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Processo n.º 337/07
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Mário Torres
 
 
 
  Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,
 
  
 
                         1. Relatório
 
                         1.1. A Caixa Geral de Aposentações (CGA) e o 
 representante do Ministério Público na Secção de Contencioso Administrativo do 
 Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN) interpuseram recurso para o 
 Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 
 de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, 
 aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela 
 Lei n.º 13‑A/98, de 26 de Fevereiro (LTC), contra o acórdão do referido 
 Tribunal, de 8 de Fevereiro de 2007, que recusou a aplicação, com fundamento em 
 inconstitucionalidade material, por violação do disposto nos artigos 2.º e 266.º 
 da Constituição da República Portuguesa (CRP), das normas constantes dos artigos 
 
 1.º, n.º 6, e 2.º da Lei n.º 1/2004, de 15 de Janeiro, quando entendidas no 
 sentido de que não é aplicável o regime do Decreto‑Lei n.º 116/85, de 19 de 
 Abril, aos processos que, apesar de se terem iniciado antes de 31 de Dezembro de 
 
 2003, não deram entrada na CGA até à data da entrada em vigor daquela Lei (1 de 
 Janeiro de 2004).
 
  
 
                         1.2. O referido acórdão foi proferido em recurso 
 jurisdicional interposto pela CGA contra a sentença do Tribunal Administrativo e 
 Fiscal de Coimbra, de 24 de Fevereiro de 2006, que julgou procedente a acção 
 administrativa especial, de condenação à prática de acto devido, contra a mesma 
 deduzida pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local 
 
 (STAL), em representação do seu associado A., condenando a CGD a apreciar o 
 pedido de aposentação antecipada por este apresentado, ao abrigo do disposto no 
 Decreto‑Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, em 14 de Novembro de 2003, embora só 
 remetido pela Câmara Municipal da Figueira da Foz à CGA em 12 de Janeiro de 
 
 2004.
 
                         O acórdão recorrido deu como assente a seguinte matéria 
 de facto:
 
  
 
             “I) O associado do autor A. é funcionário do quadro de pessoal do 
 Município da Figueira da Foz, com a categoria de bombeiro municipal, e está 
 inscrito na CGA desde 15 de Janeiro de 1975;
 
             II) Em 14 de Novembro de 2003, dirigiu ao Presidente da Câmara 
 Municipal da Figueira da Foz o requerimento que consta de fls. 1 do documento 
 n.º 3, junto com a petição inicial, de cujo teor aqui se destaca o seguinte: «em 
 virtude de ter completado 36 anos de serviço, solicita a V. Exa. se digne 
 promover que o requerimento seja remetido à Caixa Geral de Aposentações (…) 
 depois de informado por esta Câmara Municipal»;
 
             III) O seu requerimento mereceu informações favoráveis do 
 comandante dos Bombeiros Municipais e da Vereadora dos Recursos Humanos da 
 Câmara Municipal da Figueira da Foz, nos termos constantes de fls. 2 do 
 documento n.º 3, junto com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por 
 integralmente reproduzido;
 
             IV) O Coordenador Distrital do Centro Distrital de Operações de 
 Socorro de Coimbra emitiu, com data de 12 de Novembro de 2003, a declaração que 
 consta de fls. 8 do documento n.º 3, junto com a petição inicial, cujo teor aqui 
 se dá por integralmente reproduzido;
 
             V) Por ofício datado de 12 de Janeiro de 2004, a Vereadora da Câmara 
 Municipal da Figueira da Foz com delegação de competências remeteu à CGA o 
 processo de aposentação de A. – cf. documento de fls. 12 do processo 
 administrativo, bem como o documento n.º 4, junto com a petição inicial, cujo 
 teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
 
             VI) Por ofício datado de 30 de Janeiro de 2004, a CGA procedeu à 
 devolução do processo do funcionário associado do autor, nos termos e com os 
 fundamentos constantes do documento que consta de fls. 13 do processo 
 administrativo, que aqui se dá por reproduzido, de cujo teor se destaca o 
 seguinte: «O Decreto‑Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, foi revogado pelo n.º 3 do 
 artigo 1.º da Lei n.º 1/2004, de 15 de Janeiro. Tendo presente que o pedido de 
 aposentação não foi enviado a esta Caixa dentro do prazo estabelecido no n.º 6 
 do artigo 1.º da citada Lei, junto se devolve por falta de fundamento legal».”
 
  
 
                         Na fundamentação jurídica, após reprodução do quadro 
 legal relevante e desenvolvidas considerações sobre a retroactividade e os 
 princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança, implícitos no 
 princípio do Estado de Direito democrático, o acórdão recorrido, especificamente 
 sobre o caso em apreço, explana o seguinte:
 
  
 
             “Revertendo ao caso vertente temos que a Lei n.º 1/2004 consagrou 
 normas transitórias (cf. artigos 1.º, n.ºs 6 a 8, e 2.º), normas essas que, no 
 entendimento da recorrente, conduzem à rejeição da pretensão do associado do 
 recorrido, entendimento que não teve acolhimento na decisão judicial recorrida.
 
             Cremos que esta ajuizou bem a situação vertente e, nessa medida, o 
 presente recurso jurisdicional deverá improceder.
 
             Explicitemos o nosso posicionamento.
 
             O associado do recorrido, tal como deriva da factualidade apurada, 
 formulou a sua pretensão de aposentação antecipada ao abrigo e nos termos do 
 regime legal decorrente do Decreto‑Lei n.º 116/85, em 14 de Novembro de 2003 
 
 [cf. n.º II)], nos serviços competentes da Câmara Municipal da Figueira da Foz e 
 que esta, após instrução, remeteu o respectivo processo à CGA em 12 de Janeiro 
 de 2004 [cf. n.ºs III), IV) e V) dos factos assentes].
 
             Mais se infere da factualidade apurada que aquele requerimento 
 apenas foi objecto de pronúncia por parte da CGA, através de ofício datado de 30 
 de Janeiro de 2004, determinando a devolução do processo de aposentação 
 porquanto o Decreto‑Lei n.º 116/85 havia sido revogado pelo n.º 3 do artigo 1.º 
 da Lei n.º 1/2004 e que, não tendo o pedido de aposentação sido enviado à CGA 
 dentro do prazo estabelecido no n.º 6 do citado artigo 1.º, o mesmo não tem 
 fundamento legal [cf. n.º VI)].
 
             Ora, por força do n.º 3 do artigo 1.º da Lei n.º 1/2004, o regime 
 especial de aposentação antecipada previsto no Decreto‑Lei n.º 116/85, ao abrigo 
 do qual se iniciou o procedimento administrativo em crise, foi expressamente 
 revogado.
 
             Assim, no caso sub judice compreende‑se que a eliminação daquele 
 regime especial previsto no Decreto‑Lei n.º 116/85 por parte do legislador 
 afecte expectativas dos destinatários da prescrição legal.
 
             Não havia razão específica para os destinatários que haviam 
 formulado os seus requerimentos tendentes à sua aposentação ao abrigo daquele 
 Decreto‑Lei tivessem de antecipar aquela mutação da ordem jurídica, mormente, a 
 imposição de um limite temporal e modo de definição ou aferição daquele momento 
 findo o qual aquele direito se extinguia.
 
