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Processo n.º 404/06
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto
 
  
 
  
 Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 I. Relatório
 
 1.Em 21 de Fevereiro de 2006, A. apresentou reclamação do despacho de 7 de 
 Fevereiro de 2006, que lhe não admitiu o recurso que pretendeu interpor para o 
 Supremo Tribunal de Justiça do acórdão proferido em 20 de Dezembro de 2005, pelo 
 Tribunal da Relação de Évora, que revogou a decisão do 1.º Juízo do Tribunal de 
 Comarca de Silves “no que concerne à repartição em partes iguais do montante de 
 
 € 50.000,00 atribuído às recorrentes a título de indemnização por danos de 
 natureza não patrimonial – perda do direito à vida do B.– devendo tal 
 importância, acrescida dos competentes juros legais, contados a partir da 
 decisão proferida em 1.ª instância, ser paga pela demandada Companhia de Seguros 
 Fidelidade – C., S.A., e por inteiro, à recorrente D.”.
 A reclamante suscitou a questão da inconstitucionalidade do disposto no artigo 
 
 400.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, quando interpretado “no sentido de 
 que não é possível recorrer para o S.T. de Justiça quanto à indemnização civil, 
 porque a correspondente decisão penal é irrecorrível”, por violação do disposto 
 nos artigos 13.º, n.º 1, 20.º e 205.º da Constituição da República Portuguesa.
 Por despacho de 17 de Março de 2006, o Presidente do Supremo Tribunal de 
 Justiça, invocando o Acórdão n.º 1/2002 desse Tribunal (publicado no Diário da 
 República, I Série-A, de 21 de Maio de 2002) e os Acórdãos n.ºs 201/94 e 525/98 
 do Tribunal Constitucional (publicados, respectivamente, nos Acórdãos do 
 Tribunal Constitucional, 27.º vol., pp. 473 e segs., e no Diário da República, 
 II Série, de 30 de Junho de 1999), indeferiu a reclamação, considerando não se 
 poder dizer que “esta interpretação desrespeite o princípio da igualdade ou 
 qualquer outro preceito da Lei Fundamental”.
 
 2.Inconformada, a reclamante veio interpor recurso de constitucionalidade ao 
 abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal 
 Constitucional, pretendendo obter a apreciação da conformidade com a 
 Constituição da República do artigo 400.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, 
 na interpretação feita pelo Supremo Tribunal de Justiça “de que não há recurso 
 para o Supremo Tribunal de Justiça, neste caso sub judice”.
 Admitido o recurso, a recorrente encerrou assim as suas alegações:
 
 «1. A recorrente interpôs o presente recurso para o Venerando Tribunal 
 Constitucional da douta decisão do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, ao 
 abrigo da alínea b) do n.º 1 do art.º 70.º da Lei Constitucional, porquanto a 
 recorrente na reclamação do não recebimento do recurso para o Presidente do 
 Venerando Supremo Tribunal de Justiça alegou que a interposição dada pelo 
 Acórdão recorrido do Tribunal da Relação de Évora é contra a letra e o espírito 
 da lei, é contra o senso comum, e é inconstitucional a interpretação dada ao 
 art.º 432.°, alínea b), do CPP, com referência ao art.º 400.°, n.º 1, alínea e), 
 do mesmo diploma, pois tal interpretação vai contra o princípio da igualdade 
 
 (art.º 13.º, n.º 1, da CRP), priva a ora reclamante de acesso ao direito e à 
 tutela jurisdicional (art.º 20.º da CRP) e não está conforme ao n.º 1 do art.º 
 
 205.º da CRP, pois as entidades recorridas beneficiam da interpretação dada pelo 
 Tribunal a quo. 
 
 2. A recorrida fica privada de defender os seus direitos, permitindo-se assim 
 que as entidades recorridas desrespeitem os direitos e interesses legalmente 
 protegidos dos cidadãos (Art.º 266.º da CRP). 
 
 3. Efectivamente, no processo sub judice, o inditoso filho da reclamante morreu 
 em consequência dum acidente de viação ocorrido por culpa do condutor do outro 
 veículo que foi condenado pelo crime de homicídio por negligência, na pena de 18 
 meses de prisão, cuja execução suspendeu por três anos. 
 
 4. Tanto o recurso interposto para o Tribunal da Relação de Évora, quanto o 
 presente recurso para o Supremo Tribunal de Justiça versam sobre o pedido de 
 indemnização civil e sobre a indemnização atribuída ou não à recorrente. 
 
 5. Aí se discutem apenas assuntos de natureza civil que, pela sua complexidade e 
 pelas soluções contraditórias da primeira e da segunda instância, necessitam que 
 sobre elas se pronuncie o Supremo Tribunal de Justiça, sendo certo que está em 
 causa um pedido de indemnização civil de montante elevado e a decisão do 
 Tribunal da Relação decidiu nada atribuir, a título de indemnização, à mãe do 
 inditoso: nem por danos patrimoniais nem por danos morais, retirando-lhe mesmo a 
 indemnização fixada pela primeira instância como compensação pela perda do 
 direito à vida que foi atribuído em partes iguais pela mãe e pela ainda mulher 
 
 (de que estava separado de facto, já tinham tudo acordado quanto ao divórcio), 
 nos termos do art.º 2133.º do C.C. 
 
