido, total ou parcialmente, a entidades patronais do mesmo sector 
 económico e a trabalhadores da mesma profissão ou profissão análoga mediante 
 portarias de extensão (artigos 27.º a 29.º da Lei da Regulamentação Colectiva 
 de Trabalho). As portarias de extensão tornam-se necessárias por força do 
 princípio da igualdade (artigo 13º. da Constituição) e da sua especial 
 aplicação que é o princípio de que para trabalho igual salário igual (alínea a) 
 do nº. 1 do artigo 59º. da Constituição). A relatada jurisprudência 
 constitucional italiana (supra nº. 11) pôs este ponto em relevo. Mesmo sem 
 portaria, a imediata aplicabilidade do princípio já impõe que na mesma empresa 
 os trabalhadores de igual qualificação tenham as mesmas condições 
 remuneratórias, independentemente da sua filiação sindical. Todos eles devem 
 ser considerados no número de trabalhadores por categoria profissional 
 envolvidos no processo que se situem no âmbito da aplicação do acordo a celebrar 
 
 (nº. 4 do artigo 22º. da Lei da Regulamentação Colectiva do Trabalho). Mas o 
 princípio também vale para empresas e trabalhadores fora da convenção mas em 
 iguais circunstâncias. As portarias de extensão não se aplicam aos trabalhadores 
 abrangidos directamente pelas convenções colectivas que estendem. Ora o 
 princípio da igualdade que fundamenta a extensão do âmbito pessoal de um certo 
 regime jurídico, proíbe também que tenham diferente regime jurídico 
 trabalhadores e empresas que se encontram em circunstâncias iguais do ponto de 
 vista relevante da igualdade. Ora não há dúvida de que as portarias de extensão 
 são fontes de direito objectivo, contêm normas jurídicas 'gerais' e, portanto, 
 vinculadas ao bem comum como é entendido no Estado de direito democrático da 
 Constituição e sujeitas ao controlo de constitucionalidade do Tribunal 
 Constitucional. É jurisprudência assente (Acórdão nº. 392/89, Diário da 
 República, 2ª Série, de 14 de Setembro p. 9177 ss.) e o acórdão também o 
 confirma (nº. 7). Seria uma ofensa da igualdade, se as normas da convenção 
 colectiva não estivessem sujeitas aos mesmos critérios de validade, e se as 
 pessoas por esta abrangidas não tivessem os mesmos direitos garantidos da mesma 
 maneira, inclusivamente do ponto de vista da fiscalização concreta da 
 constitucionalidade. E que a lei assim o considera depreende-se desde logo de se 
 tratar de portarias de extensão e não, como na Alemanha, de generalização. Se a 
 portaria tivesse uma diferente natureza jurídica (norma jurídica em vez de regra 
 da autonomia privada), diferentes critérios de apreciação da sua conformidade 
 com a Constituição e diferente regime de controlo da constitucionalidade, 
 então o princípio da igualdade exigiria que o Estado substituísse o título e o 
 regime dos direitos e obrigações resultantes da convenção e 'generalizasse' o 
 regime desta.  Não o faz porque pressupõe que as normas da convenção já têm a 
 mesma qualidade jurídica e o mesmo regime que a portaria se limita a estender 
 a outra classe de pessoas.
 As portarias não visam, portanto, essencialmente, controlar a conformidade das 
 convenções colectivas com a Constituição e a lei e com a política 
 económico-financeira do Governo. Não há controlo do fundo deste tipo no 
 processo de depósito para publicação e entrada em vigor das convenções, que o 
 Governo controla (artigos 24º a 26º da Lei da Regulamentação Colectiva do 
 Trabalho). A interpretação correcta é antes a de que se comete aos parceiros 
 sociais a determinação de certos aspectos da política económico-social e de que 
 essa comissão serve melhor o bem comum do que a interferência do Estado nessa 
 esfera (...)”.
 
  
 As alterações legislativas ocorridas em 2003 em matéria laboral, resultantes da 
 aprovação do Código do Trabalho, vieram reforçar o papel que as convenções 
 colectivas de trabalho desempenham no contexto das actuais fontes de direito 
 aplicáveis às situações jurídico-laborais.   
 Conforme refere LIBERAL FERNANDES (em “Alguns aspectos da evolução do Direito do 
 Trabalho”, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, Ano I, 
 
 2004, pp. 197-219), “assistiu-se ao recrudescimento de um certo 
 neo-contratualismo em que se advoga o reforço da autonomia, individual e 
 colectiva, dos empregadores e dos trabalhadores em detrimento do 
 intervencionismo do Estado e a consequente redução do conteúdo vinculativo das 
 normas legais e a redefinição do sistema de fontes do direito do trabalho”.
 Ou, como constata também APELLES J. B. CONCEIÇÃO (em “Notas sobre protecção 
 social dos empregados bancários”, na R.D.E.S., Ano XLVII (nº 1 e 2), pág. 33):
 
 “…a actual busca de uma alternativa ao Estado-Providência tem vindo a 
 realizar-se através da redução dos atributos da soberania do Estado…pela 
 revitalização da vontade das partes como fonte de direito – neocorporativismo –, 
 modelo nórdico (domina o contrato colectivo como fonte de direito), a vontade 
 das partes versus a vontade geral. Trata-se da denominada refeudalização das 
 sociedades e dos parceiros sociais que vêem reconhecido o seu direito de criar o 
 direito”.
 Por isso, importa ainda aditar a argumentação actualizada que foi 
 pertinentemente aduzida na declaração de voto aposta pelo Conselheiro MÁRIO 
 TORRES, no aludido acórdão n.º 224/2005, que teve em consideração as disposições 
 do Código de Trabalho aprovado em 2003:
 
 “(...) A relevância normativa das cláusulas das convenções colectivas de 
 trabalho enquanto fonte constitucionalmente reconhecida do direito do trabalho 
 