             Cientes dos considerandos anteriormente tecidos, importa saber se 
 tais expectativas, no caso do associado do recorrido, eram legítimas, no sentido 
 de merecerem a tutela do Direito, ou se o legislador, através do quadro 
 transitório definido, acautelou a possibilidade de formação de tais 
 expectativas, advertindo os destinatários da impossibilidade de manterem aquele 
 regime de aposentação.
 
             Tal como se aludiu, a impossibilidade de previsão de uma mudança só 
 frustra expectativas legítimas dos destinatários da norma em causa se estes não 
 devessem razoavelmente contar com a possibilidade da mudança e, em particular, 
 quando já haviam formulado pretensão substantiva junto da Administração nos 
 termos ou fundada num regime normativo que lhe conferia um direito à aposentação 
 antecipada.
 
             A este propósito atente‑se no entendimento sustentado pelo Dr. J. 
 Cândido Pinho, que aqui se sufraga, quando afirma que o «… regime da 
 aposentação determina‑se em função do momento em que certos factos jurídicos se 
 verificarem [factos determinativos da aposentação e da reforma].
 
             Na aposentação exclusivamente voluntária […], o facto a considerar é 
 a data do despacho a reconhecer o direito à aposentação […].
 
             Não releva, deste modo, a data da entrada do requerimento, até 
 porque entre ela e a da resolução final a reconhecer o direito pode decorrer um 
 período mais ou menos longo, no seio do qual possam advir alterações 
 estatutárias ou legais que possam favorecer o requerente. É o que de jure 
 constituto está definido. Porém, mal e em desrespeito constitucional, em nossa 
 opinião.
 
             Efectivamente, cremos que sempre deverá relevar a data em que é 
 apresentado o requerimento nos casos em que à época o interessado já reúna em 
 si os pressupostos efectivos para a concessão da aposentação. Na verdade, se na 
 data em que a aposentação for pedida já o funcionário dispuser das condições 
 factuais para a aposentação, não faz sentido submeter o regime desta ao universo 
 jurídico existente no momento em que a resolução definitiva vier a ser tomada 
 uma vez que no momento em que faz o pedido já o direito se encontra adquirido. 
 Pode entre a apresentação do requerimento e a decisão final interpor‑se um 
 intervalo de tempo mais ou menos prolongado que se reflicta negativamente sobre 
 a esfera do requerente. Imagine‑se, por exemplo, que na data em que a 
 aposentação vem a ser decidida já os requisitos legais se alteraram (v. g., de 
 
 65 anos o limite subiu para 70; ou da verificação exclusiva do tempo de 36 anos 
 de serviço para a obtenção da reforma ‘por inteiro’, a lei nova passou a exigir 
 um novo factor adicional de 65 anos de idade). Nos exemplos apontados, o 
 requerente quando efectua o pedido já atingiu os 65 anos de idade ou já tinha 
 perfeito os 36 anos de serviço. Tinha nesse instante uma séria, fortíssima e 
 legítima expectativa de que a reforma lhe seria concedida nos moldes legais 
 existentes e já conhecidos, nunca em função de requisitos futuros totalmente 
 ignorados. Assim, é de entender que o regime aplicável é o existente na data em 
 que o pedido é apresentado se estiverem já reunidos os pressupostos factuais de 
 acordo com a lei vigente nessa ocasião. Se assim não se entender, estar-se-á a 
 violar os princípios sagrados da boa fé e da confiança (artigo 6.º‑A do CPA), 
 de consagração constitucional (artigo 266.º, n.º 2, da CRP) e que, enquanto 
 corolários da segurança jurídica, se apresentam como pilares infra‑estruturantes 
 de um verdadeiro Estado de Direito, respeitador do indivíduo, das relações 
 inter‑individuais e administrativas e dos princípios jurídico‑normativos que em 
 cada momento as disciplinam (…).» (in Estatuto da Aposentação – Anotado – 
 Comentado – Jurisprudência, 2003, pág. 161).
 
             E a propósito da alteração legislativa introduzida pelo artigo 9.º 
 da Lei n.º 32‑B/2002, de 30 de Dezembro, entretanto julgada inconstitucional, 
 conclui o citado autor: «… Alterações legais que, por conseguinte, venham a 
 ocorrer posteriormente à data do requerimento somente serão de relevar nos casos 
 em que se repercutam positivamente na esfera dos interessados, ou seja, quando 
 se mostrem mais favoráveis aos interesses dos visados. Se o interessado 
 manifesta a sua vontade e exercita o seu direito num dado momento, mostrando 
 que quer ver a sua situação resolvida ao abrigo do regime vigente nessa altura, 
 não poderá o caso ser resolvido senão pela lei desse momento. A lei nova não 
 pode, assim, retroagir os seus efeitos sobre uma situação de facto consolidada 
 anteriormente (cf. artigo 13.º do Código Civil). É um pouco essa preocupação que 
 subjaz ao artigo 9.º, n.º 6, da Lei n.º 32‑B/2002, de 30 de Dezembro, na medida 
 em que garante a aplicação da lei anterior aos subscritores cujos processos 
 sejam enviados à CGA (não apenas recebidos) até 31 de Dezembro de 2002. Mas, 
 ainda assim, esta salvaguarda está aquém da garantia plena que tem que ser 
 reconhecida a quem em 31 de Dezembro de 2002 reunisse as condições para a 
 aposentação mais favorável segundo o regime anterior. Cremos, na verdade, que o 
 que importa é a data da verificação dos pressupostos, não a data do envio, que 
 até pode, e nalguns casos, até terá mesmo que ser posterior (basta pensar nas 
 situações em que os pressupostos se reúnem apenas no final do ano; é bom de ver 
 que, nesses casos, os serviços não terão tempo de enviar o processo devidamente 
 instruído até 31 de Dezembro). Essa inquietação, porém, é sossegada pelo n.º 8 
 do mesmo artigo 9.º, ao firmar o postulado de que relevante é, afinal, a 
 situação material existente em 31 de Dezembro de 2002 (…)» (in obra citada, pág. 
 
 162).
 
             Transpondo para a situação em análise os considerandos ora 
 reproduzidos, temos que, no quadro fáctico‑jurídico vertente, não poderá deixar 
 de se considerar que a actuação da CGA, tal como foi considerada pela decisão 
 judicial recorrida, é claramente violadora dos valores e princípios da 
 protecção da confiança, da boa fé e da segurança jurídica, que devem nortear e 
 pautar um Estado de Direito democrático.
 
             É certo que, numa interpretação estritamente literal das disposições 
 conjugadas do n.º 6 do artigo 1.º e do artigo 2.º da Lei n.º 1/2004, o regime 
 de aposentação antecipada previsto e regulado no Decreto‑Lei n.º 116/85 não se 
 aplicaria aos processos de aposentação que tivessem sido enviados à CGA em data 
 posterior a 1 de Janeiro de 2004, já que, atendendo à data em que o processo de 
 aposentação do associado do recorrido foi enviado à CGA, no caso, 12 de Janeiro 
 de 2004, a ele não seria aplicável aquele Decreto‑Lei, mas ao invés o regime 
 previsto no artigo 37.º‑A do Estatuto da Aposentação (ora aditado pelo n.º 2 do 
 artigo 1.º da Lei n.º 1/2004).
 
             Contudo, pensamos não ser ou dever ser essa a correcta interpretação 
 do quadro legal.
 