 6. Não faz pois sentido retirar-se à assistente este direito de recorrer para o 
 Supremo Tribunal de Justiça, sendo certo que este pedido civil se fosse objecto 
 duma acção no Tribunal Civil pelo valor da causa e pelas decisões contraditórias 
 da primeira e segunda instância podia subir sempre até ao Supremo Tribunal de 
 Justiça. 
 
 7. E este entendimento propicia soluções contraditórias perante o mesmo caso. 
 
 8. Nos termos do art.º 71.º do CPP, o pedido de indemnização civil fundado na 
 prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, só o podendo ser em 
 separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei. 
 
 9. E, nos termos do art.º 72.º, o pedido civil pode ser deduzido em separado, 
 perante o Tribunal civil, nos casos aí taxativamente enumerados. 
 
 10. Ora, é perfeitamente possível, que, por exemplo, num acidente de viação, um 
 dos sinistrados deduza o pedido de indemnização civil no processo penal 
 respectivo e outro sinistrado porque o podia fazer nos termos do art.º 72.º do 
 CPP, deduziu o pedido civil em separado, ou seja, nos tribunais cíveis. 
 
 11. E pode acontecer que o arguido seja condenado no tribunal criminal, na pena 
 de 2 anos de cadeia, com execução suspensa, pelo facto de ter cometido dois 
 crimes de homicídio por negligência (art.º 137.º do C.P.), e o pedido 
 indemnizatório, embora muito elevado, só pode ser discutido até ao Tribunal da 
 Relação, na interpretação dada. 
 
 12. Os herdeiros do outro sinistrado, por hipótese intentaram a acção no 
 tribunal cível, o pedido indemnizatório era elevado e subiu até ao Supremo 
 Tribunal de Justiça onde foi feita justiça. 
 
 13. É pois manifestamente inconstitucional o entendimento de que só se pode 
 recorrer da questão cível no caso de ser recorrível a decisão penal. 
 
 14. Ora, se o recorrente aceita a decisão penal que condenou o arguido e por 
 isso legitimou o pedido de indemnização cível, por que motivo os aspectos cíveis 
 que devem ser julgados de acordo com o Código Civil no que concerne às 
 indemnizações, não podem, em termos de recurso, ser julgados pelo Supremo 
 Tribunal de Justiça? 
 
 15. Assim, como se alegou, a decisão do Tribunal da Relação ao não admitir o 
 presente recurso viola directa e necessariamente a letra e o espírito da lei 
 
 (art.º 400.º, n.º 2, do C.P. Penal). 
 
 16. E o entendimento versado neste Acórdão, a interpretação dada ao referido 
 artigo de que não há recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, neste caso sub 
 judice, é inconstitucional, como acima se alegou, violando-se o princípio da 
 igualdade (art.º 13.º, n.º 1, do CRP), priva a ora recorrente do acesso ao 
 direito e à tutela jurisdicional (art.º 20.º da CRP) até à última instância, e 
 não está conforme ao n.º 1 do art.º 205.º do CRP, pois as entidades recorridas 
 
 (Companhia de Seguros, a ainda mulher e portanto viúva) beneficiam da 
 interpretação dada pelo Tribunal a quo, sendo certo também que tal decisão fere 
 o senso comum, pois as leis são feitas por pessoas inteligentes, e por pessoas 
 inteligentes devem ser interpretadas. E tão absurda é esta interpretação que 
 repugna ao senso comum e não se compreende num Estado democrático, onde todos os 
 cidadãos devem ser tratados igualmente perante a lei e, neste caso, a pobre mãe 
 que perde um filho, num brutal acidente de viação, filho esse que, após a 
 separação da ainda mulher que o abandonou, com ela convivia, nada recebe a 
 título de indemnização, no seu entender por erro manifesto da análise das 
 questões jurídicas já na primeira instância mas sobretudo na segunda instância, 
 que chega ao cúmulo de não admitir o recurso de decisões tão contraditórias. 
 Termos em que a interpretação dada ao art.º 400.º, n.º 2, do C. P. Penal no 
 douto acórdão recorrido é inconstitucional o que deve ser decidido pelo 
 Venerando Tribunal Constitucional e, em consequência, o recurso interposto do 
 acórdão do Tribunal da Relação de Évora deve ser recebido e subir para o 
 Venerando Supremo Tribunal de Justiça. 
 Decidindo-se assim far-se-á justiça e história na correcta interpretação da lei, 
 sempre na salvaguarda dos direitos constitucionais dos cidadãos acima alegados — 
 o que se espera do Venerando Tribunal Constitucional.»
 Por sua vez, o Ministério Público concluiu as suas contra-alegações desta forma:
 
 «1 - O regime consagrado no n.º 2 do art.º 400.º do Código de Processo Penal, 
 segundo o qual não cabe recurso ordinário da decisão proferida pela Relação 
 sobre a matéria da indemnização civil quando não seja recorrível a 
 correspondente decisão sobre a matéria penal, não afronta o direito de acesso ao 
 direito e aos tribunais, nem o princípio da igualdade.
 
