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Processo nº 987/09 
 
 
 
 1ª Secção 
 
 
 Relatora: Conselheira Maria João Antunes 
 
 
 Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional 
 
 
 I. Relatório 
 
 
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Évora, em que é 
 reclamante A. e é reclamado o Ministério Público, vem a primeira reclamar do 
 despacho de 23 de Outubro de 2009 que não admitiu recurso interposto para o 
 Tribunal Constitucional 
 
 
 
 2. A reclamante interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Évora do despacho 
 de pronúncia do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, de 17 de Julho de 2008, 
 formulando as seguintes conclusões: 
 
 
 
 «1) O Juiz de Instrução, pronunciou o Arguido por factos que não constituem 
 crime. 
 
 
 
 2) Não se vislumbra que o emprego das expressões constantes do requerimento ?in? 
 acta de 28/10/2005 ou a circunstância que as rodeiam, tenha qualquer intuito de 
 rebaixar ou humilhar a assistente. 
 
 
 
 3) Pelo que devem ser consideradas atípicas as ditas expressões, para efeitos de 
 tutela penal. 
 
 
 
 4) Pugnando-se pela liberdade de expressão constitucionalmente consagrada, 
 
 
 
 5) E na consequente imunidade conferida aos advogados, no uso de expressões no 
 
 âmbito da sua profissão. 
 
 
 
 6) As expressões utilizadas foram tão somente utilizadas, com vista a 
 fundamentar o requerimento em que a arguida sentindo-se ofendida pretendia 
 certidão, para lhe ser entregue em mão. 
 
 
 
 7) Estando inseridas dentro dos limites da crítica objectiva e relacionadas 
 directamente com a actividade processual e exercício do mandato. 
 
 
 
 8) Não estando, assim, tipificado o crime p. e p. nos termos conjugados dos 
 artigos 181.º, n.º 1 e 184.º, ambos do CP. 
 
 
 
 9) E em consequência deverá a arguida ser não pronunciada. 
 
 
 
 10) Obviando assim a sujeição da arguida a julgamento». 
 
 
 
 3. Por acórdão de 9 de Julho de 2009, o Tribunal da Relação de Évora negou 
 provimento ao recurso. Foi então interposto recurso para o Tribunal 
 Constitucional, através do seguinte requerimento: 
 
 
 
 «A., arguida no processo em epígrafe referenciado, porque não se conforma com o 
 Douta Decisão do STJ, vem dele interpor RECURSO para o Tribunal Constitucional (Processo 
 de fiscalização concreta da Constitucionalidade e legalidade) o abrigo do artigo 
 
 70º n. 1 ali. b)da LTC, cuja inconstitucionalidade foi suscitada quer nas 
 alegações de recurso para o STJ, quer na reclamação da não admissão do mesmo 
 recurso. 
 
 
 O recurso, é delimitado às questões de inconstitucionalidade suscitada. A 
 recorrente tem legitimidade artº 72º n. 1 al. b) e n.2; É tempestivo (artº 75º n. 
 
 1); com efeito suspensivo e sobe nos próprios autos (artº 78º n.3) todos do LTC. 
 
 
 A recorrente pretende ver apreciada a constitucionalidade relativas aos artº 181º, 
 n. 1 e 184º ambos do CP quando interpretados, no sentido de considerar merecedor 
 de tutela do crime aí tipificado, por proferir a expressão a expressão: ? 
 extraia certidão (...) tendo em conta que não só arguido como a ilustre 
 mandatária deste se consideram ofendidos no uso da sua palavra (direito que lhes 
 assiste) (...), em face da solicitação à MMª Juiz para efectuar um requerimento 
 simples, este é constantemente negado e interrompido, salvo o devido respeito, 
 fazendo a MM.ª Juiz usar das suas palavras para ?redigir?, interceder nos 
 requerimentos em acta efectuadas pela defesa.? 
 
 
 
 ?Tendo em conta que a MM.ª. Juiz, salvo o devido respeito e melhor opinião ?atacou? 
 a defesa do arguido.?, por sua interpretação violar o disposto no artº 37º e 208º 
 ambos da CRP, tendo em atenção que a ora recorrente proferiu tais expressões em 
 requerimento formal, e no âmbito do exercício do mandato forense, que lhe foi 
 conferido». 
 
 
 
 4. Convidada a ?esclarecer o teor? deste requerimento, a reclamante respondeu 
 que: 
 
 
 
 «Trata-se de lapso de escrita manifesto na identificação do tribunal recorrido, 
 que desde já se rectifica, ao abrigo do disposto no artigo 667.º do CPC. 
 
