 Imprimir acórdão
 Imprimir acórdão   
			
Processo n.º 301/08
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
 
 
 Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 A – Relatório 
 
  
 
  
 
             1 – A., com os demais sinais dos autos, recorre para o Tribunal 
 Constitucional ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei 
 n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual redacção (LTC), pretendendo ver 
 apreciada a constitucionalidade das normas definidas no respectivo requerimento 
 de interposição do recurso nos seguintes termos:
 
  
 
             “(...)
 
 1.      “A norma extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo do artigo 
 
 188º, nº 1, do Código de Processo Penal segundo a qual “é no termo de cada 
 período de escuta, e não logo a seguir a cada conversação telefónica 
 interceptada, que deve ser elaborado o auto de gravação com indicação pelo órgão 
 de polícia criminal das passagens relevantes para a prova” é inconstitucional 
 por violação do disposto nos artigos 18º, nº 2 e 3, e 34º, nº 4, da Constituição 
 da República Portuguesa” (Cfr. 3º Parágrafo da página 14 da Motivação e Ponto 8 
 das Conclusões do recurso) 
 
 2.      “A norma extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo segundo a qual 
 
 “após a alteração legislativa de 2000 a maior complexidade na elaboração do auto 
 de gravação impõe a adopção de critério mais dilatado quanto ao requisito da 
 imediatividade da sua apresentação” é ainda inconstitucional por violação do 
 disposto nos artigos 13º, 18º, nºs 2 e 3, e 34º, nº 4, da Constituição da 
 República Portuguesa” (Cfr. 5º Parágrafo da página 18 da Motivação e Ponto 14 
 das conclusões do recurso) 
 
 3.      “A norma extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo do artigo 
 
 188º, nº 1, do Código de Processo Penal, segundo a qual o inciso imediatamente 
 deve ser interpretado “dentro das contingências inerentes à complexidade e 
 dimensão do processo”, equivalendo, nessa medida, ao “tempo mais rápido 
 possível” é inconstitucional por violação do disposto nos artigos 18º, nºs 2 e 
 
 3, 32º, nº 1, e 34º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa” (Cfr. 4º 
 Parágrafo da página 25 da Motivação e Ponto 22 das conclusões de recurso). 
 
 4.      “É, assim, inconstitucional por violação do disposto nos artigos 18º, 
 nºs 2 e 3 e 34º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa, a norma extraída 
 pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo do artigo 188º, nº 1 do Código de 
 Processo Penal, segundo a qual, nos casos em que decida proceder pessoalmente à 
 integral audição dos suportes magnéticos que lhe hajam sido entregues, fica ao 
 livre arbítrio do Juiz de Instrução Criminal a determinação do lapso de tempo em 
 que o teor dessas mesmas conversações telefónicas deva ser conhecido” (Cfr. 3º 
 Parágrafo da página 32 da Motivação e Ponto 30 das conclusões do recurso). 
 
 5.      “Deverá também o presente Tribunal julgar inconstitucional, por violação 
 dos artigos 32º, nºs 2 e 8, 34º, nº 4, e 18º, nºs 2 e 3 da CRP, a norma extraída 
 pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo dos artigos 187º, nº 1 e 188º, nº 1, do 
 Código de Processo Penal, segundo a qual “uma vez autorizada a intercepção e 
 gravação por determinado período, pode ser concedida autorização para a sua 
 continuação sem que o juiz tome conhecimento do resultado das anteriores 
 conversações telefónicas interceptadas e gravadas” (Cfr. 40 Parágrafo da página 
 
 43 da Motivação e Ponto 49 das conclusões do recurso). 
 
 6.      “Deve também ser declarada inconstitucional por violação das normas dos 
 artigos 32º, nº 1 e 8, 18º, nºs 2 e 3 e 34º, nº 4, a norma extraída pelo 
 Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo do disposto no artigo 188º, nº 3, do Código 
 de Processo Penal, segundo a qual “nada impõe que a ordem de destruição seja 
 dada imediatamente após a primeira selecção, podendo o Juiz aditar aos “autos de 
 gravação” sessões que haja anteriormente considerado irrelevantes para a prova” 
 
 (Cfr. 6º Paragrafo da página 47 da Motivação e Ponto 56 das conclusões do 
 recurso).
 
  
 
             2 – Com interesse para a decisão do caso sub judicio, cumpre 
 relatar:
 
             2.1 – O presente recurso surge interposto do Acórdão do Tribunal da 
 Relação do Porto que negou provimento ao recurso interposto da decisão 
 instrutória proferida no 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Gondomar que 
 pronunciara o arguido pela prática de vinte e seis crimes dolosos de corrupção 
 passiva para prática de acto ilícito.
 
             2.2 – Nesse recurso, o arguido insurgiu-se contra a decisão 
 instrutória na parte em que nesta foi indeferido o seu pedido de declaração de 
 nulidade das escutas telefónicas, colocando ao Tribunal da Relação as seguintes 
 questões:
 
        “(...)
 
 1.        A regra consagrada na primeira parte do artigo 188.º, n.º 1 do Código 
 de Processo Penal, não foi respeitada no caso sub judice, o que, nos termos do 
 disposto nos artigos 189.º e 126.º, n.º 3, do mesmo diploma legal, determina a 
 nulidade das escutas telefónicas ordenadas e, por conseguinte, a proibição da 
 utilização como prova das transcrições das conversações telefónicas 
 interceptadas.
 
 2.        Do cotejo entre os “autos de gravação” de fls. 205, 206, 298, 230, 
 
 231, 266, 267, 268, 278, 298, 299, 305, 321, 339, 343, 348, 364, 365, 397, 404, 
 
 407, 417, 427, 489, 492, 494, 525, 533, 567, 629, 676, 677, 708, 743, 756, 782, 
 
 886, 945, 1048, 1131, 1186, 1213, 1530, 1069, 1839 e 4172 e as “Promoções” do 
 Ministério Público de fls. 215, 285, 326, 378, 473, 503, 538, 670, 815, 1009, 
 
 1090, 1167, 1263, 1557, 1641, 2278 e 4259, verifica-se que nunca os “autos de 
 
 “gravação” relativos a conversações telefónicas mantidas por e através do número 
 de telemóvel pessoal do Arguido, B. (“alvo” 27199), foram imediatamente levados 
 ao conhecimento da Meritíssima Juiz do Tribunal de Instrução Criminal de 
 Gondomar, mediando sempre entre a sua conclusão e a competente remessa, vários 
 dias, e nalguns casos até mais de um mês;
 
 3.        O mesmo sucedeu com as intercepções e gravações de conversações 
 telefónicas efectuadas por e através do número de telemóvel (“alvo” 20798) 
 pertencente ao Arguido, C., cujos “autos de gravação” foram sempre remetidos à 
 Meritíssima Juiz do Tribunal de Instrução Criminal de Gondomar vários dias, 
 nalguns casos até mais de um mês, depois de terem sido lavrados (Cfr. “autos de 
 gravação” de fls. 159, 160, 166, 192, 235, 243, 271, 272, 279, 301, 304, 320, 
 
 323, 341, 342, 345, 355, 372, 392, 406, 414, 426, 487, 491, 527, 528, 617, 673, 
 
 696, 797, 749, 759, 755, 788 e 789, 855, 885, 944, 1047, 1130, 1185, 1212, 1608, 
 
 1838, 4171 e 4523 e “Promoções” do Ministério Público de fls. 173, 215, 251, 
 
 285, 330, 378, 473, 503, 670, 815,1009, 1090, 1167, 1263, 1557, 1641, 4087, 4259 
 e 4275).
 
 4.        A validade das escutas telefónicas efectuadas foi defendida pelo 
 Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo com base no entendimento segundo o qual é “no 
 termo de cada período de escuta e, não logo a seguir a cada conversação 
 interceptada, que deve ser elaborado o auto de gravação com indicação pelo órgão 
 de polícia criminal das passagens consideradas relevantes para a prova”.
 
 5.        Tal interpretação a que o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo procedeu 
 do disposto no artigo 188.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, não encontra 
 qualquer correspondência nem na letra nem no espírito da lei.
 
 6.        Considerando que o escopo da lei ou “pensamento legislativo” 
 subjacente à regra plasmada no artigo 188.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, 
 
 é o de salvaguardar a menor compressão possível dos direitos fundamentais 
 coarctados pelas escutas telefónicas através do acompanhamento efectivo e 
 contínuo das operações que lhe são inerentes pelo Juiz, o critério 
 interpretativo a adoptar neste caso não pode deixar de ser aquele que justamente 
 assegure um maior acompanhamento judicial em que se materializa este específico 
 meio de obtenção de prova.
 
 7.        Seguindo o critério interpretativo que “assegure a menor compressão 
 possível dos direitos fundamentais afectados pela escuta telefónica”, 
 chegar-se-á necessariamente à conclusão que, no decurso do período pelo qual foi 
 autorizada a realização de escutas de telefónicas, devem ser apresentados ao 
 Juiz de Instrução Criminal “autos de gravação” intercalares.
 
 8.        Considera também o Recorrente que a norma extraída pelo Meritíssimo 
 Juiz do Tribunal a quo do artigo 188.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, 
 segundo a qual “é no termo de cada período de escuta, e não logo a seguir a cada 
 conversação interceptada, que deve ser elaborado o auto de gravação com 
 indicação pelo órgão de polícia criminal das passagens consideradas relevantes 
 para a prova”, é inconstitucional por violação do disposto nos artigos 18.º, n.º 
 
 2 e 3, e 34.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa.
 
 9.        Os Projectos de Lei de revisão do Código de Processo Penal que foram 
 recentemente apresentados na Assembleia da República, em que o Meritíssimo Juiz 
 a quo se ampara para sustentar a sua posição, levariam necessariamente à 
 proibição de utilização de grande parte das conversações telefónicas dos 
 Arguidos, B. e C., porquanto, os respectivos “autos de gravação” foram, quase 
 todos, levados ao conhecimento da Meritíssima Juiz do Tribunal a quo mais de 17 
 dias depois de terem sido lavrados (Cfr. artigo 188.º, n.º 3, da Proposta de Lei 
 n.º 109/X).
 
 10.    No que respeita ao espaço de tempo que deve mediar entre o fim da 
 gravação e a apresentação do respectivo auto, defende o Meritíssimo Juiz do 
 Tribunal a quo que “após a alteração legislativa de 2000 a maior complexidade na 
 elaboração do auto impõe a adopção de critério mais dilatado quanto ao requisito 
 da imediatividade da sua elaboração e apresentação, não sendo exigível a fixação 
 de um prazo máximo rígido, que sempre se poderia mostrar completamente 
 desadequado ao condicionalismo do caso concreto” (Cfr. Fls. 22921 da douta 
 Decisão Recorrida).
 
 11.    Entende o Recorrente que também este argumento invocado pelo Meritíssimo 
 Juiz do Tribunal a quo é totalmente desprovido de sentido, visto que, conforme 
 resulta claramente do disposto no artigo 188.º, n.º 1 do Código de Processo 
 Penal, o “requisito da imediatividade” se prende com a remessa do auto ao Juiz 
 de Instrução Criminal e não, como é por demais evidente, com a sua elaboração 
 pelos Órgãos de Polícia Criminal.
 
 12.    Se é verdade por um lado, que, por força da alteração legislativa de 
 
 2000, a elaboração dos “autos de gravação” passou a exigir mais tempo, não é 
 menos verdade, por outro, que, uma vez lavrados, razão alguma existe para que os 
 mesmos autos não sejam imediatamente levados ao conhecimento do Juiz, pois que, 
 tal remessa não implica qualquer outra operação que não seja a mera elaboração 
 pelo Ministério Público de uma “Promoção” acompanhada os respectivos autos e 
 suportes magnéticos das gravações.
 
 13.    Tanto a interpretação da lei propugnada pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal 
 a quo quanto a decisão que se baseou nessa mesma interpretação violam o disposto 
 no artigo 188.º, n.º 1 do Código de Processo Penal.
 
 14.    Além de ilegal, a norma extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo 
 segundo a qual “após alteração legislativa de 2000 a maior complexidade na 
 elaboração do auto de gravação impõe a adopção de critério mais dilatado quanto 
 ao requisito da imediatividade da sua apresentação” é ainda inconstitucional por 
 violação do disposto nos artigos 13.º, 18.º, nºs 2 e 3, e 34.º, nº 4 da 
 Constituição da República Portuguesa.
 
 15.    Apesar de salientar que “independentemente da interpretação do direito 
 ordinário vigente que se considere mais correcta, não é legítimo transformar o 
 regime legal em regime constitucional”, o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo 
 aprecia a validade das escutas, não ao abrigo do disposto no artigo 188.º, n.º 1 
 do Código de Processo Penal, mas antes e apenas à luz do “acompanhamento 
 judicial” que, de acordo com a jurisprudência do Tribunal Constitucional, deve 
 orientar todas as operações em que se materializam as escutas telefónicas.
 
 16.    Sem prejuízo de considerar não houve in casu esses mesmo acompanhamento 
 judicial, cumpre ao Recorrente salientar que é ao legislador, e não ao 
 
 “julgador”, que cabe regulamentar em que moldes devem processar-se as escutas 
 telefónicas de forma a que exista, a cada momento da sua execução, um 
 acompanhamento pelo Juiz das operações em que este meio de obtenção de prova se 
 materializa. 
 
 17.    O Juiz não pode afastar a aplicação da formalidade imperativamente 
 prescrita no artigo 188.º, n.º 1 do Código Processo Penal, considerando que as 
 escutas telefónicas são válidas porquanto se mostra cumprido o desiderato que 
 subjaz a tal formalidade.
 
 18.    Considerar-se válidas escutas telefónicas realizadas em desrespeito pelas 
 formalidades prescritas no referido preceito normativo por alegadamente ter 
 havido esse acompanhamento judicial equivaleria, na verdade, em transformar as 
 regras e princípios jurisprudencialmente enunciados pelo Tribunal Constitucional 
 num regime legal em preterição daquele que legitimamente se acha consagrado, o 
 que, em última análise, poderia até consubstanciar uma violação do princípio da 
 separação de poderes.
 
 19.    É também contrário à lei e à CRP o argumento do Meritíssimo Juiz do 
 Tribunal a quo segundo o qual o inciso “imediatamente” tem de ser interpretado 
 
 “dentro das contingências inerentes à complexidade e dimensão do processo”.
 
 20.    Seguindo o critério interpretativo acima enunciado, não pode senão 
 concluir-se que a expressão em causa tem, sob pena de nulidade, de ser 
 interpretada no seu sentido literal, não podendo o “julgador” afastá-la para 
 fazer valer um outro prazo de entrega dos “autos de gravação” que, em seu 
 entendimento, respeite ainda o acompanhamento judicial e “materialmente próximo 
 da fonte” que o artigo 18.º, n.º s 2 e 3, implicitamente exige em matéria de 
 restrição de direitos fundamentais. 
 
 21.    Atentos os direitos de defesa do arguido consagrados no artigo 32.º da 
 CRP e os direitos fundamentais quer do Arguido quer de terceiros que 
 necessariamente são coarctados pelas escutas telefónicas, ainda que as 
 
 “contingências inerentes à complexidade e dimensão do processo” pudessem, de 
 alguma forma, explicar os dias, e nalguns casos até mais um mês, que mediaram 
 entre a conclusão do “auto de gravação” e a sua remessa à Meritíssima Juiz do 
 Tribunal de Instrução Criminal de Gondomar, sempre teria de concluir-se que são 
 nulas as intercepções e transcrições das conversações telefónicas dos Arguidos, 
 C. e A., obtidas com violação das formalidades prescritas no artigo 188.º do 
 Código de Processo Penal.
 
 22.    A norma extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo do artigo 188.º, 
 n.º 1 do Código de Processo Penal, segundo a qual o inciso imediatamente deve 
 ser interpretado “dentro das contingências inerentes à complexidade e dimensão 
 do processo”, equivalendo, nessa medida, “ao tempo mais rápido possível” é 
 inconstitucional por violação do disposto nos artigos 18.º, n.º s 2 e 3, 32.º, 
 n.º 1, e 34.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa.
 
 23.    A tabela elaborada pelo Meritíssimo JIC para demonstrar que houve in casu 
 um acompanhamento judicial efectivo e próximo da fonte (fls. 22921 a 23023 da 
 douta decisão recorrida), é omissa quanto às datas que justamente permitem 
 aferir se foi ou não cumprida a exigência que o artigo 188.º, n.º 1, do Código 
 de Processo Penal formula, ou seja, as datas das “Promoções” do Ministério 
 Público, acto processual que levava ao conhecimento do Juiz “os autos de 
 gravação” acompanhados dos suportes magnéticos das gravações.
 
 24.    Não obstante a posição expressa pelo Meritíssimo JIC – enaltecendo a 
 circunstância de resultar dos vários despachos exarados que a Meritíssima Juiz 
 do Tribunal de Instrução Criminal de Gondomar procedeu à audição pessoal de 
 todos os suportes magnéticos das gravações – a verdade é que do confronto entre 
 as datas das “Promoções” do Ministério Público e as datas dos Despachos que se 
 lhes seguiram, verifica-se, porém, que, nalguns casos, seria, de todo, 
 impossível que a Meritíssima Juiz do Tribunal de Instrução Criminal tivesse 
 conseguido ouvir pessoalmente todos os registos magnéticos que lhe foram 
 apresentados.
 
 25.    Atendendo ao elevado número de arguidos que se encontravam “sob escuta” e 
 ao tempo que implicaria a audição pessoal de todos os registos magnéticos, para 
 evitar atrasos excessivos entre as conversações já interceptadas e o seu 
 conhecimento do teor dessas mesmas conversações, deveria a Meritíssima Juiz do 
 Tribunal de Instrução Criminal de Gondomar ter-se socorrido do auxílio dos 
 
 Órgãos de Polícia Criminal, como, de resto, prevê o artigo 188.º, n.º 4 do 
 Código de Processo Penal.
 
 26.    Na tentativa – nem sempre bem-sucedida – de ouvir pessoalmente todos os 
 suportes magnéticos das gravações, a Meritíssima Juiz do Tribunal de Instrução 
 Criminal de Gondomar acabou por levar a um enorme desfasamento entre as 
 conversações interceptadas e já gravadas e a sua apreciação do teor das mesmas.
 
 27.    Nos doutos despachos de fls. 1110 e seguintes, 1266 e seguintes, 1571 e 
 seguintes, 1648 e seguintes e 1872 e seguintes, a Meritíssima Juiz de Instrução 
 Criminal pronuncia-se, não sobre a “Promoção” do Ministério Público que mais 
 recentemente lhe havia sido remetida, mas sobre promoções bem mais antigas, 
 permanecendo, assim, as comunicações telefónicas dos Arguidos longos períodos de 
 tempo sem serem judicialmente controladas e apreciadas, o que é desconforme não 
 só com o regime previsto na lei processual penal, mas também com a própria 
 Constituição.
 
 28.    Deverão, pois, ser declaradas nulas, por violação do disposto no artigo 
 
 188.º, n.º 1 do Código de Processo Penal e de harmonia com o que se acha 
 consagrado nos artigos 34.º, n.º 4 e 18.º, nºs 2 e 3 da CRP, as escutas 
 telefónicas dos Arguidos, C. e A., porquanto as correspectivas conversações 
 telefónicas interceptadas foram conhecidas e apreciadas pela Meritíssima Juiz do 
 Tribunal de Instrução Criminal de Gondomar muito tempo após lhe terem sido 
 entregues.
 
 29.    Se a Meritíssima Juiz do Tribunal de Instrução Criminal de Gondomar não 
 se socorreu, como podia e deveria ter feito, do auxílio dos Órgãos de Polícia 
 Criminal, não pode, depois, o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo valer-se do 
 tempo que sempre demora ouvir pessoalmente as gravações para com isso justificar 
 os graves atrasos registados entre a gravação das conversas interceptadas e o 
 seu controlo e (falta de) acompanhamento judiciais.
 
 30.    É, assim, inconstitucional por violação do disposto nos artigos 18.º, nºs 
 
 2 e 3 e 34.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa, a norma extraída 
 pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo do artigo 188.º, n.º 1 do Código de 
 Processo Penal, segundo a qual, nos casos em que decida proceder pessoalmente à 
 integral audição dos suportes magnéticos que lhe hajam sido entregues, fica ao 
 livre arbítrio do Juiz de Instrução Criminal a determinação do lapso de tempo em 
 que o teor dessas mesmas conversações telefónicas interceptadas deva ser 
 conhecido.
 
 31.    Além de ter não recorrido aos mecanismos que lhe permitiriam acompanhar 
 continuamente as gravações interceptadas, a Meritíssima Juiz do Tribunal de 
 Instrução Criminal permitiu ainda que os Órgãos de Polícia Criminal adoptassem 
 procedimentos que atrasavam gravemente as operações em que se materializam as 
 escutas telefónicas e que inviabilizavam o acompanhamento judicial a que alude a 
 jurisprudência do Tribunal Constitucional.
 
 32.    Os Órgãos de Polícia Criminal, ao invés de, à medida que fossem sendo 
 interceptadas comunicações telefónicas, lavrarem um auto e o remeterem logo ao 
 Ministério Público para que este elaborasse a competente promoção, deixavam 
 passar longos períodos de tempo sem que procedessem a qualquer gravação, sendo 
 certo que, depois, num mesmo dia, elaboravam vários “autos de gravação”, os 
 quais, decorridos que fossem vários dias, nalguns casos até mais de um mês, eram 
 então e (só então) entregues à Meritíssima Juiz de Instrução Criminal.
 
 33.    É ilegal o comportamento dos Órgãos de Polícia Criminal traduzido na 
 acumulavam de vários autos que eram entregues à Meritíssima Juiz de Instrução 
 Criminal numa mesma “Promoção”.
 
 34.    Como senão bastasse, a partir de Julho/Setembro de 2003, da maioria dos 
 
 “autos de gravação”, consta, como data da sua elaboração, não um, mas vários 
 dias, o que, para além de consubstanciar uma irregularidade nos termos do artigo 
 
 94.º, n.º 6 do Código de Processo Penal, viola, ainda, as regras e princípios 
 legal e constitucionalmente consagrados em matéria de escutas telefónicas.
 
 35.    Com estes seus ilegais procedimentos, os Órgãos de Polícia Criminal 
 levaram a que as conversações telefónicas dos Arguidos permanecessem longos 
 períodos de tempo sem serem conhecidas e apreciadas pela Meritíssima Juiz do 
 Tribunal de Instrução Criminal de Gondomar.  
 
 36.    É que, ao lapso de tempo que sempre mediava entre a intercepção e o 
 início da gravação, acresce ainda o tempo que tais intercepções demoravam a ser 
 gravadas e os vários dias, nalguns casos até mais de um mês, que mediavam entre 
 a conclusão desses autos de gravação e o seu conhecimento pela Meritíssima Juiz 
 do Tribunal de Instrução Criminal de Gondomar.
 
 37.    Em face do que antecede, forçoso é reconhecer-se que não houve no caso 
 concreto o acompanhamento judicial efectivo e “materialmente próximo da fonte” a 
 que o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo tantas vezes se refere na fundamentação 
 da sua douta decisão.
 
 38.    São, pois, nulas, por violação do disposto no artigo 188.º, n.º1, do 
 Código de Processo Penal, todas as escutas telefónicas efectuadas aos números de 
 telemóvel pessoais dos Arguidos, C. e A., não podendo, por tal razão e conforme 
 preceituam os artigos 126.º, n. 3 e 32.º, n.º 8 da CRP, do mesmo diploma legal, 
 ser utilizadas como meio de prova as conversações telefónicas daqueles dois 
 Arguidos que foram transcritas nos presentes autos no âmbito do inquérito.
 
 39.    Conforme se constata pela mera análise dos doutos despachos de fls.312 e 
 seguintes, 380 e seguintes, fls. 541 e seguintes, fls. 1095 e seguintes, 1648 e 
 seguintes, que as 5 prorrogações do prazo de intercepção e gravação das escutas 
 telefónicas ordenadas ao seu número de telemóvel pessoal (“alvo” 21179) foram 
 ordenadas sem que a Meritíssima Juiz do Tribunal de Instrução Criminal tivesse 
 tomado conhecimento do teor de todas as conversações anteriormente 
 interceptadas.
 
 40.    O mesmo sucedeu com as escutas telefónicas ordenadas ao número de 
 telemóvel pessoal (“alvo” 20798) do também aqui Arguido, C., em que 5 das 6 
 prorrogações do prazo de intercepção e gravação das suas comunicações 
 telefónicas foram também autorizadas sem que, mais uma vez, a Meritíssima Juiz 
 do Tribunal de Instrução Criminal tivesse tido a oportunidade de conhecer 
 previamente o teor das conversações que haviam sido já interceptadas (Cfr. 
 doutos despachos indicados no ponto anterior). 
 
 41.    As prorrogações dos prazos de intercepção das comunicações telefónicas 
 ordenadas sem que a Meritíssima Juiz do Tribunal de Instrução Criminal tivesse 
 tomado conhecimento do teor de conversações já constantes dos autos violam o 
 disposto no artigo 188.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, o que, por sua 
 vez, determina a nulidade de todos os despachos de prorrogação de prazos acima 
 referidos e, por conseguinte, dos “autos de gravação” e transcrições de 
 conversações telefónicas que se lhes seguiram, como, de resto, resulta da 
 aplicação em conjugação do disposto nos artigo 189.º e 126.º, n.º 3 do mesmo 
 diploma legal.
 
 42.    Essas mesmas prorrogações violam também o preceituado no n.º 1 do artigo 
 
 187.º do mesmo diploma legal, visto que não tendo a Meritíssima Juiz do Tribunal 
 a quo tomado conhecimento do teor de todas as conversações telefónicas 
 interceptadas, a decisão de prorrogação dos prazos é tomada, em bom rigor, não 
 pelo órgão judicialmente competente para o efeito, mas antes pelos Órgãos de 
 Polícia Criminal e pelo próprio Ministério Público.
 
 43.    Apesar de reconhecer que as sucessivas prorrogações dos prazos de 
 intercepção e gravação das conversações telefónicas dos Arguidos que tiveram 
 
 “sob escuta” foram ordenadas sem que previamente tivesse sido judicialmente 
 conhecido o teor de comunicações anteriormente interceptadas, o Meritíssimo Juiz 
 do Tribunal a quo decidiu indeferir a nulidade arguida após o encerramento do 
 inquérito, uma vez que “as conversações que a Meritíssima Juíza de Instrução 
 Criminal já tinha ouvido e ordenado a sua transcrição quando decidiu proferir os 
 despachos de prorrogação agora colocados em crise permitiram-lhe concluir no 
 sentido do grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova na 
 continuação da intercepção do telefone a que diziam respeito as prorrogações”.
 