 2 – Termos em que deve improceder o presente recurso.»
 Importa decidir.
 II. Fundamentos
 
 3.Convém começar por esclarecer que no presente recurso não está em causa a 
 apreciação de qualquer decisão sobre o pedido de indemnização civil efectuado 
 pela recorrente, mas apenas a questão da conformidade com a Constituição de uma 
 norma processual, relativa à possibilidade de recurso para o Supremo Tribunal de 
 Justiça. A questão de (in)constitucionalidade do artigo 400.º, n.º 2, do Código 
 de Processo Penal, na interpretação precisada pela recorrente e aplicada pelo 
 acórdão recorrido, segundo a qual não cabe recurso para o Supremo Tribunal de 
 Justiça de decisão do Tribunal da Relação relativa à indemnização civil, 
 proferida em segunda instância, se for irrecorrível a correspondente decisão 
 penal, foi recentemente objecto de apreciação pelo Tribunal Constitucional, 
 tendo o mesmo concluído pela sua conformidade com a Lei Fundamental no Acórdão 
 n.º 338/2005 (disponível no sítio da Internet www.tribunalconstitucional.pt), em 
 cuja fundamentação se lê: 
 
 “4. Como se sabe, não compete ao Tribunal Constitucional pronunciar-se sobre 
 qual é a melhor interpretação do direito infra-constitucional aplicável ao caso, 
 ou aplicado pelo tribunal recorrido (cfr., por exemplo, os acórdãos n.ºs 44/85 e 
 
 186/2000, publicados, respectivamente, em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 
 
 5.º vol., págs. 403-409, e 46.º, págs. 745-758). Também por esta razão, não 
 poderão ser ponderadas as razões aduzidas pelo recorrente (coerência global, 
 adequação ao caso) na medida em que não relevem para a questão da 
 constitucionalidade, e antes como fundamentos para a crítica à solução jurídica 
 adoptada, por alegadamente não corresponder ao melhor direito.
 Isto assente, pode partir-se do que se escreveu no acórdão n.º 201/94 (publicado 
 em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 27.º vol., págs. 473-482):
 
 «1. No vigente diploma adjectivo criminal consagrou-se, por intermédio do seu 
 art.º 71.º, a regra da obrigatoriedade de dedução em processo criminal do pedido 
 de indemnização civil baseado na prática de actos ilícitos que revistam a 
 natureza de crime, regra que só pode ser afastada nos casos reportados no art.º 
 
 72.º, sendo que se admite mesmo a dedução desse pedido no processo crime (cfr. 
 art.º 73.º) dirigido contra pessoas que, não sendo responsáveis criminalmente, o 
 sejam já no campo meramente civil.
 Por outro lado, estatui-se no n.º 1 do art.º 403.º do mesmo corpo de leis que é 
 admissível a limitação do recurso de uma decisão a uma sua parte, e isto se for 
 possível separar a parte impugnada da parte que o não for, de molde a aquela 
 primeira ser objecto de uma apreciação distinta da segunda, tornando‑se esta 
 
 última autónoma, embora tal autonomia, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo, não 
 prejudique o dever de retirar da procedência do recurso da parte impugnada “as 
 consequências legalmente impostas relativamente a toda a decisão recorrida”.
 Perante a consagração, no citado art.º 71.º, do denominado “princípio de 
 adesão”, compreende-se que na alínea a) do n.º 2 do aludido art.º 403.º se dê 
 como exemplo de autonomia de parte da decisão, com a consequente recorribilidade 
 dela, a “matéria penal, relativamente àquela que se referir a matéria civil”, 
 compreendendo-se igualmente que no art.º 401.º, n.º 1, alínea c), se confira 
 legitimidade para recorrer às partes civis “da parte das decisões contra si 
 proferidas”, que no art.º 402.º, n.º 2, alínea c), se estabeleça que, salvo no 
 caso de recurso fundado em motivos estritamente pessoais, o recurso interposto 
 pelo responsável civil aproveita ao arguido, mesmo para efeitos penais, e no 
 art.º 404.º se comande que, em caso de recurso interposto por uma das partes 
 civis, a parte contrária possa interpor recurso subordinado.»
 Depois de transcrever as normas então em apreciação (o n.º 2 do artigo 400.º - 
 na redacção anterior à Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto –, o artigo 427.º e o 
 artigo 432.º do Código de Processo Penal), escreveu-se ainda no referido 
 acórdão:
 
 «4.1. A consagração do sistema de adesão, em regra obrigatório, da acção cível à 
 acção penal, não significa que, pela unidade da causa, se confundam as 
 pretensões que fundamentam uma e outra ou que ambas deixem de ter autonomia 
 
 (cfr. sobre a questão, Figueiredo Dias, “Sobre a reparação de perdas e danos 
 arbitrada em processo penal”, estudo publicado no Boletim da Faculdade de 
 Direito de Coimbra, 1966, págs. 88 e segs., Direito Processual Penal, 1.º vol., 
 págs. 540 e segs., e Jornadas de Direito Processual Penal, pág. 15).
 Simplesmente, a ritologia processual a que obedecerão ambas as pretensões é 
 regulada pela lei adjectiva criminal, pelo que será esta a matriz a que deverão 
 obedecer os trâmites destinados a fazer reconhecer em juízo, ou a tornar 
 coercivelmente realizada, a pretensão cível, sendo certo que em tal lei 
 adjectiva é unitário o recurso ordinário, aí não se consagrando as figuras da 
 apelação e revista.
 Por isso, será de harmonia com as regras próprias daquela lei adjectiva que os 
 recursos tocantes à pretensão cível hão-de obedecer, não se podendo, pois, dizer 
 que - no que concerne a matéria cível objecto de pretensão processual deduzida 
 em tribunal civil perante as regras da lei adjectiva civil e matéria da mesma 
 natureza, fundada na prática de um acto ilícito de natureza penal, que terá, em 
 princípio, de ser objecto de reconhecimento em juízo através do processo penal - 
 haja uma identidade de situações reclamante de tratamento semelhante.
 
