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Processo nº 363/06
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria João Antunes
 
  
 
   
 
  
 Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
  
 I. Relatório
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que é 
 recorrente o Município de Boticas e em que são recorridos A. e outros, foram 
 interpostos recursos para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no 
 artigo 70º, nº 1, alíneas a) e b), da Lei da Organização, Funcionamento e 
 Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do acórdão daquele Tribunal, de 7 de 
 Março de 2006.
 
  
 
 2. Em 23 de Maio de 2006, foi proferida decisão sumária, pela qual se entendeu 
 não tomar conhecimento do objecto dos recursos interpostos (artigo 78º-A, nº 1, 
 da LTC). Relativamente ao recurso previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da 
 LTC – o único que importa considerar, já que o decidido quanto ao previsto na 
 alínea a) do mesmo nº e artigo não é objecto de reclamação –, a decisão de não 
 conhecimento assentou nos seguintes fundamentos:
 
  
 
 “No que se refere ao recurso interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 
 
 70º da LTC, afirma o recorrente, no respectivo requerimento, que a decisão 
 recorrida «ao assinalar que “(...) o método de avaliação de parcela integrada em 
 zona verde tem de basear-se apenas em circunstâncias e factores exógenos à 
 própria parcela” e não também nos elementos objectivos desta última, perfilhou 
 uma interpretação da norma constante do nº 12 do artigo 26° do CE que viola os 
 princípios constitucionais da igualdade e da justa indemnização, consagrados no 
 artigo 13° e n° 2, do artigo 64° da CRP».
 Sucede, porém, que, analisado o teor da decisão recorrida, na sua globalidade e 
 no passo citado pelo próprio recorrente, resulta claro não poder afirmar-se que 
 o Tribunal da Relação do Porto tenha adoptado um critério que não atende aos 
 elementos objectivos da parcela, para fixação da indemnização, assim se 
 distinguindo a situação dos autos daquela que foi analisada no Acórdão do 
 Tribunal Constitucional nº 145/05, para o qual remete a decisão sumária citada 
 pelo recorrente (decisão sumária com o nº 204/05, proferida no processo nº 
 
 365/05).
 De facto, pode ler-se na decisão agora recorrida que:
 
  
 
 «Para efeitos do cálculo da indemnização por expropriação, o solo classifica-se, 
 de acordo com o disposto no art. 25°, n.º 1, do CE, em:
 
              - solo apto para construção;
 
              - solo apto para outros fins.
 O cálculo do valor do solo para construção obedece aos critérios que vêm 
 definidos no art. 26º.
 No caso dos autos, o solo da parcela expropriada vem classificado como solo apto 
 para construção.
 Essa classificação foi aceite por todos os intervenientes. Nem poderia ser de 
 outro modo, uma vez que o terreno expropriado está situado no centro da vila de 
 Boticas, a 40 metros da CGD, a 60 metros da Repartição de Finanças e a 70 metros 
 do Mercado – v. fls. 249» (itálico aditado); 
 
 «O que importa, sobretudo, assinalar é que o método de avaliação de parcela 
 integrada em zona verde tem de basear-se apenas em circunstâncias e factores 
 exógenos à própria parcela; o que efectivamente conta é o que existe no 
 perímetro exterior de 300 metros, avaliando-se o valor médio das construções aí 
 existentes ou, se não existirem construções, o valor médio do que nesse 
 perímetro seja possível construir. A única condição exigível relativamente à 
 própria parcela, para o funcionamento do n.º 12 do art. 26°, é que ela tenha uma 
 vocação objectiva para a edificabilidade, condição essa que está perfeitamente 
 verificada no caso concreto» (itálico aditado).
 
  
 Enquanto que, na decisão proferida no processo que deu origem ao Acórdão nº 
 
 145/05, se entendeu prescindir da averiguação das condições objectivas de 
 edificabilidade da parcela expropriada, a que se refere o nº 2 do artigo 25º do 
 Código das Expropriações, tendo este Tribunal julgado inconstitucional “a norma 
 do n.º 12 do artigo 26º do Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 
 
