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Processo nº 728/04
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria João Antunes
 
  
 
  
 
  
 Acordam na 1ª secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
  
 
 1. Notificado do Acórdão nº 397/2006, vem agora A. requerer a reforma do mesmo, 
 nos termos do disposto no artigo 716º do Código de Processo Civil, aplicável por 
 força do disposto no artigo 69º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo 
 do Tribunal Constitucional (LTC), com os seguintes fundamentos:
 
  
 
 «Em 1. Fundamentação, parte final (pagina 17), refere o douto Acórdão,
 
 “Por outro lado, o objecto do recurso não pode estender-se à interpretação que o 
 Tribunal Judicial da Comarca de Esposende fez da alínea b), do n.° 1 do artigo 
 
 137.º do Decreto -Lei n.° 2002/2004, de 18 de Agosto( cf. resposta ao despacho 
 que notificou o recorrente da possibilidade de ser proferida decisão de não 
 conhecimento da questão de ilegalidade), atendendo aos requisitos do recurso de 
 constitucionalidade previsto na al. b) do n.° 1 do artigo 70° da LTC”.
 Porém,
 
 É certo que o arguido suscitou como questão prévia nas alegações perante esse 
 Venerando Tribunal a inutilidade superveniente do recurso, um virtude de entrada 
 em vigor do Decreto-Lei n.° 202/2004, de 18 de Agosto, que alegadamente 
 degradaria o crime em apreço em mera contra-ordenação.
 No entanto, em sede de primeira instância, o Tribunal acabou por considerar que 
 não se verificava in casu a extinção da responsabilidade criminal do arguido, em 
 virtude de se manterem inalteradas as normas do art.° 30.º, n.° 2, da Lei de 
 Bases conjugadas com a norma do n.° 2, art. 56º do agora Decreto-Lei n.° 
 
 202/2004, de 18 de Agosto. E que se tratariam de situações distintas “o 
 exercício da caça em local que não seja permitido” e “o exercício da caça nas 
 zonas de caça às quais não se tenha legalmente acesso”.
 Ou seja, acabando por interpretar com um certo sentido a dimensão normativa da 
 al. b), n.° 1, art. 137°, do Decreto-Lei n.° 202/2004, onde, segundo esta mesma 
 interpretação, não haveria lugar à descriminalização da conduta do arguido.
 Saliente-se, porém que, na questão prévia suscitada, concretamente na alínea m), 
 o requerente refere que a despenalização da sua conduta se fundava no preceito 
 constitucional a que alude o n.° 4 do artigo 29.° do Constituição.
 Posteriormente, em sede de aclaração da decisão de primeira instância, o 
 requerente reafirmou a necessidade de interpretação da mesma norma com o 
 disposto no n.° 4 do Art. 29.° da Constituição.
 Deste modo, quer na questão prévia, quer na aclaração da decisão proferida sobre 
 esta questão, o requerente pugnou pela interpretação daquela norma inovatória à 
 luz do disposto no aludido n.° 4 do art. 29.° da Constituição.
 Pelo exposto, e salvo melhor opinião, entende o requerente que foi suscitada a 
 necessidade de interpretação da norma prevista na alínea b), n.° 1, art. 137°, 
 do Decreto-Lei n.° 202/2004, de 18 de Agosto, em conformidade com o n.° 4 do 
 art. 29.° da Constituição.
 Interpretação, aliás, que não obteve aplicação, quer na decisão proferida pelo 
 Tribunal de primeira instância, quer na aclaração desta decisão.
 Assim sendo, dado que o controlo concreto da constitucionalidade, previsto no 
 artigo 280º CRP, decorre do recurso das decisões judiciais que apliquem norma 
 
 (ou normas) arguidas de inconstitucionalidade pelas partes no processo.
 Sendo, portanto, o pressuposto específico deste recurso a aplicação de uma norma 
 cuja inconstitucionalidade o recorrente haja suscitado durante o processo, deve 
 entender-se que, neste caso, o requerente suscitou durante o processo a 
 interpretação daquela norma à luz da Constituição. Interpretação que, como se 
 viu, não foi acolhida naquela decisão».
 