 4.2. O princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição, como 
 sabido é, exige a dação de tratamento igual àquilo que, essencialmente, for 
 igual, reclamando, por outro lado, a dação de tratamento desigual para o que for 
 dissemelhante, não proibindo, por isso, a efectivação de distinções. Ponto é que 
 estas sejam estabelecidas com fundamento material bastante e, assim, se não 
 apresentem como irrazoáveis ou arbitrárias (cfr., na jurisprudência deste 
 Tribunal, por todos, o Acórdão n.º 188/90, publicado na 2.ª Série do Diário da 
 República, de 12 de Setembro de 1990).
 Sendo assim, há que saber se existe arbitrariedade, irrazoabilidade ou não há 
 fundamento bastante para a diferenciação no que respeita ao regime de recursos 
 respeitante à matéria cível, quando ela for objecto de pretensão deduzida em 
 acção regulada no Código de Processo Civil, ou for objecto de pretensão fundada 
 na prática de um acto ilícito de natureza penal, caso em que, em princípio, terá 
 de ser deduzida no processo criminal.
 A resposta a uma tal questão não pode, na perspectiva do Tribunal, deixar de ser 
 negativa.
 Efectivamente, viu-se já que da circunstância de se consagrar o sistema de 
 adesão - e essa consagração, advinda da norma do art.º 71.º do Código de 
 Processo Penal, não foi questionada pelo recorrente do ponto de vista da sua 
 conformidade constitucional - resulta que a pretensão de pedido de indemnização 
 derivado da responsabilidade civil conexionada com a prática de um acto ilícito 
 de natureza criminal tem de ser efectivada jurisdicionalmente por intermédio da 
 coorte de leis adjectivas penais, às regras destas se subordinando.»
 Importa explicitar o que estava em causa no caso que deu origem ao citado 
 aresto: um pedido de indemnização civil contra um lesante e sua seguradora, 
 julgado procedente (em parte) por decisão singular do Tribunal de 1.ª instância, 
 que foi confirmada por decisão do Tribunal da Relação e à qual o Supremo 
 Tribunal de Justiça, já em fase de vistos, recusou reapreciação porque,
 
 «tratando-se de sentença de um Juiz Singular não é permitido recurso para o 
 Supremo Tribunal de Justiça, salvo se a lei previr especialmente o caso, o que 
 não se dá na hipótese que nos ocupa».
 O segmento das normas impugnadas que então foi julgado não inconstitucional não 
 coincidiu, porém, exactamente com esta interpretação, uma vez que se entendeu 
 que:
 
 «Da concatenação dos transcritos textos legais e de acordo com a leitura que 
 deles fez, in casu, o Supremo Tribunal de Justiça, resulta que, caso alguém com 
 legitimidade para recorrer se não conforme com a parte decisória de um acórdão 
 proferido pelo tribunal do júri ou pelo tribunal colectivo, mas unicamente na 
 parte relativa a matéria civil, só poderá impugná-la se essa parte decisória lhe 
 for desfavorável em mais de Esc. 250.000$00 (metade da alçada daqueles tribunais 
 
 - cfr. art.º 20.º da Lei n.º 38/87, de 23 de Dezembro), impugnação que terá 
 lugar directamente perante o Supremo Tribunal de Justiça; se, por outro lado, 
 alguém com legitimidade para recorrer se não conformar com a parte restrita à 
 matéria civil constante de uma decisão proferida em processo criminal por um 
 tribunal de 1.ª instância que não seja tribunal do júri ou tribunal colectivo, 
 igualmente só poderá impugná-la, e perante o tribunal da relação, se essa parte 
 lhe for desfavorável em mais do que a quantia acima indicada.»
 Mesmo com este sentido alargado para lá das circunstâncias do caso, todavia, 
 estava ainda em causa apenas a limitação decorrente do valor do decaimento de 
 quem pretendia recorrer, como, também, no caso julgado por este Tribunal pelo 
 acórdão n.º 722/98 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt, proferido num 
 caso em que eram partes um advogado e um magistrado judicial, e em que o recurso 
 para o Supremo Tribunal de Justiça foi vedado, não obstante o Tribunal da 
 Relação ter intervindo como Tribunal da 1.ª Instância), e no caso julgado por 
 este Tribunal pelo acórdão n.º 100/2002, publicado em Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional, 52.º vol., pp. 477-489 (em que, interposto recurso para o 
 Tribunal da Relação, ele não foi admitido com fundamento no não preenchimento do 
 duplo limite introduzido no artigo 400.º, n.º 2, do Código de Processo Penal 
 pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto: valor do pedido superior à alçada do 
 tribunal recorrido e decisão desfavorável para o recorrente em valor superior a 
 metade desta alçada).
 Em ambas as situações, o procedimento criminal fora declarado extinto por 
 aplicação da lei da amnistia antes da decisão judicial de que se pretendia 
 recorrer. E a extinção do procedimento criminal também ocorrera no caso decidido 
 por este Tribunal no acórdão 94/2001 (publicado em Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional, 49.º vol., págs. 359-367), em que estava em causa a arguição de 
 nulidades da sentença no recurso que se pretendeu interpor para o Tribunal da 
 Relação, e não foi admitido.
 Já no caso decidido pelo acórdão n.º 138/98 (disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt), o que estava em causa era antes a articulação 
 das normas dos artigos 400.º, n.º 2, 427.º e 432.º do Código de Processo Penal 
 em termos tais que, não obstante se verificar a condição estabelecida pelo n.º 2 
 do artigo 400.º do Código de Processo Penal quanto ao montante do decaimento, 
 não se admitia o recurso por falta de verificação das condições dos artigos 
 