 168/99, de 18 de Setembro, interpretada no sentido de que, para efeitos da sua 
 aplicação, a aptidão edificativa da parcela expropriada não tem de aferir-se 
 pelos elementos objectivos definidos no artigo 25º, n.º 2, do mesmo Código”, na 
 decisão recorrida é expressamente afirmada a necessidade de verificação daquelas 
 condições objectivas.
 Não pode, pois, afirmar-se que o acórdão do Tribunal da Relação do Porto 
 interpretou e aplicou o nº 12 do artigo 26º do Código das Expropriações, no 
 sentido de o método de avaliação de parcela integrada em zona verde ter de 
 basear-se apenas em circunstâncias e factores exógenos à própria parcela e não 
 também nos elementos objectivos desta última. Nas palavras do Acórdão do 
 Tribunal Constitucional para onde remete a decisão sumária citada pelo 
 recorrente, o tribunal recorrido não aplicou a norma do n.º 12 do artigo 26º do 
 Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro, 
 interpretada no sentido de que a aptidão edificativa da parcela expropriada não 
 tem de aferir-se pelos elementos objectivos definidos no artigo 25º, n.º 2, do 
 mesmo Código.
 Não tendo a decisão recorrida aplicado a norma enunciada pelo recorrente, 
 importa concluir pelo não conhecimento do objecto do recurso, por não 
 verificação de um dos requisitos do recurso previsto na alínea b) do nº 1 do 
 artigo 70º da LTC – a aplicação pelo tribunal recorrido, como ratio decidendi, 
 da norma cuja constitucionalidade é questionada pela recorrente – 
 justificando-se, assim, a prolação da presente decisão (artigo 78º-A, nº 1, da 
 LTC)”.
 
  
 
 3. Desta decisão vem agora o recorrente reclamar para a conferência, ao abrigo 
 do nº 3 do artigo 76º da LTC, com os seguintes fundamentos:
 
  
 
 «A douta decisão sumária, ao decidir como decidiu, vem permitir a consagração de 
 uma interpretação do n° 12, do artigo 26° do Código das Expropriações (CE), 
 efectuada pela douta sentença do Tribunal da Relação, o que viola flagrantemente 
 os princípios constitucionais da igualdade e da justa indemnização previstos nos 
 artigos 13° e 64°, n°2, da Constituição da República (CRP).
 De facto, e reiterando a fundamentação constante do requerimento de interposição 
 do recurso em causa, e dos esclarecimentos adicionais prestados pela recorrente, 
 esta referida sentença ao expressamente afirmar que “...o método de avaliação de 
 parcela integrada em zona verde tem de basear-se apenas em circunstâncias e 
 factores exógenos à própria parcela” (sublinhado a negro nosso), deixa 
 claramente de fora dessa avaliação os elementos objectivos da própria parcela 
 expropriada, como são as servidões privada de passagem e administrativa 
 constituída ao abrigo do domínio hídrico nela existentes que afectam 
 substancialmente a sua aptidão edificativa.
 Pois considerou irrelevante para a fixação da indemnização do prédio expropriado 
 aquelas condicionantes da potencialidade construtiva da própria parcela 
 expropriada, com base justamente no entendimento de que aquele n° 12, do artigo 
 
 26 do CE não obriga a atender aos elementos objectivos que condicionam a plena 
 aptidão edificativa do prédio expropriado, mas apenas às circunstâncias ou 
 factores exógenos à própria parcela existentes no perímetro de 300 metros.
 E nessa interpretação aos expropriados é atribuído um tratamento mais favorável, 
 dando-lhes um prémio, por se lhes reconhecer uma indemnização superior em 
 comparação com os demais proprietários de solos aptos para construção com 
 idênticas as servidões, mas situados em zona que não tenha a classificação 
 prevista naquele n° 12, criando situações de desigualdade injustificáveis entre 
 aqueles expropriados e estes últimos.
 E determina ainda o pagamento de um indemnização pelo prédio expropriado que é 
 excessiva e está muito para além do que os seus proprietários por ele obteriam 
 no mercado a funcionar segundo as boas regras da concorrência.
 Pelo que o Tribunal da Relação, como nas decisões anteriores, aplicou aquele n° 
 
 12, numa interpretação, que excluindo do método de avaliação os elementos 
 objectivos inerentes à própria parcela, é claramente inconstitucional por pôr em 
 causa os princípios constitucionais acima referenciados.
 E é a constitucionalidade da aplicação da referida norma com essa interpretação 
 que a recorrente suscitou no seu recurso, pelo que se mostra preenchido o 
 requisito para a apreciação do recurso previsto na alínea b), do n° 1, do artigo 
 
 70° da Lei do Tribunal Constitucional».
 
  
 
 4. Notificados desta reclamação, os recorridos não responderam.
 
  
 
 5. Em cumprimento do disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil, 
 aplicável por força do artigo 69º da LTC, o recorrente e os recorridos foram 
 notificados para se pronunciarem sobre a possibilidade de o Tribunal decidir não 
 tomar conhecimento do objecto do recurso, com fundamento na não identificação da 
 norma cuja inconstitucionalidade o recorrente pretende ver apreciada por este 
 Tribunal. 
 