             Na verdade, a Lei n.º 1/2004 foi aprovada pela Assembleia da 
 República em 4 de Dezembro de 2003 e só veio a ser publicada, gozando de força 
 de lei e de eficácia, em 15 de Janeiro de 2004, quando o associado do recorrido 
 havia formulado a sua pretensão substantiva de aposentação antecipada em 14 de 
 Novembro de 2003 e fundado num quadro legal no qual confiava legitimamente e do 
 qual poderia esperar, nos termos do artigo 3.º, n.º 1, do Decreto‑Lei n.º 
 
 116/85, um prazo de 30 dias contado da data da entrada do seu requerimento, 
 para o processo ser informado pelo respectivo departamento, designadamente 
 quanto a inexistência de prejuízo para o serviço, para a sua submissão a 
 despacho de concordância por quem tiver poderes para esse efeito e, obtido esse, 
 
 à sua remessa ou envio para a CGA.
 
             Aquele interessado, uma vez formulada a sua pretensão, deixa por 
 completo de controlar o procedimento administrativo tendente à análise do 
 pedido de aposentação. Assim, não pode o mesmo ser responsabilizado ou 
 prejudicado pela demora na actuação dos serviços da Administração, não sendo 
 legítimo que o mesmo, confiando no regular e normal andamento dos processos e no 
 respeito escrupuloso dos prazos, venha a ser confrontado com o incumprimento 
 daqueles prazos e penalizado na sua esfera jurídica por motivos aos quais é 
 alheio e que apenas são assacáveis a omissão da Administração.
 
             Sob pena de enfermar de inconstitucionalidade, pensamos que tanto a 
 letra como o sentido da norma transitória inserta no n.º 6 do artigo 1.º, na sua 
 concatenação com o n.º 8 do mesmo normativo, vão no sentido de não aplicar o 
 disposto nos n.ºs 1 a 5 aos subscritores cujos processos de aposentação tenham 
 sido formulados e enviados à CGA pelos respectivos serviços ou entidades até à 
 data da entrada em vigor daquela Lei, aqui entendida no sentido dado pelo artigo 
 
 2.º da Lei n.º 74/98, ou seja, até à data da sua publicação (15 de Janeiro de 
 
 2004) e desde que os interessados reunissem até 31 de Dezembro de 2003 as 
 condições legalmente exigidas para a concessão da aposentação.
 
             O que o legislador ordinário pretendeu foi salvaguardar as situações 
 dos subscritores cujos processos de aposentação se haviam iniciado antes de 31 
 de Dezembro de 2003, que entraram na CGA até à data da entrada em vigor da lei 
 nova, aposentando‑os de harmonia com a lei antiga desde que os mesmos 
 reunissem, àquela data, os respectivos requisitos. Atente-se, aliás, para o 
 efeito, no regime vertido no n.º 8 do artigo 1.º da citada Lei.
 
             A assim se não interpretar este quadro legal, num esforço para o 
 compatibilizar com a Lei Fundamental, temos que outra solução não nos resta que 
 não seja a de considerar tal regime transitório definido na Lei n.º 1/2004 como 
 violador dos princípios da protecção da confiança e da segurança jurídica 
 estruturantes de um Estado de Direito democrático (artigos 2.º, 3.º e 266.º, n.º 
 
 2, da CRP) e como tal inconstitucional.
 
             De facto, o requerente, associado do ora recorrido, quando efectuou 
 o pedido de aposentação antecipada (em 14 de Novembro de 2003), teria de ter 
 completado os 36 anos de serviço, sendo que, para obter o deferimento da sua 
 pretensão, impunha‑se conseguir informação e despacho concordante quanto ao 
 outro requisito cumulativo, o da «inexistência de prejuízo para o serviço».
 
             Tinha, pois, nesse momento, uma séria, uma fortíssima e legítima 
 expectativa de que a reforma lhe seria concedida nos moldes legalmente 
 existentes e ao abrigo dos quais formulou a sua pretensão, mas nunca em função 
 de requisitos futuros totalmente ignorados e que vieram a ser introduzidos pela 
 Lei n.º 1/2004.
 
             Formulada pretensão junto da Administração ao abrigo de determinado 
 quadro legal, é de entender que o regime aplicável será o existente na data em 
 que o pedido é apresentado, devendo ser à sua luz, dos seus requisitos, que a 
 pretensão terá de ser analisada, deferindo‑a ou indeferindo‑a.
 
             A assim não ser considerado, estar‑se‑á perante uma violação dos 
 princípios sagrados da confiança e da segurança jurídica, os quais se 
 apresentam como pilares basilares de um Estado que se reclama de Direito e 
 respeitador do indivíduo.
 
             A lei nova não pode legitimamente retroagir os seus efeitos sobre 
 uma situação de facto consolidada anteriormente (dedução de requerimento 
 contendo pretensão de aposentação ao abrigo de determinado regime legal), 
 quando a confiança do cidadão na manutenção da situação jurídica com base na 
 qual tomou a sua decisão foi violada de uma forma que se reputa de intolerável 
 por efeito de uma mutação da ordem jurídica com que, razoavelmente, não podia 
 contar e sem que a necessidade de salvaguardar direitos ou interesses 
 constitucionalmente protegidos que se devam considerar prevalecentes.
 
             Um regime transitório como o consagrado na Lei n.º 1/2004, que se 
 abstrai por completo da data em que é formulado o requerimento contendo pedido 
 de aposentação antecipada ao abrigo do Decreto‑Lei n.º 116/85, que se limita a 
 atender apenas à data em que o processo deu entrada ou tinha de ter dado entrada 
 na CGA, penalizando e prejudicando os administrados cujos processos apenas 
 deram entrada na CGA após a entrada em vigor e por motivos a que os mesmos são 
 absolutamente alheios, não pode ter‑se como respeitador dos princípios em 
 referência.
 
             Não é minimamente aceitável, à luz dos mesmos princípios, que um 
 diploma com este alcance e com os efeitos negativos ao mesmo conexos na esfera 
 jurídica dos interessados venha a ser publicado apenas no dia 15 de Janeiro de 
 
 2004, reportando retroactivamente seus efeitos a 1 de Janeiro de 2004 e fazendo 
 com que os processos de aposentação remetidos à CGA, ao abrigo de um determinado 
 regime legal vigente por devido, regular e legitimamente publicado e 
 publicitado (Decreto‑Lei n.º 116/85), no qual se confiava e se depositavam 
 expectativas, ficassem destituídos de fundamento legal.
 
             Cremos, por conseguinte, que o que importa para assegurar no caso os 
 princípios constitucionais em referência é a data da dedução da pretensão e não 
 a data do envio, a qual até pode, e nalguns casos até terá mesmo que ser 
 posterior. Aliás, essa inquietação preside ao próprio teor da solução 
 consagrada no n.º 8 do mesmo artigo 1.º, quando ali se firma o postulado de que 
 o que é relevante é, afinal, a situação material existente em 31 de Dezembro de 
 
 2003.
 
             As regras basilares de um Estado de Direito democrático (artigo 2.º 
 da CRP) reclamam que no caso a confiança e segurança na situação jurídica 
 preexistente haverá de prevalecer sobre a medida legislativa que veio agravar a 
 posição do cidadão e isso porque, tendo tal confiança, nesse caso, maior «peso» 
 ou «relevo» constitucional do que o interesse público subjacente à alteração 
 legislativa em causa, é justo que o conflito se resolva daquela maneira, 
 postulando um mínimo de certeza nos direitos das pessoas e nas expectativas que 
 lhes são juridicamente criadas, censurando as afectações inadmissíveis, 
 arbitrárias ou excessivamente onerosas, com as quais não se poderia 
 razoavelmente contar.
 