 (cf., por último, Maria do Rosário Palma Ramalho, Direito do Trabalho, Parte I 
 
 – Dogmática Geral, Coimbra, 2005, pp. 229‑236, 469‑472 e 799‑847) foi reforçada 
 com a publicação do Código do Trabalho (CT), ao consentir o afastamento de 
 normas legais por convencionais mesmo que estas se não mostrassem mais 
 favoráveis para os trabalhadores (artigo 4.º, n.º 1), ao manter a regra da 
 subsidiariedade dos instrumentos não negociais de regulamentação colectiva de 
 trabalho face aos negociais (artigo 3.º) e ao reafirmar que as mesmas vinculam 
 mesmo trabalhadores e empregadores não representados pelas associações 
 signatárias no momento da celebração (artigo 553.º) ou que delas se venham a 
 desfiliar (artigo 554.º). Assinale‑se ainda que, como resulta do n.º 21 do 
 Acórdão n.º 306/2003, emitido em sede de fiscalização preventiva da 
 constitucionalidade de diversas normas do CT, a pronúncia do Tribunal 
 Constitucional no sentido da não inconstitucionalidade dos regulamentos de 
 extensão radicou, no fundo, no reconhecimento de que eles não representam o 
 exercício (autónomo) do poder regulamentar do Estado, mas antes o alargamento, 
 consentido pelo artigo 56.º, n.º 4, da CRP, do âmbito pessoal das normas 
 constantes de convenções colectivas de trabalho, tidas constitucionalmente como 
 fonte de direito, a par das fontes de origem estatal”.
 
  
 Como resulta demonstrado nos excertos das declarações de voto acima transcritos 
 as disposições constantes das convenções colectivas, apesar da sua origem 
 contratual, constituem hoje não só regras dotadas das características de 
 generalidade e abstracção, mas também verdadeiras normas, num conceito 
 funcionalmente adequado ao sistema de fiscalização de constitucionalidade 
 adoptado.
 Na verdade, nelas se encontram os apelidados critérios adicionais que, na óptica 
 da jurisprudência deste Tribunal, justificam a sua sujeição à fiscalização 
 constitucional: a heteronomia (intenção vinculativa não dependente da vontade 
 dos seus destinatários), e o reconhecimento jurídico-político (imposição desse 
 vinculismo pelo ordenamento jurídico) (sobre estes conceitos e a sua constatação 
 nas convenções colectivas de trabalho, vide VIEIRA DE ANDRADE em “A fiscalização 
 da constitucionalidade de normas privadas pelo Tribunal Constitucional”, na 
 R.L.J., Ano 133.º, pág. 357-363).
 Ora, estando nós num tempo de apelo à revitalização da contratação colectiva, em 
 que se deseja que cada vez mais as relações laborais sejam reguladas por normas 
 que nasçam da vontade concordante dos representantes dos seus destinatários, 
 não é compreensível que todo um vastíssimo sector da vida dos cidadãos, com 
 particular relevância constitucional, como o que se prende com os direitos dos 
 trabalhadores, fique privado de acesso ao Tribunal Constitucional. 
 Por todas estas razões deve a constitucionalidade das normas contidas em 
 convenções colectivas de trabalho, ou da interpretação que delas façam os 
 tribunais, poder constituir objecto de recurso para o Tribunal Constitucional.
 No caso em apreço a questão de constitucionalidade colocada pelo recorrente, 
 conforme já se evidenciou na delimitação do objecto de recurso, não respeita ao 
 sentido da decisão recorrida, mas sim a uma determinada interpretação normativa 
 duma cláusula inserida numa Convenção Colectiva de Trabalho, que fundamentou 
 essa decisão, pelo que se conclui pela idoneidade do objecto do recurso.
 
  
 
 3. Do mérito do recurso 
 O Recorrente entende que as normas constantes da cláusula 137.ª, do Acordo 
 Colectivo de Trabalho Vertical para o Sector Bancário (versão publicada no BTE 
 
 31/1992) são inconstitucionais, quando interpretadas no sentido de que para 
 
 “efeitos de atribuição de pensão de reforma, a calcular de acordo com o referido 
 instrumento de contratação colectiva, apenas são levados em consideração os 
 valores correspondentes à retribuição-base e diuturnidades, com desconsideração 
 dos demais valores recebidos no activo a título de retribuição.”
 
 É o seguinte o texto da mencionada cláusula:
 
 “Cláusula 137.ª
 Doença ou invalidez
 
 1 – No caso de doença ou invalidez, ou quando tenham atingido 65 anos de idade 
 
 (invalidez presumível), os trabalhadores em tempo completo têm direito:
 a) Às mensalidades que lhes competirem, de harmonia com a aplicação das 
 percentagens do anexo V, aos valores fixados no anexo VI;
 b) A um subsídio de Natal de valor igual ao das mensalidades referidas na alínea 
 a), a satisfazer no mês de Novembro;
 c) A um 14.º mês de valor igual ao das mensalidades referidas na alínea a), a 
 satisfazer no mês de Abril, sendo-lhe aplicável o princípio estabelecido no n.º 
 
 3 da cláusula 102.ª.
 
 2 – Cada uma das prestações a que os trabalhadores têm direito, nos termos do 
 número anterior, não poderá ser de montante inferior ao do valor ilíquido da 
 retribuição ao nível mínimo de admissão do grupo em que estavam colocados à data 
 da sua passagem a qualquer das situações previstas no n.º 1 desta cláusula.
 
 3 – Os trabalhadores em regime de tempo parcial terão direito às prestações 
 referidas nos n.ºs 1 ou 2, calculadas proporcionalmente ao período normal de 
 trabalho.
 
 4 – As mensalidades fixadas, para cada nível, no anexo VI serão sempre 
 actualizadas na mesma data e pela aplicação da mesma percentagem em que o forem 
 os correspondentes níveis do anexo II.
 
 5 – Excepcionalmente, e por acordo de ambas as partes, poderá o trabalhador, com 
 mais de 65 anos de idade e menos de 70, continuar ao serviço; a continuação ao 
 serviço dependerá de aprovação do trabalhador em exame médico, feito anualmente, 
 e a instituição pode, em qualquer momento, retirar o seu acordo a essa 
 continuação, prevenindo o trabalhador com 30 dias de antecedência.
 
 6 – O trabalhador que completar 40 anos de serviço antes de atingir 65 anos de 
 idade ou o que completar 35 anos de serviço tendo mais de 60 anos de idade pode 
 ser colocado na situação de invalidez presumível, mediante acordo com a 
 instituição.
 