 427.º e 432.º, ressalvadas no artigo 400.º do mesmo Código (“Sem prejuízo do 
 disposto nos artigos 427.º e 432.º…”). E a decisão então tomada foi fundamentada 
 com remissão para os fundamentos do acórdão n.º 201/94, por a argumentação aí 
 expendida ter sido considerada aplicável também neste caso.
 Exactamente a mesma questão – «das decisões do Tribunal da Relação proferidas em 
 recurso da decisão do Tribunal Singular de 1.ª instância, ainda que 
 circunscritas ao pedido cível de valor superior à alçada do Tribunal da Relação, 
 não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, nos termos dos artigos 
 
 427.º e 432.º do Código de Processo Penal» - foi decidida, do mesmo modo, no 
 acórdão n.º 429/99 (disponível também em www.tribunalconstitucional.pt), onde se 
 escreveu o seguinte, depois de sintetizar a posição assumida no acórdão n.º 
 
 201/94:
 
 «O Tribunal considera que, na sua essência, este entendimento se aplica ao caso 
 sub judicio.
 Com efeito, ao sistema de adesão subjazem razões de economia processual, de 
 uniformização de julgados (ou, dito de outro modo, de coerência entre a decisão 
 civil e a decisão penal) e de celeridade processual (cf., sobre esta matéria, 
 Jorge Ribeiro de Faria, Indemnização por perdas e danos arbitrada em processo 
 penal - o chamado processo de adesão, 1978, p. 117 e ss.; Germano Marques da 
 Silva, Direito processual penal, I, 1993, p. 254). Mas a apreciação num mesmo 
 processo - no processo penal - da questão criminal e da questão civil funda-se, 
 essencialmente, na existência de uma conexão entre os dois ilícitos, resultante 
 da unidade do facto simultaneamente gerador de responsabilidade civil e de 
 responsabilidade penal (cf. Jorge Ribeiro de Faria, ob. cit., p. 59 e ss., e 
 Jorge de Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, 1.º vol., 1974, p. 540 e 
 ss., onde se refere como razão de ser do sistema de adesão a “natureza 
 tradicionalmente absorvente do facto que dá causa às duas acções”). É essa 
 unidade que justifica um julgamento global do caso, fundamental para a coerência 
 e racionalidade da decisão final.
 Ora, o julgamento no processo penal do pedido de indemnização civil implicará a 
 aplicação a este último das regras do processo penal quanto a recursos, 
 exactamente para obter os resultados de coerência e celeridade processual 
 referidos.
 São alheias à lógica dos recursos em processo penal as regras de recurso do 
 processo civil que se referem ao valor da acção. O facto de no processo penal 
 prevalecer sobre a realização do interesse das partes uma dimensão, 
 insusceptível de avaliação pecuniária, de reparação dos danos do crime, tanto no 
 plano colectivo como no do ofendido, implica que a sujeição de uma causa ao 
 processo penal, nomeadamente por opção do autor da queixa quanto ao pedido de 
 indemnização civil (artigo 72.º, n.º 2, do Código de Processo Penal), tenha como 
 consequência uma dimensão relativamente à qual não prevalece a afectação do 
 sistema dos recursos pelo valor da alçada.
 Esta dimensão distinta do objecto processual condiciona, consequentemente, os 
 critérios do respectivo sistema de recursos. Porém, estes critérios não se 
 encontram questionados em si mesmos neste processo, mas apenas na medida em que, 
 quanto ao pedido de indemnização civil, não são adoptados os critérios do valor 
 da alçada.
 Assim, sob a pura perspectiva da igualdade, pela qual a recorrente pretende que 
 seja apreciada a questão, não há, obviamente, qualquer tratamento diferenciado 
 de situações idênticas. Com efeito, o pedido de indemnização civil deduzido no 
 processo penal é processualmente tratado de modo idêntico à causa penal e 
 sujeito aos seus critérios processuais de recurso, justificados pela dignidade 
 pública da justiça penal.
 Nessa medida, não é legítima a pretendida identidade entre as duas situações, 
 dado que existem razões justificadoras de um diferente tratamento, em razão do 
 facto gerador de eventual responsabilidade civil ter natureza criminal.»
 O mesmo se diga do caso decidido pelo Tribunal Constitucional no seu acórdão n.º 
 
 183/2001 (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 49.º vol., págs. 
 