 44.    Sem conhecer todas as conversas que haviam sido já gravadas, não podia a 
 Meritíssima Juiz do Tribunal de Instrução Criminal presumir, em face do teor 
 daquelas que havia já ouvido, que a conduta criminosa iria continuar e que, por 
 isso, se afigurava plenamente justificada a compressão de direitos fundamentais 
 do Arguido e de terceiros que as escutas telefónicas sempre acarretam, em prol 
 dos interesses da investigação criminal.
 
 45.    E neste caso a compressão dos direitos dos Arguidos e de terceiros é 
 particularmente grave pois que, sendo o “auto de gravação” omisso quanto aos 
 factos que resultavam das conversações telefónicas gravadas, a Meritíssima Juiz 
 do Tribunal de Instrução Criminal nada sabia quanto ao conteúdo dessas mesmas 
 conversações telefónicas, pelo que, confiou totalmente no juízo que os Órgãos de 
 Polícia Criminal e Ministério Público fizeram da necessidade da manutenção das 
 escutas, dando formalmente o seu consentimento a tal prorrogação mas delegando 
 materialmente naqueles a decisão em causa.
 
 46.    No tocante a este particular, acrescentou também o Meritíssimo Juiz do 
 Tribunal a quo que “reiteração das condutas era mais ou menos óbvia, nada 
 havendo nos autos que indiciasse ou permitisse pressupor a cessação daquela 
 actividade”, sendo certo, que “os campeonatos de futebol em que os escutados 
 intervinham se prolongavam por toda a época desportiva”.
 
 47.    Além colidir com a garantia constitucional da presunção de inocência, tal 
 entendimento poderia mesmo levar a que se considerasse legitima uma autorização 
 de um período de escutas correspondente à duração de um campeonato de futebol, o 
 que, conjugado com a interpretação também defendida na douta decisão recorrida 
 segundo a qual é no termo do período autorizado que deve ser lavrado o auto de 
 gravação, conduziria, in extremis, a cerca de 10 meses de escutas telefónicas 
 sem qualquer acompanhamento judicial.
 
 48.      Considera o Recorrente que a douta decisão recorrida viola as regras 
 imperativamente consagradas nos artigos 187.º, n.º 1, 188.º, 1, 189.º e 126, n.º 
 
 3 do Código de Processo Penal, devendo este Venerando Tribunal substituí-la por 
 outra que declare a nulidade dos despachos acima indicados e, por conseguinte, 
 dos “autos de gravações” relativos a comunicações telefónicas relativas dos 
 
 “alvos” 20798 e 21179 e respectivas transcrições. 
 
 49.    Deverá também o presente Tribunal julgar inconstitucional, por violação 
 dos artigos 32.º, nºs 2 e 8, 34.º, n.º 4 e 18.º, n.º s 2 e 3 da CRP, a norma 
 extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo dos artigos 187.º, n.º 1 e 
 
 188.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, segundo a qual “uma vez autorizada a 
 intercepção e gravação por determinado período, pode ser concedida autorização 
 para a sua continuação sem que o juiz tome conhecimento do resultado das 
 anteriores conversações telefónicas interceptadas e gravadas”.
 
 50.    O Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo indeferiu a arguida nulidade dos 
 aditamentos efectuados aos “autos de gravação” de fls. 429 e 1130 de “sessões” 
 que haviam sido já consideradas irrelevantes pela Meritíssima Juiz do Tribunal 
 de Instrução Criminal de Gondomar e cujos registos magnéticos, contra o que 
 dispõe o artigo 188.º, n.º 3 do Código de Processo Penal, não haviam sido 
 oportunamente destruídos.
 
 51.     A parte da douta decisão relativa à apreciação desta questão padece de 
 uma insanável contradição porquanto o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo 
 considera, a este propósito, igualmente acertadas e legais as decisões da 
 Meritíssima Juiz do Tribunal de Instrução Criminal de Gondomar de destruição e 
 não destruição dos suportes magnéticos das gravações.
 
 52.    Ainda a respeito desta questão, defende também o Meritíssimo Juiz do 
 Tribunal a quo que “o artigo 188.º, n.º 3, do CPP não impõe que a ordem de 
 destruição seja dada imediatamente após a primeira selecção, nem resulta da lei 
 que o controlo ou acompanhamento judicial das operações seja posto em causa pelo 
 facto de se vir a seleccionar mais de um ano depois outras sessões que 
 anteriormente se considerara irrelevantes”.
 
 53.    É certo que o Recorrente se opôs à destruição dos suportes magnéticos que 
 contivessem gravações de conversações telefónicas suas que, segundo a 
 Meritíssima Juiz de Instrução Criminal, não eram relevantes para efeitos de 
 prova, tendo, no entanto, presidido a tal requerimento a legitima intenção de 
 proceder à audição de tais gravações, verificando se das mesmas resultavam ou 
 não elementos que pudessem infirmar os factos que lhe viriam a ser imputados na 
 douta Acusação.
 
 54.    Salvo melhor opinião, os registos magnéticos relativos a “sessões” 
 judicialmente consideradas irrelevantes só poderão permanecer nos autos em 
 obediência ao princípio do contraditório e às garantias de defesa do Arguido, 
 sendo certo que, para efeitos de acusação, deverão tanto o Juiz de Instrução 
 Criminal quanto o próprio Ministério Público “ficcionar” que esses mesmos 
 suportes foram destruídos por ser essa, de resto, a consequência que 
 necessariamente resultaria caso tivesse sido cumprida a regra imperativamente 
 prevista no artigo 188.º, n.º 3, do Código de Processo Penal.
 
 55.    Assim, nos termos dos artigos 188.º, n.º 3 do Código de Processo Penal e 
 
 32.º da CRP, deverão ser considerados nulos os aditamentos ao “autos de 
 gravação” de fls.429 e 1130 ordenados pelo Meritíssima Juiz do Tribunal de 
 Instrução Criminal de Gondomar, não podendo, por conseguinte, as transcrições 
 correspondentes às “sessões” aditadas ser utilizadas como meio de prova.
 
 56.    Deve também ser declarada inconstitucional por violação das normas dos 
 artigos 32.º, n.º s 1 e 8, 18.º, n.º s 2 e 3 e 34.º, n.º 4, a norma extraída 
 pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo do disposto no artigo 188.º, n.º 3 do 
 Código de Processo Penal, segundo a qual “nada impõe que a ordem de destruição 
 seja dada imediatamente após a primeira selecção, podendo o Juiz aditar aos 
 
 “autos de gravação” sessões que haja anteriormente considerado irrelevantes para 
 a prova”.
 
 57.    Na fundamentação expendida na douta decisão recorrida, não encontrou o 
 Recorrente, qualquer referência às irregularidades dos “autos de gravação” 
 oportunamente arguidas após o encerramento do inquérito, nem tão pouco as razões 
 que justificaram o indeferimento (tácito) daquela sua arguição.
 
 58.    Em resposta a um requerimento apresentado nesse sentido, veio o 
 Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo esclarecer que sobre a suscitada 
 irregularidade dos “autos de gravação” se havia pronunciado a fls. 23051, sendo 
 certo, porém, que nem naquele ponto nem em qualquer outro se acham explicitados 
 os fundamentos que determinaram a decisão de indeferimento da irregularidade 
 oportunamente invocada.
 
 59.     Padece, por conseguinte, e no que a esta questão diz respeito, a douta 
 decisão recorrida do vício de falta de fundamentação, conforme preceituam os 
 artigos 97.º, n.º 3 e 123.º do Código de Processo Penal, determina a sua 
 irregularidade.
 
 60.    Nenhum dos “autos de gravação” relativos às intercepções das comunicações 
 telefónicas do Arguido, aqui Recorrente, faz referência ao despacho que ordenou 
 a realização das escutas, ao lugar onde foram feitas as gravações e “à hora da 
 sua ocorrência com referência ao momento do respectivo início e conclusão”, 
 sendo todos eles, por tal razão e conforme preceitua o artigo 94.º, n.º 6 do 
 Código de Processo Penal, manifestamente irregulares.
 
 61.    Mais se refira que dos autos de fls. 305, 398, 404, 407, 417, 427, 489, 
 
 492, 1048, 1131, 1186, 1213, 1530, 1069, 1839 e 1472, consta, como data da sua 
 elaboração, não um, mas vários dias, o que, não permite apurar de forma exacta o 
 circunstancialismo do tempo em que foram gravadas as intercepções das 
 comunicações telefónicas do Arguido, B., ora Recorrente, não fazendo fé da 
 operação de gravação enquanto tal.
 
  
 Assim, deverá então a decisão recorrida quanto a este ponto ser revogada, nos 
 termos do disposto no artigo 94.º, n.º 6, do Código de Processo Penal, por este 
 Venerando Tribunal, e substituída por outra que declare a invalidade de todos os 
 
 “actos de gravação” acima indicados, bem como, das transcrições de conversações 
 telefónicas que se lhes seguiram”.
 
  
 
             2.3 – Respondendo às questões suscitadas pelo recorrente, o Tribunal 
 da Relação do Porto decidiu negar provimento ao recurso quanto às questões “da 
 intercepção e gravação das escutas telefónicas e do seu conhecimento pelo juiz 
 de instrução criminal; da prorrogação dos prazos de intercepção e gravação das 
 escutas telefónicas; e do aditamento aos autos de gravação de sessões 
 anteriormente consideradas irrelevantes” e concedeu provimento ao recurso quanto 
 
 à alegada omissão de pronúncia relativa à irregularidade dos autos de gravação, 
 ordenando o seu suprimento pelo Tribunal de 1.ª Instância.
 
             O Acórdão do Tribunal da Relação encontra-se suportado na seguinte 
 fundamentação:
 
  
 
             “(...)
 
 2. DA INTERCEPÇÃO E GRAVAÇÃO DAS ESCUTAS TELEFÓNICAS E DO SEU CONHECIMENTO PELO 
 JUIZ DE INSTRUÇÃO CRIMINAL:
 
  
 
 2.1. Esta questão tem subjacente, à sua apreciação, o disposto em duas 
 disposições legais:
 
 - o disposto no artigo 34.º, n.º 4 da CRP, que diz:
 
 “é proibida toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas 
 telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvos os casos previstos na 
 lei em matéria de processo criminal”.
 
 - e o disposto no artigo 188.º n.º 1, do CPP, que refere:
 
 “da intercepção e gravação a que se refere o artigo anterior é lavrado auto, o 
 qual, junto com as fitas gravadas ou elementos análogos, é imediatamente levado 
 ao conhecimento do juiz que tiver ordenado ou autorizado as operações, com 
 indicação das passagens das gravações ou elementos análogos considerados 
 relevantes para a prova”.
 
  
 
             No entender do recorrente[1], “ …de acordo com a posição 
 unanimemente sustentada pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores, à 
 regra processual plasmada naquele preceito normativo subjaz a necessidade de as 
 escutas telefónicas serem objecto de um acompanhamento judicial próximo e 
 efectivo ao longo de toda a sua execução “com uma dupla finalidade”: i) fazer 
 cessar, tão depressa quanto possível, escutas que se venham a revelar 
 injustificadas ou desnecessárias e ii) submeter a um crivo judicial prévio a 
 aquisição processual das provas obtidas por esse meio” (Vide, a título meramente 
 exemplificativo o Acórdão n.º 407/97 do Tribunal Constitucional in 
 
 www.dgsi.pt)[2].
 
             …
 
             “ E foi justamente com o intuito de acautelar esse acompanhamento 
 efectivo e “materialmente próximo da fonte” pelo Juiz que o legislador ordinário 
 consignou, sob pena de nulidade, que “da intercepção e gravação (...) é lavrado 
 auto, o qual, junto com as fitas gravadas ou elementos análogos, é imediatamente 
 levado ao conhecimento do juiz”.
 
             
 
             “ Sucede, porém, que aquela regra, consagrada na primeira parte do 
 artigo 188.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, não foi respeitada no caso sub 
 judice, o que, nos termos do disposto nos artigos 190.º e 126.º, n.º 3, do mesmo 
 diploma legal, determina a nulidade das escutas telefónicas ordenadas e, por 
 conseguinte, a proibição da utilização como prova das conversações 
 interceptadas”.
 
             O despacho recorrido apreciou e fundamentou desenvolvidamente esta 
 matéria.
 
             E fê-lo de um modo não só desenvolvido, com uma análise da evolução 
 histórico-legislativa, mas também de um modo convicto e esclarecedor, com 
 análise pormenorizada dos elementos do processo.
 
                         A questão a apurar traduz-se em definir e delimitar o 
 conceito de “ imediatamente” referido no artigo 188º, do CPP, o mesmo é dizer, 
 uma vez que esse artigo não refere[3] prazos, quando é que os autos de 
 intercepção e gravação das escutas, devem ser apresentados ao Juiz, para 
 efectivo controlo judicial.
 
             O Tribunal Constitucional tem vindo a apreciar e a conhecer esta 
 matéria em vários acórdãos, de que se dá conta quer no despacho recorrido, quer 
 nas alegações do recorrente quer na resposta do Ministério Público.
 
                         Por tal facto, não vamos aqui reproduzir toda essa 
 jurisprudência, fazendo-o apenas na medida do necessário para tornar 
 compreensível a decisão.
 
             Da evolução legislativa sobre os procedimentos que rodeiam as 
 escutas, centremo-nos naquela à luz da qual foram feitas as dos presentes autos 
 e cuja alteração foi introduzida pelo DL nº 320-C/200, de 15 de Dezembro, que 
 aditou ao nº 1, do então artigo 188º, do CPP, a seguinte expressão[4]:
 
             (“Da intercepção e gravação a que se refere o artigo anterior é 
 lavrado auto, o qual, junto com as fitas gravadas ou elementos análogos, é 
 imediatamente levado ao conhecimento do juiz que tiver ordenado ou autorizado as 
 operações”) “com a indicação das passagens das gravações ou elementos análogos 
 considerados relevantes para a prova”.
 
  
 
             Sobre o conceito ou sentido da expressão “ imediatamente “, “ 
 acompanhamento próximo “ e “ controlo judicial do conteúdo “, escreve-se no ac. 
 do Tribunal Constitucional nº 4/2006, de 3 de Janeiro[5] :
 
             “O imediatamente, aqui, tem de ser entendido em termos hábeis, pois 
 que o n.º 2 do artigo 188.º do CPP permite que o órgão de polícia criminal que 
 proceder à investigação tome previamente conhecimento do conteúdo da comunicação 
 interceptada a fim de poder praticar os actos cautelares necessários e urgentes 
 para assegurar os meios de prova, e pode muito bem acontecer que, devido à 
 extensão das conversações, a sua audição pelo órgão de polícia criminal leve 
 alguns dias. Além disso, de harmonia com a parte final do n.º 1 da mesma 
 disposição legal, o auto é apresentado ao juiz com a indicação das passagens das 
 gravações ou elementos análogos considerados relevantes para a prova, o que 
 significa que, para dar cumprimento a tal preceito legal, a entidade que tiver 
 procedido às intercepções deve ouvir previamente as gravações, pois só assim 
 pode ficar a saber quais as que são relevantes para a prova, o que pode demorar 
 mais ou menos tempo consoante a extensão das gravações e que tem necessariamente 
 de ser levado em conta na interpretação do que deve ser a apresentação imediata 
 ao juiz[6]”.
 
             E mais adiante:
 
             “Ora, já se indicou que o critério interpretativo neste campo não 
 pode deixar de ser aquele que assegure a menor compressão possível dos direitos 
 fundamentais afectados pela escuta telefónica. Também já se assentou – e importa 
 lembrá‑lo de novo – que a intervenção do juiz é vista como uma garantia de que 
 essa compressão se situe nos apertados limites aceitáveis e que tal intervenção, 
 para que de uma intervenção substancial se trate (e não de um mero tabelionato), 
 pressupõe o acompanhamento da operação de intercepção telefónica. Com efeito, só 
 acompanhando a recolha de prova, através desse método em curso, poderá o juiz ir 
 apercebendo os problemas que possam ir surgindo, resolvendo‑os e, assim, 
 transformando apenas em aquisição probatória aquilo que efectivamente pode ser. 
 Por outro lado, só esse acompanhamento coloca a escuta a coberto dos perigos – 
 que sabemos serem consideráveis – de uso desviado.
 
                         Com isto, não se quer significar que toda a operação de 
 escuta tenha de ser materialmente realizada pelo juiz. Contrariamente a tal 
 visão maximalista, do que aqui se trata é, tão‑só, de assegurar um 
 acompanhamento contínuo e próximo temporal e materialmente da fonte (imediato, 
 na terminologia legal), acompanhamento esse que comporte a possibilidade real de 
 em função do decurso da escuta ser mantida ou alterada a decisão que a 
 determinou.
 
 …
 
             Finalmente, a alteração operada pelo Decreto‑Lei n.º 320‑C/2000 veio 
 de novo alterar o conteúdo do auto de intercepção e de gravação. Ele deixou de 
 ser mero auto de registo da efectivação da operação, para dever sempre conter, 
 não a transcrição das passagens que o órgão de polícia criminal reputasse 
 relevantes (como entendera o parecer n.º 92/91 da Procuradoria‑Geral da 
 República), mas a indicação dessas passagens, com o objectivo, que resulta do 
 artigo 4.º da Lei n.º 27‑A/2000, de limitar o dever de o juiz ouvir as gravações 
 
 às passagens indicadas. Desta alteração resultou, por outro lado, que, para 
 poder fornecer a indicação das passagens das gravações ou elementos análogos 
 considerados relevantes para a prova, o órgão de polícia criminal tem de passar 
 a, por sistema, tomar conhecimento do conteúdo das comunicações interceptadas, o 
 que obviamente posterga o carácter excepcional de que, na redacção anterior, 
 esse conhecimento tinha (unicamente destinado a prevenir a prática de actos 
 cautelares necessários e urgentes para assegurar meios de prova). Por outro, 
 deixando de ser um mero acto de registo de ocorrência, para passar a implicar o 
 prévio desenvolvimento de actividades, necessariamente morosas, de audição de 
 gravações (por vezes em língua estrangeira), identificação dos intervenientes e 
 ponderação da sua relevância para a investigação, é óbvio que a exigência de 
 
 “imediatividade” da apresentação do auto tem de ser vista à luz de outros 
 critérios, diversos dos que estavam presentes quando foram proferidos os Acórdão 
 nºs 407/97, 347/2001 e 528/2003. Disso mesmo deu conta este Tribunal, logo no 
 Acórdão n.º 699/2004, quando, ao analisar a admissibilidade de recurso 
 interposto ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea g), da LTC, por a decisão 
 então recorrida ter pretensamente feito aplicação da norma do n.º 1 do artigo 
 
 188.º do CPP em contradição com os juízos de inconstitucionalidade contidos nos 
 Acórdãos nºs 407/97, 347/2001 e 528/2003 (os dois primeiros incidindo sobre a 
 redacção anterior à Lei n.º 59/98 e o terceiro sobre a redacção desta Lei, mas 
 anterior à do Decreto‑Lei n.º 320‑C/2000), contestou a identidade entre a 
 dimensão normativa aplicada na decisão recorrida (enquanto posterior a este 
 decreto‑lei) e a anteriormente julgada inconstitucional pelo Tribunal 
 Constitucional, afirmando: “ao acrescentar a este texto [o do n.º 1 do artigo 
 
 188.º do CPP] «com a indicação das passagens das gravações ou elementos análogos 
 considerados relevantes para a prova», o Decreto‑Lei n.º 320‑C/2000 introduziu 
 uma alteração relevante para a interpretação da norma de que se trata no 
 presente recurso, e que não permite a respectiva apreciação ao abrigo de um 
 recurso interposto ao abrigo do disposto na alínea g) do n.º 1 do artigo 70.º da 
 Lei n.º 28/82, se baseado em acórdãos relativos à anterior versão da lei”. 
 Também a Decisão Sumária n.º 252/2005 não conheceu de recurso interposto ao 
 abrigo da alínea g) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, tendo por objecto a norma do 
 n.º 1 do artigo 188.º do CPP, na redacção do Decreto‑Lei n.º 320‑C/2000, 
 aplicada na decisão recorrida alegadamente em desconformidade com os juízos de 
 inconstitucionalidade proferidos nos Acórdãos nºs 407/97, 347/2001 e 528/2003 
 
 (todos eles reportados a redacções anteriores), por falta de coincidência 
 normativa, dado que a alteração de redacção ocorrida em 2000 “assume (...) claro 
 relevo na apreciação da questão de constitucionalidade apreciada”, pois 
 
 “introduzindo‑se pela nova redacção um formalismo até então inexistente, o mesmo 
 
 é susceptível de condicionar o critério da imediatividade a que se refere o 
 artigo.
 
  
 
                         A este propósito há, no entanto, que salientar que os 
 inconvenientes derivados da maior complexidade e consequente morosidade da 
 elaboração do auto em causa serão, no todo ou em grande parte, compensados com a 
 maior rapidez e precisão que o novo sistema permite no que respeita ao acto 
 judicial de controlo da relevância das gravações e de selecção das que devem ser 
 transcritas, pelo que não se trata de fazer recair única e exclusivamente sobre 
 o arguido o ónus da alteração legislativa assinalada enquanto determina uma 
 alteração do critério da imediatividade anteriormente seguido”[7].
 
  
 
             Esta posição do Tribunal Constitucional é um contributo forte para 
 se fazer uma subsunção jurídica dos elementos dos presentes autos à ideia de 
 imediatividade que deve prevalecer na interpretação deste conceito.
 
             
 
             2.2. Compulsados os elementos dos autos no que ao recorrente 
 interessa, alvos 20798 e 21179, verificamos que:
 
             a) Os despachos judiciais que autorizaram as escutas telefónicas 
 fixaram, para estas, prazos entre 30 e 60 dias, nenhum deles fixando prazo para 
 a apresentação ao juiz, do respectivo auto de gravação;
 
                         b) Os autos de gravação e selecção das sessões com 
 interesse foram sendo apresentadas ao juiz de instrução[8] inicialmente com um 
 espaço temporal de cerca de 2 a seis dias, posteriormente entre 10 a 15, 
 atingindo nalguns casos cerca de 30 dias e pontualmente, cerca de 5 vezes, 
 quanto ao alvo 20798, 35 e 36 dias e quanto ao alvo 21179, cerca de 7, em que 
 atingiram também 35 a 36 dias, sendo uma delas de 39 dias, tudo conforme mapa 
 remetido pelo tribunal recorrido a nossa solicitação e junto aos autos a fls. 
 
 5929 a 5944.
 
                         c) Como já se deixou subentendido na alínea anterior, o 
 espaço temporal da apresentação dos autos ao JIC foi aumentando a partir do 
 crescente número de alvos a escutar e do número de gravações a efectuar, o que 
 passou a verificar-se a partir dos meses de Julho e Agosto de 2003.
 
             d) Em nenhuma das situações foi ultrapassado o prazo fixado para a 
 execução das escutas telefónicas pelo JIC.
 
             e) A Srª Juíza nas funções de JIC, procedeu à audição de todas as 
 gravações autorizadas.
 
  
 
             A conjugação de todos estes elementos permite-nos ajuizar no sentido 
 de que houve um controlo judicial apertado e efectivo de todas as escutas 
 autorizadas, não tendo as mesmas ficado ao livre arbítrio da entidade policial 
 ou outra.
 
             É verdade que alguns prazos, vistos de per si, isoladamente, quando 
 estamos a falar de 30 a 40 dias[9], se afiguram algo distantes do conceito de 
 
 “imediatamente” referido no artigo 188º do CPP.   
 
                         Acontece que tal conceito de imediatividade tem de ser, 
 
 à luz da legislação e procedimentos em vigor a quando das escutas, adaptado a 
 cada caso concreto de escutas, nomeadamente de complexidade, mas que nunca 
 ultrapasse o limite do razoável e pretira direitos fundamentais do arguido.
 
                         Como refere o Ministério Público na sua resposta ao 
 recurso do recorrente, “ o tempo que demorou entre a elaboração dos autos de 
 gravação, com indicação das sessões relevantes, e a sua apresentação à 
 Meritíssima Juiz de Instrução Criminal, cumprindo a exigência contida no 
 advérbio “imediatamente” foi nestes autos o tempo adequado – respeitando a 
 concordância prática entre as necessidades da investigação e a compressão dos 
 direitos dos visados – se tivermos em conta o elevado número de Alvos 
 
 (telefones) interceptados, a enorme quantidade de conversações de cada Alvo, a 
 necessidade de elaboração de relatórios parcelares relativos a cada apresentação 
 de autos de gravação e dos respectivos CDs gravados por forma a facilitar à M.ma 
 JIC a tarefa de selecção das passagens relevantes (que é afinal o que se 
 pretende com 188.º, n.º 1, do Código de Processo Penal) e a necessidade de a 
 M.ma JIC ter tempo razoável para entretanto certificar as inúmeras sessões que 
 já haviam sido seleccionadas por despachos seus anteriores e transcritas.
 
             Na sua acepção normativa, o termo “imediatamente” aludido no artigo 
 
 188.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, destina-se a exigir que os elementos 
 a submeter a apreciação judicial sejam facultados à autoridade judiciária tão 
 cedo quanto possível, ou melhor, tão cedo quanto o superior critério definido 
 pelo juiz, ou seja, tal advérbio apenas se reporta ao tempo que medeia entre a 
 elaboração do auto de gravação, com a indicação das passagens relevantes e com 
 os CDs e a sua apresentação ao Juiz e não ao tempo que medeia entre a elaboração 
 de tal auto e a audição e ordem de transcrição”.
 
             
 
                         Se atentarmos bem na análise dos mapas de fls. 5929 e 
 seguintes que registam as datas dos autos de gravação das escutas e as datas da 
 sua apresentação ao JIC, verificamos que em muitas situações a entidade 
 encarregada de executar as ditas gravações, optou por apresentar ao Jic, na 
 mesma data, autos de gravações de datas diferentes, ou seja, foi procedendo a 
 várias gravações e só findo determinado período de gravação é que a apresentou. 
 Veja-se, por exemplo, a fls. 5930, em que no dia 20 de Agosto de 2003, foram 
 apresentadas as gravações dos dias 16, 24 e 31 de Julho e 8 e 18 de Agosto de 
 
 2003. E a fls. 5933 e seguintes em que no dia 12 de Dezembro de 2003 foram 
 apresentadas ao Jic as gravações dos dias 6, 12, 17, 21 e 24 de Novembro e 3 de 
 Dezembro de 2003[10].
 