 7 – Da aplicação do anexo V não poderá resultar diminuição das anteriores 
 mensalidades contratuais cujo pagamento se tenha iniciado.
 
 8 – Todos os trabalhadores abrangidos por esta cláusula têm direito à 
 actualização das mensalidades recebidas sempre que seja actualizado o anexo II, 
 quer tenham sido colocados nas situações de doença, invalidez ou invalidez 
 presumível antes ou depois de cada actualização.
 
 9 – Os direitos previstos nesta cláusula aplicam-se a todos os trabalhadores na 
 situação de doença, invalidez ou invalidez presumível, quer tenham sido 
 colocados nessas situações antes ou depois da entrada em vigor deste acordo.”
 
  
 Na perspectiva do Recorrente a referida interpretação normativa contraria o 
 disposto nos artigos 63.º, n.º 4, da C.R.P., no segmento em que exige que “todo 
 o tempo de trabalho contribui…para o cálculo das pensões de velhice…”, e os 
 princípios constitucionais da igualdade e da universalidade. 
 Relativamente à compatibilidade da referida interpretação normativa com o 
 segmento do artigo 63.º, n.º 4, da C.R.P., e com o princípio da igualdade, este 
 Tribunal já se pronunciou pela inexistência de qualquer inconstitucionalidade no 
 acórdão n.º 675/2005 (em “Acórdãos do Tribunal Constitucional”, 62.º vol., p. 
 
 565).
 
  
 
 3.1. Do confronto com o disposto no artigo 63º, nº 4, da C.R.P.
 Quanto à exigência constitucional de que todo o tempo de trabalho desenvolvido 
 deve contribuir para o cálculo das pensões de velhice, escreveu-se o seguinte no 
 referido acórdão n.º 675/2005:
 
  “(…) 
 
 6. O problema que o recorrente traz a apreciação, nos presentes autos, às várias 
 instâncias é, sinteticamente, o seguinte: é ou não obrigatória a inclusão, no 
 cálculo das pensões de reforma dos trabalhadores do sector bancário, do montante 
 percebido, enquanto trabalhadores no activo, a título de remuneração 
 complementar.
 
 (...)
 
 7. O recorrente alega que a cláusula 137.ª do ACT seria inconstitucional por 
 violação do artigo 63.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa (actual 
 n.º 4).
 
 …
 O recorrente pretende, com esta argumentação, conduzir à conclusão de que o 
 artigo 63.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa deve ser lido de uma 
 forma lata, utilizando-se como elemento interpretativo dessa disposição o artigo 
 
 26.º da mencionada Lei de Bases da Segurança Social, de modo a abranger na sua 
 previsão outros factores para cálculo das pensões que não apenas a antiguidade, 
 desde logo a retribuição efectivamente auferida pelo trabalhador no activo.
 No entanto, tal argumentação não procede. A Constituição da República Portuguesa 
 não consagra em qualquer das suas normas ou princípios a exigência de que se 
 tenha em consideração, como critério para o cálculo do montante das pensões de 
 reforma, o montante da retribuição efectivamente auferida pelo trabalhador no 
 activo. Na verdade, a Constituição não define e não concretiza o conteúdo do 
 direito à segurança social, nem estabelece prazos para essa concretização, 
 remetendo para a lei, através do artigo 63.º, n.º 2, essa tarefa. Daqui decorre 
 que não procede a leitura da expressão “todo o tempo de trabalho” como tendo de 
 incluir, em si, a expressão “toda a remuneração mensal” realmente auferida pelo 
 trabalhador durante o tempo de trabalho. Pode – e, numa certa perspectiva, 
 haverá mesmo que – distinguir-se entre a necessária consideração de todo o 
 tempo de trabalho e uma (inexistente) imposição de utilização, como critério de 
 cálculo do valor da pensão, do montante dos rendimentos realmente auferidos 
 
 (incluindo remuneração base e outros rendimentos complementares) durante o 
 tempo de trabalho.
 Quanto à invocação, por parte do recorrente, da pretensa contradição entre o ACT 
 e a Lei de Bases da Segurança Social dir-se-á que as normas legais, mesmo 
 aquelas de valor reforçado, não se impõem como elementos interpretativos da 
 Constituição. Acresce que não existe qualquer correspondência entre o artigo 
 
 26.º da Lei de Bases da Segurança Social e o artigo 63.º, n.º 5 (actual n.º 4), 
 da Constituição da República Portuguesa, e, ainda, que é a própria Lei de Bases 
 da Segurança Social que, na sua tarefa de concretização do conteúdo do direito à 
 segurança social, exclui do seu âmbito o sector bancário, satisfazendo-se com o 
 pré‑existente regime de segurança social dos bancários, deixando-os de fora do 
 sistema estatal de segurança social…”
 
  
 No direito constitucional à segurança social (artigo 63.º, da C.R.P.), 
 encontra-se incluído o direito a uma pensão de velhice (o qual não é totalmente 
 estranho ao direito à segurança económica das pessoas idosas enunciado no 
 artigo 72.º, n.º 1, da C.R.P.), que garanta, em época de reconhecido direito ao 
 repouso, o recebimento duma quantia que funcione como um “sucedâneo” da 
 retribuição percebida pelo trabalho anteriormente prestado.
 Contudo, a definição dos critérios a que deve obedecer a fixação do montante 
 dessa pensão foi fundamentalmente atribuída ao legislador ordinário, tendo-se 
 apenas imposto a consideração nesse cálculo de “todo o tempo de 
 trabalho…independentemente do sector de actividade em que tiver sido prestado”.
 Como dizem GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA “a Constituição é omissa sobre o 
 sistema de pensões e prestações do sistema de segurança social, bem como sobre 
 os critérios da sua concessão e do seu valor pecuniário, ficando essa matéria na 
 livre disposição do legislador (...). Isso inclui o direito de alterar as 
 condições e requisitos de fruição e de cálculo das prestações (designadamente 
 das pensões) em sentido mais exigente, desde que por motivos justificados 
 
 (nomeadamente a sustentabilidade financeira do sistema)” (em “Constituição da 
 República Portuguesa anotada”, vol. I, pág. 819, da 4.ª edição, da Coimbra 
 Editora).
 O “tempo de trabalho” é um elemento perfeitamente distinto e independente do 
 valor da remuneração auferida por esse trabalho, tendo, aliás, unidades de 
 medida diferentes, pelo que não tem o mínimo de suporte uma interpretação que 
 pretendesse incluir no n.º 4, do artigo 63.º, da C.R.P., a obrigatoriedade do 
 valor da pensão de velhice ter em consideração o montante de todo o tipo de 
 remunerações auferidas pelo beneficiário quando trabalhava.
 Assim, o disposto na cláusula 137.ª, do Acordo Colectivo de Trabalho Vertical 
 para o Sector Bancário, em nada ofende a exigência constitucional da ponderação 
 do critério enunciado no n.º 4, do artigo 63.º, da C.R.P..
 
