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Processo nº 560/06
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria João Antunes
 
  
 
  
 
  
 Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
  
 I. Relatório
 
 1. Nos presentes autos de recurso, vindos do Tribunal da Comarca de Viana do 
 Castelo, em que é recorrente o Ministério Público e recorrido A., foi interposto 
 recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70º, nº 
 
 1, alínea a), da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal 
 Constitucional (LTC), do despacho daquele Tribunal de 29 de Maio de 2006.
 
 É o seguinte, para o que agora releva, o teor da decisão recorrida:
 
  
 
 «II - Fundamentação
 Factos Provados:
 
 1 - O arguido A. no dia 10/04/2005 pelas 17H25m, no local EN 13, Km 76.5, 
 Carreço, Viana do Castelo, conduzia o veículo ligeiro de passageiros, com 
 matrícula 00-00-00, pisou e transpôs a linha longitudinal continua, marca Ml, 
 separadora de sentidos de trânsito.
 
 2 - O arguido procedeu ao pagamento voluntário da coima.
 
 3 - Por decisão de 26 de Abril de 2005, foi aplicada ao arguido a sanção 
 acessória, especialmente atenuada, de 30 dias de inibição de conduzir pela 
 prática de uma contra-ordenação p. e p. pelos arts. 60, n.º 1, e 65, al. a), do 
 Regulamento de Sinalização do Transito e arts. 146, al. o), 139, 137, 140 e 141 
 do CEstrada.
 
 4 - O recorrente não tem averbado no seu registo de condutor a prática de 
 qualquer infracção ao C.E..
 
 5 - O recorrente necessita da carta de condução para o exercício da sua 
 profissão (…).
 III - O Direito
 Com a presente impugnação judicial pretende a [o] arguida [arguido] pôr em causa 
 a decisão da Direcção Geral de Viação (Delegação Distrital de Viação de Viana do 
 Castelo), constante de fls. 14 a 16.
 Atenta a matéria de facto provada e não provada, resulta fora de dúvida a 
 correcta subsunção jurídica efectuada na decisão posta em crise.
 Importa, assim, apreciar da justeza da sanção imposta.
 O que referir quanto à sanção acessória de inibição de conduzir estabelece o 
 art. 138, n.º 1, do Código da Estrada, na redacção anterior à entrada em vigor 
 do DL n.º 44/2005, de 23 de Fevereiro, aplicável ao caso:
 
 “As contra-ordenações graves e muito graves são sancionadas com coima e com 
 sanção acessória”.
 Verificada, pois, a prática da infracção, a aplicação da sanção acessória é 
 consequência que se impõe, apenas podendo haver lugar à sua atenuação especial 
 ou suspensa na sua execução.
 A atenuação especial da sanção acessória mostra-se regulada pelo art. 140 do 
 C.E. e quanto a esta importa referir que se afigura, em abstracto, susceptível 
 de aplicação ao presente caso considerando os seus pressupostos legais e a 
 factualidade provada. Esta só é susceptível de ser aplicada para as 
 contra-ordenações muito graves.
 Tal suspensão está sujeita à verificação dos pressupostos de que a lei penal 
 geral faz depender a suspensão da execução da pena (art. 141, n.º 1, do Código 
 da Estrada) e desde que se encontre paga a coima, sendo que a mesma só é 
 susceptível de ser aplicada às contra-ordenações graves.
 Tais pressupostos assentam na conclusão de que, atendendo à personalidade do 
 agente, às suas condições de vida, à sua conduta anterior e posterior aos factos 
 e às circunstâncias destes, a simples censura do facto e a ameaça da execução 
 realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. art. 50, 
 n.º 1, do Código Penal).
 Ora, no caso, verifica-se que o arguido praticou, efectivamente, a infracção 
 pela qual foi autuado e que a mesma é classificada como contra-ordenação muito 
 grave.
 Por outro lado, o recorrente não praticou, nos últimos cinco anos, qualquer 
 contra-ordenação grave ou muito grave ou facto sancionado com proibição ou 
 inibição de conduzir e a coima mostra-se paga.
 Além disso, estamos perante uma típica infracção de perigo abstracto em que o 
 bem jurídico tutelado é a segurança rodoviária em geral e não a de cada condutor 
 em particular, não se exige, para a sua verificação, a prova de que se criou 
 algum perigo para os demais utentes da via, enquanto resultado 
 espacio-temporalmente cindido da conduta. Nem sequer se exigirá a prova da 
 perigosidade objectiva da conduta em si mesma considerada, caso em que 
 estaríamos já perante uma infracção de perigo abstracto-concreto.
 Na verdade, relativamente à infracção sob exame, o perigo para a circulação 
 rodoviária funciona apenas como fundamento pré-legal da sua previsão, não 
 integrando qualquer elemento da sua tipicidade objectiva.
 O arguido requer que lhe seja aplicada a suspensão da execução da sanção 
 acessória, apesar de ter praticado uma contra-ordenação muito grave.
 Considerando que se mostram reunidos os pressupostos que à luz da lei anterior 
 levariam este tribunal a aplicar a suspensão da execução da sanção acessória, 
 designadamente por o arguido não ter antecedentes estradais, importa analisar a 
 constitucionalidade da nova redacção dada ao artigo 141, n.º 1, do CE.
 A norma em causa foi aditada ao regime inicial do DL 114/94, de 3-5, pelo DL 
 