  
 
             Pelo que faz todo o sentido o afirmado pelo Ministério Público na 
 sua resposta, ao dizer:
 
             “ Exigir que os órgãos de polícia criminal procedessem às gravações 
 
 à medida que fossem fazendo as intercepções e lavrassem logo os respectivos 
 autos de gravação e os entregassem imediatamente à juiz após a elaboração de 
 cada um deles, como parece querer sustentar o arguido a fls. 33, seria, isso 
 sim, um verdadeiro descontrolo das intercepções, não só para a Polícia 
 Judiciária, mas sobretudo para a Juiz que as autorizou, pois que cada Alvo 
 tinha, no período autorizado, vários autos de gravação, com dezenas e até 
 centenas de sessões cada um, e eram vários Alvos (telefones) interceptados. Isso 
 sim colocaria em perigo os direitos dos arguidos, pois levaria à confusão total 
 sem garantia do que quer fosse. 
 
 …
 Por isso a tese defendia pelo arguido a fls. 9 a 14, 23 e 33 da sua motivação de 
 recurso, de que “imediatamente” terá de ser interpretado no seu sentido literal, 
 e de que se deveria ter procedido a gravações à medida que fossem interceptadas 
 as conversações, devendo ser lavrado o respectivo auto de gravação que seria 
 levado imediatamente ao conhecimento da juiz, traduzir-se-ia numa total anarquia 
 em termos de controlo judicial das escutas…
 O procedimento adoptado de gravar várias conversações interceptadas, num mesmo 
 CD, elaborar os correspondentes autos de gravação e de juntar vários autos de 
 gravação para os levar ao conhecimento da Juiz, respeitou a exigência contida na 
 lei, nos termos em que a interpretou o Tribunal Constitucional nos seus Acórdãos 
 nºs 426/05, 4/06, onde se admite que tais autos possam ser apresentados 
 imediatamente após o período autorizado de intercepções (o que neste caso foi 
 mais que cumprido pois foram apresentados autos intercalares). 
 Por outro lado, tal procedimento foi o mais adequado a um efectivo controlo das 
 operações pois permitiu à juiz ter tempo para ir tomando conhecimento das 
 gravações, ir ordenando as transcrições e ir verificando a conformidade das 
 conversas entretanto transcritas, ao mesmo tempo que permitiu aos órgãos de 
 polícia criminal levar a cabo, de forma organizada, as suas tarefas de gravação, 
 elaboração de autos, sugestão de passagens a transcrever e transcrição das já 
 ordenadas, contribuindo tudo para um melhor respeito pelos direitos das pessoas 
 cujas conversas estavam a ser interceptadas…”.
 
  
 Poderá o recorrente desabafar senão mesmo retorquir que tanto lhe assiste razão, 
 que o legislador[11] veio agora fixar o prazo de 15 dias para o órgão de polícia 
 criminal levar ao conhecimento do MP, de 15 em 15 dias, a partir do início da 
 primeira intercepção efectuada, dos suportes técnicos das gravações que, por sua 
 vez, no prazo máximo de 48 horas, deverá levá-los ao conhecimento do Juiz.
 Ora, a fixação destes prazos era um imperativo legal para, de uma vez por todas, 
 acabar com as ainda indefinições e várias interpretações do conceito de “ 
 imediatamente “, que dava causa a tanto recurso.
 E, numa matéria tão sensível como esta, em que está em causa uma restrição a um 
 direito individual tão fundamental, as certezas nunca são demais.
 Mas, o próprio legislador teve necessidade de definir um prazo já considerado “ 
 alargado “[12], pois o conceito de “ imediatividade” tem de levar em conta a 
 dificuldade e o tempo para elaboração dos autos de gravação, contando com 
 processos complexos e alvos vários, sem retirar a eficácia pretendida à 
 investigação.
 Pelo que, tal como estava definido o processamento das escutas e seu controlo 
 judicial, apesar de em relação a algumas gravações se ter ultrapassado o limite 
 de 17 dias para a sua apresentação ao Jic, não significa que se esteja perante a 
 nulidade pretendida e alegada pelo recorrente.
 Não só porque tal prazo não estava definido na lei, como essencialmente, o 
 processamento das escutas em causa, atendendo ao seu número e complexidade, 
 foram conhecidas pelo juiz em tempo considerado razoável, para este efectivar um 
 controlo judicial de facto como ocorreu na prática, estando salvaguardados os 
 direitos do recorrente.
 Com certeza que, doravante, as regras serão diferentes, porque melhor definidas. 
 Mas tal facto não é fundamento para a anulação das escutas entretanto feitas 
 nestes autos, ao recorrente, nos termos em que o foram.
 Improcede, assim, nesta parte, a pretensão do recorrente.
 
  
 
 3. DA PRORROGAÇÃO DOS PRAZOS DE INTERCEPÇÃO E GRAVAÇÃO DAS CONVERSAÇÕES 
 TELEFÓNICAS.
 O recorrente coloca o acento tónico desta questão no facto de ter havido 
 autorização de prorrogações do prazo de intercepção e gravação das suas 
 comunicações telefónicas sem que a Meritíssima Juiz do Tribunal de Instrução 
 Criminal tivesse tomado conhecimento do teor de todas as conversações 
 anteriormente interceptadas.
 Decidiu-se no tribunal recorrido:
 
 “ Ainda assim importa acrescentar que as conversações que a Meritíssima Juíza de 
 Instrução Criminal já tinha ouvido e ordenado a sua transcrição quando decidiu 
 proferir os despachos de prorrogação agora colocados em crise permitiram-lhe 
 concluir no sentido do grande interesse para a descoberta da verdade ou para a 
 prova na continuação da intercepção do telefone a que diziam respeito as 
 prorrogações.
 E isto porque a reiteração das condutas era mais ou menos óbvia, nada havendo 
 nos autos que indiciasse ou permitisse pressupor a cessação daquela actividade 
 
 (é pelo menos a conclusão a que se chega quando analisados os autos de 
 transcrição). Não se olvide que os campeonatos de futebol em que os escutados 
 intervinham se prolongavam por toda a época desportiva, sendo que tudo isto, 
 associado à particular forma de actuação daqueles, conduzia à inevitável 
 conclusão de que continuava a haver fortes razões para crer que tais condutas se 
 iriam prolongar pelo menos até ao fim de tais campeonatos de futebol (o que só 
 iria ocorrer em Maio de 2004).
 Por outro lado, dos autos (das sessões efectivamente escutadas, que é certo não 
 foram todas) resultava já aquando dos despachos de prorrogação que os 
 utilizadores dos telefones sob intercepção falavam uns com os outros, quer entre 
 telefones interceptados, quer através de telefones fixos ou móveis não 
 interceptados, para telefones interceptados, pelo que ao ouvir as sessões 
 telefónicas referentes a uns facilmente se concluía que havia fortíssimas razões 
 para crer que a prorrogação das intercepções de uns e outros telefones era 
 necessária para os efeitos a que alude a parte final do n.º 1 do art. 187º do 
 CPP.
 Quero com tudo isto dizer que apesar da Meritíssima Juíza de Instrução ter 
 prorrogado prazos de intercepção na ocasião em que ainda não mandara transcrever 
 todas as sessões que lhe haviam sido no mesmo momento apresentadas, o certo é 
 que o resultado das sessões anteriormente escutadas permitia-lhe ter fortes 
 razões para crer que continuava a haver grande interesse para a descoberta da 
 verdade ou para prova na continuação da intercepção do telefone a que dizia 
 respeito a prorrogação.
 Não foram assim, e também por isto, violadas as disposições legais constantes 
 dos arts 187º e 188º do CPP, tal como não se verifica qualquer violação do 
 princípio da proporcionalidade, consagrado no art. 18º da CRP, uma vez que a 
 quantidade de crimes a investigar e a comprovada reiteração das condutas 
 criminosas dos intervenientes legitimava, de forma não desproporcional, a 
 compressão do seu direito à palavra, à reserva da intimidade da vida privada, da 
 correspondência e das telecomunicações – cfr. art. 34º da CRP”.
 
  
 Está, em nosso entender, mais que justificado e fundamentado o facto de ter 
 havido prorrogações de prazos de intercepção sem que, num caso ou outro, 
 tivessem sido ainda ouvidas as escutas imediatamente anteriores.
 Mas, para além da interligação que existia nas várias escutas, como resulta dos 
 autos, devido ao número de escutas a decorrer, por vezes era materialmente 
 impossível à Srª Juíza de instrução, ouvir, “ em tempo útil”, ou seja, antes da 
 necessidade de prorrogação do prazo, todas as escutas.
 Cessar abruptamente uma escuta para a retomar dias depois, não beneficiava de 
 modo algum a investigação, podendo mesmo contribuir para a sua frustração ou 
 inêxito.
 Como bem anota, em nosso entender, o Ministério Público na sua resposta, 
 
 “ O que a data dos despachos, em que a Meritíssima Juiz de Instrução criminal 
 manda transcrever as passagens relevantes, revela é que foi nessa data que a 
 Meritíssima Juiz concluiu a análise (e por isso o conhecimento) de todas as 
 gravações que lhe foram apresentadas, o que significa que nos dias situados 
 entre a apresentação de tais autos de gravação e CDs e a prolação de tais 
 despachos (e não apenas nas datas dos despachos) a Meritíssima Juiz foi 
 analisando e seleccionado as passagens relevantes, tomando, ao longo desses 
 dias, e não apenas no último dia em que proferiu o despacho, conhecimento do 
 conteúdo das gravações apresentadas, tarefa que só concluiu quando datou e 
 assinou os despachos em que mandou transcrever aquelas que entendeu relevantes 
 para a prova. 
 
 …
 Ou seja, muito embora a Meritíssima Juiz de Instrução tenha prorrogado prazos de 
 intercepção na ocasião em que ainda não mandara transcrever as sessões que lhe 
 foram, no mesmo momento, apresentadas, o que é certo é que todo o manancial 
 probatório das sessões anteriormente escutadas permitia-lhe ter fortes razões 
 para crer que continuava a haver grande interesse para a descoberta da verdade 
 ou para prova na continuação da intercepção do telefone a que dizia respeito a 
 prorrogação”.
 A posição do despacho recorrido é inteiramente esclarecedora e merece a nossa 
 concordância, não havendo necessidade de lhe acrescentar ou fundamentar mais o 
 que quer que seja.
 Pelo que também esta questão do recorrente será julgada improcedente.
 
  
 
 4. DO ADITAMENTO AOS AUTOS DE GRAVAÇÃO DE SESSÕES ANTERIORMENTE CONSIDERADAS 
 IRRELEVANTES.
 Insurge-se o recorrente contra o facto de ter havido aditamentos aos autos de 
 gravação de sessões anteriormente consideradas irrelevantes, não tendo sido 
 cumprido logo na altura, o disposto no artigo 188º, nº 3, ordenando a sua 
 destruição.
 A decisão instrutória apreciou a questão começando por citar a jurisprudência do 
 Tribunal Constitucional que no Acórdão nº 426/2005, de 25 de Agosto, decidiu:
 
 “deve ser facultado à defesa (e também à acusação) a possibilidade de requerer a 
 transcrição de mais passagens do que as inicialmente seleccionadas pelo juiz, 
 quer por entenderem que as mesmas assumem relevância própria, quer por se 
 revelarem úteis para esclarecer ou contextualizar o sentido de passagens 
 anteriormente seleccionadas”.
 E continua:
 
 “ …o art. 188º, n.º 3 do CPP não impõe que a ordem de destruição seja dada 
 imediatamente após a primeira selecção, nem resulta da lei que o controlo ou 
 acompanhamento judicial das operações seja posto em causa pelo facto de se vir a 
 seleccionar mais de um ano depois outras sessões que anteriormente se 
 considerara irrelevantes.
 O que se pretende com o controlo ou acompanhamento judicial das operações é 
 propiciar que seja determinada a interrupção da intercepção logo que a mesma se 
 revele desnecessária, desadequada ou inútil e fazer depender a aquisição 
 processual da prova assim obtida de um “crivo” judicial quanto ao seu carácter 
 não proibido e à sua relevância.
 E é este controlo judicial que não é colocado em causa com a posterior selecção 
 de uma passagem considerada anteriormente sem interesse.
 
 …
 No caso dos autos a selecção inicial das passagens relevantes para a prova foi 
 efectuada de facto pela Meritíssima Juíza de Instrução Criminal, que decidiu não 
 mandar destruir as restantes porque poderiam vir a assumir relevância, ainda que 
 em conjugação com outros elementos de prova.
 Posteriormente, já depois de ter sido analisada a prova que veio a ser 
 posteriormente obtida através da apreensão de documentos nas buscas efectuadas 
 em 20/04/2004 e após terem sido levadas a cabo as perícias ordenadas, 
 inquirições e interrogatórios, bem como analisado o teor das transcrições já 
 efectuadas, chegou-se à conclusão de que havia interesse para a prova na 
 transcrição de outras sessões anteriormente não mandadas transcrever.
 Nada na lei proíbe uma tal actuação, nem tal é sinónimo de falta de controlo 
 judicial das intercepções telefónicas efectuadas, tanto mais que se tratou de 
 uma situação excepcional, isto se tivermos em conta o número global de passagens 
 seleccionadas.
 No sentido do que acabo de deixar dito deve ler-se o citado (e seguido de perto) 
 Acórdão n.º 4/2006 do Tribunal Constitucional, que concluiu de forma igual ou 
 idêntica à agora exposta.
 Sucede porém que nos presentes autos foi de facto ordenada a destruição de 
 algumas escutas sem que tenha sido dada a possibilidade aos arguidos de terem 
 acesso ao seu conteúdo. Por via disto, alguns houve que consideraram existir uma 
 nulidade das escutas telefónicas resultante da violação do n.º 3 do art. 188º do 
 CPP (quando interpretado no sentido de que só podem ser mandadas destruir 
 sessões das escutas telefónicas depois de ser facultado aos arguidos o conteúdo 
 das mesmas para, querendo, exercerem o seu direito de defesa) e que uma 
 interpretação da referida norma com sentido diverso é inconstitucional, por 
 violar os art. 32º, n.º 1, 34º, n.º 1 e 4 e 18º, n.º 2 da CRP “[13].
 Esta questão foi igualmente objecto de apreciação pelo Acórdão do Tribunal 
 Constitucional nº 660/06, proferido em 28.11.2006, no âmbito do processo nº 
 
 729/2006, o qual julga “inconstitucional, por violação do art. 32°, n.º 1 da 
 CRP, a norma do art. 188°, n.º 3 do CPP, na interpretação segundo a qual permite 
 a destruição de elementos de prova obtidos mediante a intercepção de 
 telecomunicações, que o órgão de polícia criminal e o Ministério Público 
 conheceram e que são considerados irrelevantes pelo juiz de instrução, sem que o 
 arguido deles tenha conhecimento e sem que se possa pronunciar sobre a sua 
 relevância”.
 
  
 Depois de o Senhor Juiz recorrido ter manifestado a sua discordância pessoal com 
 o teor do mesmo, aderindo sim à posição da Exmª Conselheira Maria Fernanda Palma 
 que lavrou desenvolvido voto de vencido, concluiu na decisão recorrida de acordo 
 com aquela posição: 
 
 “…analisado o ordenamento constitucional e infraconstitucional vigente em 
 Portugal é lícito concluir que embora o Juiz de Instrução possa decidir não 
 destruir as escutas invocando o facto de poderem ter interesse para a prova 
 
 (quer de quem investiga, quer de quem se defende), se inversamente decidir 
 destruir algumas, tal decisão, para além de ser legal – já que o art. 188º, n.º 
 
 3 do CPP não impõe o momento da destruição –, também não viola os direitos de 
 defesa do arguido, e por isso não é inconstitucional (art. 32º, n.º 1 CRP)”.
 
  
 Por sua vez, na sua resposta, também o MP começa por citar a jurisprudência do 
 Tribunal Constitucional que no já referido Acórdão nº 426/2005, de 25 de Agosto, 
 mais decidiu:
 
 “… em rigor, essa selecção dos elementos a transcrever é necessariamente uma 
 primeira selecção, dotada de provisoriedade, podendo vir a ser reduzida ou 
 ampliada. Assiste, na verdade, ao arguido, ao assistente e às pessoas escutadas 
 o direito de examinarem o auto de transcrição, exame que se deve entender não só 
 ser apenas destinado a conferir a conformidade da transcrição com a gravação e 
 exigir a rectificação dos erros de transcrição detectados ou de identificação 
 das vozes gravadas, mas também para reagir contra transcrições proibidas (por 
 exemplo, de conversações do arguido com o defensor) ou irrelevantes. 
 Inversamente, deve ser facultado à defesa (e também à acusação) a possibilidade 
 de requerer a transcrição de mais passagens do que as inicialmente seleccionadas 
 pelo juiz, quer por entenderem que as mesmas assumem relevância própria, quer 
 por se revelarem úteis para esclarecer ou contextualizar o sentido de passagens 
 anteriormente seleccionadas.” 
 Responde ainda o Ministério Público:
 
 “ Ora, se não merece censura constitucional a não desmagnetização da passagens 
 consideradas inicialmente sem interesse para a prova, tal só pode querer 
 significar que podem vir a revelar-se com interesse posteriormente, quer para 
 quem investiga, quer para quem exerce o seu direito de defesa.
 Pelo que, a alegada nulidade das escutas resultante do facto de terem sido 
 seleccionadas sessões telefónicas mais de um ano depois da primeira selecção, 
 com aditamento aos autos de gravação de fls. 429 e 1130, não colhe apoio legal 
 nem constitucional.
 
 …
 Ora, para além de a selecção inicial das passagens relevantes para a prova ter 
 sido, de facto efectuada pela Meritíssima Juiz de Instrução Criminal, ela mesma 
 decidiu não mandar destruir as restantes porque poderiam vir a assumir 
 relevância em conjugação com outros elementos de prova, ou seja, acautelou desde 
 logo a possível relevância. Ou seja, a Meritíssima Juiz não julgou desde logo 
 essas passagens irrelevantes. Acautelou a sua possível relevância.
 E de facto isto veio a verificar-se, já que, após ter sido analisada a prova que 
 veio a ser posteriormente obtida através de apreensão de documentos nas buscas 
 efectuadas em 20/04/2004 e em datas posteriores, e após terem sido levadas a 
 cabo as perícias ordenadas, inquirições e interrogatórios, bem como ao ser 
 conjugada toda essa análise com o teor das transcrições já efectuadas, chegou-se 
 
 à conclusão de que havia interesse para a prova na transcrição de outras sessões 
 anteriormente não mandadas transcrever”.
 
  
 Este entendimento da questão tem o nosso completo acordo.
 Como resulta dos autos, o recorrente censura a posição do juiz de instrução por 
 não ter destruído logo as partes das sessões que não foram consideradas 
 relevantes a quando da sua primeira audição.
 Por sua vez, outros arguidos no processo censuram o mesmo juiz por ter procedido 
 
 à destruição de algumas sessões de gravações!
 
 É mais que justificado afirmar, adaptando aqui um ditado português: censurado 
 por fazer, censurado por não fazer!
 Mas não só a jurisprudência do Tribunal Constitucional tem vindo de encontro à 
 posição adoptada pela juiz de instrução e, consequentemente, à da decisão 
 recorrida, como o legislador veio agora consagrar expressamente, na nova 
 redacção do artigo 188º do Código de Processo Penal, a possibilidade de 
 aditamentos desta natureza[14], bem como veio regular a guarda das gravações até 
 momentos posteriores: até ao trânsito em julgado da decisão quanto aos suportes 
 técnicos referentes a conversações não transcritas (nº 12 do art. 188º ) ou 
 junto ao processo, em envelope lacrado, só podendo ser utilizados em caso de 
 interposição de recurso extraordinário, quanto aos suportes técnicos que não 
 forem destruídos nos termos dos números anteriores (nº 13, do art. 188º ).
 Por todos os fundamentos expostos, improcederá também esta pretensão do 
 recorrente.
 
             (...)”.
 
  
 
             2.4 – Discordando do decidido, o arguido interpôs nos termos supra 
 referidos o presente recurso de constitucionalidade, tendo o mesmo sido admitido 
 pelo Tribunal da Relação.
 
  
 
             2.5 – Já neste Tribunal Constitucional, foi proferido pelo relator o 
 seguinte despacho:
 
                         
 
   “A., melhor identificado nos autos recorre para o Tribunal Constitucional, ao 
 abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de 
 Novembro, na sua actual redacção, pretendendo ver fiscalizada a 
 constitucionalidade das seguintes normas:
 
                     a) “(...) norma extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a 
 quo do artigo 188º, nº 1, do Código de Processo Penal segundo a qual “é no termo 
 de cada período de escuta, e não logo a seguir a cada conversação telefónica 
 interceptada, que deve ser elaborado o auto de gravação com indicação pelo órgão 
 de polícia criminal das passagens relevantes para a prova” é inconstitucional 
 por violação do disposto nos artigos 18º, nº 2 e 3, e 34º, nº 4, da Constituição 
 da República Portuguesa”;
 b) “(...) norma extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo segundo a qual 
 
 “após a alteração legislativa de 2000 a maior complexidade na elaboração do auto 
 de gravação impõe a adopção de critério mais dilatado quanto ao requisito da 
 imediatividade da sua apresentação” é ainda inconstitucional por violação do 
 disposto nos artigos 13º, 18º, nºs 2 e 3, e 34º, nº 4, da Constituição da 
 República Portuguesa”;
 c) “(...) norma extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo do artigo 188º, 
 nº 1, do Código de Processo Penal, segundo a qual o inciso imediatamente deve 
 ser interpretado “dentro das contingências inerentes à complexidade e dimensão 
 do processo”, equivalendo, nessa medida, ao “tempo mais rápido possível” é 
 inconstitucional por violação do disposto nos artigos 18º, nº s 2 e 3, 32º, nº 
 
 1, e 34º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa”; 
 d) “(...) norma extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo do artigo 188º, 
 nº 1 do Código de Processo Penal, segundo a qual, nos casos em que decida 
 proceder pessoalmente à integral audição dos suportes magnéticos que lhe hajam 
 sido entregues, fica ao livre arbítrio do Juiz de Instrução Criminal a 
 determinação do lapso de tempo em que o teor dessas mesmas conversações 
 telefónicas deva ser conhecido”, por violação do disposto nos artigos 18º, nºs 2 
 e 3 e 34º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa; 
 e) “(...) norma extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo dos artigos 
 
 187º, nº 1 e 188º, nº 1, do Código de Processo Penal, segundo a qual “uma vez 
 autorizada a intercepção e gravação por determinado período, pode ser concedida 
 autorização para a sua continuação sem que o juiz tome conhecimento do resultado 
 das anteriores conversações telefónicas interceptadas e gravadas”, por violação 
 dos artigos 32º, nºs 2 e 8, 34º, nº 4, e 18º, nºs 2 e 3 da CRP; e,
 f) “(...) norma extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo do disposto no 
 artigo 188º, nº 3, do Código de Processo Penal, segundo a qual “nada impõe que a 
 ordem de destruição seja dada imediatamente após a primeira selecção, podendo o 
 Juiz aditar aos “autos de gravação” sessões que haja anteriormente considerado 
 irrelevantes para a prova”, por violação das normas dos artigos 32º, nº 1 e 8, 
 
 18º, nº s 2 e 3 e 34º, nº 4, da CRP.
 
 ***
 
             Constituem requisitos essenciais do recurso interposto ao abrigo da 
 alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º, da LTC, que o tribunal recorrido tenha 
 aplicado como ratio decidendi uma norma cuja inconstitucionalidade  tenha sido 
 suscitada de forma adequada durante o processo.
 
             Nestes termos, notifique o recorrente e o recorrido para, no prazo 
 legal, alegar e contra-alegar, respectivamente, bem como para se pronunciarem, 
 querendo, sobre a possibilidade do Tribunal não tomar conhecimento das questões 
 de constitucionalidade constantes das alíneas a), d), e) e f), supra referidas, 
 com base no eventual entendimento de o Tribunal recorrido não ter aplicado, como 
 ratio decidendi, as normas aí impugnadas; bem, ainda, como da questão aqui 
 identificada pela alínea b), neste caso sob o eventual pretexto de o recorrente 
 não ter controvertido a constitucionalidade de uma norma ancorada num preceito 
 de direito positivo, sendo que a identificação da base legal à qual se imputa a 
 norma cuja constitucionalidade se pretende ver apreciada constitui um momento 
 insuprível do controlo de constitucionalidade, na medida em que importa saber se 
 essa base legal elegida para a fiscalização de constitucionalidade se apresenta 
 como idónea a suportar esse sentido (cf., neste sentido, o Acórdão n.º 416/03, 
 publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 57º vol., p. 279)”.
 
  
 
             2.6 – Na sequência, o recorrente apresentou as suas alegações de 
 recurso e formulou as seguintes conclusões:
 
  
 
             “(...)
 