 
 De facto, a decisão dos presentes autos não provêm do Supremo Tribunal de 
 Justiça (como se escreveu no primeiro parágrafo da página 1 do recurso a dirigir 
 para o Tribunal Constitucional) mas sim provém do Tribunal da Relação de Évora. 
 
 
 Assim, onde menciona S.T.J. deve ler-se Tribunal da Relação de Évora, pois 
 vislumbrados os autos de forma clara, facilmente se apercebe do lapso de escrita 
 manifesto. 
 
 
 Assim também não se entende nem se acompanha o mencionado no despacho proferido, 
 na parte onde, alega o seguinte: SIC (?) nem invocação de inconstitucionalidade 
 nos presentes autos (...)? 
 
 
 Com efeito, e salvo o devido respeito, foi com base na declaração de 
 inconstitucionalidade já invocada em sede de recurso ordinário junto do Tribunal 
 
 ?a quo?, que o presente recurso foi redigido e assinado, com destino ao Tribunal 
 Constitucional. Assim, nesta parte, inexiste, qualquer lapso manifesto de 
 escrita por parte da arguida na identificação do Tribunal ?ad quem?». 
 
 
 
 5. O recurso de constitucionalidade não foi admitido, por despacho onde se lê o 
 seguinte: 
 
 
 
 «Porque não ocorre qualquer das situações previstas no n.º 1 do art.º 70.º da 
 lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, não admito o recurso interposto a fls. 447». 
 
 
 
 6. É este despacho que é objecto da presente reclamação, com os seguintes 
 fundamentos: 
 
 
 
 «Nos presentes foi determinado, pelo o MP o arquivamento dos autos. 
 
 
 Sobre o mesmo, foi requerida a Abertura de Instrução, pela Assistente. 
 
 
 Por Decisão Instrutória nos autos foi a reclamante, pronunciada, em 1ª instância. 
 
 
 Deste a reclamante não se conformando recorreu para o Tribunal da Relação, 
 competente. 
 
 
 Ao mesmo foi negado provimento, uma vez que não terá sido invocada a 
 inconstitucionalidade, em sede própria. 
 
 
 Ora, acontece que em sede de conclusões de recurso, é aflorado o princípio 
 constitucional de liberdade de expressão. 
 
 
 Que nos factos em causa nos presentes autos, está indissociavelmente ligado ao 
 mandato forense. 
 
 
 Pois que a reclamante é Advogada de profissão, e os factos tiveram lugar em 
 virtude de um mandato. 
 
 
 Como tal, a questão em apreço com o recurso prendesse [prende-se] essencialmente, 
 com o livre exercício da advocacia. 
 
 
 E na consequente imunidade conferida aos advogados, no uso de expressões no 
 
 âmbito da sua profissão. 
 
 
 Pugnando-se pela a tipicidade das expressões utilizadas. 
 
 
 Questão diferente, será a de se considerar não estarem preenchidos os 
 formalismos para a aludida invocação de inconstitucionalidade. 
 
 
 Não obstante, a reclamante defende que tal, deveria ser sujeito ao regime, de 
 convite a aperfeiçoamento, o que nos presentes não verificou. 
 
 
 Por outro lado sempre se refere, que estando em causa a liberdade da recorrente, 
 atenta o crime pela qual foi pronunciada, e mesmo tendo em atenção que a decisão 
 que admita ou mande admitir o recurso não vincula o Tribunal de recurso (cfr. 
 artº 414º, nº3 e 405º, nº 4 do CPP), dever-se-á dar primazia ao entendimento e 
 orientação mais favorável ao recorrente. 
 
 
 Assim, impõe-se, e apelando ao princípio da dúvida, que os recursos devem ser 
 admitidos com vista a dar ensejo a que a questão seja apreciada e decidida no 
 Tribunal superior. 
 
 
 Não obstante, nos presentes autos estarmos perante uma questão de validade 
 formal, que tem o condão de obstar o conhecimento do recurso, e da matéria nele 
 controvertida. 
 
 
 Como tal deverá ser considerada inconstitucional o estatuído no artº 411º n. 4 
 por ref ao artº 412º nº 2 e 3 ambos do CPP, quando interpretado no sentido de 
 não admitir o recurso, por alegadamente a recorrente não ter invocado o vicio, 
 quando em sede de conclusões de recurso pugna pela liberdade de expressão 
 constitucionalmente consagrada, mesmo que não haja sido cumprido os formalismos 
 integrantes da LTC, designadamente artº 70, sem para tal haver convite a 
 aperfeiçoamento, por violação do previsto no artº 32º nº1 da CRP, que se deixa 
 aqui arguida e requerida com as legais consequências. 
 