             Pese embora, no caso em apreço, o interessado não dispusesse, nem à 
 data de apresentação do requerimento (14 de Novembro de 2003), nem à data da 
 publicação da Lei n.º 1/2004, de um direito subjectivo à aposentação 
 consolidado na sua esfera jurídica, era, todavia, detentor de uma expectativa 
 legítima, juridicamente criada, de que o seu pedido de aposentação iria ser 
 apreciado e decidido à luz do regime legal vertido no Decreto‑Lei n.º 116/85.
 
             Ressuma de tudo o atrás exposto que a CGA, ao devolver o processo de 
 aposentação antecipada deduzido pelo associado do recorrido através do ofício 
 datado de 30 de Janeiro de 2004, com a fundamentação no mesmo veiculada, fez ou 
 uma errada aplicação da lei decorrente de uma incorrecta interpretação dos 
 artigos 1.º e 2.º da Lei n.º 1/2004, ou, então, estribou‑se em quadro legal que, 
 em concreto, padece de inconstitucionalidade, por ofensa aos princípios da 
 protecção da confiança e da segurança jurídica, porquanto definiu regime 
 transitório cujo lapso temporal limite imposto como condição de apreciação da 
 pretensão de aposentação ao abrigo dum determinado regime legal (no caso, o 
 vertido no Decreto‑Lei n.º 116/85) ofende e põe claramente em causa aqueles 
 princípios, subvertendo as regras num Estado de Direito.
 
             Se é certo que o artigo 43.º do Estatuto da Aposentação incorpora 
 uma previsão genérica de possibilidade de mudança de regimes, ao determinar que 
 o regime da aposentação se fixa com base na lei em vigor e na situação existente 
 
 à data em que se verifiquem os pressupostos que dão origem à aposentação, tal 
 não significa, sob pena também de inconstitucionalidade do normativo, que 
 perante um pedido de aposentação formulado ao abrigo dum determinado quadro 
 legal, no qual se consagrava a possibilidade de aposentação antecipada, o mesmo 
 venha a ser rejeitado ou devolvido pelo simples facto de entretanto se ter 
 publicado novo quadro legal que eliminou aquela forma de aposentação e que fez 
 aplicação desse novo regime legal a procedimentos administrativos que estavam já 
 em curso e que se haviam legitimamente fundado num quadro legal que à data da 
 sua interposição vigorava.
 
             Como justificar ou considerar adequada e respeitadora da Lei 
 Fundamental uma solução legal transitória que permite que dois interessados que 
 hajam formulado a mesma pretensão (aposentação antecipada ao abrigo do 
 Decreto‑Lei n.º 116/85) num mesmo dia (v. g., 1 de Setembro de 2003 ou outra 
 qualquer data até 31 de Dezembro de 2003) possam ver a Administração decidir em 
 sentidos diametralmente opostos pelo simples facto de, quanto a um dos 
 indivíduos, o processo se haver desenvolvido com respeito dos prazos e o 
 processo ter dado entrada na CGA antes de 31 de Dezembro de 2003 e, quanto ao 
 outro, por omissão da Administração, o processo só ter dado entrada após aquela 
 data.
 
             Não é jurídica e eticamente sustentável e defensável uma tal 
 solução.
 
             Não está aqui em causa a constituição ou não dum direito adquirido 
 por parte dos interessados à aposentação antecipada, mas apenas a tutela 
 legítima do interesse na confiança e na segurança jurídicas de todos aqueles que 
 já haviam formulado pretensão invocando um quadro legal de referência e que 
 confiadamente esperavam uma decisão ao abrigo do mesmo quadro legal pretensivo. 
 Note‑se que nesta sede não se está a tutelar posições ou eventuais direitos de 
 cidadãos que, à data da entrada em vigor da nova lei, ainda não haviam formulado 
 qualquer pretensão, pois relativamente a estes é legítimo o operar e a 
 aplicabilidade do novo regime legal, visto os mesmos não deterem posição ou 
 situação substantiva merecedora de protecção da confiança e da segurança 
 jurídica. Já o mesmo não pode ser entendido quanto a todos aqueles que tinham 
 formulado requerimento segundo regime legal que à data vigorava e visando um 
 determinado objectivo.
 
             Deve, assim, concluir‑se pela inconstitucionalidade material das 
 normas vertidas no n.º 6 do artigo 1.º e do artigo 2.º da Lei n.º 1/2004, quando 
 entendidas no sentido de que não é aplicável o regime do Decreto‑Lei n.º 116/85 
 aos processos que se iniciaram antes de 31 de Dezembro de 2003 pelo simples 
 facto de não terem dado entrada na CGA até à data da entrada em vigor daquela 
 Lei, por violação conjugada do disposto nos artigos 2.º e 266.º da CRP 
 
 (princípios da protecção da confiança e da segurança jurídica inerentes ao 
 princípio do Estado de Direito). 
 
             Nessa medida, a decisão da CGA objecto de apreciação na presente 
 acção administrativa, assentando os seus pressupostos nos citados normativos, 
 cuja aplicação este tribunal se recusa a fazê‑lo por os mesmos contrariarem a 
 CRP, padece de ilegalidade que a invalida, conclusão a que se chegou igualmente 
 na decisão judicial recorrida, sendo certo que no mais esta não se mostra 
 impugnada no presente recurso jurisdicional e como tal dela não cumpre cuidar 
 nesta sede.
 
             Improcede, por conseguinte, na totalidade o presente recurso 
 jurisdicional.”
 
  
 
                         1.3. No Tribunal Constitucional, a CGA apresentou 
 alegações, no termo das quais formulou as seguintes conclusões:
 
  
 
             “1.ª – O Decreto‑Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, previa um regime 
 especial e excepcional de aposentação antecipada face ao regime‑regra previsto 
 no artigo 37.º do Estatuto da Aposentação e constituía, antes de tudo o mais, 
 uma medida conjuntural «de descongestionamento da Administração Pública» 
 dependente de não haver «prejuízo para o serviço», e não o reconhecimento 
 incondicional de um direito dos funcionários à aposentação antecipada, sendo 
 expectável a sua alteração quando se modificassem as circunstâncias da adopção 
 da medida legislativa.
 
             2.ª – A tramitação administrativa triangular – bem conhecida do 
 legislador –, prevista no artigo 3.º do Decreto‑Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, 
 esteve na base da eleição do critério da data do envio do processo para a CGA a 
 que se refere o artigo 1.º, n.º 6, da Lei n.º 1/2004, de 15 de Janeiro, não 
 tendo sido propositadamente dada qualquer relevância à data em que o subscritor 
 efectuou o pedido junto do serviço.
 
             3.ª – Tal critério é claro e objectivo, não violando qualquer 
 princípio ou norma constitucional.
 
             4.ª – Acresce que a revogação do Decreto‑Lei n.º 116/85, de 19 de 
 Abril, não atingiu o conteúdo essencial do direito à aposentação dos 
 subscritores da CGA, seja nos termos gerais (artigo 37.º, n.ºs 1 e 2, do 
 Estatuto da Aposentação – EA), seja na nova modalidade de aposentação 
 antecipada (prevista no artigo 37.º‑A do EA) e, como tal, não implica «uma 
 alteração inadmissível, intolerável, arbitrária, demasiado onerosa e 
 inconsistente».
 