  
 
 6. O recorrente e os recorridos não apresentaram qualquer resposta.
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II. Fundamentação
 Constitui um ónus para o recorrente indicar, no requerimento de interposição de 
 recurso, a norma cuja inconstitucionalidade pretende que o Tribunal 
 Constitucional aprecie (artigos 75º-A, nº 1, 76º, nº 2, e 78º-A, nº 2, da LTC). 
 E tem vindo este Tribunal a entender que “o cumprimento destes ónus [os 
 constantes dos nºs 1, 2, 3 e 4 do artigo 75º-A da LTC) não representa simples 
 observância do dever de colaboração das partes com o Tribunal; constitui, antes, 
 o preenchimento de requisitos formais essenciais ao conhecimento do objecto do 
 recurso' (cf. o Acórdão nº 200/97, não publicado, e, entre outros, o Acórdão nº 
 
 462/94, Diário da República, II Série, de 21 de Novembro de 1994, o Acórdão nº 
 
 243/97, Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 36º, p. 609, os Acórdãos nºs 
 
 137/99, 207/2000 e 382/2000, não publicados).
 Convidado a indicar com precisão a norma cuja inconstitucionalidade pretendia 
 que este Tribunal apreciasse, ao abrigo do disposto no nº 6 do artigo 75º-A da 
 LTC – no requerimento apresentado, o recorrente limitou-se a remeter para a 
 interpretação que o tribunal recorrido havia feito do nº 12 do artigo 26º do 
 Código das Expropriações – o ora reclamante precisou que a decisão recorrida, 
 
  
 
 «na aliena b) da respectiva fundamentação, ao assinalar que “(...) o método de 
 avaliação de parcela integrada em zona verde tem de basear-se apenas em 
 circunstâncias e factores exógenos à própria parcela” e não também nos elementos 
 objectivos desta última, perfilhou uma interpretação da norma constante do n° 12 
 do artigo 26° do CE que viola os princípios constitucionais da igualdade e da 
 justa indemnização, consagrados no artigo 13° e n° 2, do artigo 64° da CRP, 
 sendo certo que o Tribunal Constitucional já se pronunciou pela 
 inconstitucionalidade daquela norma nessa interpretação, pelo menos na Decisão 
 Sumária n° 365/05, proferida no Processo 365/05-1ª Secção».
 
  
 Face aos precisos termos desta formulação, importa concluir que o recorrente 
 acabou por não indicar, com a necessária precisão, a norma cuja 
 constitucionalidade pretendia questionar. 
 Por um lado, resulta que se trata do nº 12 do artigo 26º do Código das 
 Expropriações, interpretado no sentido de o método de avaliação de parcela 
 integrada em zona verde ter de basear-se apenas em circunstâncias e factores 
 exógenos à própria parcela e não também nos elementos objectivos desta última; 
 por outro, que está em causa a apreciação da “norma do n.º 12 do artigo 26º do 
 Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro, 
 interpretada no sentido de que, para efeitos da sua aplicação, a aptidão 
 edificativa da parcela expropriada não tem de aferir-se pelos elementos 
 objectivos definidos no artigo 25º, n.º 2, do mesmo Código” (a que foi julgada 
 inconstitucional pelo Acórdão nº 145/2005, cujo juízo foi depois reiterado na 
 Decisão sumária nº 204/2005, tirada no Processo nº 365/05 da 1ª secção deste 
 Tribunal). 
 De resto, para além de o reclamante não ter contrariado a afirmação de que o 
 acórdão do Tribunal da Relação do Porto não aplicou, como ratio decidendi, esta 
 
 última norma, não demonstrou, tão-pouco, que a norma agora enunciada na presente 
 reclamação (o nº 12 do artigo 26º, interpretado no sentido de não obrigar a 
 atender aos elementos objectivos que condicionam a plena aptidão edificativa do 
 prédio expropriado, mas apenas às circunstâncias ou factores exógenos à própria 
 parcela existentes no perímetro de 300 metros) constava já do requerimento de 
 interposição de recurso e respectivo aperfeiçoamento – a peça processual que 
 define o objecto do recurso de constitucionalidade.
 Resta, pois, concluir pelo indeferimento da presente reclamação.
 
  
 III. Decisão
 Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação e, em consequência, confirmar a 
 decisão reclamada.
 Sem custas, face à isenção do reclamante.
 
  
 Lisboa, 26 de Setembro de 2006
 Maria João Antunes
 Rui Manuel Moura Ramos
 Artur Maurício