  
 I.                          A norma extraída do artigo 188°, nº 1, do Código de 
 Processo Penal, segundo a qual é “no termo de cada período de escuta, e não logo 
 a seguir a cada conversação telefónica interceptada que deve ser elaborado o 
 auto de gravação com indicação pelo órgão de polícia criminal das passagens 
 relevantes para a prova” é inconstitucional, por violação do disposto nos 
 artigos 18°, nº 2 e 3, e 34°, nº 4, da Constituição da República Portuguesa. 
 II.                       Entende o Recorrente que, contrariamente à questão 
 prévia que o Exmo. Senhor Juiz Conselheiro Relator suscitou, a posição da 
 primeira instância foi sufragada pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto 
 precisamente com base na aplicação da norma acima enunciada; 
 III.                     Considera, pois, o Arguido que a aludida interpretação 
 normativa constitui a “ratio decidendi” da decisão recorrida, sendo certo que aí 
 se diz expressamente que o procedimento adoptado em primeira instância respeitou 
 a exigência contida na lei nos termos em que a interpretou o Tribunal 
 Constitucional nos seus Acórdãos nºs 426/05, 4/96, onde se sustentou 
 precisamente que os autos podem ser apresentados após o “período autorizado de 
 intercepções”. 
 IV.                    Sucede que a norma extraída quer pelo Juiz de Instrução 
 Criminal quer pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto do artigo 188°, nº 1, 
 do Código de Processo Penal, na versão que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei nº 
 
 320-C/2000, é manifestamente inconstitucional, por violar os artigos 18°, nº 2 e 
 
 3, e 34°, nº 4, da Constituição da República Portuguesa. 
 V.                       Apesar de o artigo 188°, nº 1, do Código de Processo 
 Penal, na versão anterior à actualmente vigente, não ser suficientemente 
 esclarecedor quanto ao momento a partir do qual o auto de gravação deve ser 
 lavrado e “imediatamente” levado ao conhecimento do Juiz de Instrução Criminal, 
 o escopo das formalidades prescritas no aludido preceito consiste em acautelar 
 que as operações de escutas telefónicas sejam efectiva e continuadamente 
 acompanhadas pelo Juiz de Instrução Criminal, de modo a que escutas 
 injustificadas ou desnecessárias sejam feitas cessar tão depressa quanto 
 possível (evitando a desnecessária compressão dos direitos fundamentais à 
 palavra, à reserva da intimidade privada e à inviolabilidade das 
 telecomunicações) e a que a aquisição das provas obtidas por esse meio seja 
 submetida a um crivo judicial prévio. 
 VI.                    Atendendo aos direitos fundamentais cuja restrição ao 
 mínimo o “pensamento legislativo” subjacente à regra plasmada no artigo 188°, nº 
 
 1, do Código de Processo Penal visou garantir, o critério interpretativo a 
 adoptar não pode deixar de ser aquele que assegure um maior acompanhamento 
 judicial das operações em que se materializa este especifico meio de obtenção de 
 prova (conforme tem sustentado a jurisprudência do Tribunal Constitucional), 
 VII.                  Critério interpretativo este que terá, necessariamente de 
 passar pela conclusão de que, no decurso do período pelo qual foi autorizada a 
 realização de escutas de telefónicas, devem ser apresentados ao Juiz de 
 Instrução Criminal “autos de gravação” intercalares, procedimento que assegura 
 um maior acompanhamento das operações de escutas do que a mera elaboração de um 
 só auto no “termo do período autorizado” (o que poderia significar a realização 
 de escutas durante três meses sem que as mesmas fossem objecto de qualquer 
 controlo judicial). 
 VIII.               Caso contrário, a regra do artigo 188°, nº 1 do Código de 
 Processo Penal perderia todo o seu efeito útil, pois, nos casos em que o prazo 
 inicialmente concedido para as escutas não fosse objecto de prorrogação, não 
 haveria qualquer acompanhamento judicial contínuo, efectivo e “materialmente 
 próximo da fonte”, mas apenas, um controlo a posteriori. 
 IX.                    O Acórdão nº 4/2006 do Tribunal Constitucional, invocado 
 no aresto recorrido, não só merece a discordância do Recorrente como é contrário 
 
 à posição defendida em muitos outros arestos proferidos por este mesmo Tribunal 
 
 (vide, a título meramente exemplificativo Acórdãos nºs 407/97, 347/2001, 
 
 528/2003, 379/2004, 324/2006, in www.dgsi.pt) e cujas conclusões perpassam todas 
 as alterações legislativas ao aludido normativo, porquanto estas influência 
 alguma tiveram quanto ao esclarecimento da questão da obrigatoriedade da 
 apresentação de autos intercalares. 
 X.                       Por outro lado, caso fosse aplicável ao presente 
 processo a actual redacção do artigo 188º do Código de Processo Penal, seria 
 proibida a utilização de grande parte das conversações telefónicas dos Arguidos 
 B. e C., atenta a redacção do no nº 3 do artigo 188º introduzida pela Lei nº 
 
 48/2007, de 29 de Agosto, porquanto, os respectivos autos de gravação foram 
 levados à Meritíssima Juiz do Tribunal a quo mais de 17 dias depois de terem 
 sido lavrados. 
 XI.                    Ainda que não aplicáveis ao presente processo, as normas 
 que se acham consignadas no actual artigo 188º do Código de Processo Penal, 
 constituem mais um precioso contributo para que este Tribunal forme a sua 
 convicção quanto à inconstitucionalidade da interpretação normativa em que se 
 estriba a decisão que declarou válidas as escutas telefónicas efectuadas aos 
 números de telefone pessoais dos Arguidos C. e A., na medida em que na sua base 
 esteve o labor deste Tribunal que tantas vezes se pronunciou sobre a 
 
 (in)constitucionalidade das diferentes dimensões interpretativas do normativo em 
 apreço e apelou a que fosse assegurado o acompanhamento judicial próximo e 
 efectivo das escutas telefónicas. 
 C.
 
  
 XII.         Quanto à questão colocada no Despacho de dia 9 de Abril de 2008, 
 sobre se a base legal indicada é idónea a suportar o sentido interpretativo cuja 
 inconstitucionalidade se invocou, cumprirá esclarecer que, pese embora a 
 alteração legislativa de 2000, a interpretação normativa que aqui se pretende 
 ver apreciada foi extraída pelo Tribunal a quo do referido artigo 188°, nº 1, do 
 Código de Processo Penal, sendo também com base na regra de que a complexidade 
 
 “na elaboração do auto de gravação impõe a adopção de critério mais dilatado 
 quanto ao requisito da imediatividade da sua apresentação” que o Tribunal a quo 
 valida as escutas efectuadas, em desrespeito pelo teor literal do artigo. 
 XIII.               Acresce que, apesar de os Órgãos de Polícia Criminal terem 
 passado a ter de investir mais tempo na elaboração do competente “auto de 
 gravação”, com a exigência da indicação das passagens da gravação consideradas 
 relevantes, a verdade é que o advérbio “imediatamente” se reporta, não à 
 elaboração do auto, mas antes à sua remessa ao Juiz de Instrução Criminal. 
 XIV.               Assim, razão alguma existe que possa justificar o facto de, 
 uma vez lavrados, os “autos de gravação” não terem sido imediatamente levados ao 
 conhecimento da Meritíssima Juiz do Tribunal de Instrução Criminal de Gondomar, 
 pois tal envio não implicava qualquer outra operação que não fosse a mera 
 elaboração pelo Ministério Público de uma promoção acompanhada dos respectivos 
 autos e dos suportes magnéticos das gravações. 
 XV.                 Deste modo, afastar-se a aplicação do inciso “imediatamente” 
 em prol da “adopção de critério mais dilatado” consubstancia uma interpretação 
 inconstitucional na medida em que dificulta o acompanhamento efectivo e 
 
 “materialmente próximo da fonte” que, de acordo com a posição unanimemente 
 defendida pelo Tribunal Constitucional, deve ser feito pelo Juiz em matéria de 
 escutas telefónicas, implicando ainda a permanência de conversações já 
 interceptadas e gravadas durante longos períodos de tempo sem serem 
 judicialmente conhecidas. 
 XVI.               A falta de imediação judicial pode também conduzir a uma 
 devassa, muito para além do constitucionalmente permitido, dos direitos 
 escutados com a divulgação pública, conforme, como é sabido, também aqui 
 sucedeu, das conversações telefónicas interceptadas. 
 XVII.            Pelo exposto, não pode senão ser considerada inconstitucional, 
 por violação do disposto nos artigos 13°, 18°, nºs 2 e 3, e 34°, nº 4, da 
 Constituição da República Portuguesa, a norma extraída pelo Tribunal a quo do 
 artigo 188°, nº 1, do Código de Processo Penal segundo a qual “após a alteração 
 legislativa de 2000 a maior complexidade na elaboração do auto de gravação impõe 
 a adopção de critério mais dilatado quanto ao requisito da imediatividade da sua 
 apresentação” é ainda inconstitucional. 
 D.
 
  
 XVIII.          A interpretação do artigo 188°, nº 1, do Código de Processo 
 Penal, nos termos da qual, “o inciso imediatamente deve ser interpretado “dentro 
 das contingências inerentes à complexidade e dimensão do processo”, equivalendo, 
 nessa medida, ao “tempo mais rápido possível” é inconstitucional por violação do 
 disposto nos artigos 18°, nºs 2 e 3, 32°, nº 1, e 34°, nº 4, da Constituição da 
 República Portuguesa. 
 XIX.               Sobre esta mesma questão já se pronunciou, por diversas 
 vezes, o Tribunal Constitucional, considerando que a complexidade do processo e 
 a eventual escassez de meios técnicos e humanos a que o douto Acórdão recorrido 
 faz apelo não pode implicar a preterição das formalidades imperativamente 
 prescritas em matéria de escutas telefónicas, atentos os direitos de defesa do 
 arguido que expressamente são consagrados no artigo 32º da CRP, bem como os 
 direitos fundamentais quer do Arguido quer de terceiros coarctados com as 
 escutas telefónica. 
 XX.                 Aliás, tal como no caso apreciado no Acórdão nº 407/97, 
 fazer equivaler o advérbio “imediatamente” ao mais rápido tempo possível veio a 
 significar longos períodos de tempo sem que o teor das conversações 
 interceptadas e gravadas fossem objecto de controlo judicial, tendo o próprio 
 Venerando Tribunal a quo reconhecido, na decisão sub judice, que os 30 a 40 dias 
 que nalguns casos mediaram entre a elaboração do auto de gravação e a sua 
 remessa ao Juiz de Instrução Criminal, no presente processo, se afiguram 
 distantes do conceito de “imediatamente”. 
 XXI.               Atento o exposto, o ónus das dificuldades técnicas e da 
 complexidade do processo não pode, em caso algum, correr por conta do Arguido, 
 devendo, em tais circunstâncias, sacrificar-se a prossecução da investigação e 
 punição do crime em prol dos direitos fundamentais dos Arguidos e todas as 
 demais pessoas que, por essa via, são também escutadas. 
 E. 
 
  
 XXII.      Deverá considerar-se inconstitucional, por violação do disposto nos 
 artigos 18°, nºs 2 e 3 e 34°, nº 4 da Constituição da República Portuguesa, a 
 norma extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal de Instrução Criminal de 
 Gondomar e confirmada pelo Tribunal a quo, do artigo 188°, nº 1 do Código de 
 Processo Penal, segundo a qual, “nos casos em que decida proceder pessoalmente à 
 integral audição dos suportes magnéticos que lhe hajam sido entregues, fica ao 
 livre arbítrio do Juiz de Instrução Criminal a determinação do lapso de tempo em 
 que o teor dessas mesmas conversações telefónicas interceptadas deva ser 
 conhecido”. 
 XXIII.          Desde logo, respondendo ao convite que lhe foi endereçado pelo 
 Exmo. Senhor Juiz Relator, caberá ao Recorrente referir que também a 
 interpretação normativa acima enunciada constitui ratio decidendi do Acórdão 
 recorrido, na medida em que o Venerando Tribunal da Relação do Porto alicerça a 
 sua posição no facto de a Meritíssima Juiz de Instrução Criminal ter procedido à 
 audição de todas as gravações interceptadas (fls. 26939) e na ilação de que “tal 
 procedimento foi o mais adequado a um efectivo controlo das operações” (fls. 
 
 26942). 
 XXIV.         Semelhantes elementos apontam para uma conclusão decisória segunda 
 a qual existiu um acompanhamento judicial das operações em que se materializam 
 as escutas pela audição pessoal das mesmas, não obstante não ter sido 
 rigorosamente respeitado o inciso imediatamente consagrado no artigo 188°, nº 1, 
 do Código de Processo Penal. 
 XXV.            No que concerne à inconstitucionalidade da interpretação ora em 
 apreço, saliente-se, desde logo, que atendendo ao elevado número de arguidos que 
 se encontravam “sob escuta” e ao tempo que necessariamente implicaria a integral 
 audição das mesmas, deveria a Meritíssima Juiz de Instrução Criminal ter 
 
 “lançado mão” do mecanismo previsto no artigo 188, nº 4, do Código de Processo 
 Penal (criado justamente para agilizar o acompanhamento próximo e efectivo das 
 escutas telefónicas pelo Juiz) ao invés de promover um enorme desfasamento entre 
 as conversações interceptadas e já gravadas e a sua apreciação do teor das 
 mesmas (como resulta dos despachos de fls. 1110 e seguintes, 1266 e seguintes, 
 
 1571 e seguintes, 1648 e seguintes e 1872 e seguintes, nos quais a Meritíssima 
 Juiz de Instrução Criminal pronuncia-se, não sobre a “Promoção” do Ministério 
 Público que mais recentemente lhe havia sido remetida, mas sobre promoções bem 
 mais antigas). 
 XXVI.         Aliás, o próprio Tribunal Constitucional, já considerou por várias 
 vezes que a audição pessoal pelo Juiz da totalidade das gravações não é o único 
 método constitucionalmente admissível de se efectivar o acompanhamento judicial 
 das operações em que se materializam as escutas telefónicas. 
 XXVII.       Ora, se a Meritíssima Juiz do Tribunal de Instrução Criminal de 
 Gondomar não se socorreu, como podia e deveria ter feito, daquele auxílio, não 
 pode o Tribunal a quo valer-se do tempo que sempre demora ouvir pessoalmente as 
 gravações para com isso justificar os graves e excessivos atrasos registados 
 entre a gravação das conversas interceptadas e o seu controlo e (falta de) 
 acompanhamento judiciais. 
 XXVIII.    Dando aqui por reproduzido o que se aduziu em pontos anteriores da 
 presente peça processual sobre os direitos fundamentais atingidos pelas escutas 
 telefónicas e sobre a necessidade de ponderação entre essa restrição e os fins 
 da investigação criminal, não poderá a interpretação da norma ora posta em crise 
 deixar de ser considerada inconstitucional atenta (também) a violação do 
 princípio da proporcionalidade que nesta matéria deverá reger. 
 F. 
 
  
 XXIX.         Deverá ainda este Tribunal julgar inconstitucional, por violação 
 dos artigos 32°, nºs 2 e 8, 34°, nº 4 e 18°, nºs 2 e 3 da CRP, a norma extraída 
 pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo dos artigos 187°, nº 1 e 188°, nº 1 do 
 Código de Processo Penal, segundo a qual uma vez autorizada a intercepção e 
 gravação por determinado período, pode ser concedida autorização para a sua 
 continuação sem que o juiz tome conhecimento do resultado das anteriores 
 conversações telefónicas interceptadas e gravadas”. 
 XXX.            Com efeito, é na aludida interpretação do artigo 188°, nº 1 do 
 Código de Processo Penal que o Tribunal a quo – conquanto reconhece 
 expressamente que as sucessivas prorrogações dos prazos de intercepção e 
 gravação das conversações telefónicas dos Arguidos que tiveram “sob escuta” 
 foram ordenadas sem que previamente a Meritíssima Juiz do Tribunal de Instrução 
 Criminal de Gondomar tivesse tomado conhecimento de comunicações anteriormente 
 interceptadas – se alicerça para indeferir a nulidade das escutas. 
 XXXI.         E tanto assim é que no douto Acórdão recorrido se citam, a esse 
 propósito, os excertos do douto Despacho de Pronúncia em que tal interpretação é 
 desenvolvida e explicada, acrescentando-se apenas, e na esteira do que havia já 
 sido propugnado pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal de Instrução Criminal de 
 Gondomar, que “todo o manancial probatória das sessões anteriormente escutadas 
 permitia” ao Juiz que ordenou as escutas “ter fortes razões para crer que 
 continuava a haver grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova 
 na continuação da intercepção do telefone a que dizia respeito a prorrogação”. 
 XXXII.       Uma vez que a Meritíssima Juiz do Tribunal de Instrução Criminal de 
 Gondomar não tinha ainda tomado conhecimento do teor de todas as conversações 
 telefónicas interceptadas, limitou-se a acolher o que lhe havia sido sugerido 
 pelo Ministério Público, dando uma autorização meramente formal, e não válida e 
 devidamente fundamentada, às requeridas prorrogações dos prazos das escutas. 
 XXXIII.    O legislador ordinário, na densificação do artigo 34°, n°4 da CRP 
 procurou dotar a realização das operações inerentes às escutas telefónicas de um 
 conjunto de formalidades que permitissem ao Juiz de Instrução Criminal exercer 
 um controlo efectivo e “materialmente próximo da fonte” deste especifico meio de 
 prova, o que implica que a prorrogação do prazo pelo qual foi inicialmente 
 autorizada a realização de escutas telefónicas seja seguida da tomada de 
 conhecimento, pelo Juiz de Instrução Criminal do teor de todas as conversações 
 telefónicas já interceptadas e gravadas pelos Órgãos de Polícia Criminal. 
 XXXIV.    Sem conhecer todas as conversas que haviam sido já gravadas, não podia 
 a Meritíssima Juiz do Tribunal de Instrução Criminal presumir, em face do teor 
 daquelas que havia já ouvido, que a conduta criminosa iria continuar e que, por 
 isso, se afigurava plenamente justificada a prorrogação de prazo de intercepção 
 e gravação das comunicações telefónicas dos Arguidos. 
 XXXV.      Além de consubstanciar uma inconstitucional e, nessa medida, 
 inadmissível restrição dos direitos das pessoas “escutadas”, o entendimento 
 propugnado pelo Tribunal a quo em prol da validade dos despachos de prorrogação 
 e intercepção que se lhe seguiram colide, além de com os direitos acima 
 referidos, com a garantia da presunção de inocência, na medida em que 
 poder-se-ia ter dado o caso de qualquer dos Arguidos decidir, a dada altura, não 
 mais continuar a actividade que estava a ser investigada no âmbito do inquérito, 
 o que o Juiz de Instrução sempre ignoraria se não conhecesse o teor das 
 conversações telefónicas interceptadas e já gravadas. 
 XXXVI.    Ora, sendo o “auto de gravação” omisso quanto aos factos que 
 resultavam das conversações telefónicas gravadas e não tendo sequer a 
 Meritíssima Juiz de Instrução Criminal recorrido aos Órgãos de Polícia Criminal 
 para saber, ainda que de forma resumida, o teor das conversações telefónicas 
 interceptadas e gravadas, nada poderia saber quanto ao conteúdo dessas mesmas 
 conversações telefónicas, pelo que se limitou a confiar no juízo que os Órgãos 
 de Polícia Criminal e o próprio Ministério Público fizeram acerca da necessidade 
 da manutenção das escutas. 
 XXXVII. Por outro lado, é também destituído de sentido o argumento de segundo o 
 qual a circunstância de os campeonatos de futebol em que os Arguidos intervinham 
 se prolongar por toda a época desportiva levar a presumir que a actividade 
 criminosa continuaria até que terminasse aquele evento desportivo, pois tal, no 
 extremo, legitimaria 10 meses de escutas telefónicas sem qualquer acompanhamento 
 judicial. 
 XXXVIII.                       Foi já firmada jurisprudência neste Tribunal no 
 sentido de que a interpretação do artigo 188°, nº 1 do Código de Processo Penal 
 nos termos da qual, uma vez autorizada a intercepção e gravação por determinado 
 período, pode ser concedida autorização para a sua continuação sem que o juiz 
 tome conhecimento do resultado das anteriores conversações é inconstitucional. 
 XXXIX.    Acresce ainda que no mesmo Despacho (fls. 1095 e seguintes) em que 
 foram decididas novas prorrogações dos prazos das escutas ao seu telemóvel 
 pessoal e ao do Arguido, C., a Meritíssima do Tribunal de Instrução Criminal de 
 Gondomar entendeu não autorizar a prorrogação requerida relativamente às escutas 
 de outros Arguidos, alegando, justamente que não podia tomar tal decisão 
 porquanto não havia ainda conhecido de todas as conversações telefónicas 
 anteriormente gravadas. 
 XL.                  É, pois, firme convicção do Arguido que outra decisão não 
 poderá este Tribunal adoptar que não seja a de considerar inconstitucional, por 
 violação dos artigos 32°, nºs 2 e 8, 34°, nº 4 e 18°, nºs 2 e 3 da CRP, a norma 
 que Tribunal a quo extraiu dos artigos 187°, nº 1 e 188°, nº 1 do Código de 
 Processo Penal, para julgar válidas as escutas telefónicas realizadas durante as 
 prorrogações que foram ordenadas sem que previamente tivessem sido judicialmente 
 conhecidas o teor das conversações interceptadas e já gravadas. 
 
 (...)”.
 
  
 
             2.7 – Por seu turno, o representante do Ministério Público 
 contra-alegou concluindo que:
 
 “(...)
 
 1. Porque o recorrente nas alegações apresentadas neste Tribunal nada disse 
 quanto à questão de constitucionalidade que vinha enunciada na alínea f) do 
 despacho do Excelentíssimo Senhor Relator que delimitou o objecto do recurso, 
 não deve tal questão integrar esse mesmo objecto.
 
 2. Por não estarem reunidos todos os requisitos e pressupostos, não deverá 
 conhecer-se do objecto do recurso relativamente às questões de 
 constitucionalidade referidas nas alíneas a), b), d) e e) daquele mesmo 
 despacho.
 
 3. A conhecer-se, e uma vez que as normas em causa na dimensão efectivamente 
 aplicada não violam qualquer princípio ou preceito constitucional, não devem as 
 mesmas ser julgadas inconstitucionais.  
 
 4. Desde que se verifique que tenha havido um controlo judicial eficaz das 
 interferências nas comunicações – como sucedeu no caso dos autos – a norma do 
 artigo 188º, nº 1, do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual 
 o inciso imediatamente deve ser interpretado “dentro das contingências inerentes 
 
 à complexidade e dimensão do processo”, equivalendo nessa medida “ao tempo mais 
 rápido possível” não é inconstitucional.
 
 5. Termos em que não deverá proceder o presente recurso”.
 
  
 
             
 Cumpre agora julgar.
 
  
 
  
 
  
 B – Fundamentação
 
  
 
  
 
 3 – Em primeiro lugar, importa considerar a “questão prévia” relativa ao não 
 conhecimento do recurso de constitucionalidade quanto às seguintes normas: [a)] 
 
 “norma extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo do artigo 188º, nº 1, do 
 Código de Processo Penal segundo a qual é no termo de cada período de escuta, e 
 não logo a seguir a cada conversação telefónica interceptada, que deve ser 
 elaborado o auto de gravação com indicação pelo órgão de polícia criminal das 
 passagens relevantes para a prova”; [b)] “norma extraída pelo Meritíssimo Juiz 
 do Tribunal a quo segundo a qual após a alteração legislativa de 2000 a maior 
 complexidade na elaboração do auto de gravação impõe a adopção de critério mais 
 dilatado quanto ao requisito da imediatividade da sua apresentação”; [c)] “norma 
 extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo do artigo 188º, nº 1 do Código 
 de Processo Penal, segundo a qual, nos casos em que decida proceder pessoalmente 
 
 à integral audição dos suportes magnéticos que lhe hajam sido entregues, fica ao 
 livre arbítrio do Juiz de Instrução Criminal a determinação do lapso de tempo em 
 que o teor dessas mesmas conversações telefónicas deva ser conhecido”; [d)] 
 
 “norma extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo dos artigos 187º, nº 1 e 
 
 188º, nº 1, do Código de Processo Penal, segundo a qual uma vez autorizada a 
 intercepção e gravação por determinado período, pode ser concedida autorização 
 para a sua continuação sem que o juiz tome conhecimento do resultado das 
 anteriores conversações telefónicas interceptadas e gravadas”; e, finalmente, 
 
 [e)] “norma extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo do disposto no 
 artigo 188º, nº 3, do Código de Processo Penal, segundo a qual nada impõe que a 
 ordem de destruição seja dada imediatamente após a primeira selecção, podendo o 
 Juiz aditar aos “autos de gravação” sessões que haja anteriormente considerado 
 irrelevantes para a prova”.
 Como se deixou consignado no despacho que equacionou a possibilidade do Tribunal 
 não tomar conhecimento do recurso quanto a essas normas, a questão decidenda diz 
 respeito a saber se as normas supra transcritas sob as alíneas a), c), d) e e) 
 foram, ou não, aplicadas como ratio decidendi do acórdão recorrido, e, quanto à 
 norma referida em b), se a questão de constitucionalidade foi adequadamente 
 suscitada pelo facto do recorrente não ter controvertido perante o tribunal a 
 quo a constitucionalidade de uma norma ancorada num preceito de direito 
 positivo.
 Começando pela análise do primeiro fundamento, importa começar por referir que 
 um dos pressupostos determinantes da admissibilidade do recurso interposto ao 
 abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, consiste na 
 exigência de que a norma constitucionalmente censurada tenha constituído ratio 
 decidendi do juízo recorrido, pois só nessa circunstância terá a decisão do 
 Tribunal Constitucional a possibilidade de projectar-se no caso sub judicio, 
 sendo certo que, como se afirmou no Acórdão n.º 112/84, o Tribunal 
 Constitucional, enquanto “(...) órgão jurisdicional, nunca age, nem pode aceitar 
 agir, como se fosse um órgão consultivo em matéria jurisdicional (...), toda e 
 qualquer apreciação e declaração de inconstitucionalidade de uma norma não pode 
 deixar de produzir efeito no caso sub judice; não pode, e não deve, com efeito, 
 o Tribunal Constitucional, pronunciar-se sobre «pleitos puramente teóricos ou 
 académicos» (cf. Acórdão n.º 149 da Comissão Constitucional)”, o que sucederia, 
 inequivocamente, em todas as situações onde a formulação de um juízo de 
 constitucionalidade sobre determinada norma não se viesse a repercutir na 
 decisão recorrida porque o critério legal em crise não foi, afinal, aplicado ao 
 caso concreto como ratio decidendi do juízo proferido.
 
  
 
 3.1 – Perscrutados os fundamentos da decisão recorrida, pode verificar-se que a 
 
 “norma (...) do artigo 188º, nº 1, do Código de Processo Penal segundo a qual é 
 no termo de cada período de escuta, e não logo a seguir a cada conversação 
 telefónica interceptada, que deve ser elaborado o auto de gravação com indicação 
 pelo órgão de polícia criminal das passagens relevantes para a prova”, não foi 
 aplicada, na dimensão normativa questionada, como ratio decidendi do acórdão do 
 Tribunal da Relação do Porto.
 Tal proposição é confirmada pelo excerto da decisão relativo à matéria 
 circunstancialmente em causa, podendo aí ler-se o seguinte:
 
  
 
 “(...)
 Se atentarmos bem na análise dos mapas de fls. 5929 e seguintes que registam as 
 datas dos autos de gravação das escutas e as datas da sua apresentação ao JIC, 
 verificamos que em muitas situações a entidade encarregada de executar as ditas 
 gravações, optou por apresentar ao Jic, na mesma data, autos de gravações de 
 datas diferentes, ou seja, foi procedendo a várias gravações e só findo 
 determinado período de gravação é que a apresentou. Veja-se, por exemplo, a fls. 
 
 5930, em que no dia 20 de Agosto de 2003, foram apresentadas as gravações dos 
 dias 16, 24 e 31 de Julho e 8 e 18 de Agosto de 2003. E a fls. 5933 e seguintes 
 em que no dia 12 de Dezembro de 2003 foram apresentadas ao Jic as gravações dos 
 dias 6, 12, 17, 21 e 24 de Novembro e 3 de Dezembro de 2003.
 