  
 
 3.2. Do confronto com o princípio da igualdade
 O recorrente invoca ainda que a interpretação recorrida viola o princípio da 
 igualdade.
 Também JORGE MIRANDA (em “Pensões no sector bancário e direito à segurança 
 social (Parecer)”, em “Jurisprudência Constitucional”, nº 7, pág. 16), defende 
 que as cláusulas aplicáveis do Acordo Colectivo de Trabalho Vertical para o 
 Sector Bancário “infringem o princípio da igualdade, por introduzirem 
 diferenciações infundadas entre os trabalhadores bancários e os trabalhadores 
 dos demais sectores económicos e também entre os trabalhadores bancários e os 
 não integrados nos quadros da respectiva instituição”. 
 Todavia, quanto à invocada violação deste princípio constitucional, escreveu-se 
 no citado acórdão n.º 675/2005:
 
                   (…)
 Quanto ao segundo dos argumentos avançados pelo recorrente – o de que o ACT 
 trata de forma desigual uma idêntica situação remuneratória face ao regime geral 
 da segurança social –, nada na Lei de Bases da Segurança Social obriga, porém, a 
 que o cálculo das pensões de reforma seja igual para todos os trabalhadores. Com 
 efeito, e como de resto é dito na decisão recorrida, é essa própria lei que 
 reconhece expressamente a subsistência transitória de regimes especiais (artigo 
 
 69.º), os quais podem também contemplar aspectos mais favoráveis. E entre esses 
 regimes conta‑se, justamente, o dos trabalhadores bancários, que se rege pelas 
 cláusulas do respectivo ACT, pelo que as expectativas dos trabalhadores 
 bancários quanto à sua pensão de reforma apenas poderão ser aquelas que 
 decorrem do referido ACT, e não do Regime Geral da Segurança Social.
 Nestes termos, sendo a forma de cálculo das pensões de reforma igual para todos 
 os trabalhadores do sector bancário, não se verifica, por aqui, violação do 
 princípio da igualdade.
 A idêntica conclusão se chega quando se perspectiva a mesma questão em relação 
 aos trabalhadores de outros sectores de actividade. O princípio da igualdade, 
 concretizado relativamente à retribuição no n.º 1 do artigo 59.º da Constituição 
 da República Portuguesa, não significa que tenha de existir equiparação 
 absoluta em todas as circunstâncias, nem impede que possa haver um tratamento 
 justificadamente diferenciado. Com efeito, para se poder aferir da 
 admissibilidade de uma diferenciação de tratamento de duas situações não se 
 pode apenas considerá-las de forma isolada. Antes deve considerar-se toda a 
 disciplina de cada uma delas. Como tem sido repetidamente afirmado por este 
 Tribunal, a igualdade desejada pela Constituição não é uma igualdade 
 
 “matemática”, mas antes uma “proporcional” (cfr., entre outros, os Acórdãos nºs 
 
 375/89, publicado no Diário da República [D.R.], II Série, de 2 de Fevereiro de 
 
 1989, 1167/96, publicado no D.R., II Série, de 7 de Fevereiro de 1997; 454/97, 
 publicado no D.R., II Série, de 10 de Dezembro de 1997; e 672/98, publicado no 
 D.R., II Série, de 3 de Março de 1999). Tal como o regime da reforma dos 
 trabalhadores do sector bancário pode conter diferenciações no sentido positivo, 
 também nada obriga a que, no cálculo do montante da pensão, sejam seguidas 
 regras idênticas às de outros sectores, ou, mesmo, do regime geral da segurança 
 social.
 Acresce, ainda, que, do confronto do artigo 59.º com o artigo 63.º, ambos da 
 Constituição, resulta que o direito à reforma não é exclusivo dos trabalhadores 
 por conta de outrem, mas antes um direito de todos os cidadãos, cuja 
 concretização será posteriormente feita por lei, e nada na lei obriga a que as 
 pensões de reforma tenham de ser calculadas para todos de forma igual.
 Do exposto decorre que não existe, também quanto a este ponto, qualquer 
 divergência entre a cláusula 137.ª do ACT para o sector bancário e a 
 Constituição da República Portuguesa”.
 
  
 Na verdade, a norma aqui em causa faz parte do Acordo Colectivo de Trabalho 
 Vertical para o Sector Bancário que, na secção I, do capítulo XI, cria e regula 
 um sistema de segurança social para os trabalhadores bancários abrangidos por 
 aquela convenção.
 Desta regulamentação resulta a existência de um sistema de segurança social 
 específico, independente e alheio aos outros sistemas, como é o caso do sistema 
 geral público de segurança social. Daí que alguns trabalhadores bancários – como 
 sucede com o Recorrente – se encontrem abrangidos pela contratação colectiva do 
 sector em matéria de previdência quanto às eventualidades de doença, invalidez, 
 velhice e prestações complementares da segurança social. A utilização da 
 expressão “alguns trabalhadores bancários” é plena de sentido na medida em que, 
 diversamente do que sucede com o Recorrente, existem outros trabalhadores 
 bancários abrangidos por ACT próprios, cujo âmbito material já não inclui o 
 regime da segurança social. 
 Como é que se chegou a esta situação? 
 As origens desta diversidade de regimes de segurança social remontam há mais de 
 