 667-679), em que estava em causa a inadmissibilidade do recurso para o Supremo 
 Tribunal de Justiça da condenação no pagamento de indemnização cível após a 
 extinção do procedimento criminal (por descriminalização da conduta), então por 
 força do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 400.º do Código de Processo 
 Penal. Invocou-se aí o que se escreveu no acórdão n.º 429/99 «depois de invocar 
 a jurisprudência contida no acórdão n.º 201/94». E no acórdão n.º 320/2001 
 
 (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 50.º vol., págs. 753-770), em 
 que estava em causa, também, a exclusão do recurso de uma decisão do Tribunal da 
 Relação, que seria admitido em processo civil, com base no disposto nos artigos 
 
 400.º, n.º 1, alínea d), e n.º 2, e 432.º do Código de Processo Penal, após 
 extinção do procedimento criminal, por amnistia, anteriormente à decisão da 
 primeira instância, considerou-se o seguinte, antes de remeter para a anterior 
 jurisprudência do Tribunal sobre a questão e de se transcrever o mesmo acórdão 
 n.º 201/94:
 
 «5. - Tal como consta da decisão recorrida, era “entendimento estabilizado” na 
 jurisprudência do STJ que, no regime de recursos anterior às alterações de 1998, 
 face às disposições conjugadas dos artigos 400.º, n.º 1, alínea d), e n.º 2, 
 
 427.º e 432.º do CPP, não poderia haver recurso de acórdãos das Relações 
 proferidos em recursos das decisões de primeira instância. Com efeito, entendia 
 o STJ que a norma do n.º 2 do artigo 400.º não constituía excepção à alínea d) 
 do n.º 1, por forma a alargar a sua competência: de facto, o preceituado no 
 artigo 432.º não comportava esse sentido e as implicações do sistema de adesão 
 constantes do artigo 71.º e ss. do CPP contrariavam tal entendimento.
 Segundo o STJ, as alegações de se tratar de uma limitação injustificada do 
 direito de recurso eram afastadas na medida em que o artigo 72.º, n.º 1, alínea 
 d), do CPP permite a dedução do pedido de indemnização civil em separado do 
 processo penal quando o valor permitisse a intervenção no processo civil do 
 Colectivo. O n.º 2 do artigo 400.º consubstanciava uma limitação do direito de 
 recurso, na medida em que exigia que a decisão impugnada relativamente à 
 indemnização civil fosse desfavorável ao demandante em valor superior a metade 
 da alçada do tribunal requerido, para poder ser admitido o recurso.
 Sobre este regime - muito sucintamente caracterizado, seguindo, de perto, a 
 decisão recorrida - já este Tribunal Constitucional se teve de pronunciar, 
 existindo várias decisões em que se apreciou a questão da constitucionalidade da 
 norma do n.º 2 do artigo 400.º do CPP, na redacção anterior à Lei n.º 59/98, 
 exactamente na parte em que tal norma não permitia o acesso ao Supremo 
 relativamente às decisões proferidas pelas relações em processos de adesão.»
 E depois dessa transcrição acrescentou-se: 
 
 «Esta fundamentação - a que se adere, no que tem de essencial - mantém inteira 
 validade face à legislação anterior às alterações da Lei n.º 59/98.»
 Estabilizada esta jurisprudência, este tipo de casos passou a ser decidido por 
 decisão sumária, nos termos do artigo 78.º-A, n.º 1, da Lei do Tribunal 
 Constitucional. Assim, na decisão sumária n.º 126/2003 (disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt), de novo se transcreveu a fundamentação do 
 acórdão n.º 201/94, agora a propósito da irrecorribilidade da decisão final do 
 Tribunal da Relação relativa à indemnização civil, «se for irrecorrível a 
 correspondente decisão penal, de acordo com a jurisprudência firmada no Acórdão 
 do Supremo Tribunal de Justiça, de 14 de Março de 2002, proferido no recurso 
 extraordinário n.º 2235/01 (‘Assento n.º 1/2002’, no Diário da República, I 
 Série-A, n.º 117, de 21 de Maio de 2002).»
 
 5. O alargado grupo de decisões que se referiu demonstra que o Tribunal 
 Constitucional já foi confrontado com as diversas particularidades 
 constitucionalmente relevantes do caso que agora foi trazido à sua apreciação: 
 já houve hipóteses em que as regras dos recursos penais obstaram ao conhecimento 
 de recursos relativos a indemnizações cíveis, em situações em que não houve 
 decisão penal por tal procedimento se ter extinto por amnistia, e em que os 
 valores da indemnização fixada, de que se pretendia recorrer, não obstariam a 
 esse conhecimento.
 Assim, embora podendo aplicar-se integralmente o que anteriormente foi decidido 
 sobre o assunto, ponderar-se-á apenas se, como invoca o recorrente,
 
 «os demandados civis julgados em processo penal e os demandados civis julgados 
 em processo civil [se] encontram, objectiva e materialmente, em situação 
 idêntica; a diferença é meramente formal e conceptual!
 Sustentar que a situação do demandado civil julgado em processo penal é 
 diferente da situação do demandado civil julgado em processo civil, pelo facto 
 de o primeiro se encontrar sujeito ao princípio da adesão e, como tal, se 
 encontrar sujeito ao conjunto de normas processuais penais, traduz um argumento 
 puramente conceptual e formal, baseado, apenas, no tipo de lei processual 
 tendencialmente aplicável e no foro com competência decisória, sendo certo que 
 tal competência, no mais das vezes, resulta de uma escolha do demandante. 
 Pelo que se desatende, em toda a linha, à materialidade subjacente a ambas as 
 situações!»
 Ora, entende-se que a diferença entre as situações dos demandados referidos, 
 ainda que resultante de uma opção do demandante civil, não é arbitrária, e antes 
 possui uma justificação razoável: a circunstância de o princípio da adesão valer 
 para as situações em que se cumulam pretensões penais e civis, incluindo as 
 hipóteses em que, excepcionalmente – como são os casos de aplicação de amnistias 
 