  
 
             Pelo que faz todo o sentido o afirmado pelo Ministério Público na 
 sua resposta, ao dizer:
 
             “ Exigir que os órgãos de polícia criminal procedessem às gravações 
 
 à medida que fossem fazendo as intercepções e lavrassem logo os respectivos 
 autos de gravação e os entregassem imediatamente à juiz após a elaboração de 
 cada um deles, como parece querer sustentar o arguido a fls. 33, seria, isso 
 sim, um verdadeiro descontrolo das intercepções, não só para a Polícia 
 Judiciária, mas sobretudo para a Juiz que as autorizou, pois que cada Alvo 
 tinha, no período autorizado, vários autos de gravação, com dezenas e até 
 centenas de sessões cada um, e eram vários Alvos (telefones) interceptados. Isso 
 sim colocaria em perigo os direitos dos arguidos, pois levaria à confusão total 
 sem garantia do que quer fosse. 
 
 …
 Por isso a tese defendia pelo arguido a fls. 9 a 14, 23 e 33 da sua motivação de 
 recurso, de que “imediatamente” terá de ser interpretado no seu sentido literal, 
 e de que se deveria ter procedido a gravações à medida que fossem interceptadas 
 as conversações, devendo ser lavrado o respectivo auto de gravação que seria 
 levado imediatamente ao conhecimento da juiz, traduzir-se-ia numa total anarquia 
 em termos de controlo judicial das escutas…
 O procedimento adoptado de gravar várias conversações interceptadas, num mesmo 
 CD, elaborar os correspondentes autos de gravação e de juntar vários autos de 
 gravação para os levar ao conhecimento da Juiz, respeitou a exigência contida na 
 lei, nos termos em que a interpretou o Tribunal Constitucional nos seus Acórdãos 
 nºs 426/05, 4/06, onde se admite que tais autos possam ser apresentados 
 imediatamente após o período autorizado de intercepções (o que neste caso foi 
 mais que cumprido pois foram apresentados autos intercalares)”. 
 
  
 Daqui resulta, pois, que apesar dos autos de gravação não terem sido elaborados 
 após cada conversação interceptada, o certo é que foram realizados antes do 
 termo de cada período autorizado e levados ao conhecimento do juiz através da 
 apresentação de autos intercalares.
 De resto, como faz notar o representante do Ministério Público junto deste 
 Tribunal, é paradigmática a resposta dada por esta entidade na resposta à 
 motivação do recurso interposto para a Relação na parte em que controverte a 
 alegada inconstitucionalidade denunciando que “nos presentes autos nada disso se 
 passou, dado que os referidos autos de intercepção e gravação, sempre foram 
 apresentados ao Juiz de Instrução Criminal, com os CDs, em períodos que andaram, 
 no início entre 2 a 6 dias (quando havia poucos alvos interceptados), depois, à 
 volta dos 10 a 15 dias e, nalguns casos, à volta dos 30 dias (quando já havia 
 muitos mais alvos interceptados), sendo certo que nestes casos de maior dilação 
 os prazos de autorização de intercepção eram de 60 a 90 dias”.
 Não se olvidará, decerto, que a decisão em causa considera admissível que os 
 autos de intercepção e gravação possam ser apresentados após o período 
 autorizado das intercepções. Contudo, atenta a realidade valorada em juízo, essa 
 menção, apenas releva enunciativamente – a maiori ad minus – ao nível da 
 configuração dos limites de validade da actuação judicial, ficando a norma 
 aplicada aquém desse critério, sendo incontornável que esse arrimo metodológico 
 acaba por precipitar-se num concreto resultado interpretativo, que, pela sua 
 autonomia normativa e em face do pedaço de realidade nele vertido, não pode 
 considerar-se coincidente com norma erigida em objecto do recurso de 
 constitucionalidade, nele se afirmando um critério diferenciado em função do 
 momento em que os autos foram realizados e levados ao conhecimento do juiz.
 Por essa razão, qualquer que fosse o julgamento em matéria de 
 constitucionalidade o mesmo não teria a virtualidade de implicar a alteração do 
 juízo da Relação, que sempre se manteria incólume à decisão do Tribunal 
 Constitucional uma vez que a interpretação questionada do artigo 188.º, n.º 1, 
 do Código de Processo Penal, no sentido de que os autos de gravação podem ser 
 elaborados após o termo de cada período de escutas, não corresponde à ratio 
 decidendi sufragada pelo Tribunal da Relação, na medida em que, como se valorou, 
 os autos foram elaborados antes do termo desse período.
 Assim sendo, não se conhecerá do recurso de constitucionalidade quanto a tal 
 norma.
 
  
 
 3.2 – Mutatis mutandis, o mesmo poderá dizer-se em relação à “norma extraída 
 pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo do artigo 188º, nº 1 do Código de 
 Processo Penal, segundo a qual, nos casos em que decida proceder pessoalmente à 
 integral audição dos suportes magnéticos que lhe hajam sido entregues, fica ao 
 livre arbítrio do Juiz de Instrução Criminal a determinação do lapso de tempo em 
 que o teor dessas mesmas conversações telefónicas deva ser conhecido”.
 De modo a superar o carácter prolixo da formulação literal da norma supra 
 referida, considerem-se as alegações do recorrente na parte pertinente à questão 
 
 (conclusões XXIII a XXVIII):
 
  
 
 “(...) Desde logo, respondendo ao convite que lhe foi endereçado pelo Exmo. 
 Senhor Juiz Relator, caberá ao Recorrente referir que também a interpretação 
 normativa acima enunciada constitui ratio decidendi do Acórdão recorrido, na 
 medida em que o Venerando Tribunal da Relação do Porto alicerça a sua posição no 
 facto de a Meritíssima Juiz de Instrução Criminal ter procedido à audição de 
 todas as gravações interceptadas (fls. 26939) e na ilação de que “tal 
 procedimento foi o mais adequado a um efectivo controlo das operações” (fls. 
 
 26942). 
 Semelhantes elementos apontam para uma conclusão decisória segunda a qual 
 existiu um acompanhamento judicial das operações em que se materializam as 
 escutas pela audição pessoal das mesmas, não obstante não ter sido rigorosamente 
 respeitado o inciso imediatamente consagrado no artigo 188°, nº 1, do Código de 
 Processo Penal. 
 No que concerne à inconstitucionalidade da interpretação ora em apreço, 
 saliente-se, desde logo, que atendendo ao elevado número de arguidos que se 
 encontravam “sob escuta” e ao tempo que necessariamente implicaria a integral 
 audição das mesmas, deveria a Meritíssima Juiz de Instrução Criminal ter 
 
 “lançado mão” do mecanismo previsto no artigo 188, nº 4, do Código de Processo 
 Penal (criado justamente para agilizar o acompanhamento próximo e efectivo das 
 escutas telefónicas pelo Juiz) ao invés de promover um enorme desfasamento entre 
 as conversações interceptadas e já gravadas e a sua apreciação do teor das 
 mesmas (como resulta dos despachos de fls. 1110 e seguintes, 1266 e seguintes, 
 
 1571 e seguintes, 1648 e seguintes e 1872 e seguintes, nos quais a Meritíssima 
 Juiz de Instrução Criminal pronuncia-se, não sobre a “Promoção” do Ministério 
 Público que mais recentemente lhe havia sido remetida, mas sobre promoções bem 
 mais antigas). 
 Aliás, o próprio Tribunal Constitucional, já considerou por várias vezes que a 
 audição pessoal pelo Juiz da totalidade das gravações não é o único método 
 constitucionalmente admissível de se efectivar o acompanhamento judicial das 
 operações em que se materializam as escutas telefónicas. 
 Ora, se a Meritíssima Juiz do Tribunal de Instrução Criminal de Gondomar não se 
 socorreu, como podia e deveria ter feito, daquele auxílio, não pode o Tribunal a 
 quo valer-se do tempo que sempre demora ouvir pessoalmente as gravações para com 
 isso justificar os graves e excessivos atrasos registados entre a gravação das 
 conversas interceptadas e o seu controlo e (falta de) acompanhamento judiciais. 
 Dando aqui por reproduzido o que se aduziu em pontos anteriores da presente peça 
 processual sobre os direitos fundamentais atingidos pelas escutas telefónicas e 
 sobre a necessidade de ponderação entre essa restrição e os fins da investigação 
 criminal, não poderá a interpretação da norma ora posta em crise deixar de ser 
 considerada inconstitucional atenta (também) a violação do princípio da 
 proporcionalidade que nesta matéria deverá reger”. 
 
  
 Daqui se depreende que, na óptica do recorrente, a norma cuja 
 constitucionalidade se pretende ver sindicada acaba por radicar num juízo 
 conclusivo consequencialmente formulado a partir do facto do juiz de instrução 
 ter decidido pela audição pessoal da totalidade das gravações sem mobilizar, 
 para tal, o expediente previsto no artigo 188.º, n.º 4, do Código de Processo 
 Penal, extraindo a partir daí a inconstitucionalidade do n.º 1 desse mesmo 
 preceito legal. 
 Em face de tal argumentação e do correspondente recorte da questão de 
 constitucionalidade, resulta claro que a norma em causa não foi aplicada como 
 ratio decidendi pelo acórdão recorrido.
 Uma primeira razão, especificamente atinente ao controvertido período temporal, 
 prende-se com o facto do Tribunal a quo ter excluído a realidade em causa da 
 esfera da aplicação da hipótese prevista na norma impugnada considerando que 
 essa norma se refere ao lapso temporal circunscrito entre a elaboração do auto 
 de gravação e a sua apresentação ao juiz e “não ao tempo que medeia a elaboração 
 de tal auto e a audição e a ordem de transcrição”, o que apenas pode significar 
 que o controlo material da esfera temporal em que estas operações são 
 realizadas, com ou sem coadjuvação dos órgãos de policia criminal, terá 
 forçosamente de ser fundado na norma que se refere à realização dos referidos 
 actos e ao modus em que os mesmos podem ter lugar, não podendo ignorar-se que o 
 pressuposto em que se estriba a imputação da inconstitucionalidade se refere 
 expressamente às condições em que se desenvolve a mencionada actividade 
 jurisdicional e que se encontram estabelecidas nos nºs 3 e 4 do artigo 188.º do 
 Código de Processo Penal.
 Por esse motivo, a ratio decidendi sufragada pela Relação não poderia 
 considerar-se referida ao n.º 1 desse preceito.
 Por outro lado e em todo o caso, atendendo à valoração presente no acórdão 
 recorrido, não se vislumbra que a decisão haja sufragado a possibilidade de 
 deixar ao “livre arbítrio” do juiz a determinação do momento em que este deva 
 tomar conhecimento do teor das conversações gravadas, sendo notório, face ao 
 circunstancialismo emergente dos autos, que esse lapso temporal não resultou de 
 qualquer subjectividade do decidente, mas fora determinado por factores 
 objectivos, tais com a complexidade das operações em causa e a densidade do 
 controlo sobre elas exercido.
 Não se ignora, relativamente a este último aspecto, que o recorrente contestou o 
 facto do juiz não ter “lançado mão” do mecanismo previsto no artigo 188, nº 4, 
 do Código de Processo Penal, que admite a possibilidade do “juiz pode[r] ser 
 coadjuvado, quando entender conveniente, por órgão de policia criminal (...)”, 
 optando, ao invés, por proceder à audição pessoal de todas as gravações 
 autorizadas.
 Todavia, cumpre anotar que o recorrente não sindicou sub species constitutionis 
 a validade desse critério que serve de base normativa justificadora da referida 
 opção e a partir do qual se julgou adequado o procedimento de controlo das 
 operações.
 Destarte, em face do exposto, não se tomará conhecimento do recurso de 
 constitucionalidade na parte em questão.
 
  
 
 3.3 – Considere-se agora a hipótese relativa à “norma (...) dos artigos 187º, nº 
 
 1 e 188º, nº 1, do Código de Processo Penal, segundo a qual uma vez autorizada a 
 intercepção e gravação por determinado período, pode ser concedida autorização 
 para a sua continuação sem que o juiz tome conhecimento do resultado das 
 anteriores conversações telefónicas interceptadas e gravadas”.
 Sobre essa matéria, o Tribunal da Relação pronunciou-se do seguinte modo:
 
 “(...)
 O recorrente coloca o acento tónico desta questão no facto de ter havido 
 autorização de prorrogações do prazo de intercepção e gravação das suas 
 comunicações telefónicas sem que a Meritíssima Juiz do Tribunal de Instrução 
 Criminal tivesse tomado conhecimento do teor de todas as conversações 
 anteriormente interceptadas.
 Decidiu-se no tribunal recorrido:
 
 “Ainda assim importa acrescentar que as conversações que a Meritíssima Juíza de 
 Instrução Criminal já tinha ouvido e ordenado a sua transcrição quando decidiu 
 proferir os despachos de prorrogação agora colocados em crise permitiram-lhe 
 concluir no sentido do grande interesse para a descoberta da verdade ou para a 
 prova na continuação da intercepção do telefone a que diziam respeito as 
 prorrogações.
 E isto porque a reiteração das condutas era mais ou menos óbvia, nada havendo 
 nos autos que indiciasse ou permitisse pressupor a cessação daquela actividade 
 
 (é pelo menos a conclusão a que se chega quando analisados os autos de 
 transcrição). Não se olvide que os campeonatos de futebol em que os escutados 
 intervinham se prolongavam por toda a época desportiva, sendo que tudo isto, 
 associado à particular forma de actuação daqueles, conduzia à inevitável 
 conclusão de que continuava a haver fortes razões para crer que tais condutas se 
 iriam prolongar pelo menos até ao fim de tais campeonatos de futebol (o que só 
 iria ocorrer em Maio de 2004).
 Por outro lado, dos autos (das sessões efectivamente escutadas, que é certo não 
 foram todas) resultava já aquando dos despachos de prorrogação que os 
 utilizadores dos telefones sob intercepção falavam uns com os outros, quer entre 
 telefones interceptados, quer através de telefones fixos ou móveis não 
 interceptados, para telefones interceptados, pelo que ao ouvir as sessões 
 telefónicas referentes a uns facilmente se concluía que havia fortíssimas razões 
 para crer que a prorrogação das intercepções de uns e outros telefones era 
 necessária para os efeitos a que alude a parte final do n.º 1 do art. 187º do 
 CPP.
 Quero com tudo isto dizer que apesar da Meritíssima Juíza de Instrução ter 
 prorrogado prazos de intercepção na ocasião em que ainda não mandara transcrever 
 todas as sessões que lhe haviam sido no mesmo momento apresentadas, o certo é 
 que o resultado das sessões anteriormente escutadas permitia-lhe ter fortes 
 razões para crer que continuava a haver grande interesse para a descoberta da 
 verdade ou para prova na continuação da intercepção do telefone a que dizia 
 respeito a prorrogação.
 Não foram assim, e também por isto, violadas as disposições legais constantes 
 dos arts 187º e 188º do CPP, tal como não se verifica qualquer violação do 
 princípio da proporcionalidade, consagrado no art. 18º da CRP, uma vez que a 
 quantidade de crimes a investigar e a comprovada reiteração das condutas 
 criminosas dos intervenientes legitimava, de forma não desproporcional, a 
 compressão do seu direito à palavra, à reserva da intimidade da vida privada, da 
 correspondência e das telecomunicações – cfr. art. 34º da CRP”.
 
  
 Está, em nosso entender, mais que justificado e fundamentado o facto de ter 
 havido prorrogações de prazos de intercepção sem que, num caso ou outro, 
 tivessem sido ainda ouvidas as escutas imediatamente anteriores.
 Mas, para além da interligação que existia nas várias escutas, como resulta dos 
 autos, devido ao número de escutas a decorrer, por vezes era materialmente 
 impossível à Srª Juíza de instrução, ouvir, “ em tempo útil”, ou seja, antes da 
 necessidade de prorrogação do prazo, todas as escutas.
 Cessar abruptamente uma escuta para a retomar dias depois, não beneficiava de 
 modo algum a investigação, podendo mesmo contribuir para a sua frustração ou 
 inêxito.
 Como bem anota, em nosso entender, o Ministério Público na sua resposta, 
 
 “ O que a data dos despachos, em que a Meritíssima Juiz de Instrução criminal 
 manda transcrever as passagens relevantes, revela é que foi nessa data que a 
 Meritíssima Juiz concluiu a análise (e por isso o conhecimento) de todas as 
 gravações que lhe foram apresentadas, o que significa que nos dias situados 
 entre a apresentação de tais autos de gravação e CDs e a prolação de tais 
 despachos (e não apenas nas datas dos despachos) a Meritíssima Juiz foi 
 analisando e seleccionado as passagens relevantes, tomando, ao longo desses 
 dias, e não apenas no último dia em que proferiu o despacho, conhecimento do 
 conteúdo das gravações apresentadas, tarefa que só concluiu quando datou e 
 assinou os despachos em que mandou transcrever aquelas que entendeu relevantes 
 para a prova. 
 
 …
 Ou seja, muito embora a Meritíssima Juiz de Instrução tenha prorrogado prazos de 
 intercepção na ocasião em que ainda não mandara transcrever as sessões que lhe 
 foram, no mesmo momento, apresentadas, o que é certo é que todo o manancial 
 probatório das sessões anteriormente escutadas permitia-lhe ter fortes razões 
 para crer que continuava a haver grande interesse para a descoberta da verdade 
 ou para prova na continuação da intercepção do telefone a que dizia respeito a 
 prorrogação”.
 A posição do despacho recorrido é inteiramente esclarecedora e merece a nossa 
 concordância, não havendo necessidade de lhe acrescentar ou fundamentar mais o 
 que quer que seja.
 Pelo que também esta questão do recorrente será julgada improcedente”.
 
  
 Este discurso denuncia claramente que a norma supra transcrita não foi aplicada 
 pelo tribunal a quo na dimensão normativa impugnada, não constituindo, como tal, 
 ratio decidendi do juízo firmado relativamente à matéria em crise, daí 
 resultando que o Tribunal jamais admitiu a possibilidade de prorrogação dos 
 prazos de intercepção no desconhecimento do resultado das anteriores 
 conversações interceptadas e gravadas, uma vez que o pressuposto assumido nesta 
 sede foi justamente o de firmar os despachos de prorrogação no resultado das 
 sessões escutadas na medida em que daí resultavam “fortes razões para crer que 
 continuava a haver grande interesse para a descoberta da verdade ou para prova 
 na continuação da intercepção do telefone a que dizia respeito a prorrogação”.
 E o facto do Tribunal a quo ter admitido como possível a prorrogação dos prazos 
 de intercepção sem que, pontualmente, tivessem sido ouvidas as escutas 
 imediatamente anteriores não se afigura susceptível de alterar o sentido 
 normativo do critério aplicado, metamorfoseando-o na dimensão normativa 
 contestada pelo recorrente.
 Na verdade, mesmo considerando esse dado, a decisão não deixa quaisquer dúvidas 
 de que os despachos de prorrogação se baseiam no efectivo conhecimento das 
 escutas anteriores, ainda que se excluam as “sessões que (...) foram, no mesmo 
 momento, apresentadas, é certo que todo o manancial probatório das sessões 
 anteriormente escutadas” permitiu ao Tribunal a prolação dos referidos despachos 
 a partir desse sustentáculo.
 De resto, o próprio recorrente tem noção desta realidade, como resulta do 
 material alegatório que aportou aos presentes autos de recurso, pois aí 
 considera, a propósito da invalidade da presente norma, que o juiz de instrução 
 não poderá proferir despacho de prorrogação sem previamente tomar conhecimento 
 de todas as conversações previamente gravadas.
 No entanto, como é perceptível, essa exigência de sentido não é coincidente com 
 a específica dimensão normativa que se controvertera perante o Tribunal a quo e 
 que o recorrente fez aportar aos presentes autos de recurso de 
 constitucionalidade.
 E essa divergência não é irrelevante, nela se consubstanciando um distinto 
 critério normativo, não podendo fazer-se equivaler a “norma (...) dos artigos 
 
 187º, nº 1 e 188º, nº 1, do Código de Processo Penal, segundo a qual uma vez 
 autorizada a intercepção e gravação por determinado período, pode ser concedida 
 autorização para a sua continuação sem que o juiz tome conhecimento do resultado 
 das anteriores conversações telefónicas interceptadas e gravadas”,  à norma 
 segundo a qual uma vez autorizada a intercepção e gravação por determinado 
 período, pode ser concedida autorização para a sua continuação sem que o juiz 
 tome conhecimento do resultado de todas as anteriores conversações.
 Ora, considerando estas distintas dimensões normativas, conclui-se, com 
 meridiana clareza, que a Relação não aplicou como ratio decidendi a norma dos 
 artigos 187.º, n.º 1, e 188.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, no sentido 
 normativo cuja inconstitucionalidade foi controvertida pelo recorrente, 
 alicerçando, ao invés, a sua decisão num outro critério que sempre seria aqui 
 insindicável por corresponder a um inadmissível alargamento do objecto do 
 recurso.
 
  
 
 3.4 – Quanto à “norma extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo do 
 disposto no artigo 188º, nº 3, do Código de Processo Penal, segundo a qual nada 
 impõe que a ordem de destruição seja dada imediatamente após a primeira 
 selecção, podendo o Juiz aditar aos “autos de gravação” sessões que haja 
 anteriormente considerado irrelevantes para a prova”, constata-se que o 
 recorrente nada alegou neste Tribunal, daí resultando, consequentemente, o 
 abandono dessa questão com a inerente restrição do objecto do recurso tal como o 
 mesmo surge delimitado nas respectivas conclusões, razão pela qual não se 
 conhecerá dessa questão (artigo 684.º, n.º 3, do Código de Processo Civil).
 
  
 
 3.5 – Por fim, importa ainda considerar a questão prévia de não conhecimento do 
 objecto do recurso quanto à “norma extraída pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a 
 quo segundo a qual após a alteração legislativa de 2000 a maior complexidade na 
 elaboração do auto de gravação impõe a adopção de critério mais dilatado quanto 
 ao requisito da imediatividade da sua apresentação”.
 Tal questão colocou-se por se haver entendido que o recorrente não controverteu 
 perante o Tribunal a quo a constitucionalidade de uma norma ancorada num 
 preceito de direito positivo.
 Ora, como é consabido, a indicação do concreto preceito legal sob cuja veste a 
 norma aparece no nosso sistema jurídico é um elemento essencial para o 
 conhecimento da questão de constitucionalidade, não podendo ter-se por 
 adequadamente suscitada uma questão de constitucionalidade sem uma tal 
 identificação, em virtude de, no nosso sistema de fiscalização concreta de 
 constitucionalidade, apenas, poderem constituir objecto do recurso normas 
 jurídicas que estejam recortadas em disposições ou preceitos que resultem do 
 exercício de um poder normativo (conceito funcional de norma).
 Em conformidade com o exposto, as exigências postuladas para a adequada 
 suscitação de uma questão de constitucionalidade normativa tornam apodíctico que 
 se individualize, perante o Tribunal a quo, um critério que se tenha 
 positivamente suportado por referência ao direito objectivo, a partir do qual se 
 desvela a concreta dimensão normativa que se pretende ver apreciada.
 A este respeito, escreveu-se no Acórdão n.º 90/05, disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt, o seguinte, que aqui se reitera:
 
    “[…] só pode apresentar-se como sendo interpretação de uma determinada norma 
 jurídica, mesmo quando ela seja lida conjugadamente com outra ou outras normas 
 jurídicas, um sentido que seja referível ao seu teor verbal: é que, o intérprete 
 não pode considerar ‘o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um 
 mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso’ e deve 
 presumir ‘que o legislador […] soube exprimir o seu pensamento em termos 
 adequados’” 
 
    
 E no Acórdão n.º 531/05, disponível no mesmo site, disse-se, dentro da mesma 
 linha, o seguinte, que aqui também se renova:
 
    “[…] em sede de recurso de constitucionalidade, “a norma sujeita a 
 fiscalização aparece sob a veste de um texto, de um preceito ou disposição 
 
 (artigo, base, número, parágrafo, alínea) e é a partir dessa forma verbal que 
 ela há-de ser encontrada, através dos métodos hermenêuticos” (Jorge Miranda, 
 Manual de Direito Constitucional, Coimbra Editora, vol. VI, 2ª edição, 2005, p. 
 
 166). Não pode, pois, no caso vertente, em que não houve sequer indicação do 
 preceito legal em causa, ter-se por observado o ónus de suscitação de uma 
 questão de inconstitucionalidade”.
 
  
 
    Assim se concluindo que a identificação da base legal à qual se imputa a 
 norma cuja constitucionalidade se pretende ver apreciada é, pois, um momento 
 insuprível do controlo de constitucionalidade, na medida em que importa saber se 
 essa base legal elegida para a fiscalização de constitucionalidade se apresenta 
 como idónea a suportar esse sentido (cf. Neste sentido, o Acórdão n.º 416/03, 
 publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 57º vol., p. 279).
 Não se podendo considerar a questão de constitucionalidade adequadamente 
 suscitada, a indicação da norma em causa nas alegações de recurso perante o 
 Tribunal Constitucional é manifestamente extemporânea e determina o não 
 conhecimento do objecto do recurso nesta parte.
 
  
 
  
 
 4 – Delimitado o objecto do recurso, fica o mesmo circunscrito à norma do artigo 
 
 188.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, nos termos da qual o inciso 
 
 “imediatamente” deve ser interpretado dentro das contingências inerentes à 
 complexidade e dimensão do processo, que o recorrente considera contrária ao 
 disposto nos artigos 18.º, nºs 2 e 3, 32.º, n.º 1, e 34.º, n.º 4, da 
 Constituição da República Portuguesa.
 
             A presente questão de constitucionalidade incide sobre um problema 
 que está na origem de diversos arestos deste Tribunal.
 
             Num dos seus arestos mais recentes, o Tribunal Constitucional teve 
 oportunidade de se pronunciar, sistemática e detalhadamente, sobre o regime das 
 escutas telefónicas em processo penal, considerando em particular as implicações 
 jusfundamentais pressupostas pela exigência constante do artigo 188.º, n.º 1, do 
 Código de Processo Penal (cf. o Acórdão n.º 4/2006, disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt).
 
             A pertinência das considerações aí expendidas, justificam que aqui 
 se assumam os fundamentos discursivos dessa decisão, da qual se passa a 
 transcrever o seguinte:
 
  
 
             “[...] interessará recordar a evolução do quadro legal relativo à 
 efectivação de escutas telefónicas no âmbito do processo criminal, com menção da 
 jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre a matéria, o que foi objecto de 
 desenvolvido tratamento no recente Acórdão n.º 426/2005, de que se retomarão as 
 passagens essenciais.
 