 60 anos atrás e apresenta contornos que se prendem obviamente com questões de 
 
 índole financeira.
 O legislador constituinte de 1933 incumbiu expressamente o Estado de promover e 
 favorecer as instituições de solidariedade e previdência (artigo 41.º). 
 No plano da lei ordinária, o art. 2.º, da Lei n.º 1884, de 16 de Março de 1935, 
 dispunha que “incumbe aos Grémios e aos Sindicatos Nacionais e respectivas 
 Federações a iniciativa e organização das Caixas Sindicais de Previdência, por 
 meio de acordos, ou por efeito dos contratos colectivos de trabalho”.  
 Ao abrigo do referido diploma legal, mais concretamente no ano de 1938, foi 
 aprovada a primeira contratação colectiva do sector bancário, com origem 
 exclusivamente corporativa, e, desde então, o seguro social dos empregados 
 bancários, afinal o seu regime principal, encontra-se apenas previsto na 
 contratação colectiva do sector (vide MENEZES CORDEIRO, em “Convenções 
 Colectivas de Trabalho e Direito Transitório: com Exemplo no Regime de Reforma 
 no Sector Bancário”, in Revista da Ordem dos Advogados, ano 64, 2004, págs. 65 e 
 segs. e APELES J. B. CONCEIÇÃO em “Notas sobre a protecção social dos empregados 
 bancários”, na Revista de Direito e de Estudos Sociais”, Ano XLVII, 2006, n.º 1 
 e 2, pág. 9 e seg.).
 Em 1976, a nova Constituição veio determinar que todos têm direito à segurança 
 social, independentemente da sua situação profissional (artigos 12.º, n.º 1, e 
 
 63.º, n.º 1, da C.R.P.).
 Estabeleceu-se uma garantia constitucional dos pressupostos mínimos para uma 
 existência humana digna, a efectivar de acordo com as condições sociais 
 concretas do país.
 Para esse efeito, a Constituição incumbiu o Estado de organizar, coordenar e 
 subsidiar um sistema de segurança social unificado e descentralizado, com a 
 participação das associações sindicais, de outras organizações representativas 
 dos trabalhadores e de associações representativas dos demais beneficiários 
 
 (artigo 63.º, n.º 2, da C.R.P.). 
 O direito à segurança social passou a ser um típico direito social de natureza 
 positiva, cuja realização exige o fornecimento de prestações por parte do 
 Estado, impondo-lhe obrigações de fazer e de prestar.
 Todavia, o Estado não ignorou a existência dos sistemas de segurança social não 
 estatais pré-existentes, assim como as dificuldades da sua integração num 
 sistema único de natureza pública, pelo que, após a entrada em vigor da 
 Constituição de 1976, com as exigências acima enunciadas, a manutenção do regime 
 de previdência previsto na contratação colectiva do sector bancário foi sendo 
 objecto de salvaguarda pelas disposições transitórias das leis que 
 sucessivamente estabeleceram as bases gerais do sistema público de segurança 
 social (cfr. artigo 69.º, da Lei n.º 28/84, de 14 de Agosto; artigo 109.º, da 
 Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto; artigo 123.º, da Lei n.º 32/2002, de 20 de 
 Dezembro; e, mais recentemente, artigo 103.º, da Lei n.º 4/2007, de 16 de 
 Janeiro).
 A salvaguarda do regime previdencial do sector bancário, através de normas de 
 direito transitório das leis de bases do sistema de segurança social, não pode, 
 obviamente, deixar de ser interpretada no sentido de que futuramente se 
 verificará a integração de todos trabalhadores bancários no regime geral do 
 sistema público de segurança social.
 Contudo, essa integração não é fácil, desde logo por causa da ausência da 
 obrigação contributiva que caracteriza grosso modo o regime próprio dos 
 bancários em particular. No regime convencional dos empregados bancários a 
 responsabilidade financeira é assumida directamente pelas próprias instituições 
 bancárias, ao invés do que sucede com o sistema público de segurança social em 
 que o risco social é transferido obrigatoriamente para instituições públicas 
 pelo pagamento das correspondentes contribuições. Assim, a eventual 
 transferência dos trabalhadores bancários para a segurança social a partir de 
 determinada data teria de ser acompanhada de medidas de financiamento e de 
 sustentabilidade, designadamente a responsabilização das entidades bancárias 
 pelo período anterior de carreira daqueles trabalhadores, em relação ao qual 
 não se verificaram contribuições para o sistema.
 Enquanto esta difícil integração não se concretiza, as sucessivas leis de bases 
 gerais da segurança social salvaguardaram a vigência do regime previdencial do 
 sector bancário constante dos instrumentos de contratação colectiva.
 Através desta forma de actuar, o legislador vincou o enquadramento obrigatório 
 desses regimes especiais e procurou garantir o princípio da plenitude do sistema 
 de segurança social através da manutenção em vigor de uma diversidade de regimes 
 público e privados.
 Actualmente, pode-se afirmar que o sistema de segurança social, correspondente 
 ao sector bancário coberto por convenções colectivas que o regulam, é, afinal, o 
 próprio regime principal e obrigatório deste sector instituído por via 
 convencional, e, por isso mesmo, independente e alheio aos outros sistemas, como 
 
 é o caso do sistema público de segurança social.
 
 “Cada um deles possui individualidade própria, funcionando em relação aos demais 
 com autonomia e não como espécie de um género” (CATARINA PIRES e JOÃO COSTA 
 ANDRADE, em “O regime jurídico relativo à atribuição e cálculo da reforma de 
 certos trabalhadores do sector bancário: tentativa de superação de um (falso) 
 problema de aplicação da lei no tempo”, in “O Direito”, 2004, I, p. 158). 
 Perante a admissibilidade desta diversidade de sistemas não faz sentido exigir 
 uma igualação do conteúdo das regras dos sistemas não estatais ao regime geral 
 do sistema público da segurança social. Admitindo-se a vigência de regimes 
 diversos, apoiados em diferentes pressupostos, não é exigível uma identidade de 
 soluções, uma vez que o princípio constitucional da igualdade não exige um 
 tratamento igual para realidades distintas.
 Por isso se conclui que a interpretação das normas da cláusula 137.ª, do Acordo 
 Colectivo de Trabalho Vertical para o Sector Bancário, sustentada na decisão 
 recorrida, também não viola o princípio constitucional da igualdade.
 