 44/05, de 23-02.
 Assim sendo, e tendo em conta o tipo de diploma legal – Decreto-Lei – 
 verifica-se que a sua proveniência orgânica é o Governo.
 Nos termos do art. 165, n.º 1 c) da CRP vigente - Reserva relativa de 
 competência legislativa - 1- É da exclusiva competência da Assembleia da 
 República legislar sobre as seguintes matérias, salvo autorização ao Governo: 
 
 (...)d) Regime geral de punição das infracções disciplinares, bem como dos actos 
 ilícitos de mera ordenação social e do respectivo processo; (...) 2- As leis de 
 autorização legislativa devem definir o objecto, o sentido, a extensão e a 
 duração da autorização, a qual pode ser prorrogada. 3- As autorizações 
 legislativas não podem ser utilizadas mais de uma vez, sem prejuízo da sua 
 execução parcelada. 4- As autorizações caducam com a demissão do Governo a que 
 tiverem sido concedidas, com o termo da legislatura ou com a dissolução da 
 Assembleia da República. 5- As autorizações concedidas ao Governo na lei do 
 Orçamento observam o disposto no presente artigo e, quando incidam sobre matéria 
 fiscal, só caducam no termo do ano económico a que respeitam.
 Tal significa que o Governo, para poder legislar sobre tais matérias, porque da 
 reserva relativa da AR, tem que se ver munido da respectiva autorização 
 legislativa e observar a mesma nos seus estritos preceitos e limitações, tais 
 quais aquelas que genericamente o próprio corpo do artigo da CRP fixa.
 Com inobservância dessas regras cai-se no âmbito da inconstitucionalidade 
 orgânica.
 O DL 44/05, de 23-02, surgiu por via da LAL [LEI] 53/04, de 4.11.
 Essa LAL [LEI] permitia ao Governo criar o corpo do art. 141? 
 A resposta é negativa.
 De facto da referida LAL [LEI] não consta qualquer referência que permita 
 sustentar a actuação do Governo a afastar a aplicação da suspensão da sanção 
 acessória de inibição de conduzir às contra-ordenações muito graves. Daquela 
 resulta, na parte que interessa ao caso em análise, que:
 