                         Na versão originária do CPP, o artigo 187.º condicionava 
 a intercepção e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas a: (i) 
 ordem ou autorização por despacho judicial; (ii) estarem em causa crimes: 1) 
 puníveis com pena de prisão de máximo superior a três anos; 2) relativos ao 
 tráfico de estupefacientes; 3) relativos a armas, engenhos, matérias explosivas 
 e análogas; 4) de contrabando; ou 5) de injúrias, de ameaças, de coacção e de 
 intromissão na vida privada, quando cometidos através de telefone (o Decreto-Lei 
 n.º 317/95, de 28 de Novembro, substituiu a expressão “intromissão na vida 
 privada”, usada no artigo 180.º da versão originária do Código Penal, por 
 
 “devassa da vida privada e perturbação da paz e sossego”, em conformidade com as 
 designações dos ilícitos previstos nos artigos 192.º e 190.º, n.º 2, do Código 
 Penal revisto pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março); e (iii) haver razões 
 para crer que a diligência se revelará de grande interesse para a descoberta da 
 verdade ou para a prova (n.º 1). Proibia-se, porém, a intercepção e a gravação 
 de conversações ou comunicações entre o arguido e o seu defensor, salvo se o 
 juiz tivesse fundadas razões para crer que elas constituíam objecto ou elemento 
 do crime (n.º 3). As formalidades das operações eram estabelecidas no artigo 
 
 188.º, que determinava que: (i) da intercepção ou gravação fosse lavrado auto, o 
 qual, juntamente com as fitas gravadas ou elementos análogos, devia ser 
 imediatamente levado ao conhecimento do juiz que ordenara ou autorizara as 
 operações (n.º 1); (ii) o juiz, se considerasse os elementos recolhidos, ou 
 alguns deles, relevantes para a prova, fá-los-ia juntar ao processo, ou, caso 
 contrário, ordenava a sua destruição, ficando todos os participantes nas 
 operações ligados por dever de sigilo relativamente àquilo de que tivessem 
 tomado conhecimento (n.º 2); (iii) o arguido e o assistente, bem como as pessoas 
 cujas conversações tiverem sido escutadas, podiam examinar o auto para se 
 inteirarem da conformidade das gravações e obterem, à sua custa, cópia dos 
 elementos naquele referidos (n.º 3), excepto se, tratando-se de operações 
 ordenadas no decurso do inquérito ou da instrução, o juiz tivesse razões para 
 crer que o conhecimento do auto ou das gravações pelo arguido ou pelo assistente 
 podia prejudicar as finalidades do inquérito ou da instrução (n.º 4). Nos termos 
 do artigo 189.º, todos os requisitos e condições referidos nos artigos 187.º e 
 
 188.º eram estabelecidos sob pena de nulidade, e o artigo 190.º estendia o 
 disposto nos três artigos anteriores às conversações ou comunicações 
 transmitidas por qualquer meio técnico diferente do telefone.
 
                         As normas contidas nos referidos artigos 187.º, n.º 1, e 
 
 190.º foram apreciadas, em sede de fiscalização preventiva da 
 constitucionalidade, pelo Tribunal Constitucional, que, no Acórdão n.º 7/87, não 
 se pronunciou pela sua inconstitucionalidade, por entender que, “face à natureza 
 e gravidade dos crimes a que se aplicam (...) se afigura que tais restrições [ao 
 direito à intimidade da vida privada e familiar”, consagrado no artigo 26.º, n.º 
 
 1, da CRP] não infringem os limites da necessidade e proporcionalidade exigidos 
 pelos citados números [nºs 2 e 3] do artigo 18.º da Constituição”.
 
                         A regulamentação legal da matéria em causa na versão 
 originária do CPP, pelo seu relativo laconismo, suscitou diversas dúvidas de 
 interpretação e de aplicação: qual o prazo de duração das escutas; quem tem 
 legitimidade para as requerer ao juiz; qual o relacionamento entre órgão de 
 polícia criminal, magistrado do Ministério Público e juiz de instrução; se a 
 proibição do n.º 3 do artigo 187.º é extensível a conversações com pessoas que, 
 para além do defensor, estejam legitimadas a recusar depoimento em nome de 
 outros tipos de sigilo profissional (artigo 135.º) ou que, em geral, possam 
 recusar-se a depor como testemunhas (artigo 134.º); qual o conteúdo do auto de 
 intercepção e gravação; qual a oportunidade de efectivação da transcrição e da 
 destruição; como se efectiva o acesso do arguido, do assistente e das pessoas 
 escutadas ao auto e às gravações; se a nulidade referida no artigo 189.º 
 respeita a nulidade da prova ou a nulidade processual e se, neste caso, é 
 sanável ou insanável, etc.
 
                         Foi neste contexto que foi emitido o Parecer 
 
 (complementar) n.º 92/91, do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da 
 República, de 17 de Setembro de 1992 (cuja fundamentação foi integralmente 
 transcrita no n.º 2.4. do citado Acórdão n.º 426/2005), cuja doutrina foi 
 sintetizada nas seguintes conclusões:
 
  
 
             “1.ª – Da intercepção e gravação das comunicações telefónicas ou 
 similares é lavrado um auto (artigo 188.º, n.º 1, do Código de Processo Penal – 
 CPP);
 
             2.ª – O referido auto deve inserir a menção do despacho judicial que 
 ordenou ou autorizou a intercepção e da pessoa que a ela procedeu, a 
 identificação do telefone interceptado, o circunstancialismo de tempo, modo e 
 lugar da intercepção, bem como o conteúdo da gravação necessária à decisão 
 judicial sobre o que deverá ou não constar do processo penal respectivo;
 
             3.ª – A transcrição do conteúdo da gravação a que se refere a alínea 
 anterior deverá abranger a integralidade dos elementos da comunicação telefónica 
 ou similar interceptada que a entidade responsável pelas operações considere de 
 interesse para a descoberta da verdade ou para a prova dos crimes previstos no 
 artigo 187.º, n.º 1, do CPP;
 
             4.ª – O conteúdo da gravação, que àquela entidade se revelar 
 destituído de interesse para a descoberta da verdade ou para a prova dos crimes 
 referidos na conclusão anterior, deverá ser mencionado naquele auto, tão só de 
 modo genérico com a mera referência à sua natureza ou tema, sob a égide do 
 respeito do direito à intimidade da vida privada dos cidadãos;
 
             5.ª – Lavrado o referido auto, é imediatamente levado ao 
 conhecimento do juiz que tiver ordenado ou autorizado a intercepção telefónica 
 ou similar (artigo 188.º, n.º 1, do CPP);
 
             6.º – O juiz, por despacho, ordenará a junção ao processo dos 
 elementos relevantes para a prova e a destruição dos irrelevantes, incluindo a 
 desmagnetização das «cassetes» ou bandas magnéticas (artigo 188.º, n.º 2, do 
 CPP);
 
             7.ª – O juiz, se o entender necessário à prolação da decisão 
 referida na conclusão segunda, poderá ordenar a transcrição mais ampla ou 
 integral da parte objecto da menção referida na conclusão 4.ª;
 
             8.ª – Os participantes nas operações de intercepção, gravação, 
 transcrição e eliminação de elementos recolhidos ficam vinculados ao dever de 
 sigilo quanto àquilo de que em tais diligências tomaram conhecimento (artigo 
 
 188.º, n.º 2, do CPP);
 
             9.ª – As «cassetes» ou as bandas magnéticas cujo conteúdo seja 
 inserido nos autos devem a estes ser apensos ou, se isso se tornar impossível, 
 guardadas depois de seladas, numeradas e identificadas com o processo respectivo 
 
 (artigos 10.º, nºs 1 e 2, do Código Civil, e 101.º, n.º 3, do CPP);
 
             10.ª – O arguido, o assistente e as pessoas escutadas podem examinar 
 o referido auto a fim de controlarem a conformidade dos elementos recolhidos e 
 objecto de aquisição processual com os registos de som respectivos, e desses 
 elementos constantes do auto obterem cópias (artigo 188.º, n.º 3, do CPP);
 
             11.ª – O arguido e o assistente não podem proceder ao exame referido 
 na conclusão anterior se a intercepção telefónica ou similar ocorrer no decurso 
 do inquérito ou da instrução e o juiz decidir que o conhecimento por eles do 
 auto ou das gravações é susceptível de prejudicar a respectiva finalidade 
 
 (artigo 188.º, n.º 4, do CPP).”
 
  
 
                         Foi ainda na vigência da redacção originária do artigo 
 
 188.º do CPP que o Tribunal Constitucional proferiu o Acórdão n.º 407/97, que 
 constitui a sua primeira decisão sobre questão de constitucionalidade suscitada 
 a propósito dessa norma, embora centrada (como os posteriores Acórdãos nºs 
 
 347/2001, 528/2003, 379/2004 e 223/2005) na interpretação do conceito de 
 
 “imediatamente” reportado à apresentação, ao juiz que tiver ordenado ou 
 autorizado a operação, do auto de intercepção e gravação, juntamente com as 
 fitas gravadas ou elementos análogos. Após referências aos parâmetros 
 constitucionais pertinentes e ao direito comparado, o Acórdão n.º 407/97 fundou 
 o seu juízo de inconstitucionalidade, por violação do disposto no n.º 6 (actual 
 n.º 8) do artigo 32.º da CRP, da norma do n.º 1 do artigo 188.º do CPP – “quando 
 interpretado em termos de não impor que o auto da intercepção e gravação de 
 conversações ou comunicações telefónicas seja, de imediato, lavrado e levado ao 
 conhecimento do juiz, de modo a este poder decidir atempadamente sobre a junção 
 ao processo ou a destruição dos elementos recolhidos, ou de alguns deles, e bem 
 assim, também atempadamente, a decidir, antes da junção ao processo de novo auto 
 da mesma espécie, sobre a manutenção ou alteração da decisão que ordenou as 
 escutas” – nas seguintes considerações:
 
  
 
             “Trata-se aqui de precisar o conteúdo constitucionalmente viável do 
 trecho do artigo 188.º, n.º 1, do CPP, onde surge a expressão «imediatamente». 
 Ora, partindo do pressuposto consubstanciado na proibição de ingerência nas 
 telecomunicações, resultante do n.º 4 do artigo 34.º da Lei Fundamental, a 
 possibilidade de ocorrer diversamente (de existir ingerência nas 
 telecomunicações), no quadro de uma previsão legal atinente ao processo criminal 
 
 (a única constitucionalmente tolerada), carecerá sempre de ser compaginada com 
 uma exigente leitura à luz do princípio da proporcionalidade, subjacente ao 
 artigo 18.º, n.º 2, da Constituição, garantindo que a restrição do direito 
 fundamental em causa (de qualquer direito fundamental que a escuta telefónica, 
 na sua potencialidade danosa, possa afectar) se limite ao estritamente 
 necessário à salvaguarda do interesse constitucional na descoberta de um 
 concreto crime e punição do seu agente.
 
             Nesta ordem de ideias, a imediação entre o juiz e a recolha da prova 
 através da escuta telefónica aparece como o meio que melhor garante que uma 
 medida com tão específicas características se contenha nas apertadas margens 
 fixadas pelo texto constitucional.
 
             O actuar desta imediação, potenciadora de um efectivo controlo 
 judicial das escutas telefónicas, ocorrerá em diversos planos, sendo um deles o 
 que pressupõe uma busca de sentido prático para a obrigação de levar 
 
 «imediatamente» ao juiz o auto da intercepção e «fitas gravadas ou elementos 
 análogos», de que fala a lei.
 
             13. Vejamos, a este propósito, o discurso interpretativo subjacente 
 
 à decisão recorrida. De sublinhar nesta, desde logo, a afirmação de que o artigo 
 
 188.º, n.º 1, do CPP, ao não fixar um prazo certo, «acaba por relativizar muito 
 as coisas». Há que reter esta ideia que torna patente a existência de um espaço 
 aberto à procura de um sentido, enfim, de um espaço aberto à interpretação.
 
             Não obstante, mais adiante, a decisão recorrida parece apontar para 
 uma impossibilidade de alcançar o sentido da expressão «imediatamente» no 
 contexto normativo em causa (ao dizer a fls. 102: «Não sabemos. Não dispomos de 
 qualquer critério para decidir sobre isso. Nem sequer é possível estabelecer e 
 assentar num critério de razoabilidade a tal propósito»).
 
             Ora, já se indicou que o critério interpretativo neste campo não 
 pode deixar de ser aquele que assegure a menor compressão possível dos direitos 
 fundamentais afectados pela escuta telefónica. Também já se assentou – e importa 
 lembrá-lo de novo – que a intervenção do juiz é vista como uma garantia de que 
 essa compressão se situe nos apertados limites aceitáveis e que tal intervenção, 
 para que de uma intervenção substancial se trate (e não de um mero tabelionato), 
 pressupõe o acompanhamento da operação de intercepção telefónica. Com efeito, só 
 acompanhando a recolha de prova, através desse método em curso, poderá o juiz ir 
 apercebendo os problemas que possam ir surgindo, resolvendo-os e, assim, 
 transformando apenas em aquisição probatória aquilo que efectivamente pode ser. 
 Por outro lado, só esse acompanhamento coloca a escuta a coberto dos perigos – 
 que sabemos serem consideráveis – de uso desviado.
 
             Com isto, não se quer significar que toda a operação de escuta tenha 
 de ser materialmente realizada pelo juiz. Contrariamente a tal visão 
 maximalista, do que aqui se trata é, tão-só, de assegurar um acompanhamento 
 contínuo e próximo temporal e materialmente da fonte (imediato, na terminologia 
 legal), acompanhamento esse que comporte a possibilidade real de em função do 
 decurso da escuta ser mantida ou alterada a decisão que a determinou.
 
             14. Refere-se ainda o Acórdão a dificuldades práticas que a situação 
 
 é susceptível de criar («Sabemos, isso sim, que a Polícia Judiciária como muitos 
 outros departamentos do Estado, nos quais se incluem os tribunais, seguramente 
 carece, cronicamente, de meios técnicos e humanos que lhe não permitem cumprir, 
 muitas vezes, as suas tarefas em tempo normal»), moldando, no que não deixa de 
 ter um certo sentido correctivo, o conceito de «imediatamente» («usado por um 
 legislador excessivamente preocupado com a aceleração processual, porém 
 esquecido das grandes lacunas e dos grandes estrangulamentos do sistema») ao que 
 qualifica de entendimento «em termos hábeis». A saber: aquele em que 
 
 «imediatamente» equivale a «no tempo mais rápido possível». Ora, o «mais rápido 
 possível» significou aqui longos períodos de tempo em que as escutas não foram 
 acompanhadas (igual a controladas) pelo juiz e, mais ainda, espaços muito 
 significativos de tempo em que as escutas já haviam terminado e o processo 
 continuava sem ter qualquer conhecimento do seu teor (vejam-se as conclusões 2.ª 
 e 4.ª de fls. 4 verso, tendo-se presente que as datas aí indicados obtêm 
 confirmação nos autos).
 
             É a teorização interpretativa que sufraga esta situação que de modo 
 algum se pode ter por conforme ao disposto no artigo 34.º, n.º 4, da 
 Constituição, lido à luz do princípio da proporcionalidade. Se é certo que se 
 não podem ignorar, pura e simplesmente, os aspectos práticos de uma situação, 
 designadamente as dificuldades técnicas que esta ou aquela opção interpretativa 
 possa ocasionar, não é menos verdade que o ónus dessas dificuldades técnicas, 
 num processo crime, sempre correrá por conta do Estado (a quem compete 
 ultrapassá-las), jamais por conta do arguido.
 
             Poder-se-ia aqui relembrar o dilema, já relatado, do Juiz Holmes, 
 sobre o «mal maior» e o «mal menor». Obviamente que no processo criminal de um 
 Estado de direito democrático, face a «dificuldades técnicas», o «mal menor» 
 sempre será a hipotética impunidade de eventuais criminosos.
 
             15. Trata-se, pois, de fixar a interpretação constitucionalmente 
 conforme do artigo 188.º, n.º 1, do CPP no segmento em que se insere a expressão 
 
 «imediatamente», sendo certo ser tal expediente possível ainda nos limites da 
 interpretação.
 
             Assim sendo, «imediatamente» não poderá, desde logo, reportar-se 
 apenas ao momento em que as transcrições se mostrarem feitas (pois ficaria 
 aberto o caminho à existência de largos períodos de falta de controlo judicial à 
 escuta sempre que a transcrição se atrasasse). Em qualquer dos casos, 
 
 «imediatamente», no contexto normativo em que se insere, terá de pressupor um 
 efectivo acompanhamento e controlo da escuta pelo juiz que a tiver ordenado, 
 enquanto as operações em que esta se materializa decorrerem. De forma alguma 
 
 «imediatamente» poderá significar a inexistência, documentada nos autos, desse 
 acompanhamento e controlo ou a existência de largos períodos de tempo em que 
 essa actividade do juiz não resulte do processo.
 
             Em qualquer caso, tendo em vista os interesses acautelados pela 
 exigência de conhecimento imediato pelo juiz, deve considerar-se 
 inconstitucional, por violação do n.º 6 do artigo 32.º da Constituição, uma 
 interpretação do n.º 1 do artigo 188.º do CPP que não imponha que o auto de 
 intercepção e gravação de conversações ou comunicações telefónicas seja, de 
 imediato, lavrado e levado ao conhecimento do juiz, de modo a este poder decidir 
 atempadamente sobre a junção ao processo ou a destruição dos elementos 
 recolhidos, ou de alguns deles, e bem assim, também atempadamente, a decidir, 
 antes da junção ao processo de novo auto de escutas posteriormente efectuadas, 
 sobre a manutenção ou alteração da decisão que ordenou as escutas.
 
             É esta, exposta com a minúcia possível, a interpretação conforme à 
 Constituição. A ela importa vincular o intérprete – «juiz incluído» como este 
 Tribunal tem repetidamente referido em situações onde faz uso deste recurso 
 interpretativo.
 
             Sublinhar-se-á apenas, como nota final, que as consequências a 
 retirar da interpretação da norma com o sentido apontado se encontram já fora do 
 
 âmbito da intervenção do Tribunal Constitucional, situando-se claramente no 
 domínio de intervenção do Tribunal recorrido.”
 
                         Considerou, assim, o Tribunal Constitucional que a 
 especial danosidade da intromissão traduzida pela intercepção telefónica impunha 
 uma intervenção substancial do juiz no decurso da mesma, através de um 
 acompanhamento contínuo e próximo temporal e materialmente da fonte, 
 acompanhamento esse que comportasse a possibilidade real de, em função do 
 decurso da escuta, ser mantida ou alterada a decisão que a determinou, 
 sublinhando, contudo, que o exigente critério assumido não significava “que toda 
 a operação de escuta tenha de ser materialmente realizada pelo juiz”, posição 
 que corresponderia a uma “visão maximalista”, que o Tribunal não subscreveu.
 
  
 
                         2.3. A nível legislativo, a primeira alteração a 
 assinalar foi a levada a cabo pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto, que alterou a 
 redacção, entre outros, dos artigos 188.º e 190.º do CPP.
 
                         Estas alterações não constavam da Proposta de Lei n.º 
 
 157/VII, que esteve na génese daquela Lei, antes resultaram de propostas de 
 alteração apresentadas pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista (cf. Código 
 de Processo Penal – Processo Legislativo, vol. II, tomo II, ed. Assembleia da 
 República, Lisboa, 1999, pp. 114-115), que viriam a ser aprovadas por 
 unanimidade (obra citada, p. 107), tendo as relativas ao artigo 188.º sido 
 justificadas, na Declaração de Voto dos Deputados do Partido Socialista relativa 
 
 à votação final global dessa iniciativa legislativa, nos seguintes termos (obra 
 citada, p. 153):
 
  
 
             “As alterações levam em conta o parecer da Procuradoria-Geral da 
 República n.º 92/91 (complementar), as dificuldades práticas da «vida 
 judiciária», o n.º 4 do artigo 18.º da Lei de Segurança Interna e o acórdão do 
 Tribunal Constitucional n.º 407/97 (Diário da República, II Série, de 18 de 
 Julho de 1997), que anulou as escutas porque a transcrição não foi imediata.
 
             Tornava-se necessário clarificar: quem selecciona os elementos a 
 transcrever; se o agente de investigação pode ter contacto com a conversa (uma 
 vez que a operação é feita por técnico de telecomunicações, mas não pode 
 excluir-se a presença da polícia, sob pena de a diligência não ter sentido ou 
 eficácia); o que é que o juiz ouve (sabendo-se que, não ouvindo, manda 
 transcrever a totalidade dos registos, o que é excessivamente moroso, oneroso e 
 inútil); e esclarecer o procedimento.
 
             O n.º 1 do artigo refere que da intercepção é lavrado auto (mas não 
 distingue entre auto de intercepção e auto de transcrição, sendo certo que 
 importa clarificar que são duas coisas diferentes). Assim, fica claro que uma 
 coisa é o auto de intercepção (n.º 1) e outra o auto de transcrição (n.º 3).
 
             O n.º 2 permite que a polícia ouça e possa intervir de imediato, por 
 exemplo, para fazer uma apreensão de droga combinada telefonicamente e «apanhar 
 o flagrante».
 
             Os nºs 3 e 4 tornam claro que é o juiz quem selecciona, que é o 
 responsável pelo conteúdo da transcrição, mas que é auxiliado materialmente pela 
 polícia, o que é importante em termos de execução.”
 
  
 
                         As modificações operadas pela Lei n.º 59/98 no artigo 
 
 188.º do CPP consistiram:
 
                         – no aditamento de um novo n.º 2, do seguinte teor: “O 
 disposto no número anterior não impede que o órgão de polícia criminal que 
 proceder à investigação tome previamente conhecimento do conteúdo da comunicação 
 interceptada a fim de poder praticar os actos cautelares necessários e urgentes 
 para assegurar os meios de prova”;
 
                         – na passagem do primitivo n.º 2 a n.º 3, dispondo 
 agora, na sua primeira parte, que “Se o juiz considerar os elementos recolhidos, 
 ou alguns deles, relevantes para a prova, ordena a sua transcrição em auto e 
 fá-lo juntar ao processo;.”, enquanto anteriormente apenas dizia que o juiz “... 
 fá-los juntar ao processo;”; mantendo-se inalterada a segunda parte: “caso 
 contrário, ordena a sua destruição, ficando todos os participantes nas operações 
 ligados por dever de segredo relativamente àquilo de que tenham tomado 
 conhecimento”;
 
                         – no aditamento de um novo n.º 4, do seguinte teor: 
 
 “Para efeitos do disposto no número anterior, o juiz pode ser coadjuvado, quando 
 entender conveniente, por órgão de polícia criminal, podendo nomear, se 
 necessário, intérprete. À transcrição aplica-se, com as necessárias adaptações, 
 o disposto no artigo 101.º, nºs 2 e 3.”;
 
                         – na passagem do primitivo n.º 3 a n.º 5, com 
 especificação de que o auto cujo exame é facultado ao arguido, ao assistente e 
 
 às pessoas escutadas, “para se inteirarem da conformidade das gravações e 
 obterem, à sua custa, cópias dos elementos naquele referidos”, é “o auto de 
 transcrição a que se refere o n.º 3” (a redacção originária referia-se a 
 
 “examinar o auto”, sem mais); e
 
                         – na eliminação do primitivo n.º 4 (que ressalvava “do 
 disposto no número anterior o caso em que as gravações tiverem sido ordenadas no 
 decurso do inquérito ou da instrução e o juiz que as ordenou tiver razões para 
 crer que o conhecimento do auto ou das gravações, pelo arguido ou pelo 
 assistente, poderia prejudicar as finalidades do inquérito ou da instrução”; 
 trata-se de eliminação algo enigmática, pois nada no debate parlamentar foi 
 referido para a justificar ou sequer enunciar).
 
                         No artigo 190.º, a extensão originária da aplicabilidade 
 do disposto nos artigos 187.º, 188.º e 189.º “às conversações ou comunicações 
 transmitidas por qualquer meio técnico diferente do telefone” foi complementada 
 com o seguinte aditamento: “designadamente correio electrónico ou outras formas 
 de transmissão de dados por via telemática, bem como à intercepção das 
 comunicações entre presentes”.
 
  
 
                         2.4. A segunda alteração legislativa com especial 
 relevância para as questões que constituem objecto do presente recurso resultou 
 do Decreto-Lei n.º 320-C/2000, de 15 de Dezembro, que aditou ao n.º 1 do artigo 
 
 188.º do CPP (“Da intercepção e gravação a que se refere o artigo anterior é 
 lavrado auto, o qual, junto com as fitas gravadas ou elementos análogos, é 
 imediatamente levado ao conhecimento do juiz que tiver ordenado ou autorizado as 
 operações”) a expressão: “com a indicação das passagens das gravações ou 
 elementos análogos considerados relevantes para a prova”.
 
                         Este inciso final corresponde à utilização da 
 autorização legislativa concedida pela Lei n.º 27-A/2000, de 17 de Novembro, que 
 autorizou o Governo a rever o Código de Processo Penal, com o sentido e extensão 
 definidos nos artigos seguintes (artigo 1.º), entre os quais, segundo o artigo 
 
 4.º: “Permite-se que o juiz possa limitar a audição das gravações às passagens 
 indicadas como relevantes para a prova, sem prejuízo de as gravações efectuadas 
 lhe serem integralmente remetidas”. Esta norma não constava da Proposta de Lei 
 n.º 41/VIII (Diário da Assembleia da República, VIII Legislatura, 1.ª Sessão 
 Legislativa, II Série-A, n.º 59, de 15 de Julho de 2000, pp. 1891-1898), tendo 
 surgido no texto de substituição elaborado pela Comissão de Assuntos 
 Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, e aí aprovada por unanimidade 
 
 (Diário da Assembleia da República, VIII Legislatura, 2.ª Sessão Legislativa, II 
 Série-A, n.º 10, de 23 de Outubro de 2000, pp. 218-224), tal como no Plenário 
 
 (Diário citado, I Série, n.º 13, de 20 de Outubro de 2000, p. 498).
 
                         Para terminar a recensão do quadro legal aplicável, 
 resta referir que a Lei n.º 5/2002, de 11 de Janeiro, que estabeleceu um regime 
 especial de recolha de prova, quebra do segredo profissional e perda de bens a 
 favor do Estado relativa, entre outros, aos crimes de associação criminosa, 
 lenocínio e lenocínio e tráfico de menores, estes quando praticados de forma 
 organizada (artigo 1.º, nºs 1, alíneas f) e h), e 2), estatuiu no seu artigo 6.º 
 
 (Registo de voz e de imagem):
 
  
 
             “1 – É admissível, quando necessário para a investigação de crimes 
 referidos no artigo 1.º, o registo de voz e de imagem, por qualquer meio, sem 
 consentimento do visado.
 