  
 
 3.3. Do confronto com o princípio da universalidade
 Importa, finalmente, abordar a invocada violação do princípio da universalidade 
 que supostamente afecta a interpretação dada pelo tribunal recorrido à referida 
 cláusula.
 Segundo o princípio da universalidade todos os cidadãos podem ser titulares dos 
 direitos consagrados na ordem jurídica (artigo 12.º, nº 1, da C.R.P.), incluindo 
 o direito à segurança social (artigo 63.º, n.º 1, da C.R.P.).
 Alega o Recorrente que a violação do referido princípio ocorre na medida em que 
 os trabalhadores abrangidos pelo ACTV dos bancários ficam “afastados das 
 regalias do regime geral da segurança social”, uma vez que “não são 
 considerados, para efeitos de reforma, os montantes que os trabalhadores, 
 enquanto no activo, auferiam, por exemplo, a título de isenção de horário de 
 trabalho”.  
 Esta posição também é defendida por JORGE MIRANDA (na ob. e loc. cit.), ao dizer 
 que as cláusulas do referido acordo colectivo “infringem o princípio da 
 universalidade, por subtraírem as pessoas de determinada categoria profissional 
 
 à plena efectivação do direito à segurança social”.
 Note-se, contudo, que o Recorrente não pretende afastar em bloco o regime 
 previdencial particular dos empregados bancários inscrito num instrumento de 
 regulamentação colectiva de trabalho e sujeitar-se, em alternativa, à aplicação 
 em bloco do regime geral do sistema público de segurança social previsto na lei, 
 pois isso significaria, desde logo, a substituição da Recorrida pelo Estado no 
 lado passivo da lide, enquanto devedor das prestações previdenciais 
 peticionadas, assim como a necessidade de introdução, com efeitos retroactivos, 
 da vertente contributiva na relação jurídico-previdencial do Recorrido.
 Bem vistas as coisas, o Recorrente pretende ser equiparado aos beneficiários do 
 regime geral da segurança social apenas na parte em que este seja 
 comparativamente mais generoso para efeito de elevação do quantum da pensão de 
 reforma.
 Ora, a interpretação da cláusula 137.ª, do Acordo Colectivo de Trabalho Vertical 
 para o Sector Bancário, efectuada pela decisão recorrida, não afasta o 
 Recorrente do direito à segurança social previsto no n.º 1, do artigo 63.º, da 
 C.R.P., nomeadamente na vertente do direito a auferir uma pensão de velhice, 
 limitando-se a adoptar um critério de cálculo desta diferente do previsto no 
 regime geral do sistema público da segurança social, pelo que não é a 
 universalidade daquele direito que está em causa.
 A existência do regime previdencial constante do ACTV dos Bancários encontra-se 
 legalmente salvaguardada pelo Estado e os trabalhadores por ele abrangidos não 
 se encontram privados do direito à segurança social em situação de velhice e 
 invalidez, pelo que não se vê como possa estar em causa o princípio da 
 universalidade do direito à segurança social.
 Esta última argumentação do Recorrente surge sob a capa da reivindicação da 
 universalidade do direito à segurança social, mas a verdade é que soa muito mais 
 a uma reiteração do argumento da violação do princípio da igualdade, já atrás 
 analisado e rejeitado
 Pode ser discutível se a manutenção em vigor, ainda que transitória, do sistema 
 de segurança social privado para os bancários, constante da referida convenção 
 colectiva, viola um suposto princípio constitucional da unicidade do sistema de 
 segurança social ou do seu carácter público, ou se existe uma 
 inconstitucionalidade por omissão (vide sobre esta questão além do já referido 
 parecer de JORGE MIRANDA, o parecer de FREITAS DO AMARAL e RUI MEDEIROS, juntos 
 aos autos, e APELES J. B. CONCEIÇÃO em “Notas sobre a protecção social dos 
 empregados bancários”, na Revista de Direito e de Estudos Sociais”, Ano XLVII, 
 
 2006, n.º 1 e 2, p. 26), mas essa já não é uma questão da constitucionalidade da 
 interpretação da cláusula 137.ª, do Acordo Colectivo de Trabalho Vertical para o 
 Sector Bancário efectuada pela decisão recorrida, no sentido de que para 
 
 “efeitos de atribuição de pensão de reforma, a calcular de acordo com o referido 
 instrumento de contratação colectiva, apenas são levados em consideração os 
 valores correspondentes à retribuição-base e diuturnidades, com desconsideração 
 dos demais valores recebidos no activo a título de retribuição”. Essa é uma 
 questão de constitucionalidade das sucessivas Leis de Bases da Segurança Social 
 que têm mantido em vigor, paralelamente ao regime geral do sistema público da 
 segurança social, o regime de previdência previsto na contratação colectiva do 
 sector bancário. E esta questão, conforme resultou do explicitado no ponto 1. 
 deste acórdão, encontra-se fora do objecto deste recurso.
 
  
 
 4. Conclusão
 Não se revelando que a interpretação da cláusula 137.ª, do Acordo Colectivo de 
 Trabalho Vertical para o Sector Bancário, contida na decisão recorrida, viole 
 qualquer parâmetro constitucional, deve o recurso ser julgado improcedente.
 
  
 
                                                       *
 
  
 Decisão
 Pelo exposto, julga-se improcedente o recurso interposto por A., para o Tribunal 
 Constitucional, do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido neste 
 processo em 6-6-2007.
 
  
 
                                                       *
 Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 unidades de conta, 
 ponderados os critérios enunciados no artigo 9.º, nº 1, do Decreto-Lei nº 
 
 303/98, de 7 de Outubro (artigo 6.º, n.º 1, do mesmo diploma).
 