 “m) A previsão de atenuação especial e de suspensão da execução da sanção 
 acessória de inibição de conduzir condicionadas ao prévio pagamento da coima e 
 ao facto de o infractor não ter praticado outras infracções no período fixado;
 n) A consagração do princípio de que a suspensão da execução da sanção acessória 
 possa ser condicionada, além da prestação de caução de boa conduta, à frequência 
 de acções de formação ou ao cumprimento de deveres específicos previstos em 
 legislação própria;”
 Verifica-se, deste modo uma violação do objecto.
 Padecerá, assim a referida norma de inconstitucionalidade orgânica.
 Nos termos do art. 204 da CRP vigente - Apreciação da inconstitucionalidade - 
 Nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que 
 infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados.
 Face à constatada violação da CRP, por inconstitucionalidade orgânica, de que 
 padece a norma do art. 141 do DL 114/94, de 3-5, pelo DL 44/05, de 23-02, está o 
 tribunal impedido de a aplicar na parte que exclui a sua aplicação às 
 contra-ordenações muito graves.
 A determinação da medida e do regime de execução da sanção faz-se em função da 
 gravidade da contra-ordenação e da culpa, tendo ainda em conta os antecedentes 
 do infractor relativamente ao diploma legal infringido ou aos seus regulamentos.
 Quanto à fixação do montante da coima, seu pagamento em prestações e fixação da 
 caução de boa conduta, além das circunstâncias acima referidas deve ainda ser 
 tida em conta a situação económica do infractor, quando for conhecida.
 Finalmente, e quando a contra-ordenação for praticada no exercício da condução, 
 além dos critérios já referidos, deve atender-se, como circunstância agravante, 
 aos especiais deveres de cuidado que recaem sobre o condutor, designadamente 
 quando este conduza veículos de socorro ou de serviço urgente, de transporte 
 colectivo de crianças, táxis, pesados de passageiros ou de mercadorias, ou de 
 transporte de mercadorias perigosas (art. 139 do Código da Estrada).
 
 *
 IV - Decisão
 Nestes termos e por tudo o exposto, julga-se procedente o recurso e, em 
 consequência:
 
 - condenamos o arguido A. na sanção acessória de inibição de conduzir pelo 
 período de 30 dias, suspensa pelo período de um ano».
 
  
 
 2. O recorrente e o recorrido foram notificados para produzir alegações. Alegou 
 apenas o Ministério Público, concluindo que:
 
  
 
 «1 – Por não se reportar a matéria atinente ao regime geral de punição dos actos 
 ilícitos de mera ordenação social, a que alude o artigo 165°, n° 1, alínea c) da 
 Constituição, a norma do artigo 141° do Código da Estrada, na redacção do 
 Decreto-Lei nº 44/05, de 23 de Fevereiro, ao não prever a suspensão da execução 
 de sanção acessória de inibição de conduzir nas contra-ordenações muito graves, 
 não é organicamente inconstitucional.
 
 2 – Termos em que deverá proceder o presente recurso».
 
  
 Dispensados os vistos, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II. Fundamentação
 
 1. O despacho recorrido recusou a aplicação do artigo 141º, nº 1, do Código da 
 Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei nº 114/94, de 3 de Maio, na redacção do 
 Decreto-Lei nº 44/2005, de 23 de Fevereiro, interpretado no sentido de a 
 suspensão da execução da sanção acessória não ser aplicável às contra-ordenações 
 muito graves, por violação da alínea d) do nº 1 do artigo 165º da Constituição 
 da República Portuguesa. Segundo este despacho, a norma padece de vício de 
 inconstitucionalidade orgânica, já que da Lei nº 53/2004, de 4 de Novembro, ao 
 abrigo da qual foi editado o Decreto-Lei nº 44/2005, “não consta qualquer 
 referência que permita sustentar a actuação do Governo a afastar a aplicação da 
 suspensão da sanção acessória de inibição de conduzir às contra-ordenações muito 
 graves”, nomeadamente tendo em conta o disposto nas alíneas m) e n) do artigo 3º
 
  
 
 2. O artigo 141º, nº 1, do Código da Estrada – Suspensão da execução da sanção 
 acessória –, na redacção do Decreto-Lei nº 44/2005, tem a seguinte redacção:
 
  
 
 «Pode ser suspensa a execução da sanção acessória aplicada a contra-ordenações 
 graves no caso de se verificarem os pressupostos de que a lei penal geral faz 
 depender a suspensão da execução das penas, desde que se encontre paga a coima, 
 nas condições previstas nos números seguintes».
 