             2 – A produção desses registos depende de prévia autorização ou 
 ordem do juiz, consoante os casos.
 
             3 – São aplicáveis aos registos obtidos, com as necessárias 
 adaptações, as formalidades previstas no artigo 188.º do Código de Processo 
 Penal.”
 
                        
 
                         2.5. No que concerne à jurisprudência do Tribunal 
 Constitucional, há a assinalar, para além do já citado Acórdão n.º 407/97, a 
 prolação dos Acórdãos nºs 347/2001, 528/2003, 379/2004 e 223/2005 e da Decisão 
 Sumária n.º 324/2004, todos incidindo sobre a questão da “imediatividade” da 
 apresentação ao juiz do auto de intercepção e gravação prevista no artigo 
 
 188.º, n.º 1, do CPP (o primeiro Acórdão reportado à redacção anterior à Lei n.º 
 
 59/98, o segundo à redacção dada por esta Lei, os dois últimos quer à redacção 
 anterior quer à posterior ao Decreto-Lei n.º 320-C/2000, e a Decisão Sumária a 
 esta última redacção), e ainda os Acórdãos nºs 411/2002 (que julgou 
 inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 1, da CRP, a interpretação 
 normativa que torna inaplicável ao prazo de arguição de nulidade respeitante a 
 escutas telefónicas ocorrida durante o inquérito o que vem consagrado no artigo 
 
 120.º, n.º 3, alínea c), do CPP [até ao encerramento do debate instrutório] e 
 aplicável o estabelecido no artigo 105.º do mesmo Código [dez dias a contar da 
 notificação da acusação, terminando antes do fim do prazo para requerer a 
 instrução]) e 198/2004 (que não julgou inconstitucional a norma do artigo 122.º, 
 n.º 1, do CPP, entendida como autorizando, face à nulidade/invalidade de 
 intercepções telefónicas realizadas, a utilização de outras provas, distintas 
 das escutas e a elas subsequentes, quando tais provas se traduzam nas 
 declarações dos próprios arguidos, designadamente quando tais declarações sejam 
 confessórias).
 
                         Nos três primeiros Acórdãos citados (o quarto – Acórdão 
 n.º 223/2005 – incidiu sobre uma situação de incumprimento do Acórdão n.º 
 
 379/2004), o Tribunal Constitucional reiterou o critério decisório definido no 
 Acórdão n.º 407/97, que conduziu, nos casos em cada um desses arestos 
 apreciados, à emissão de similares juízos de inconstitucionalidade.
 
                         No Acórdão n.º 347/2001 – que julgou inconstitucional, 
 por violação das disposições conjugadas dos artigos 32.º n.º 8, 34.º, nºs 1 e 4, 
 e 18.º, n.º 2, da CRP, a norma constante do artigo 188.º, n.º 1, do CPP, na 
 redacção anterior à que foi dada pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto, quando 
 interpretada no sentido de não impor que o auto da intercepção e gravação de 
 conversações e comunicações telefónicas seja, de imediato, lavrado e levado ao 
 conhecimento do juiz e que, autorizada a intercepção e gravação por determinado 
 período, seja concedida autorização para a sua continuação sem que o juiz tome 
 conhecimento do resultado da anterior –, após se sumariarem as ideias-chave do 
 Acórdão n.º 407/97, consignou-se:
 
 “Ora, no caso dos autos, a norma do artigo 188.º, n.º 1, do CPP, com a 
 interpretação acolhida no acórdão impugnado, não se isenta do mesmo vício de 
 inconstitucionalidade.
 
             Na verdade, fazer equivaler o inciso «imediatamente» ao «tempo mais 
 rápido possível», em termos de «cobrir» situações como a de o auto de 
 transcrição ser apresentado ao juiz meses depois de efectuadas a intercepção e 
 gravação das comunicações telefónicas, mesmo tendo em conta a gravidade do crime 
 investigado e a necessidade daquele meio de obtenção da prova, restringe 
 desproporcionadamente o direito à inviolabilidade de um meio de comunicação 
 privada e faculta uma ingerência neste meio para além do que se considera ser 
 constitucionalmente admissível.
 
             Ficar no desconhecimento do juiz, durante tal lapso de tempo, o teor 
 das comunicações interceptadas, significa o desacompanhamento próximo e o 
 controlo judiciais do modo como a escuta se desenvolve, o que se entendeu no 
 citado Acórdão n.º 407/97 – como aqui se entende – colidir com os interesses 
 acautelados pela exigência de conhecimento imediato pelo juiz. E impede, ainda, 
 a destruição, em tempo necessariamente breve, dos elementos recolhidos sem 
 interesse relevante para a prova, a que, só por si, não obsta a fixação pelo 
 juiz de um prazo para a intercepção, no termo da qual esta deve findar.
 
             Por outro lado, autorizar novos períodos de escuta, a mero 
 requerimento do Ministério Público, sem que a autorização seja precedida do 
 conhecimento judicial do resultado da intercepção anterior, continua a 
 significar a mesma ausência de acompanhamento e de controlo por parte do juiz, o 
 que pode até traduzir-se em longos períodos (um dos postos telefónicos foi 
 interceptado desde 3 de Novembro de 1995 a 15 de Novembro de 1996 e o outro 
 desde 3 de Abril de 1996 a 12 de Novembro de 1996 e de novo entre 31 de Março de 
 
 1997 a 5 de Setembro de 1997) de utilização deste meio de obtenção de prova na 
 disponibilidade total dos órgãos de investigação.
 
             É certo que, tal como a decisão recorrida no Acórdão n.º 407/97, o 
 acórdão impugnado faz apelo às dificuldades práticas – a reconhecida carência de 
 meios técnicos e humanos – para justificar o entendimento dado ao referido 
 inciso «imediatamente», num quadro de exigências de repressão da criminalidade 
 grave, praticada por redes altamente organizadas.
 
             A esse argumento se respondeu, ainda no Acórdão n.º 407/97, em 
 termos que também aqui se acolhem, que tais dificuldades constituem, num 
 processo crime, ónus do Estado de Direito democrático, ónus que não pode estar a 
 cargo do arguido, ainda que, no limite, isso signifique deixar impunes alguns 
 criminosos. Não é de todo admissível num Estado de Direito democrático, 
 caracterizado pela publicização do ius puniendi, fazer reverter contra o arguido 
 o ónus da escassez de meios e dificuldades na obtenção de prova para o condenar.
 
             Note-se que na nova redacção dada ao artigo 188.º (em especial, no 
 n.º 3) pela Lei n.º 59/98 (actualmente pelo Decreto-Lei n.º 320-C/2000, de 15 de 
 Dezembro) se procurou obviar às alegadas dificuldades de transcrição imediata 
 dos elementos recolhidos, pois esta só será judicialmente ordenada depois de o 
 juiz considerar tais elementos relevantes para a prova.
 
             Resta acrescentar que o Tribunal Constitucional tem apenas poderes 
 para verificar a constitucionalidade de normas, pelo que lhe está vedado 
 
 «declarar inválidos todos os actos que dependerem das intercepções telefónicas 
 realizadas, conforme os artigos 122.º e 189.º do CPP», como o recorrente 
 pretende.
 
             Isto significa que é ao tribunal recorrido que compete reformar a 
 sua decisão em conformidade com o presente juízo de constitucionalidade, 
 extraindo dele as consequências pertinentes ao nível do direito 
 infraconstitucional e do concreto processo crime em causa.”
 
  
 
                         A validade da jurisprudência assim definida foi 
 reafirmada no Acórdão n.º 528/2003 – que julgou inconstitucional, por violação 
 das disposições conjugadas dos artigos 32.º, n.º 8, 34.º, nºs 1 e 4, e 18.º, n.º 
 
 2, da CRP, a norma constante do artigo 188.º, n.º 1, do CPP, na redacção 
 anterior à que foi dada pelo Decreto-Lei n.º 320-C/2000, de 15 de Dezembro, 
 quando interpretada no sentido de não impor que o auto da intercepção e gravação 
 de conversações e comunicações telefónicas seja, de imediato, lavrado e levado 
 ao conhecimento do juiz –, o qual, após transcrição da fundamentação relevante 
 dos Acórdãos nºs 407/97 e 347/2001, acrescentou:
 
 “Agora apenas se referirá que, mais recentemente, o Tribunal Europeu dos 
 Direitos do Homem voltou a ter oportunidade para reiterar a sua jurisprudência 
 em matéria de escutas telefónicas. Tal aconteceu, nomeadamente, nos casos PG e 
 JH v. Reino Unido (acórdão de 25 de Setembro de 2001) e Prado Bugallo v. Espanha 
 
 (acórdão de 18 de Fevereiro de 2003). Neste último acórdão, aquele Tribunal 
 voltou a sublinhar a necessidade de preenchimento, pelas legislações nacionais, 
 das condições exigidas pela sua jurisprudência, designadamente nos acórdãos 
 Kruslin v. França e Huvig v. França, para evitar os abusos a que podem conduzir 
 as escutas telefónicas. Referiu-se, então, nomeadamente, à necessidade de 
 definição das infracções que podem dar origem às escutas, à fixação de um limite 
 
 à duração de execução da medida, às condições de estabelecimento dos autos das 
 conversações interceptadas, bem como às precauções a tomar para comunicar 
 intactas e completas as gravações efectuadas, de modo a permitir um possível 
 controlo pelo juiz e pela defesa.
 
             Assim sendo, verifica-se que a jurisprudência do Tribunal 
 Constitucional atrás referida, que, como se salientou já, mantém inteira 
 validade e a que aqui integralmente se adere, conduz a que, também no caso dos 
 autos, tenha de considerar-se inconstitucional a interpretação do n.º 1 do 
 artigo 188.º do Código de Processo Penal, na redacção anterior à que lhe foi 
 dada pelo Decreto-Lei n.º 320-C/2000, de 15 de Dezembro, que foi acolhida pela 
 decisão recorrida. Com efeito, entender que situações como as que ocorreram no 
 presente processo – em que os autos de intercepção e gravação de conversações 
 telefónicas que tinham sido entretanto autorizadas só foram levados ao 
 conhecimento do juiz que as ordenou 38 dias depois de elas terem tido início – 
 são ainda abrangidas pela expressão imediatamente colide frontalmente com os 
 interesses que se pretendem acautelar com aquela exigência, na medida em que 
 impede o seu acompanhamento próximo pelo juiz.
 
             Resta apenas acrescentar, de modo semelhante ao que se fez nos 
 acórdãos deste Tribunal citados supra, que o Tribunal Constitucional somente tem 
 poderes para verificar a constitucionalidade de normas, situando-se já fora do 
 
 âmbito da sua intervenção retirar as consequências da interpretação da norma com 
 o sentido apontado. Isto significa que é ao tribunal recorrido que compete 
 reformar a sua decisão em conformidade com o presente juízo de 
 constitucionalidade, extraindo dele as consequências pertinentes ao nível do 
 direito infraconstitucional e do concreto processo crime em causa.”
 
  
 
                         Por seu turno, o Acórdão n.º 379/2004 – que julgou 
 inconstitucional, por violação das disposições conjugadas dos artigos 32.º, n.º 
 
 8, 43.º, nºs 1 e 4, e 18.º, n.º 2, da CRP, a norma constante do artigo 188.º, 
 n.º 1, do CPP, quer na redacção anterior quer na posterior à que foi dada pelo 
 Decreto-Lei n.º 320-C/2000, de 15 de Dezembro, quer quando interpretada no 
 sentido de uma intercepção telefónica, inicialmente autorizada por 60 dias, 
 poder continuar a processar-se, sendo prorrogada por novos períodos, ainda que 
 de menor duração, sem que previamente o juiz de instrução tome conhecimento do 
 conteúdo das conversações, quer na interpretação segundo a qual a primeira 
 audição, pelo juiz de instrução criminal, das gravações efectuadas pode ocorrer 
 mais de três meses após o início da intercepção e gravação das comunicações 
 telefónicas –, após sumariar as três decisões anteriormente referidas, 
 acrescentou:
 
  
 
             “Ora, verifica-se que esta jurisprudência do Tribunal 
 Constitucional, para cuja fundamentação se remete e se dá aqui por reproduzida, 
 mantém inteira validade para o caso em apreço, o que leva a que se considere 
 inconstitucional a norma constante do artigo 188.º, n.º 1, do Código de Processo 
 Penal, interpretada no sentido de a intercepção telefónica, inicialmente 
 autorizada por 60 dias, poder continuar a processar-se, sendo prorrogada por 
 dois novos períodos (de 30 dias cada um), sem que previamente o juiz de 
 instrução controle e tome conhecimento do conteúdo das conversações, por 
 violação dos artigos 32.º, n.º 8, 34.º, nºs 1 e 4, e 18.º, n.º 2, da 
 Constituição, bem como a mesma norma, na interpretação segundo a qual a primeira 
 audição da gravação das escutas telefónicas pelo juiz de instrução pode ocorrer 
 durante o aludido segundo período de prorrogação.”
 
  
 
                         Foi a jurisprudência delineada nos Acórdãos nºs 407/97, 
 
 347/2001, 528/2003, e 379/2004 que a Decisão Sumária n.º 324/2004, sem 
 considerações complementares, invocou para julgar inconstitucional, por violação 
 das disposições conjugadas dos artigos 32.º, n.º 8, 43.º, nºs 1 e 4, e 18.º, n.º 
 
 2, da CRP, a norma constante do n.º 1 do artigo 188.º do CPP, na redacção que 
 lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 320-C/2000, de 15 de Dezembro, quando 
 interpretada no sentido de que a primeira audição, pelo juiz de instrução 
 criminal, das gravações efectuadas pode ocorrer seis meses após o início da 
 intercepção e gravação das comunicações telefónicas.
 
                         Da explanação da jurisprudência do Tribunal 
 Constitucional (o texto integral dos Acórdãos e Decisão Sumária anteriormente 
 citados está disponível em www.tribunalconstitucional.pt), cujos traços 
 essenciais foram logo desenhados pelo Acórdão n.º 407/97, resulta que se 
 entendeu constitucionalmente justificado que a admissibilidade da intromissão 
 nas comunicações telefónicas fosse não só alvo de prévia autorização judicial, 
 mas também objecto de acompanhamento judicial ao longo da sua execução. O que se 
 exige é, pois, um “acompanhamento próximo” e um “controlo do conteúdo” das 
 conversações, com uma dupla finalidade: (i) fazer cessar, tão depressa quanto 
 possível, escutas que se venham a revelar injustificadas ou desnecessárias; e 
 
 (ii) submeter a um “crivo” judicial prévio a aquisição processual das provas 
 obtidas por esse meio (cf. JOSÉ MANUEL DAMIÃO DA CUNHA, “A jurisprudência do 
 Tribunal Constitucional em matéria de escutas telefónicas”, Jurisprudência 
 Constitucional, n.º 1, Janeiro-Março 2004, pp. 50-56). Mas – repete-se – o 
 exigente critério assumido não significa “que toda a operação de escuta tenha de 
 ser materialmente realizada pelo juiz”, posição que corresponderia a uma “visão 
 maximalista”, que o Tribunal não subscreveu.
 
  
 
                         2.6. Da exposição precedente já resultam claramente 
 evidenciadas as dúvidas e perplexidades que o regime legal das escutas 
 telefónicas tem suscitado. Mas se, ao nível da jurisprudência constitucional, 
 elas incidiram quase exclusivamente sobre o tempo de acompanhamento judicial da 
 execução da operação (sobre o modo desse acompanhamento apenas incidiu o citado 
 Acórdão n.º 426/2005, que não julgou inconstitucional a norma do artigo 188.º, 
 nºs 1, 3 e 4, do CPP, “interpretado no sentido de que são válidas as provas 
 obtidas por escutas telefónicas cuja transcrição foi, em parte, determinada pelo 
 juiz de instrução, não com base em prévia audição pessoal das mesmas, mas por 
 leitura de textos contendo a sua reprodução, que lhe foram espontaneamente 
 apresentados pela Polícia Judiciária, acompanhados das fitas gravadas ou 
 elementos análogos”), já a nível da doutrina e da prática judiciária elas têm 
 também incidido sobre os requisitos da autorização da operação, reportados ao 
 artigo 187.º do CPP, quer na perspectiva da adequação do “catálogo” de crimes 
 enunciado no seu n.º 2, quer no que concerne a uma clara definição das pessoas 
 cujas conversações podem ser colocadas sob escuta, quer quanto à ausência de uma 
 definição legal da duração das escutas. Designadamente no que respeita à 
 execução da operação, é indefinida a forma de articulação entre órgão de polícia 
 criminal, Ministério Público e juiz, registam‑se oscilações quanto à definição 
 do conteúdo do auto (ou dos autos) a elaborar e tem sido salientado o 
 inconveniente da imediata destruição das gravações que o juiz reputou 
 irrelevantes, por assim se eliminar irreversivelmente o aproveitamento de 
 passagens que eventualmente seriam consideradas importantes quer pela acusação, 
 quer pela defesa (cf. indicações bibliográficas constantes do n.º 2.9. do 
 Acórdão n.º 426/2005).
 
                         Em resultado dessas perplexidades e reflexões, as 
 iniciativas legislativas relativas à revisão do Código de Processo Penal 
 apresentadas na última Legislatura – Projecto de Lei n.º 424/IX, apresentado 
 pelo Bloco de Esquerda, Proposta de Lei n.º 149/IX e Projecto de Lei n.º 519/IX, 
 apresentado pelo Partido Socialista (Diário da Assembleia da República, II 
 Série-A, IX Legislatura, 2.ª Sessão Legislativa, n.º 50, de 3 de Abril de 2004, 
 pp. 2214-2219, e 3.ª Sessão Legislativa, n.º 17, de 20 de Novembro de 2004, pp. 
 
 21-40, e n.º 20, de 3 de Dezembro de 2004, pp. 6-118, respectivamente) – 
 propugnam, designadamente: (i) a elevação de 3 para 5 anos do máximo da pena de 
 prisão aplicável aos crimes que consentem a autorização de escutas; (ii) a 
 restrição da admissibilidade destas apenas quando não existir outro meio lícito 
 para atingir a descoberta da verdade ou se revelar de superior interesse, face 
 aos demais meios de prova, para esse objectivo; (iii) a definição das pessoas 
 cujas conversações podem ser interceptadas; (iv) a instauração de regimes 
 especiais atenta a qualidade dos escutados; (v) a exigência de especial 
 fundamentação do despacho autorizador das escutas; (vi) o estabelecimento de 
 limites temporais para a execução das escutas e respectivas prorrogações; (vii) 
 o alargamento dos casos de proibição de transcrições. Quanto aos limites 
 temporais, a Projecto de Lei n.º 519/IX (PS) propugnava que o despacho judicial 
 que autorizasse ou ordenasse a intercepção fixasse “o prazo máximo da sua 
 duração, que, com dilação de cinco dias após a data da prolação, não pode 
 ultrapassar trinta dias, prorrogáveis no limite até cinco vezes, reconhecida em 
 cada caso essa necessidade, e desde que cumpridas, em cada período autorizado, 
 as formalidades exigíveis para a operação”, não podendo o tempo da intercepção 
 ultrapassar, “em nenhum caso, o prazo máximo em concreto admitido para a duração 
 do inquérito ou da instrução” (artigo 187.º, n.º 3); enquanto a Proposta de Lei 
 n.º 150/IX previa que o referido despacho, além de fundamentado, fixasse “o 
 prazo de duração máxima das operações, por um período não superior a três meses 
 a contar da sua prolação, sendo renovável por períodos idênticos até ao 
 encerramento do inquérito, desde que se mantenham os respectivos pressupostos de 
 admissibilidade” (artigo 187.º, n.º 5).
 
                         No que especificamente respeita ao acompanhamento 
 judicial da operação, o Projecto de Lei n.º 424/IX (BE) propõe: (i) a fixação do 
 prazo máximo de 24 horas para ser levado ao conhecimento do juiz o auto de 
 intercepção e gravação, com as fitas gravadas e a indicação das passagens 
 consideradas relevantes para a prova; (ii) a supervisão de todo o processo, 
 especialmente a transcrição em auto, pelo Ministério Público; (iii) a 
 conservação das gravações não transcritas até ao trânsito em julgado da decisão 
 final, podendo o arguido requerer a sua audição em sede de julgamento ou de 
 recurso para contextualizar as conversações transcritas. A Proposta de Lei n.º 
 
 150/IX estabelece, designadamente, que: (i) os autos de intercepção e gravação, 
 com as fitas, são levados ao conhecimento do juiz, de 15 em 15 dias, com 
 indicação por parte do Ministério Público das passagens consideradas relevantes 
 para a prova; (ii) o Ministério Público é ouvido pelo juiz antes de este 
 seleccionar os elementos a consignar em suporte autónomo e a transcrever em 
 auto; (iii) as fitas e elementos análogos são conservados até ao trânsito em 
 julgado da decisão final, tendo a eles acesso o arguido para efeitos de selecção 
 de mais excertos que entenda relevantes. Por último, o Projecto de Lei n.º 
 
 519/IX (PS) prevê que seja o juiz o fixar o período findo o qual o auto com as 
 fitas é levado ao seu conhecimento, acompanhado ou da indicação das passagens e 
 dos dados considerados relevantes para a prova ou mesmo da respectiva 
 transcrição provisória, cabendo ao juiz determinar a transformação desta 
 transcrição provisória em definitiva ou, se não considerar os elementos nela 
 contidos como relevantes, determinar a sua eliminação.
 
  
 
                         2.7. Grande parte das questões referenciadas no 
 precedente número têm por suporte a apreciação da adequação do sistema legal 
 actualmente vigente entre nós com as exigências que nesta matéria têm sido 
 estabelecidas pela jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, 
 face ao disposto no artigo 8.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que 
 proclama o direito de qualquer pessoa ao respeito da sua vida privada e 
 familiar, do seu domicílio e da sua correspondência (n.º 1) e proíbe ingerências 
 da autoridade pública no exercício desse direito, excepto se essa exigência 
 estiver prevista na lei e constituir uma providência que, numa sociedade 
 democrática, seja necessária para a segurança nacional, para a segurança 
 pública, para o bem-estar económico do país, a defesa da ordem e a prevenção 
 das infracções penais, a protecção da saúde ou da moral, ou a protecção dos 
 direitos e das liberdades dos outros (n.º 2).
 
                         Na síntese apresentada por IRENEU CABRAL BARRETO (“A 
 Investigação criminal e os direitos humanos”, Polícia e Justiça – Revista do 
 Instituto Superior de Polícia Judiciária e Ciências Criminais, III Série, n.º 1, 
 Janeiro-Junho de 2003, pp. 43‑85, em especial pp. 57-63; e “A jurisprudência do 
 novo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem”, Sub Judice – Justiça e Sociedade, 
 n.º 28, Abril-Setembro 2004, pp. 9-32, em especial pp. 20-21; cf. ainda, do 
 mesmo autor, A Convenção Europeia dos Direitos do Homem Anotada, 3.ª edição, 
 Coimbra, 2005, anotações I-3.3 e II-4. e 6.4. ao artigo 8.º, a pp. 184, 196 e 
 
 199; e JOÃO RAMOS DE SOUSA, “Escutas telefónicas em Estrasburgo: O activismo 
 jurisprudencial do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem”, Sub Judice, citada, 
 pp. 47-55 ):
 
  
 
 “A jurisprudência de Estrasburgo, tendo em conta a gravidade da ingerência na 
 vida das pessoas que representa a escuta telefónica, precisou que não basta uma 
 lei a prever essa possibilidade.
 Para prevenir o risco de arbítrio que o uso desta medida poderia acarretar, 
 entende-se que uma tal lei deve conter uma série de garantias mínimas:
 
 – definir as categorias de pessoas susceptíveis de serem colocadas em escutas 
 telefónicas;
 
 – a natureza das infracções que podem permitir essa escuta;
 
 – a fixação de um limite de duração dessa medida;
 
 – as condições do estabelecimento de processos verbais de síntese consignando as 
 conversas interceptadas;
 
 – as precauções a tomar para comunicar, intactos e completos, os registos 
 realizados, para o controlo do juiz e da defesa;
 
 – as circunstâncias nas quais pode e deve proceder-se ao apagamento ou 
 destruição das fitas magnéticas, nomeadamente após uma absolvição ou o 
 arquivamento do processo.”
 
  
 
                         Como refere GÉRARD COHEN-JONATHAN (“La Cour européenne 
 des droits de l’homme et les écoutes téléphoniques”, Revue Universelle des 
 Droits de l’Homme, vol. 2, n.º 5, 31 de Maio de 1990, pp. 185–191), impõe-se a 
 existência de uma lei que preveja a possibilidade de autorização de escutas, lei 
 que deve ser acessível e precisa, e que se estabeleçam garantias adequadas, 
 desde logo definindo com precisão quais as autoridades competentes para ordenar 
 ou autorizar as escutas, quais os crimes cuja gravidade justifica o uso deste 
 meio de produção de prova e o grau de suspeita exigível, não podendo a 
 ingerência ser meramente exploratória. Depois, o acompanhamento da operação 
 há-de ocorrer em três estádios: no momento da ordem ou da autorização, no 
 decurso da operação e após o seu termo, possibilitando às pessoas colocadas sob 
 escuta o direito de acesso às gravações e respectivas transcrições, o direito à 
 eliminação das passagens irrelevantes ou interditas e o direito à destruição ou 
 restituição dos respectivos suportes.
 
                         Mas para além das “escutas judiciárias”, são ainda 
 admissíveis “escutas administrativas”, determinadas pelo poder executivo visando 
 objectivos de segurança interna e externa, as quais devem oferecer igualmente 
 garantias adequadas que afastem o risco de utilização abusiva, garantias que 
 serão naturalmente diferentes das previstas para as “escutas judiciárias”, mas 
 que sempre exigirão a possibilidade de recurso aos tribunais, embora apenas a 
 posteriori. Essas garantias passam, nalguns países, pela intervenção de 
 entidades independentes, por vezes de origem parlamentar, que acompanham a 
 actuação do executivo (cf. o Acórdão Klass, de 1978, em que o Tribunal Europeu 
 considerou suficientes os recursos judiciais a posteriori previstos no direito 
 alemão em caso de intercepção de conversações determinada pelo Governo alemão, 
 para defesa da ordem e segurança numa sociedade democrática e para evitar 
 infracções, sem controlo judicial prévio, e a decisão da Comissão Europeia dos 
 Direitos do Homem, de 10 de Maio de 1985, relativa ao Luxemburgo, ambos citados 
 no artigo de GÉRARD COHEN‑JONATHAN).
 