             5.ª – A publicação tardia do Acórdão n.º 360/2003 do Tribunal 
 Constitucional, que considerou a revogação do Decreto‑Lei n.º 116/85, de 19 de 
 Abril, pelo artigo 9.º da Lei n.º 32‑B/2002, de 30 de Dezembro, 
 inconstitucional por razões de mera forma, bem como o excessivo formalismo 
 exigido, via interpretativa, para a aprovação dos diplomas legais, implicou o 
 atraso no procedimento legislativo tendente à publicação da Lei n.º 1/2004 – que 
 culminou na sua retroactividade «quinzenal» –, mas igualmente permitiu o 
 perfeito (re)conhecimento daquele diploma antes da sua publicação final (pois as 
 normas constantes desta Lei são exactamente as mesmas que foram declaradas 
 inconstitucionais no âmbito da Lei n.º 32‑B/2002, de 30 de Dezembro), quer pelos 
 Sindicatos, que as contestaram viva e publicamente, quer pelos subscritores da 
 CGA, para além do eco que as reformas introduzidas no regime jurídico de 
 aposentação tiveram nos media, bem como as vicissitudes a ela ligadas.
 
             6.ª – A revogação do Decreto‑Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, era uma 
 alteração com a qual os cidadãos e a comunidade já há muito podiam contar, 
 expectantes que estavam, razoável e fundadamente, na alteração do ordenamento 
 jurídico que regia a constituição daquelas relações jurídicas de aposentação, 
 já que, como se demonstrou, era público e notório que estava em marcha o 
 processo legislativo tendente à aprovação de tal medida, nos mesmos moldes que 
 já haviam sido adoptados um ano antes pela Lei n.º 32‑B/2002, de 30 de Dezembro, 
 o mais rapidamente possível, para entrar em vigor em 1 de Janeiro de 2004, como, 
 aliás, é norma neste tipo de diplomas.
 
             7.ª – O atraso na publicação, que criou a situação de 
 retroactividade ou de retrospectividade em meros 15 dias, e cuja aprovação, 
 sublinha‑se, foi amplamente noticiada na comunicação social e vivamente 
 contestada pelos Sindicatos, não invalida de modo algum os seus efeitos, já que 
 a sua vigência não depende do seu conhecimento efectivo, embora a sua eficácia 
 dependa da sua publicação.
 
             8.ª – Em conclusão, os artigos 1.º, n.º 6, e 2.º da Lei n.º 1/2004, 
 de 15 de Janeiro, por conterem normas de efeitos retroactivos, não são 
 inconstitucionais, já que não atingem, de forma inadmissível, intolerável, 
 arbitrária, demasiado onerosa e inconsistente, as legítimas expectativas 
 daqueles que podiam requerer a pensão de aposentação, de características 
 excepcionais, prevista no regime instituído pelo Decreto‑Lei n.º 116/85, de 14 
 de Abril.”
 
  
 
                         1.4. Por seu turno, as alegações apresentadas pelo 
 Ministério Público culminam com a formulação das seguintes conclusões:
 
  
 
             “1.º – Face ao entendimento reiterado da jurisprudência 
 constitucional, o princípio da confiança não legitima qualquer expectativa 
 fundada na imutabilidade ou fixidez dos regimes que consubstanciam o «direito à 
 segurança social», não atingindo tal princípio constitucional a norma que 
 determina ser no momento da aposentação voluntária que se fixa, com base na lei 
 então em vigor, o respectivo regime jurídico.
 
             2.º – A retroactividade verificada a propósito da edição da Lei n.º 
 
 1/2004, de 15 de Janeiro – expressa na atribuição de efeitos aos regimes nela 
 contidos a partir de 1 de Janeiro desse ano, incluindo a revogação do regime 
 conjuntural de descongestionamento da Administração Pública, contido no Decreto 
 Lei n.º 116/85 – não afecta, em termos intoleráveis, o princípio da confiança.
 
             3.º – Na verdade, não pode invocar‑se uma expectativa fundada e 
 legítima do requerente na manutenção de tal regime – sempre dependente de uma 
 avaliação discricionária dos serviços sobre a inexistência de «prejuízo para o 
 serviço», decorrente da reforma antecipada pretendida – susceptível de excluir a 
 relevância e eficácia de quaisquer alterações legislativas, verificadas antes de 
 o processo em causa ser remetido e decidido pela Caixa Geral de Aposentações.
 
             4.º – Termos em que deverá proceder o presente recurso, em 
 conformidade com o juízo de não inconstitucionalidade da interpretação 
 normativa dos artigos 1.º, n.º 6, e 2.º da Lei n.º 1/2004, de 15 de Janeiro, 
 recusada pelo tribunal a quo e objecto do presente recurso.”
 
  
 
                         1.5. O Sindicato recorrido contra‑alegou, concluindo:
 
  
 
             “A) – 1. Investido da legitimidade decorrente de ter levantado a 
 questão na petição inicial (artigo 20.º) e alegações por escrito (artigo 10.º) 
 na acção administrativa especial, nas contra-alegações (conclusões d) a j)) e 
 resposta nos termos do artigo 146.º, n.º 2, do CPTA e por ter sido parte 
 vencedora no mui douto acórdão do TCAN por força da inconstitucionalidade à qual 
 também adere, o recorrido imputa às mesmas normas outra inconstitucionalidade a 
 acrescer à verificada no acórdão recorrido.
 
             2. Refere o artigo 2.º da Lei n.º 1/2004, de 15 de Janeiro: «...A 
 presente lei entra em vigor no dia 1 de Janeiro de 2004...», coisa diferente de 
 estatuir «A presente lei produz efeitos desde 1 de Janeiro de 2004».
 
             3. Não há nenhuma disposição neste diploma concernente à produção de 
 efeitos da norma reportando‑os a momento anterior ou posterior a esta data.
 
             4. Podendo‑se, assim, inferir que o início da produção de efeitos 
 dos normativos do diploma será concomitante à entrada em vigor, incluindo‑se 
 naqueles, naturalmente, os do n.º 6 do artigo 1.º.
 
             5. A Lei n.º 74/98 dispõe sobre a publicação, identificação e 
 formulário dos diplomas e no seu artigo 1.º, n.º 1, estabelece que: «...A 
 eficácia jurídica dos actos a que se refere a presente lei depende da 
 publicação...», estatuindo no artigo 2.º, n.º 1, que: «...Os actos legislativos 
 e outros actos de conteúdo genérico entram em vigor no dia neles fixado, não 
 podendo, em caso algum, o início da vigência verificar‑se no próprio dia da 
 publicação...».
 
             6. É uma lei que tem como destinatários os actos legislativos e que 
 por estes deve ser respeitada.
 
             7. O n.º 3 do artigo 112.º da Constituição da República Portuguesa 
 estatui que têm valor reforçado, além das leis orgânicas, as leis que careçam 
 de aprovação por maioria de 2/3, bem como aquelas que, por força da 
 Constituição, sejam pressuposto normativo necessário de outras leis ou que por 
 outras devam ser respeitadas.
 
             8. Por força do disposto nos artigos 2.º e 3.º, n.º 2, da 
 Constituição da República Portuguesa, a Lei n.º 1/2004 estava obrigada a 
 respeitar e cumprir os ditames da Lei n.º 74/98.
 
             9. Pela simples razão de que o povo não espera dos órgãos de 
 soberania que se vinculem a regras que posteriormente não cumpram.
 