  
 Por seu turno, das alíneas m) e n) do artigo 3º da Lei nº 53/2004 decorre que a 
 autorização para o Governo proceder à revisão do Código da Estrada contempla:
 
              
 
 «m) A previsão de atenuação especial e de suspensão da execução da sanção 
 acessória de inibição de conduzir condicionadas ao prévio pagamento da coima e 
 ao facto de o infractor não ter praticado outras infracções no período fixado;
 n) A consagração do princípio de que a suspensão da execução da sanção acessória 
 possa ser condicionada, além da prestação de caução de boa conduta, à frequência 
 de acções de formação ou ao cumprimento de deveres específicos previstos em 
 legislação própria».
 
  
 
 3. A questão que é objecto do presente recurso foi recentemente decidida nos 
 Acórdãos do Tribunal Constitucional nºs 603/2006, 604/2006 (Diário da República, 
 II Série, de 29 de Dezembro de 2006) e 629/2006. Do primeiro, extrai-se o 
 seguinte:
 
  
 
 “3.2. Em 1993 entendeu o legislador proceder a uma profunda revisão do Código da 
 Estrada, cuja primeira versão – na qual foram introduzidas inúmeras alterações – 
 datava de 20 de Maio de 1954.
 
                  Na sequência de um tal desiderato, emitiu o Parlamento uma 
 credencial legislativa ao Governo, o que se operou por via da Lei nº 63/93, de 
 
 21 de Agosto, a qual, no que para o caso interessa, dispôs, de entre o mais, que 
 o autorizando corpo de leis a aprovar pelo executivo contemplaria [cfr. artº 2º, 
 nº 2, alíneas j) e l)] a consagração da faculdade de suspensão da sanção 
 acessória de inibição de conduzir, entre seis meses e dois anos, verificando-se 
 os pressupostos de que a lei penal faz depender a suspensão da execução das 
 penas criminais e a consagração do princípio de que a suspensão da sanção 
 acessória de inibição de conduzir possa ser condicionada à prestação de caução 
 de boa conduta a fixar entre 20 000$ e 200 000$, tendo em conta a medida da 
 sanção e a situação económica do condutor.
 
                  Em 3 de Maio de 1994 surgiu a lume o Decreto-Lei nº 114/94, por 
 intermédio do qual foi aprovado o novo Código da Estrada.
 
                  Na versão originária desse Código surpreende-se, no nº 1 do 
 artº 145º, a consagração da possibilidade de suspensão da execução da sanção 
 acessória (de inibição de conduzir, aplicável às contra-ordenações graves e 
 muitos graves – cfr. artigos 141º e seguintes), verificando-se os pressupostos 
 de que a lei penal geral faz depender a suspensão da execução das penas.
 
                  Posteriormente, com a revisão do Código da Estrada aprovado 
 pelo Decreto-Lei nº 114/94, revisão essa decorrente do Decreto-Lei nº 2/98, de 3 
 de Janeiro, veio aquela possibilidade a ficar consagrada no nº 1 do artº 142º, 
 rezando assim este último preceito: 
 
  
 
                  1 – Pode ser suspensa a execução da sanção de inibição de 
 conduzir no caso de se verificarem os pressupostos de que a lei penal geral faz 
 depender a suspensão da execução das penas.
 
  
 
                  Tendo em conta que a prescrição que, na versão originária do 
 dito Código, constava do nº 1 do seu artº 141º, não sofreu alteração no texto 
 emergente da revisão levada a efeito pelo Decreto-Lei nº 2/98, haverá que 
 considerar que a mencionada possibilidade, conferida pelo preceito imediatamente 
 acima transcrito, tanto se reportava a contra-ordenações graves como a 
 contra-ordenações muito graves.
 