 – possa, por vicissitudes do processo penal, vir a sobreviver apenas a pretensão 
 civil. É certo que o legislador poderia, nesses casos, ter remetido o processo 
 iniciado como penal para a esfera civil. Mas não está obrigado a fazê-lo, pois 
 as razões (economia processual, uniformização de julgados, celeridade 
 processual, conexão entre os dois ilícitos) que o levaram a estabelecer o 
 princípio da adesão e a distinção do regime processual quando o processo penal 
 não perdem todo o sentido (designadamente, quando o processo se veio a 
 extinguir, como no presente caso, por amnistia), não valendo a objecção de que, 
 num certo caso, nenhuma delas se verifica.
 Aliás – e mesmo independentemente do juízo que se possa fazer quanto à 
 verificação, no caso, das razões para afirmar a regra ou, antes, para apurar uma 
 excepção -, a verdade é que o legislador não tem de prever todas as possíveis 
 vicissitudes que venham a afectar um dos processos conexos, mormente quando elas 
 resultam de outras intervenções legislativas supervenientes e excepcionais (como 
 
 é o caso das leis de amnistia). Ora, estando a regra estabelecida bem fundada 
 materialmente para a generalidade das situações, também não é a identificação de 
 tal situação excepcional que destrói o seu suporte material.
 E como a (alegada) improcedência das razões justificativas do princípio da 
 adesão ao caso dos autos resultaria unicamente de uma intervenção legislativa – 
 a lei da amnistia que, aliás, poderia até dizer-se, numa certa perspectiva, ter 
 também já colocado o ora recorrente, demandado penalmente, numa situação de 
 desigualdade em relação a outros demandados que por ela não foram abrangidos 
 
 (designadamente em razão dos limites temporais fixados nessa lei) -, é também 
 plenamente aplicável ao caso o que se escreveu no acórdão n.º 580/99 (publicado 
 em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 45.º vol., págs. 237-247) e se repetiu 
 no acórdão n.º 183/2001 (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 49.º 
 vol., págs. 667-679):
 
 «importa ter presente que o legislador tem uma ampla liberdade no que respeita à 
 alteração do quadro normativo vigente num dado momento histórico. Na verdade, o 
 legislador, de acordo com opções de política legislativa tomadas dentro de uma 
 ampla zona de autonomia, pode proceder às alterações da lei que se lhe 
 afigurarem mais adequadas e razoáveis, tendo presente, naturalmente, os 
 interesses em causa e os valores ínsitos na ordem jurídica.
 Uma alteração legislativa para operar, consequentemente, uma modificação do 
 tratamento normativo conferido a uma dada categoria de situações. Com efeito, as 
 situações abrangidas pelo regime revogado são objecto de uma valoração diferente 
 daquela que incidirá sobre as situações às quais se aplica a lei nova. Nesse 
 sentido, haverá situações substancialmente iguais que terão soluções diferentes.
 Contudo, não se pode falar neste tipo de casos de uma diferenciação 
 verdadeiramente incompatível com a Constituição. A diferença de tratamento 
 decorre, como resulta do que se disse, da possibilidade que o legislador tem de 
 modificar (revogar) um quadro legal vigente num determinado período. A intenção 
 de conferir um diferente tratamento legal à categoria de situações em causa é 
 afinal a razão de ser da própria alteração legislativa. 
 O entendimento propugnado pela recorrente levaria à imutabilidade dos regimes 
 legais, pois qualquer alteração geraria sempre uma desigualdade. Ora, tal 
 posição não é reclamável pelo princípio da igualdade no quadro constitucional 
 vigente.»
 Note-se, aliás, que, podendo embora ser da escolha do demandante a opção pela 
 dedução do pedido de indemnização civil em separado (ao abrigo, por exemplo, do 
 disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 72.º do Código de Processo Penal), em 
 vez de no próprio processo penal, é absolutamente seguro que as regras que o ora 
 recorrente põe em causa tanto restringem o recurso do demandado como do 
 demandante. Não é, assim, procedente, do ponto de vista constitucional, a 
 invocação de que o carácter facultativo da demanda civil neste caso aproveita 
 apenas ao demandante.
 
 6. Também não procede a invocação de que a norma em causa viola os princípios de 
 acesso ao direito e à tutela jurisdicional, mormente considerando que, como se 
 disse, tal garantia de acesso ao direito já foi actuada, no presente caso, em 
 mais do que um grau de jurisdição (com um grau de recurso).
 