             10. Consequentemente, os artigos 2.º e 1.º, n.º 6, da Lei n.º 1/2004 
 são também inconstitucionais por violação do n.º 3 do artigo 112.º da 
 Constituição da República Portuguesa.
 
             B) – 11. O recorrido faz suas as asserções do mui douto acórdão do 
 TCAN aqui em causa, designadamente o douto entendimento segundo o qual o próprio 
 artigo 43.º, n.º 1, do Estatuto da Aposentação pode violar o princípio da 
 confiança no sentido em que, na pendência do processo, podem ocorrer alterações 
 radicais e onerosas de regime que destruam sólidas e legítimas expectativas 
 existentes à data do pedido de aposentação.
 
             12. A partir da altura em que os subscritores abrangidos pelo âmbito 
 de aplicação do Decreto‑Lei n.º 116/85 atingiram os 36 anos, criavam uma forte 
 expectativa na sua aposentação segundo o diploma, expectativa essa reforçada a 
 partir do momento em que tinham conhecimento de não ser imprescindíveis ao 
 serviço. No caso, o certo é que o pedido e o despacho liberando o subscritor são 
 anteriores à publicação da lei.
 
             13. E não é o facto de a lei ter estado inserida no debate 
 político‑social recente sobre as dificuldades orçamentais da Segurança Social ou 
 de ter sido precedida do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 360/2003, de 8 
 de Julho, que proferiu decisão formal, que eximia o legislador de observar as 
 regras e os princípios da certeza e segurança jurídicas.
 
             14. Parenteticamente, quanto a este Acórdão do Tribunal 
 Constitucional, sem querer entrar em discussão sobre a importância das questões 
 formais pelo mesmo sopesadas, as quais salvaguardam importantes direitos, 
 designadamente, de participação, diga‑se que teve o efeito de encorajar muitos 
 subscritores com 36 anos a avançarem com pedidos de aposentação, uma vez que 
 viram subtraída à ordem jurídica uma lei que lhes impunha um regime bem mais 
 oneroso de aposentação antecipada.
 
             15. O que está, sim, em causa é o processo legislativo sujeito a 
 regras ditadas pela certeza e segurança jurídicas cuja violação acarreta a dos 
 princípios como os de boa fé e da protecção da confiança, de forma a evitar que 
 uma lei que ainda não veio juridicamente à luz do dia se repercuta na esfera de 
 direitos e interesses dos seus destinatários.
 
             16. Pouco relevando a maior ou menor informação política e social 
 destes quanto ao que poderá ser ou não ser consagrado em lei. O que releva é 
 que a Ordem Constitucional impõe a certeza e segurança jurídica.
 
             17. Os artigos 1.º, n.º 6, e 2.º da Lei n.º 1/2004, de 15 de 
 Janeiro, violam também os artigos 2.º e 266.º da CRP.
 
             C) – 18. Em suma, aos artigos 1.º, n.º 6, e 2.º da Lei n.º 2/2004, 
 de 15 de Janeiro, são imputáveis as inconstitucionalidades decorrentes da 
 violação dos artigos 2.º, 112.º, n.º 3, e 266.º da CRP.”
 
  
 
                         Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
                         2. Fundamentação
 
                         2.1. Questão idêntica à ora em apreço foi recentemente 
 decidida por este Tribunal, no Acórdão n.º 615/2007, que julgou 
 
 “inconstitucionais o n.º 6 do artigo 1.º e o artigo 2.º da Lei n.º 1/2004, 
 quando interpretados no sentido de que o regime de aposentação fixado pelo 
 Decreto‑Lei n.º 116/85 não é aplicável aos contribuintes que hajam reunido os 
 pressupostos para a sua aplicação antes de 31 de Dezembro de 2003, ainda que os 
 respectivos pedidos tenham sido enviados à Caixa Geral de Aposentações até à 
 data de publicação da Lei n.º 1/2004, ou seja, até 15 de Janeiro de 2004, dado 
 que depende da álea administrativa que é o grau de celeridade com que os 
 serviços de que dependem os subscritores enviem o processo de aposentação à 
 Caixa Geral de Aposentações, por violação dos princípios do Estado de Direito 
 Democrático (artigo 2.º da CRP) e da igualdade (artigo 13.º da CRP)”.
 
                         As considerações tecidas e a conclusão alcançada nesse 
 Acórdão n.º 615/2007 são inteiramente transponíveis para o presente caso, pois a 
 circunstância de, aqui, o requerimento do interessado ter sido apresentado em 
 
 14 de Novembro de 2003 (e no processo onde foi proferido aquele Acórdão o ter 
 sido em 11 de Novembro de 2003), é de todo irrelevante, pois sempre se 
 completaria antes de 31 de Dezembro de 2003 o prazo de 30 dias de que os 
 serviços dispunham para proceder à remessa do requerimento.
 
  
 
                         2.2. Entende‑se, no entanto, que a questão de 
 inconstitucionalidade suscitada pode e deve ser analisada na perspectiva da 
 violação do princípio da confiança.
 
                         Como no aludido Acórdão n.º 615/2007 se recordou, a 
 jurisprudência deste Tribunal tem entendido que – para além dos casos de 
 retroactividade explicitamente postergados pela Constituição quanto às leis 
 restritivas de direitos, liberdades e garantias, leis penais e leis criadoras de 
 impostos (artigos 18.º, n.º 3, 29.º, n.ºs 1, 3 e 4, e 103.º, n.º 3, da CRP) – a 
 afectação de legítimas expectativas dos cidadãos só se reputa violadora do 
 princípio da confiança, ínsito no princípio do Estado de direito democrático, 
 quando seja de reputar “inadmissível e arbitrária”, devendo a “ideia geral de 
 inadmissibilidade” ser aferida pelo recurso a dois critérios: (i) “afectação de 
 expectativas, em sentido desfavorável, será inadmissível quando constitua uma 
 mutação da ordem jurídica com que, razoavelmente, os destinatários das normas 
 dela constantes não possam contar”; e (ii) “quando não for ditada pela 
 necessidade de salvaguardar direitos ou interesses constitucionalmente 
 protegidos que devam considerar‑se prevalentes (deve recorrer‑se, aqui, ao 
 princípio da proporcionalidade, explicitamente consagrado, a propósito dos 
 direitos, liberdades e garantias, no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição desde 
 a 1.ª revisão” (formulações do Acórdão n.º 287/90, na esteira dos Acórdãos n.ºs 
 
 11/83, 17/84, 86/84 e 99/99, e que viriam a ser frequentemente retomadas em 
 decisões posteriores: cf. Acórdãos n.º 285/92 e 302/2006).
 
                         Estes apertados critérios foram estabelecidos para 
 situações em que os cidadãos detinham apenas meras expectativas legítimas, sendo 
 obviamente distinta a situação quando estejamos perante situações de direitos já 
 completamente formados e, ainda mais, de direitos já exercitados, como ocorre 
 no presente caso.
 
                         Na verdade, sendo evidente que o facto de um interessado 
 ter ingressado na função pública no domínio de um determinado regime legal, 
 designadamente em matéria de definição dos requisitos para a aposentação e das 
 regras de cálculo das respectivas pensões, não lhe outorga o direito a ver 
 inalterado esse regime durante todo o tempo, em regra várias décadas, que durar 
 a sua carreira até atingir o seu termo por aposentação, substancialmente 
 distinta é a situação – que é a ora em apreço – em que os requisitos legais para 
 a passagem à situação de aposentado se completaram no domínio da vigência de 
 determinado regime legal e são posteriormente alterados em termos de 
 determinarem o não reconhecimento desse direito.
 