 
 Pelo exposto requer-se a revogação do despacho que não admite o recurso, 
 substituindo-se por outro a ordenar a sua subida». 
 
 
 
 7. Os autos foram com vista ao Ministério Público, que se pronunciou pela forma 
 seguinte: 
 
 
 
 «1. A recorrente quando interpôs recurso para a Relação de Évora da decisão do 
 Senhor Juiz de Instrução Criminal, não suscitou, na respectiva motivação, 
 qualquer questão de inconstitucionalidade, sendo que esse era o momento 
 processual próprio. 
 
 
 
 2. Na verdade, tendo-se limitado, o acórdão recorrido, a negar provimento ao 
 recurso, nada de inovador aí se dizendo, não estamos perante uma situação em que 
 a recorrente estivesse dispensada do ónus da suscitação prévia. 
 
 
 
 3. Por outro lado, pela simples leitura do requerimento de interposição do 
 recurso para este Tribunal, constata-se que não se está perante uma qualquer 
 questão de inconstitucionalidade normativa, única que o Tribunal Constitucional 
 tem competência para apreciar. 
 
 
 
 4. Pelo exposto, deve indeferir-se a reclamação». 
 
 
 Cumpre apreciar e decidir. 
 
 
 II. Fundamentação 
 
 
 Nos presentes autos, foi interposto recurso ao abrigo da alínea b) do nº 1 do 
 artigo 70º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal 
 Constitucional (LTC), o qual não foi admitido. 
 
 
 Importa começar por dizer que em matéria de decisão de não admissão do recurso 
 de constitucionalidade e respectiva reclamação vale o disposto no artigo 76º da 
 LTC (Decisão sobre a admissibilidade), não tendo, por isso, qualquer cabimento 
 chamar os artigos 414º, nº 3, 405º, nº 4, e 411º, nº 4, do Código de Processo 
 Penal, este por referência ao artigo 412º, nºs 2 e 3, do mesmo Código. 
 
 
 A reclamante sustenta que, em sede de conclusões do recurso interposto para o 
 Tribunal da Relação de Évora, foi aflorado o princípio constitucional de 
 liberdade de expressão, pretendendo assim demonstrar o cumprimento do ónus que 
 sobre si impendia de suscitar, durante o processo, perante o tribunal que 
 proferiu a decisão recorrida, a questão de inconstitucionalidade normativa cuja 
 apreciação pretende (artigos 70º, nº 1, alínea b), e 72º, nº 2, da LTC). 
 
 
 Sucede, porém, que, na motivação do recurso interposto perante o tribunal 
 recorrido (Tribunal da Relação de Évora), não foi suscitada qualquer questão de 
 inconstitucionalidade normativa. A ora reclamante fez apenas uma referência à 
 liberdade de expressão constitucionalmente consagrada para sustentar a 
 atipicidade ?das expressões constantes do requerimento ?in? acta de 28/10/2005? 
 
 (cf. supra, ponto 2. do Relatório). 
 
 
 Trata-se, no caso, de falta insanável, por não verificação de um dos requisitos 
 do recurso interposto, pelo que seria sempre inviável o convite a que se refere 
 a reclamante. O convite referido no nº 5 do artigo 75º-A da LTC, o qual não é 
 sequer processualmente admissível em sede de reclamação deduzida ao abrigo do 
 artigo 76º, nº 4, da LTC, ?só é possível se a omissão for sanável, ou seja, se 
 consistir numa falta do próprio requerimento, não tendo cabimento para o 
 suprimento de falta de pressupostos de admissibilidade do recurso que seja 
 insanável? (Acórdão nº 99/2000). 
 
 
 Não se podendo dar como verificado um dos requisitos do recurso de 
 constitucionalidade interposto (artigos 70º, nº 1, alínea b), 72º, nº 2, da LTC), 
 há que confirmar o despacho de não admissão do mesmo. 
 
 
 III. Decisão 
 
 
 Em face do exposto, decide-se indeferir a presente reclamação. 
 
 
 Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta. 
 
 
 Lisboa, 12 de Janeiro de 2010 
 
 
 Maria João Antunes 
 
 
 Carlos Pamplona de Oliveira 
 
 
 Gil Galvão