  
 
 2. Notificado deste requerimento, o representante do Ministério Público junto 
 deste Tribunal, respondeu nos termos seguintes:
 
  
 
 «1 – O pedido de “reforma” deduzido é dificilmente inteligível, traduzindo uso 
 manifestamente abusivo de incidentes pós-decisórios, fora dos pressupostos que 
 os condicionam.
 
 2 – Sendo evidente que o acórdão proferido por este Tribunal – e que dirimiu 
 definitivamente o recurso interposto – não padece de qualquer “lapso manifesto” 
 ou inconsideração de elementos que devesse ter em conta.
 
 3 – Sendo perfeitamente ilegítimo que – a coberto deste “incidente” – o 
 recorrente se limite a persistir em argumentação que o Tribunal já entendeu não 
 proceder, em decisão inimpugnável».
 
  
 
 3. Segundo o disposto no nº 2 do artigo 669º do Código de Processo Civil, 
 aplicável à tramitação dos recursos para o Tribunal Constitucional (artigo 69º 
 da LTC), é lícito requerer a reforma da sentença (ou do acórdão, por força do 
 consagrado nos artigos 716º e 732º do mesmo Código), quando tenha ocorrido 
 manifesto lapso do juiz na determinação da norma aplicável ou na qualificação 
 jurídica dos factos ou quando constem do processo documentos ou quaisquer 
 elementos que, só por si, impliquem necessariamente decisão diversa da proferida 
 e que o juiz, por lapso manifesto, não haja tomado em consideração.
 Trata-se de um incidente pós-decisório de carácter excepcional (cf. Acórdão do 
 Tribunal Constitucional nº 94/2004, não publicado), em que “o erro manifesto de 
 julgamento de questões de direito”, contemplado na alínea a), “pressupõe 
 obviamente, para além do seu carácter evidente, patente e virtualmente 
 incontrovertível, que o juiz se não haja expressamente pronunciado sobre a 
 questão a dirimir, analisando e fundamentando a (errónea) solução jurídica que 
 acabou por adoptar (v. g., aplicou-se norma inquestionável e expressamente 
 revogada, por o julgador se não haver apercebido atempadamente da revogação)”; 
 tendo “o erro manifesto na apreciação das provas”, previsto na alínea b), 
 tradução “no esquecimento de um elemento que, só por si, implicava decisão 
 diversa da proferida (v. g., o juiz omitiu a consideração de um documento, 
 constante dos autos e dotado de força probatória plena, que só por si era 
 bastante para deitar por terra a decisão proferida)” (Lopes do Rego, Comentários 
 ao Código de Processo Civil I, Almedina, 2004, comentário ao artigo 669º, ponto 
 II).
 
 4. Do teor do pedido de “reforma” do Acórdão nº 397/2006 não se extrai qualquer 
 argumento no sentido de ter ocorrido manifesto lapso na determinação da norma 
 aplicável ou na qualificação jurídica dos factos ou de constarem do processo 
 documentos ou quaisquer elementos que, só por si, impliquem necessariamente 
 decisão diversa da proferida e que, por lapso manifesto, não foram tomados em 
 consideração. Toda a argumentação do requerente é significativa da sua 
 discordância quanto ao decidido relativamente ao âmbito do objecto do recurso 
 interposto, designadamente porque se acordou em não estender o objecto à 
 interpretação que o Tribunal Judicial da Comarca de Esposende fez da alínea b) 
 do nº 1 do artigo 137º do Decreto-Lei nº 2002/2004, de 18 de Agosto, sem 
 incorrer em qualquer um dos lapsos que justificam a reforma de uma decisão.
 
  
 
 5. Em face do exposto, decide-se indeferir o presente pedido de reforma do 
 Acórdão nº 397/2006.
 Custas pelo recorrente, fixando-se em 15 ( quinze ) unidades de conta a taxa de 
 justiça.
 
  
 Lisboa, 26 de Setembro de 2006
 Maria João Antunes
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Maria Helena Brito
 Rui Manuel Moura Ramos
 Artur Maurício