  
 
 *
 Lisboa, 11 de Março de 2008
 João Cura Mariano
 Joaquim de Sousa Ribeiro
 Mário José de Araújo Torres
 José Borges Soeiro
 Maria João Antunes
 Maria Lúcia Amaral
 Vítor Gomes
 Benjamim Rodrigues (vencido quanto à questão do conhecimento nos termos da 
 declaração anexa)
 Gil Galvão (vencido quanto à decisão de  conhecer do presente recurso, no 
 essencial, pelas razões constantes do Acórdão n.º 172/93 (de onde consta o voto 
 de vencido que agora  serve de  fundamentação a este acórdão), bem como de todos 
 os outros que, na sequência, firmaram a jurisprudência que agora se decidiu 
 inverter).
 Carlos Pamplona de Oliveira – vencido conforme declaração
 Ana Maria Guerra Martins (vencida quanto ao conhecimento do objecto do recurso, 
 com declaração)
 Carlos Fernandes Cadilha (vencido quanto  à questão do conhecimento pelas razões 
 constantes do acórdão do Plenário n.º 224/2005, cuja orientação entendo ser de 
 manter)
 Rui Manuel Moura Ramos
 
  
 
  
 
  
 DECLARÇAÕ DE VOTO
 
  
 
 1 – Votei vencido quanto ao conhecimento do recurso, na esteira da 
 jurisprudência sufragada pela grande maioria dos juízes das várias formações do 
 Tribunal Constitucional e de que constitui exemplo o Acórdão n.º 224/2005, 
 tirado em plenário.
 
  
 
             2 – Tratando-se de uma jurisprudência que permaneceu maioritária 
 durante vários anos, entendemos que, na ausência de inovações constitucionais ou 
 da emergência clara de um novo sentido do parâmetro constitucional decorrente de 
 uma prática reiterada segundo os valores do Estado de direito democrático – o 
 que, seguramente, não acontece – seria de manter a doutrina anterior, em 
 concretização do princípio da segurança jurídica, ele próprio um princípio 
 estrutural do Estado de direito democrático, consagrado no art.º 2.º da 
 Constituição.
 
  
 
             3 – A tese que fez vencimento apoia-se essencialmente no argumento 
 de que as normas constantes das convenções colectivas comungam da característica 
 da “heteronomia (intenção vinculativa não dependente da vontade dos seus 
 destinatários) e do reconhecimento jurídico-político (imposição desse vinculismo 
 pelo ordenamento jurídico)”.
 
             Mas o critério da heteronomia, como salienta Jorge Miranda (Direito 
 Constitucional, tomo VI, 2001, pp. 164) não se afigura decisivo, porque essa 
 heteronomia “tanto existe na vida das associações e sociedades no confronto com 
 os seus associados como na lei do Estado democrático no confronto com os seus 
 cidadãos”, sendo que não se defende a fiscalização pelo Tribunal Constitucional 
 de disposições normativas com tal fonte jurígena.
 
             E quanto ao reconhecimento jurídico irreleva o acórdão o facto de 
 ele não se impôr unicamente por força da Constituição, do art.º 56.º, n.º 4, mas 
 que decorre essencialmente da lei ordinária para a qual o preceito remete o 
 estabelecimento das respectivas regras relativas à eficácia das convenções 
 colectivas, tal como de resto, faz o art.º 61.º, n.º 1, relativamente à 
 iniciativa (autonomia) privada. 
 
             Do art.º 56.º, n.º 4, conjugado com o seu n.º 3, apenas poderá 
 distrair-se, atinentemente a tal matéria, uma garantia institucional de que a 
 lei ordinária tem de garantir às convenções colectivas um mínimo de eficácia, 
 não decorrendo do preceito constitucional a obrigação da lei ordinária conferir 
 eficácia às convenções colectivas porventura nos aspectos que mais podem denotar 
 a heteronomia, como, por exemplo, em relação a quem não se ache filiado na 
 respectiva associação sindical.
 
             Pela sua relatividade, tais aspectos mostram-se pois imprestáveis 
 para integrar o conceito funcional de norma para o efeito da determinação da 
 competência do Tribunal Constitucional em sede de controlo da 
 constitucionalidade.
 
             Daquele art.º 56.º, n.º 4, apenas resulta que o que poderá 
 sindicar-se perante o Tribunal Constitucional é se a lei ordinária que densifica 
 o direito ou garantia fundamental respeita o respectivo parâmetro constitucional 
 e não se as disposições contratuais colectivas que são emitidas no exercício do 
 direito fundamental e com o âmbito de eficácia estabelecido pela lei ordinária, 
 respeitam elas próprias as normas ou princípios constitucionais.
 
             É claro que as normas convencionais têm de respeitar as normas e 
 princípios constitucionais e que essa conformidade tem de poder ser sindicada. 
 
             Mas esse controlo pode ser sempre efectuado pelos outros tribunais, 
 dentro da tarefa de defesa oficiosa da Constituição que lhes é atribuída no 
 art.º 204.º da Constituição, nos termos da qual “nos feitos submetidos a 
 julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na 
 Constituição ou os princípios nela consagrados”, não decorrendo daí a 
 necessidade de uma forçosa intervenção do Tribunal Constitucional.
 
             A determinação da competência do Tribunal Constitucional é uma 
 questão completamente alheia a esse dever de defesa da Constituição, resultando 
 das normas constitucionais que a regem. 
 
             Ora, segundo cremos ter demonstrado a jurisprudência maioritária não 
 cabem no conceito funcional de norma para esse efeito normas que não advêm do 
 poder político, político-administrativo ou de poderes de autoridade cuja 
 atribuição decorre da Constituição ou do exercício daqueles dois primeiros 
 poderes.
 
             Na verdade, não vemos que a Constituição tenha concebido o Tribunal 
 Constitucional como órgão sempre forçoso de controlo de todos os juízos de 
 constitucionalidade feitos pelos outros tribunais. 
 
             Não é assim desde logo no que importa aos juízos de 
 constitucionalidade feitos relativamente a actos não normativos, sejam eles 
 judiciais, administrativos ou políticos, sempre que estes façam aplicação 
 directa de normas ou princípios constitucionais, pois não adoptou o sistema do 
 recurso de amparo.
 
             E também existem boas razões para que o não seja no caso de actos 
 normativos decorrentes da autonomia privada, individual ou colectiva, pois que 
 estes não se acham vinculados a realizar o bem comum ou os interesses colectivos 
 integrantes das atribuições do Estado ou das pessoas colectivas públicas, 
 territoriais ou não, podendo prosseguir interesses meramente pessoais ou de 
 grupo desde que estes não sejam vedados pela Constituição ou pela lei.
 
             Diferentemente se passam as coisas no que importa aos actos 
 normativos emergentes do exercício do poder político, político-administrativo ou 
 de autoridade que encontram a sua fonte na parte III da Constituição.
 