                         A consagração legal do direito exercitado pelo 
 funcionário representado pelo Sindicato ora recorrido remonta à Lei n.º 2‑B/85, 
 de 28 de Fevereiro (Orçamento do Estado para 1985), cujo artigo 10.º, n.º 4, 
 dispôs: “Poderão aposentar‑se, com direito à pensão completa, independentemente 
 de apresentação a junta médica e desde que não haja prejuízo para o serviço, os 
 funcionários e agentes que, qualquer que seja a sua idade, reúnam 36 anos de 
 serviço”.
 
                         Em execução deste comando foi editado o Decreto‑Lei n.º 
 
 116/85, em cujo preâmbulo se lê:
 
  
 
             “A Lei do Orçamento do Estado para 1985 consagrou como medida de 
 descongestionamento da Administração Pública a possibilidade de aposentação 
 voluntária dos funcionários e agentes que possuam 36 anos de serviço, 
 independentemente da respectiva idade e de submissão a junta médica.
 
             Independentemente de outras medidas de descongestionamento 
 selectivo que a situação da Administração possa vir a justificar – na linha do 
 previsto nos artigos 33.º a 37.º do Decreto‑Lei n.º 41/84, de 3 de Fevereiro –, 
 entendeu‑se dever avançar desde já com aquela, não só por razões de 
 rejuvenescimento, mas também pelo facto de ir ao encontro de uma pretensão 
 desde há muito manifestada por numerosos funcionários e agentes públicos que, 
 possuindo 36 anos de serviço e tendo por isso direito à pensão completa, eram 
 obrigados a aguardar pelo completamento dos 60 anos de idade.”
 
  
 
                         O artigo 1.º, n.º 1, do diploma reconheceu aos 
 funcionários e agentes, “seja qual for a carreira ou categoria em que se 
 integrem”, o direito a aposentar‑se, “independentemente de apresentação a junta 
 médica e desde que não haja prejuízo para o serviço, qualquer que seja a sua 
 idade, quando reúnam 36 anos de serviço”. A tramitação do procedimento 
 iniciava‑se com requerimento do interessado, a apresentar no departamento onde 
 prestava serviço, acompanhado tão‑só dos documentos necessários para 
 comprovação do tempo de serviço (n.º 1 do artigo 3.º). Competia a esse 
 departamento, no prazo de 30 dias a contar da entrada do requerimento, prestar 
 informação quanto à inexistência de prejuízo para o serviço, a submeter a 
 despacho do membro do Governo competente, que, se fosse concordante, 
 determinava o envio do processo para a Caixa Geral de Aposentações (n.º 2 do 
 artigo 3.º), que no prazo de 30 dias após a entrada devia determinar a 
 desligação para aposentação e fixação da pensão provisória (n.º 3 do artigo 
 
 3.º), cessando as funções do interessado a partir do dia 1 do mês seguinte ao da 
 prolação do despacho da Caixa (n.º 5 do artigo 3.º), que devia fixar a pensão 
 definitiva no prazo máximo de 30 dias após a entrada de todos os documentos 
 necessários à instrução do processo (n.º 7 do artigo 3.º).
 
                         Contrariamente ao sustentado pela recorrente, não 
 resulta, nem do artigo 10.º, n.º 4, da Lei n.º 2‑B/85, nem do preâmbulo e do 
 articulado do Decreto‑Lei n.º 116/85, que o regime instituído fosse considerado 
 excepcional e transitório. Na sua consagração confluíram razões ligadas à 
 necessidade de descongestionamento e de rejuvenescimento da Administração, é 
 certo, mas também motivações de justiça material com reconhecido lastro 
 temporal: satisfazer “pretensão desde há muito manifestada por numerosos 
 funcionários e agentes públicos que, possuindo 36 anos de serviço e tendo por 
 isso direito à pensão completa, eram obrigados a aguardar pelo completamento dos 
 
 60 anos de idade”. De qualquer forma, mesmo que tivesse sido – e não foi – 
 inicialmente pensado para vigorar durante um período limitado de tempo, o certo 
 
 é que o regime em causa persistiu durante mais de 18 anos. Dele resultava que a 
 aquisição do direito à aposentação dependia de três elementos: (i) requerimento 
 do interessado; (ii) prova da prestação de 36 anos de serviço; e (iii) 
 inexistência de inconveniência para o serviço motivada pela aposentação. 
 Reunidos estes três elementos, a concessão da pensão de aposentação constituía 
 acto estritamente vinculado da Caixa Geral de Aposentações, à qual não era 
 reconhecido qualquer possibilidade de denegação da pretensão.
 
                         No presente caso, tratando‑se de funcionário da 
 administração local, a competência para emitir despacho de concordância com a 
 informação no sentido da inexistência de prejuízo para o serviço foi exercitada 
 pela Vereadora dos Recursos Humanos, que ratificou a informação prestada pelo 
 Comandante dos Bombeiros Municipais, encontrando‑se ambos os despachos exarados 
 em informação datada de 20 de Novembro de 2003 (fls. 11 destes autos).
 
                         Com a conjugação desses três requisitos subjectivou‑se 
 na titularidade do interessado o direito à aposentação, que ele exercitou em 
 plena vigência do regime legal que o consagrava. A retirada, por lei posterior, 
 desse direito não pode deixar de ser considerada violadora do princípio da 
 confiança, sendo substancialmente distinta da situação (essa, sim, não 
 necessariamente violadora de tal princípio) de a alteração do regime da 
 aposentação, com a eliminação da modalidade criada pelo Decreto‑Lei n.º 116/85, 
 ser aplicável aos funcionários que estavam ao serviço ao tempo da publicação e 
 entrada em vigor da Lei n.º 1/2004 mas que nessa data ainda não tinham reunido 
 os requisitos necessários para o exercício desse direito.
 
                         Este entendimento não é afectado pelo disposto no artigo 
 
 43.º, n.º 1, alínea a), do Estatuto da Aposentação, que determina que o regime 
 da aposentação se fixa com base na lei em vigor e na situação existente à data 
 em que se profira despacho a reconhecer o direito a aposentação voluntária que 
 não dependa de verificação de incapacidade. Desde logo, é sustentável que esta 
 norma tem em vista primacialmente o regime aplicável ao cálculo da pensão de 
 aposentação. Como anota António José Simões de Oliveira (Estatuto da Aposentação 
 Anotado e Comentado, Coimbra, 1973, p. 119), esta norma – tendo por pressuposto 
 a conveniência de “uma verificação administrativa do direito de requerer a 
 aposentação” – visou acautelar as situações em que entre a data do requerimento 
 e a da resolução do processo de aposentação decorra largo tempo, no decurso do 
 qual o funcionário, em princípio, se manteve ao serviço, com mais tempo 
 aproveitável para a aposentação e eventual superveniência de outras alterações 
 relevantes, designadamente ao nível remuneratório, sendo manifestamente injusto, 
 em tal quadro, calcular a pensão à data do requerimento [No sentido da 
 inconstitucionalidade da referida norma se interpretada no sentido de aplicar 
 alterações de regime desfavoráveis ao interessado surgidas após a data do 
 requerimento – questão que não está em causa no presente recurso – cf. José 
 Cândido de Pinho, Estatuto da Aposentação, Coimbra, 2003, p. 161].
 