 É, na verdade, reconhecido uniformemente na jurisprudência do Tribunal 
 Constitucional que não pode inferir-se do artigo 20.° da Constituição da 
 República Portuguesa qualquer irrestrita possibilidade de acesso, em via de 
 recurso, ao Supremo Tribunal de Justiça. E é também pacífica e uniforme a 
 jurisprudência que afirma a inexistência de um direito a um triplo grau de 
 jurisdição (ou a um duplo recurso) – v. g. acórdãos n.ºs 402/99, 215/2001, 
 
 435/2001 (todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt). Assim, por 
 exemplo, no acórdão n.º 189/2001 (publicado em Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional, 50.º vol., págs. 285-294), escreveu-se:
 
 «A Constituição da República Portuguesa não estabelece em nenhuma das suas 
 normas a garantia da existência de um duplo grau de jurisdição para todos os 
 processos das diferentes espécies.
 Importa, todavia, averiguar em que medida a existência de um duplo grau de 
 jurisdição poderá eventualmente decorrer de preceitos constitucionais como os 
 que se reportam às garantias de defesa, ao direito de acesso ao direito e à 
 tutela judiciária efectiva.
 Não pode deixar de se referir que a jurisprudência do Tribunal Constitucional 
 tem tratado destas matérias, estando sedimentados os seus pontos essenciais.
 Assim, a jurisprudência do Tribunal tem perspectivado a problemática do direito 
 ao recurso em termos substancialmente diversos relativamente ao direito penal, 
 por um lado, e aos outros ramos do direito, pois sempre se entendeu que a 
 consideração constitucional das garantias de defesa implicava um tratamento 
 especifico desta matéria no processo penal. A consagração, após a Revisão de 
 
 1997, no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, do direito ao recurso, mostra que 
 o legislador constitucional reconheceu como merecedor de tutela constitucional 
 expressa o princípio do duplo grau de jurisdição no domínio do processo penal, 
 sem dúvida, por se entender que o direito ao recurso integra o núcleo essencial 
 das garantias de defesa.
 Porém, mesmo aqui e face a este específico fundamento da garantia do segundo 
 grau de jurisdição no âmbito penal, não pode decorrer desse fundamento que os 
 sujeitos processuais tenham o direito de impugnar todo e qualquer acto do juiz 
 nas diversas fases processuais: a garantia do duplo grau existe quanto às 
 decisões penais condenatórias e também quanto às respeitantes à situação do 
 arguido face à privação ou restrição da liberdade ou a quaisquer outros direitos 
 fundamentais (veja-se, neste sentido, o Acórdão n.º 265/94, in “Acórdãos do 
 Tribunal Constitucional”, 27.º v., pág. 751 e ss.).
 Embora o direito de recurso conste hoje expressamente do texto constitucional, o 
 recurso continua a ser uma tradução das garantias de defesa consagradas no n.º 1 
 do artigo 32.º (O processo criminal assegura todas as garantias de defessa, 
 incluindo o recurso). Daí que o Tribunal Constitucional não só tenha vindo a 
 considerar como conformes à Constituição determinadas normas processuais penais 
 que denegam a possibilidade de o arguido recorrer de determinados despachos ou 
 decisões proferidas na pendência do processo (v.g., quer de despachos 
 interlocutórios, quer de outras decisões, Acórdãos n.ºs 118/90, 259/88, 353/91, 
 in Acórdãos do Tribunal Constitucional, vols. 15.º, pg. 397; 12.º, pg. 735 e 
 
 19.º, pg. 563, respectivamente, e Acórdão n.º 30/2001, sobre a irrecorribilidade 
 da decisão instrutória que pronuncie o arguido pelos factos constantes da 
 acusação particular quando o Ministério Público acompanhe tal acusação, ainda 
 inédito), como também tenha já entendido que, mesmo quanto às decisões 
 condenatórias, não tem que estar necessariamente assegurado um triplo grau de 
 jurisdição, assim se garantindo a todos os arguidos a possibilidade de 
 apreciação da condenação pelo STJ (veja-se, neste sentido, o Acórdão n.º 209/90, 
 in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 16.º v., pg. 553)
 Uma tal limitação da possibilidade de recorrer tem em vista impedir que a 
 instância superior da ordem judiciária accionada fique avassalada com questões 
 de diminuta repercussão e que já foram apreciadas em duas instâncias. Esta 
 limitação à recorribilidadade das decisões penais condenatórias tem, assim, um 
 fundamento razoável.»
 Assim, a limitação do recurso ao Supremo Tribunal de Justiça, tendo em conta que 
 a decisão recorrida já fora proferida em recurso pelo Tribunal da Relação de 
 Lisboa, e, portanto, que o ora recorrente teve já acesso a dois graus de 
 jurisdição, também não se afigura censurável do ponto de vista do princípio 
 constitucional do acesso ao direito e aos tribunais.”
 Aderindo-se ao essencial da fundamentação expendida no transcrito Acórdão n.º 
 
 338/2005, para a qual se remete, decide-se não julgar inconstitucional a norma 
 do artigo 400.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, interpretado no sentido de 
 que não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de decisão do Tribunal 
 da Relação relativa à indemnização civil, proferida em segunda instância, se for 
 irrecorrível a correspondente decisão penal. Pelo que há que negar provimento ao 
 recurso.
 
  III. Decisão
 Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide:
 a) Não julgar inconstitucional o artigo 400.º, n.º 2, do Código de Processo 
 Penal, interpretado no sentido de que não cabe recurso para o Supremo Tribunal 
 de Justiça de decisão do Tribunal da Relação relativa à indemnização civil, 
 proferida em segunda instância, se for irrecorrível a correspondente decisão 
 penal;
 b) Consequentemente, confirmar a decisão recorrida quanto a esta questão de 
 constitucionalidade;
 c) Condenar a recorrente em custas, com 20 ( vinte  ) unidades de conta de taxa 
 de justiça.
 
  
 
  
 
                                         Lisboa, 18 de Outubro de 2006
 Paulo Mota Pinto
 Benjamim Rodrigues
 Mário José de Araújo Torres
 Maria Fernanda Palma
 Rui Manuel Moura Ramos