                         De particular relevância para o presente recurso (em 
 que, como se verá, a recorrente reclama a imediata destruição das gravações 
 tidas por irrelevantes pelo juiz de instrução) reveste-se a constante chamada de 
 atenção, por parte do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, para a necessidade 
 de as legislações nacionais tomarem precauções no sentido de assegurar “a 
 comunicação intacta e completa das gravações efectuadas, para efeito de controlo 
 pelo juiz e pela defesa” e estabelecerem as circunstâncias em que se pode operar 
 o apagamento ou a destruição das gravações, designadamente após o arquivamento 
 definitivo do processo ou o trânsito em julgado da condenação final (cf. n.º 34 
 do Acórdão Huvig, de 24 de Abril de 1990; n.º 35 do Acórdão Kruslin, da mesma 
 data; n.º 59 do Acórdão Valenzuela Contreras, de 30 de Julho de 1998; e n.º 30 
 do Acórdão Prado Bugallo, de 18 de Fevereiro de 2003).
 
                        
 
                         2.8. A análise de ordenamentos jurídicos de países cujas 
 normas constitucionais relevantes na matéria são similares às portuguesas revela 
 que o legislador ordinário tem moldado de modo diversificado o regime das 
 escutas telefónicas, designadamente no que respeita à intervenção do juiz, quer 
 na fase de autorização, quer na fase de acompanhamento da operação (cf. MARIO 
 CHIAVARIO e outros, Procedure Penali d’Europa, 2.ª edição, Milão, 2001).
 
                         Na Bélgica, de acordo com as Leis de 10 de Junho de 1998 
 e de 10 de Janeiro de 1999, a regra é a da autorização pelo juiz de instrução, 
 mas, em casos de urgência, a escuta pode ser determinada pelo Ministério 
 Público, embora sujeita a validação judicial. Só se procede à transcrição das 
 passagens consideradas relevantes, mas mantêm-se intactas as gravações, podendo 
 as partes consultá-las e requerer a transcrição de passagens inicialmente tidas 
 por irrelevantes (ob. cit., pp. 75-76).
 
                         Na França, segundo os artigos 100.º e seguintes do 
 Código de Processo Penal, alterados pela Lei de 10 de Julho de 1991, a ordem de 
 intercepção é dada pelo juiz de instrução, o qual, porém, pode delegar num 
 oficial de polícia judiciária o acompanhamento da operação. As gravações só são 
 destruídas no termo de prescrição do procedimento criminal (ob. cit., pp. 
 
 139-140).
 
                         Na Alemanha também é de regra a autorização pelo juiz, 
 mas, em caso de urgência, a intercepção pode ser determinada pelo Ministério 
 Público, sujeita a validação judicial. A ordem de intercepção implica o poder de 
 registo. No julgamento, o juiz pode optar entre a audição das gravações ou a 
 leitura das transcrições (ob. cit., p. 204).
 
                         Diversamente, na Inglaterra, as escutas são determinadas 
 pelo Ministro do Interior ou pelas autoridades policiais, com mandado 
 ministerial, não tendo o juiz qualquer poder de controlo sobre as intercepções, 
 existindo possibilidade de recurso para uma comissão integrada por advogados 
 nomeados pelo Governo, que verifica o cumprimento das condições legais da 
 intercepção (ob. cit., pp. 258-259).
 
                         Na Itália, a regra é a de que compete ao juiz de 
 instrução autorizar as intercepções, mas em caso de urgência elas podem ser 
 ordenadas pelo Ministério Público, com subsequente validação judicial (ob. cit., 
 pp. 321-322). As comunicações interceptadas são registadas em acta, aí sendo 
 transcrito, ainda que sumariamente, o conteúdo da comunicação interceptada 
 
 (artigo 268.º do Código de Processo Penal italiano). O registo da intercepção e 
 a acta são transmitidos imediatamente ao Ministério Público, que os deposita na 
 secretaria, sendo de seguida dado conhecimento ao defensor, que pode escutar os 
 registos e examinar os actos, e só então, face às posições assumidas pelas 
 partes interessadas quanto à admissibilidade e relevância das comunicações 
 interceptadas, é que o juiz de instrução manda suprimir os registos cuja 
 utilização é legalmente vedada e admite os que não são manifestamente 
 irrelevantes (artigo 268.º, n.º 6, do mesmo Código) – cf. J. A. MOURAZ LOPES, A 
 Tutela da Imparcialidade Endoprocessual no Processo Penal Português, Coimbra, 
 
 2005, pp. 145-146, nota 388.
 
                         Em Espanha, face à natureza genérica que, mesmo após a 
 modificação introduzida pela Lei Orgânica n.º 4/1998, de 25 de Maio de 1988, aos 
 artigos 553.º e 559.º da Ley de Enjuiciamiento Criminal – que se limitam a 
 permitir que o juiz autorize, por decisão fundamentada, pelo prazo máximo de 
 três meses, susceptível de prorrogação por períodos similares, a vigilância de 
 comunicações telefónicas de pessoas relativamente às quais existam indícios de 
 responsabilidade criminal –, tem sido sobretudo obra da jurisprudência a 
 definição das condições de admissibilidade das interferências nas comunicações. 
 A jurisprudência do Tribunal Constitucional espanhol, para utilizar a síntese 
 feita no fundamento jurídico 5.º da Sentença n.º 171/99, tem consignado que “uma 
 medida restritiva do direito ao segredo das comunicações só pode considerar-se 
 constitucionalmente legítima na perspectiva deste direito fundamental se, em 
 primeiro lugar, está legalmente prevista com suficiente precisão – princípio da 
 legalidade formal e material (...); se, em segundo lugar, é autorizada por 
 autoridade judicial no âmbito de um processo (...); e, em terceiro lugar, se se 
 realiza com estrita observância do princípio da proporcionalidade; é dizer, se a 
 medida é autorizada por ser necessária para alcançar um fim constitucionalmente 
 legítimo, como – entre outros –, para a defesa da ordem e prevenção de delitos 
 qualificáveis como infracções puníveis graves, e é idónea e imprescindível para 
 a investigação dos mesmos (...), e existem indícios sobre o facto constitutivo 
 do delito e sobre a conexão com o mesmo por parte das pessoas investigadas. 
 
 (...) A execução da intervenção telefónica deve ater-se aos estritos termos da 
 autorização tanto quanto aos limites materiais da mesma como às condições da sua 
 autorização (...) e, finalmente, deve levar-se a cabo sob controlo judicial”.
 
  
 
                         2.9. Recortado o parâmetro constitucional atendível 
 
 (2.1.), historiada a evolução legislativa do regime das escutas e perplexidades 
 que suscitou e suscita (2.2., 2.3., 2.4. e 2.6.), recordada a pertinente 
 jurisprudência do Tribunal Constitucional (2.2. e 2.5.) e do Tribunal Europeu 
 dos Direitos do Homem (2.7.) e feita sumária referência a sistemas jurídicos 
 próximos (2.8.), cumpre, finalmente, enfrentar as questões de 
 constitucionalidade que vêm suscitadas no presente recurso.
 
                         Continuando a trilhar o mesmo percurso já seguido no 
 Acórdão n.º 426/2005, importa salientar que não está em causa a correcção, ao 
 nível da interpretação e aplicação do direito ordinário, das interpretações 
 normativas acolhidas pelo acórdão recorrido, mas tão-só apurar se essas 
 interpretações, aceites como um dado da questão, são constitucionalmente 
 conformes.
 
                         Do relato da evolução legislativa resulta uma oscilação 
 quanto ao número e conteúdo do “auto de intercepção e gravação”. A circunstância 
 de a versão originária do artigo 188.º do CPP aludir a um único auto e de ser o 
 exame desse auto pelo arguido, pelo assistente e pelas pessoas escutadas que 
 lhes possibilitaria inteirarem-se da conformidade das gravações e obterem cópia 
 dos elementos referidos no auto, levou a que se entendesse, designadamente no 
 parecer n.º 92/91 (complementar), de 17 de Setembro de 1992, do Conselho 
 Consultivo da Procuradoria-Geral da República, que esse auto não devia conter 
 apenas o registo do acto de intercepção, mas inclusivamente o conteúdo das 
 conversações interceptadas, por transcrição das tidas por relevantes e menção 
 genérica das consideradas destituídas de interesse.
 
                         A intervenção legislativa consumada pela Lei n.º 59/98 
 visou afastar esse entendimento, tornando clara a existência de dois autos – um 
 relativo ao acto de intercepção e gravação e outro de transcrições –, sendo ao 
 auto de transcrição que é facultado o acesso por parte do arguido, do assistente 
 e das pessoas escutadas, para efeitos de controlo da fidelidade das mesmas. 
 Simultaneamente veio prever-se, de forma expressa, a possibilidade de 
 conhecimento, a título excepcional, do conteúdo das comunicações por parte do 
 
 órgão de polícia criminal antes do seu conhecimento pelo juiz, e a possibilidade 
 de o juiz, na sua tarefa de selecção dos elementos que, por considerados 
 relevantes para a prova, deviam ser transcritos, ser coadjuvado por órgão de 
 polícia criminal.
 
                         Finalmente, a alteração operada pelo Decreto-Lei n.º 
 
 320-C/2000 veio de novo alterar o conteúdo do auto de intercepção e de gravação. 
 Ele deixou de ser mero auto de registo da efectivação da operação, para dever 
 sempre conter, não a transcrição das passagens que o órgão de polícia criminal 
 reputasse relevantes (como entendera o parecer n.º 92/91 da Procuradoria-Geral 
 da República), mas a indicação dessas passagens, com o objectivo, que resulta do 
 artigo 4.º da Lei n.º 27-A/2000, de limitar o dever de o juiz ouvir as gravações 
 
 às passagens indicadas. Desta alteração resultou, por outro lado, que, para 
 poder fornecer a indicação das passagens das gravações ou elementos análogos 
 considerados relevantes para a prova, o órgão de polícia criminal tem de passar 
 a, por sistema, tomar conhecimento do conteúdo das comunicações interceptadas, o 
 que obviamente posterga o carácter excepcional de que, na redacção anterior, 
 esse conhecimento tinha (unicamente destinado a prevenir a prática de actos 
 cautelares necessários e urgentes para assegurar meios de prova). Por outro, 
 deixando de ser um mero acto de registo de ocorrência, para passar a implicar o 
 prévio desenvolvimento de actividades, necessariamente morosas, de audição de 
 gravações (por vezes em língua estrangeira), identificação dos intervenientes e 
 ponderação da sua relevância para a investigação, é óbvio que a exigência de 
 
 “imediatividade” da apresentação do auto tem de ser vista à luz de outros 
 critérios, diversos dos que estavam presentes quando foram proferidos os Acórdão 
 nºs 407/97, 347/2001 e 528/2003. Disso mesmo deu conta este Tribunal, logo no 
 Acórdão n.º 699/2004, quando, ao analisar a admissibilidade de recurso 
 interposto ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea g), da LTC, por a decisão 
 então recorrida ter pretensamente feito aplicação da norma do n.º 1 do artigo 
 
 188.º do CPP em contradição com os juízos de inconstitucionalidade contidos nos 
 Acórdãos nºs 407/97, 347/2001 e 528/2003 (os dois primeiros incidindo sobre a 
 redacção anterior à Lei n.º 59/98 e o terceiro sobre a redacção desta Lei, mas 
 anterior à do Decreto-Lei n.º 320-C/2000), contestou a identidade entre a 
 dimensão normativa aplicada na decisão recorrida (enquanto posterior a este 
 decreto-lei) e a anteriormente julgada inconstitucional pelo Tribunal 
 Constitucional, afirmando: “ao acrescentar a este texto [o do n.º 1 do artigo 
 
 188.º do CPP] «com a indicação das passagens das gravações ou elementos análogos 
 considerados relevantes para a prova», o Decreto-Lei n.º 320-C/2000 introduziu 
 uma alteração relevante para a interpretação da norma de que se trata no 
 presente recurso, e que não permite a respectiva apreciação ao abrigo de um 
 recurso interposto ao abrigo do disposto na alínea g) do n.º 1 do artigo 70.º da 
 Lei n.º 28/82, se baseado em acórdãos relativos à anterior versão da lei”. 
 Também a Decisão Sumária n.º 252/2005 não conheceu de recurso interposto ao 
 abrigo da alínea g) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, tendo por objecto a norma do 
 n.º 1 do artigo 188.º do CPP, na redacção do Decreto-Lei n.º 320-C/2000, 
 aplicada na decisão recorrida alegadamente em desconformidade com os juízos de 
 inconstitucionalidade proferidos nos Acórdãos nºs 407/97, 347/2001 e 528/2003 
 
 (todos eles reportados a redacções anteriores), por falta de coincidência 
 normativa, dado que a alteração de redacção ocorrida em 2000 “assume (...) claro 
 relevo na apreciação da questão de constitucionalidade apreciada”, pois 
 
 “introduzindo-se pela nova redacção um formalismo até então inexistente, o mesmo 
 
 é susceptível de condicionar o critério da imediatividade a que se refere o 
 artigo”.
 
                         A este propósito há, no entanto, que salientar que os 
 inconvenientes derivados da maior complexidade e consequente morosidade da 
 elaboração do auto em causa serão, no todo ou em grande parte, compensados com a 
 maior rapidez e precisão que o novo sistema permite no que respeita ao acto 
 judicial de controlo da relevância das gravações e de selecção das que devem ser 
 transcritas, pelo que não se trata de fazer recair única e exclusivamente sobre 
 o arguido o ónus da alteração legislativa assinalada enquanto determina uma 
 alteração do critério da imediatividade anteriormente seguido.
 
                         A segunda nota que importa salientar é a de que, 
 independentemente da interpretação do direito ordinário vigente que se considere 
 mais correcta, não é legítimo transformar o regime legal em regime 
 constitucional. Isto é: não é lícito considerar toda e qualquer violação ao 
 regime legal como uma violação da Constituição. Como inicialmente se salientou, 
 o n.º 4 do artigo 34.º da CRP permite, embora com carácter de excepcionalidade, 
 a ingerência das autoridades públicas nas telecomunicações, impondo directamente 
 como limitação tratar-se de matéria de processo criminal e submetendo-a a 
 reserva de lei (mas não a sujeitando explicitamente a reserva de decisão 
 judicial, como fizera no precedente n.º 2 quanto à entrada no domicílio dos 
 cidadãos), requisitos estes que se mostram no caso preenchidos: as intercepções 
 foram determinadas no âmbito de um processo criminal visando a investigação de 
 ilícitos que constam da enumeração legal dos crimes relativamente aos quais é 
 lícito o uso deste meio de obtenção de prova (artigo 187.º, n.º 1, alínea a), do 
 CPP), ao que acresce que todas elas foram previamente objecto de autorização 
 judicial e que, em todas elas (diversamente do que ocorria no caso em que foi 
 proferido o Acórdão n.º 426/2005), o juiz de instrução procedeu à audição 
 pessoal das gravações, antes de proceder à selecção das que considerava 
 relevantes e determinar a sua transcrição e aquisição processual.
 
                         Neste contexto, a eventual inconstitucionalidade das 
 interpretações normativas impugnadas, todas elas reportadas aos termos em que se 
 terá processado o acompanhamento judicial da execução da operação, apenas pode 
 assentar em violação do princípio da proporcionalidade aplicável às restrições 
 dos direitos, liberdades e garantias (artigo 18.º, nºs 2 e 3, da CRP).
 
                         No citado Acórdão n.º 407/97 e posterior jurisprudência 
 deste Tribunal que reiterou a doutrina nele definida, sustentou-se que a 
 especial danosidade social desta intromissão nas comunicações implicava, não 
 apenas um controlo judicial do desencadear da operação (não estando ora em causa 
 saber se esse controlo tem de ser sempre prévio ou pode ser de validação de 
 determinação do Ministério Público ou de órgãos de polícia criminal, como é 
 admitido noutros ordenamentos jurídicos), mas um acompanhamento judicial da 
 própria execução da operação. Acompanhamento este que deve ser contínuo e 
 próximo temporal e materialmente da fonte, mas que não implica necessariamente 
 
 “que toda a operação de escuta tenha de ser materialmente executada pelo juiz”, 
 como uma “visão maximalista” exigiria.
 
                         Há que fazer uma interpretação desse requisito 
 jurisprudencial funcionalmente adequada à sua razão de ser. E os propósitos 
 visados consistem, como se assinalou, em propiciar que seja determinada a 
 interrupção da intercepção logo que a mesma se revele desnecessária, desadequada 
 ou inútil, e, por outro lado, fazer depender a aquisição processual da prova 
 assim obtida a um “crivo” judicial quanto ao seu carácter não proibido e à sua 
 relevância.
 
             [...]
 
                         Um dos aspectos mais criticados do actual sistema legal 
 consiste no facto de a lei não prever expressamente um prazo máximo de duração 
 das escutas nem esclarecer se o auto de gravação só deve ser elaborado no termo 
 do período autorizado ou se há lugar à apresentação de autos “intercalares”. No 
 presente caso, os diversos despachos judiciais fixaram prazos de 60 dias e só 
 dois se referiram às datas de apresentação dos autos de gravação: o de 31 de 
 Janeiro de 2003 (reproduzido no de 11 de Fevereiro de 2003) determinou que, 
 antes de findar o referido período de 60 dias, deveria ser, de imediato, dado 
 conhecimento do auto lavrado, com indicação das passagens relevantes para a 
 prova, acompanhadas das respectivas fitas magnéticas gravadas ou elementos 
 análogos de consulta; e o de 18 de Setembro de 2003, determinou que esses autos 
 fossem lavrados de 20 em 20 dias.
 
                         Entende-se que os apontados prazos de 60 dias de duração 
 máxima das escutas não se pode considerar como implicando um intolerável 
 descontrolo judicial da operação, mesmo que acoplados ao entendimento de que, se 
 nada for judicialmente determinado em sentido contrário, é no termo de cada 
 período de escuta, e não logo a seguir a cada conversação interceptada, que deve 
 ser elaborado o auto de gravação com indicação, pelo órgão de polícia criminal, 
 das passagens consideradas relevantes para a prova.
 
                         A este propósito recorde-se que o Projecto de Lei n.º 
 
 519/IX preconizava que o prazo máximo de duração das escutas fosse de 30 dias 
 
 (com dilação de 5 dias após a data da prolação da autorização), prorrogáveis até 
 
 5 vezes (artigo 187.º, n.º 3), competindo ao juiz fixar o período findo o qual o 
 auto com as fitas gravadas é levado ao seu conhecimento, acompanhado ou da 
 indicação das passagens e dos dados considerados relevantes para a prova ou 
 mesmo da respectiva transcrição provisória (artigo 188.º, n.º 1). E a Proposta 
 de Lei n.º 150/IX previa que a duração máxima fosse de 3 meses, renovável por 
 períodos idênticos até ao encerramento do inquérito (artigo 187.º, n.º 5), 
 devendo os autos de intercepção e gravação, com as fitas, ser levados ao 
 conhecimento do juiz, de 15 em 15 dias, com indicação, por parte do Ministério 
 Público, das passagens consideradas relevantes (artigo 188.º, n.º 1).
 
                         Relativamente ao espaço de tempo entre o fim da gravação 
 
 (ou de fases dela) e a apresentação do respectivo auto, já se salientou que, 
 após a alteração legislativa de 2000, a maior complexidade na elaboração do auto 
 impõe a adopção de critério mais dilatado quanto ao requisito da imediatividade 
 da sua elaboração e apresentação, não sendo exigível a fixação de um prazo 
 máximo rígido, que sempre se poderia mostrar completamente desadequado ao 
 condicionalismo do caso concreto.
 
                         De qualquer forma, os prazos registados nos presentes 
 autos, quer entre os períodos de intercepções e as datas de elaboração dos 
 correspondentes autos, quer entre estas datas e as datas de apresentação ao 
 juízes de instrução criminal, quer entre estas últimas e as audições pessoais a 
 que estes juízes procederam em caso algum se mostram de tal forma dilatadas que 
 se possa questionar o respeito pela exigência do referido acompanhamento 
 judicial.
 
             [...]”.
 
  
 
             
 
             Como pode constatar-se o Tribunal, ao reflectir o regime legal 
 constante do artigo 188.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, assumiu nesse 
 aresto, na esteira de anteriores decisões sobre a matéria, que as exigências 
 constitucionais pertinentes impõem, sempre e em todo o caso, um acompanhamento 
 judicial efectivo e próximo das operações em causa, assumindo, quanto ao 
 requisito da “imediatividade”, que o mesmo possa, salvaguardada aquela 
 determinação, assumir uma certa geometria variável em face dos 
 
 “condicionalismo[s] do caso concreto”.
 
             Semelhante proposição conclusiva impõe-se no caso sub judicio.
 De facto, não pode olvidar-se que a concreta realização do direito por mediação 
 de uma norma legal pressupõe como prius metodológico a consideração do caso 
 concreto, aqui residindo o ponto de partida para a determinação do sentido 
 jurídico-normativo da norma mobilizanda. Por esse motivo, a ponderação 
 valoradora das exigências legais não pode abster-se de considerar as 
 particulares especificidades do caso concreto como condição determinante da 
 adequação problemática do critério convocado para dirimir o problema jurídico 
 concreto (A. Castanheira Neves, Metodologia jurídica. Problemas fundamentais, 
 Coimbra, 1993).
 O que assume particular relevo metodológico quando, como no caso presente, a 
 norma em causa não estabelece um prazo máximo e rígido, suscitando uma 
 actividade mediadora que terá forçosamente de atender ao condicionalismo 
 concretamente em causa.
 Nesse pressuposto, a valoração dos factores implicados pela complexidade das 
 operações – quais sejam, como relata o Acórdão recorrido, “o elevado número de 
 Alvos (telefones) interceptados, a enorme quantidade de conversações de cada 
 Alvo, a necessidade de elaboração de relatórios parcelares relativos a cada 
 apresentação de autos de gravação e dos respectivos CDs gravados por forma a 
 facilitar à M.ma JIC a tarefa de selecção das passagens relevantes (que é afinal 
 o que se pretende com 188.º, n.º 1, do Código de Processo Penal)” – constitui 
 uma dimensão inarredável para aferir do cumprimento da exigência legal, sendo 
 absolutamente compreensível que o lapso temporal a imputar ao requisito da 
 imediatividade seja forçosamente diferenciado em função desses factores,  o que, 
 só por si, em nada compromete o “efectivo controlo das operações” e o 
 acompanhamento judicial da realização das escutas telefónicas, devendo mesmo 
 aceitar-se que a aferição do momento de apresentação dos autos de gravação em 
 face das circunstâncias do caso acaba inclusivamente por ser reclamada pelo 
 investimento que o conteúdo dos autos de gravação representa em sede de controlo 
 jurisdicional das escutas telefónicas e, bem assim, dos próprios direitos dos 
 arguidos.
 
  
 
  
 C – Decisão
 
  
 
             5 – Destarte, atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide:
 a)       Não tomar conhecimento do objecto do recurso quanto às normas referidas 
 nos pontos 3.1. a 3.5.; e, quanto ao demais,
 b)       Negar provimento ao recurso.
 
  
 Custas pelo recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 25 UCs.
 Lisboa, 23.09.2008
 Benjamim Rodrigues
 João Cura Mariano
 Joaquim de Sousa Ribeiro
 Mário José de Araújo Torres
 Rui Manuel Moura Ramos
 
  
 
  
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 [1] Apenas se transcreve a parte inicial, sendo certo que o recorrente 
 desenvolve, ao longo da sua motivação, estes fundamentos.
 
 [2] Esta fundamentação está subjacente na decisão recorrida – v. fls. 22896
 
 [3] Ao tempo em que foram efectuadas as escutas.
 
 [4] Que para melhor percepção, se sublinhará.
 
 [5] No qual se faz uma resenha de toda a jurisprudência anterior sobre a 
 matéria, como já vinha acontecendo com outros acórdãos.
 
 [6] Citando a decisão recorrida do Tribunal da Relação.
 
 [7] Jurisprudência referenciada na decisão recorrida – v. fls. 22904.
 
 [8] Referimo-nos ao momento de apresentação ao juiz e não à data do auto de 
 transcrição, pois estes dois momentos podem não coincidir, como efectivamente 
 não coincidem, pois nos presentes autos, a Sra. Juíza procedeu à audição das 
 respectivas gravações, o que implicou, necessariamente, entre o momento da 
 apresentação dos autos e gravações até ao momento da ordem e elaboração do auto 
 de transcrição, hiatos de alguns ou vários dias, sendo certo que para efeitos de 
 apreciação do controlo judicial das escutas, é aquele primeiro momento que 
 interessa.
 A situação tornou-se mais morosa e complexa, quer com o avolumar do número de 
 alvos a escutar quer com o consequente número de gravações a ouvir.
 
 [9] Anota-se que no que ao recorrente respeita, em caso algum o prazo chegou aos 
 
 75 dias como a dado momento é referido no despacho recorrido a fls. 23023 e que 
 o MP corrige na sua resposta. 
 
 [10] Realça-se o facto de na data de 12 de Dezembro de 2003 não só terem sido 
 entregues as gravações de vários dias referentes ao alvo 20798, como no mesmo 
 dia 12 de Dezembro de 2003 foram também entregues os autos e gravações de vários 
 dias referentes ao alvo 21179 – v. fls. 5941 e 5942. Mas se extrapolarmos os 
 alvos em causa neste recurso e verificarmos os dados constantes do mapa 
 apresentado pelo Ministério Público na sua resposta que acaba por reflectir os 
 elementos constantes no mapa que integra a decisão recorrida, constatamos que, 
 com data de 12 de Dezembro de 2003, foram ainda apresentados outros autos e 
 gravações referentes a outros alvos e dias de gravação, num total de cerca de 
 
 86. E o que se afirma quanto a esta data, repete-se a tantas outras datas, como 
 seja a imediatamente seguinte, dia 12 de Janeiro de 2004, em que foram 
 apresentados 44.
 
 [11] Nas alterações ao artigo 188º e outros do CPP, dadas pela Lei nº 48/2007, 
 de 29 de Agosto.
 
 [12] Na prática, entre o início da gravação e a apresentação dos suportes 
 técnicos ao juiz, quer os iniciais, quer os subsequentes, poderão decorrer 17 
 dias.
 
 [13] Situação que o próprio recorrente refere na sua motivação de recurso. 
 
 [14] V. nº 10 do citado art. 188º.