                         Este Tribunal já teve oportunidade de salientar a 
 necessidade de distinguir o momento em que se subjectiva o direito a uma pensão 
 de reforma e o momento em que se subjectiva o direito ao montante da pensão (cf. 
 Acórdão n.º 330/93, último parágrafo do n.º 8), considerando que, embora o 
 direito do então recorrente a uma pensão extraordinária de aposentação se tenha 
 subjectivado na data do despacho que o considerou deficiente das Forças Armadas 
 
 (20 de Agosto de 1976), o certo é que, como ele optou por se manter no serviço 
 activo e só em 15 de Dezembro de 1983 veio requerer a transição para a situação 
 de reforma extraordinária, no cálculo que então se operou do montante da pensão 
 houve que ter em conta as alterações legislativas ocorridas entre 1976 e 1983.
 
                         No presente caso, porém, não está em causa o direito a 
 um determinado montante de pensão de aposentação, mas tão‑só o direito à 
 aposentação nos termos do Decreto‑Lei n.º 116/85, e este, pelas razões expostas, 
 entrou na titularidade do interessado quando se reuniram os três elementos de 
 que dependia (requerimento do interessado, 36 anos de serviço e inexistência de 
 prejuízo para o serviço) e foi por ele efectivamente exercitado na plena 
 vigência desse regime, sendo intolerável que posterior demora burocrática no 
 envio do processo para a Caixa Geral de Aposentações, demora a que o interessado 
 foi de todo alheio, tivesse como efeito a perda desse direito.
 
                         É que, neste domínio, o funcionário encontra‑se numa 
 situação de autonomia subjectiva face à Administração. Na verdade, não é mais 
 sustentável a concepção que reduzia o funcionário público a “elemento integrante 
 do aparelho administrativo, objecto de supremacia absoluta da Administração, 
 que define, com o legislador, autoritária e integralmente, o seu estatuto (de 
 sujeição) especial” – o chamado sistema de inclusão (António Lorena de Sèves, 
 
 “Os concursos na função pública”, em Seminário Permanente de Direito 
 Constitucional e Administrativo, vol. I, Braga, 1999, p. 49). Antes se 
 reconhece que, pelo menos em certos domínios, a posição do funcionário face à 
 Administração é, não de inclusão, mas de alteridade, que pressupõe a autonomia 
 jurídica do funcionário. Impõe‑se, assim, a distinção entre “relação orgânica” 
 
 (o funcionário como órgão do aparelho administrativo) e “relação de serviço ou 
 de emprego” (que, na concepção clássica de funcionário, era absorvida pela 
 primeira), reconhecendo a esta, tal como às comuns relações de trabalho, uma 
 tutela jurídica específica, quer na contraprestação que constitui a remuneração, 
 
 “quer com todas as outras situações que se repercutem em termos económicos na 
 esfera do agente (v. g., qualificação profissional, carreira, férias, duração 
 do trabalho, segurança social, etc.)” (Francisco Liberal Fernandes, Autonomia 
 Colectiva dos Trabalhadores da Administração. Crise do Modelo Clássico de 
 Emprego Público, Coimbra, 1995, pp. 107‑108).
 
                         A revisão constitucional de 1982, ao mudar a expressão 
 
 “funcionários e agentes do Estado e das demais entidades públicas”, constante 
 do primitivo artigo 270.º, n.º 1, para “trabalhadores da Administração Pública e 
 demais agentes do Estado e outras entidades públicas”, do novo artigo 269.º, 
 tornou claro que nenhum argumento justifica “não considerar os funcionários 
 públicos como trabalhadores, para efeitos de titularidade dos correspondentes 
 direitos, liberdades e garantias constitucionais” (J. J. Gomes Canotilho e Vital 
 Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição, Coimbra, 
 
 1993, p. 945).
 
                         Ao direito ora em causa, situado na confluência do 
 direito da função pública e do direito de segurança social, é, nesta última 
 perspectiva, aplicável, entre outros princípios gerais, o da “conservação dos 
 direitos adquiridos e em formação” (artigo 6.º da Lei de Bases da Segurança 
 Social – Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro) ou da “tutela dos direitos 
 adquiridos e em formação” (artigo 5.º da Lei de Bases do Sistema de Segurança 
 Social – Lei n.º 4/2007, de 16 de Janeiro), que “visa assegurar o respeito por 
 esses direitos” (artigos 21.º da Lei de 2002 e 20.º da Lei de 2007), 
 considerando‑se direitos adquiridos, “os que já se encontram reconhecidos ou 
 possam sê‑lo por se encontrarem cumpridas as respectivas condições legais” 
 
 (artigo 44.º, n.º 2, alínea a), da Lei de 2002) ou “os que já se encontram 
 reconhecidos ou possam sê‑lo por se encontrarem reunidos todos os requisitos 
 legais necessários ao seu reconhecimento” (artigo 66.º, n.º 2, alínea a), da Lei 
 de 2007).
 
                         No presente caso, estando reunidos, antes da publicação 
 da Lei n.º 1/2004, todos os requisitos legais para o reconhecimento, através de 
 acto estritamente vinculado, do direito do interessado à aposentação nos termos 
 do Decreto‑Lei n.º 116/85 – e tendo esse direito sido efectivamente exercitado 
 em plena vigência deste diploma –, do que se tratava, com o critério normativo 
 que o acórdão recorrido recusou aplicar com fundamento em inconstitucionalidade, 
 era, em rigor, da destruição retroactiva de um “direito adquirido”, que, 
 manifestamente, não pode deixar de ser reputada violadora do princípio da 
 confiança [Paulo Veiga e Moura (A Privatização da Função Pública, Coimbra, 2004, 
 pp. 223‑225) sustenta mesmo a inconstitucionalidade do novo regime quando 
 aplicado a funcionários que, tendo reunido em 31 de Dezembro de 2003 as 
 condições para a aposentação, só a vieram a requerer já após a publicação da Lei 
 n.º 1/2004, questão de que não cumpre tratar no âmbito do presente recurso].
 
  
 
                         3. Decisão
 
                         Em face do exposto, acordam em:
 
                         a) Julgar inconstitucionais, por violação do princípio 
 da protecção da confiança, ínsito no princípio do Estado de direito, e do 
 princípio da igualdade, consagrados nos artigos 2.º e 13.º da Constituição da 
 República Portuguesa, as normas constantes dos artigos 1.º, n.º 6, e 2.º da Lei 
 n.º 1/2004, de 15 de Janeiro, quando interpretados no sentido de que aos 
 subscritores da Caixa Geral de Aposentações que, antes de 31 de Dezembro de 
 
 2003, hajam reunido os pressupostos para a aplicação do regime fixado pelo 
 Decreto‑Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, e hajam requerido essa aplicação, deixa 
 de ser reconhecido o direito a esse regime de aposentação pela circunstância de 
 o respectivo processo ter sido enviado à Caixa, pelo serviço onde o interessado 
 exercia funções, após a data da entrada em vigor da Lei n.º 1/2004; e, em 
 consequência,
 
                         b) Confirmar a decisão recorrida, na parte impugnada.
 
                         Sem custas.
 Lisboa, 4 de Março de 2008.
 Mário José de Araújo Torres 
 Benjamim Silva Rodrigues
 João Cura Mariano
 Joaquim de Sousa Ribeiro
 Rui Manuel Moura Ramos