              É que o poder público deve não só respeitar os direitos e garantias 
 fundamentais, como assegurar o máximo possível da sua tutela. 
 
             Por outro lado, ele está também obrigado a prosseguir sempre o bem 
 comum ou o interesse público, concretizando na melhor medida igualmente possível 
 os comandos constitucionais.
 
             Por isso, a sua prática foi também sujeita a específicas regras 
 formais de controlo de evidência e de transparência da prossecução desses 
 interesses.
 
             Ora, foi a actividade desse poder público, quando corporizada em 
 actos normativos (afora o caso excepcional da inconstitucionalidade por omissão 
 
 – art.º 283.º da Constituição – mas que evidencia bem a adstringência ao dever 
 de prossecução desse bem comum) que a Lei fundamental quis subordinar ao 
 controlo do Tribunal Constitucional.
 
             De resto, a tese seguida pelo acórdão acaba por criar uma fissura na 
 unidade do sistema de fiscalização de constitucionalidade, pois que nunca lhe 
 poderá ser aplicado o regime da fiscalização abstracta preventiva ou sucessiva 
 da constitucionalidade (art.ºs 279.º e 281.º da Constituição), ficando assim 
 cingida à fiscalização concreta (art.º 280.º) e à abstracta resultante de 
 generalização (art.º 281.º, n.º 3).  
 
             Por outro lado, mesmo no respeitante a esta, é muito discutível que 
 lhe possa ser atribuído o efeito da repristinação das normas revogadas, previsto 
 no art.º 282.º, n.º1, da Constituição, pois tal solução, relativamente às normas 
 convencionais, parece atentar contra o direito fundamental da autonomia privada 
 na medida em que as partes quiseram a cessação dos efeitos da norma revogada 
 como consequência de uma outra diferente ponderação dos seus interesses que pode 
 não sair sequer frustrada, mesmo com a declaração de inconstitucionalidade.
 Benjamim Rodrigues
 
  
 
                        
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 
  
 
 1.         As razões da minha discordância incidem na parte da decisão relativa 
 ao conhecimento do objecto do recurso.
 
  
 
 2.         Merece reparo, em primeiro lugar, que o entendimento relacionado com 
 a competência do Tribunal não tenha ficado estabilizado e que, sem um momento de 
 reflexão sobre as consequências práticas da sua inversão, e sem que se invoquem 
 especiais razões premência na reanálise da questão, se assuma que tal 
 competência está apenas dependente da álea resultante da alteração da composição 
 do Tribunal, critério que, como é óbvio, nunca garante um entendimento pacífico 
 e constante nesta matéria, como me pareceria ser desejável.
 
  
 
 3.         Em segundo lugar, continuo a perfilhar o entendimento sufragado no 
 Acórdão n.º 224/2005, citado no aresto, no sentido de que as regras constantes 
 das cláusulas que compõem os acordos colectivos de trabalho não são 'normas' 
 para o efeito de sindicabilidade directa no Tribunal Constitucional. Às razões 
 apontadas no referido Acórdão n.º 224/2005 acrescerá a dificuldade prática da 
 determinação da 'norma' repristinada, na sequência da eventual desaplicação de 
 cláusula inconstitucional: é que cada cláusula não vale por si só, antes se 
 inscreve indissociavelmente num texto negociado e contratualizado, 
 representando, por isso, a contraprestação a que uma das partes se obriga num 
 contexto muito preciso de direitos e deveres. Assim, ao contrário do que se 
 passa com as demais normas jurídicas, à eventual erradicação da regra, por 
 inconstitucionalidade, não pode seguir-se, sem mais, a repristinação da norma 
 por ela revogada. Tenho, aliás, dificuldade em acompanhar o julgamento de não 
 inconstitucionalidade da 'norma' em causa, sem uma avaliação global da convenção 
 que permita sistematizar o critério de retribuição salarial do recorrente, para 
 efeito de atribuição da pensão de reforma.
 
  
 
 4.         Acresce que, no caso em presença, não ocorreu a enunciação correcta 
 da norma, nos termos que este Tribunal tem exigido para este efeito – vide 
 Acórdão n.º 66/2005 – o que deveria ter levado o Tribunal a, também por esta 
 razão, não tomar conhecimento do recurso.
 
  
 Carlos Pamplona de Oliveira
 
  
 
  
 
            
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 Vencida quanto à questão do conhecimento do objecto do recurso, por entender que 
 as “normas” constantes de convenções colectivas de trabalho não são sindicáveis 
 em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade por este Tribunal, 
 sufragando, no essencial, os fundamentos expostos nos Acórdãos nº 172/93 e 
 
 224/05. 
 Com efeito, as convenções colectivas de trabalho não são actos 
 jurídico-públicos, com eficácia externa, mas antes manifestações da autonomia, 
 da negociação ou da contratação colectiva. É certo que a autonomia colectiva 
 
 “não se confunde com a pura autonomia privada. Mas tal como ela é ainda 
 expressão de uma sociedade civil distinta (embora não separada) do Estado. 
 Submeter as normas dela emergentes ao mesmo sistema de controlo das normas de 
 Direito legislado (…) implicaria uma publicização dessas normas deslocada e 
 inconveniente” (neste sentido, JORGE MIRANDA, Manual de Direito Constitucional, 
 Tomo VI, 2ª ed., Coimbra, Coimbra Editora, 2005, p. 177), a qual não foi 
 seguramente querida pelas partes. 
 Acresce ainda que a autonomia colectiva é incindível do sistema de direitos, 
 liberdades e garantias constitucionalmente consagrado, pelo que o critério da 
 heteronomia, que a tese vencedora neste acórdão e alguma doutrina defendem, é 
 muito relativo (neste sentido, JORGE MIRANDA, Manual…, cit., p. 177) e, por 
 isso, inadequado para justificar a sindicabilidade das “normas” constantes de 
 convenções colectivas de trabalho. 
 Em suma, as “normas” das convenções colectivas de trabalho não passam, em nosso 
 entender, o teste do conceito funcional de norma que este Tribunal tem acolhido 
 em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade. 
 
  
 Ana Maria Guerra Martins