  
 
                  3.3. Compulsado o regime geral das contra-ordenações 
 
 (Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro), fácil é verificar que no mesmo não se 
 encontra expressamente consagrada a possibilidade de suspensão da execução das 
 sanções acessórias.
 
                  Na verdade, naquele regime geral (cfr. seu artº 32º) prevê-se, 
 como regime subsidiário, que, em tudo o que não for contrário à presente lei 
 aplicar-se-ão, subsidiariamente, no que respeita ao regime substantivo das 
 contra-ordenações, as normas do Código Penal.
 
                  Ora, o diploma substantivo criminal, como sabido é, no que à 
 suspensão da execução da pena concerne, apenas a prevê quando em causa estiver 
 uma pena de prisão aplicada em medida não superior a três anos (cfr. Secção II 
 do Capítulo I do Título II do Livro I e artº 50º, nº 1).
 
                  Daí que se possa dizer que, no domínio do regime geral das 
 contra-ordenações, não se preveja, ainda que subsidiariamente, a possibilidade 
 de suspensão da execução das penas acessórias.
 
                  Porventura por isso, se viu o legislador parlamentar na 
 contingência de, referentemente ao desenho de um específico regime 
 contra-ordenacional – o atinente às infracções estradais –, prever a 
 possibilidade (e no tocante a certo tipo dessas infracções) de suspensão da 
 execução da sanção acessória de inibição de conduzir.
 
  
 
                  3.4. Em 4 de Novembro de 2004 foi emitida a Lei nº 53/2004, 
 que, tendo autorizado o Governo a proceder à revisão do Código da Estrada 
 aprovado pelo Decreto-Lei nº 114/94 (com as sucessivas alterações decorrentes 
 dos Decretos-Leis números 2/98 e 265-A/2001, de 28 de Setembro, e pela Lei nº 
 
 20/2002, de 21 de Agosto) e a criar um regime especial de processo para a 
 contra-ordenações emergentes de infracções àquele Código, seus regulamentos e 
 legislação complementar, previu, como extensão específica dessa alteração, a 
 possibilidade de atenuação especial e de suspensão da execução da sanção 
 acessória de inibição de conduzir, nos termos da acima transcrita alínea m) do 
 artº 3º.
 
                  Quiçá não necessitando de prever essa especificidade – já que, 
 no que se refere à possibilidade de suspensão da execução daquela sanção 
 acessória, essa possibilidade estava já consagrada num regime especial estradal 
 
 (justamente o que veio a ficar consagrado no Código da Estrada aprovado pelo 
 Decreto-Lei nº 114/94) – o que é certo é que, uma vez mais, o legislador 
 parlamentar entendeu por bem fazê-lo.
 
                  E, se bem que o fizesse de um modo genérico, não restringindo 
 essa possibilidade a uma qualquer espécie de entre as infracções graves ou muito 
 graves, o que é certo é que da leitura da citada alínea m) do artº 3º não 
 resulta que o autorizando diploma tivesse, obrigatoriamente, ao definir as 
 concretas infracções e ao prescrever as respectivas sanções, nestas se incluindo 
 a previsão de aplicação da sanção acessória de inibição de conduzir, de prever 
 também que, em relação àquelas que incluísse na espécie de infracções muito 
 graves, uma tal possibilidade viesse a ficar consagrada.
 
                  Isso significa que, estabelecida que estava relativamente ao 
 específico regime especial das contra-ordenações estradais – quer pela Lei nº 
 
 6/93, quer pela Lei nº 53/2004 – um «desvio» relativamente ao regime geral das 
 contra-ordenações no que se prende com a consagração da possibilidade de 
 suspensão da execução da sanção acessória, podia o Governo definir, alterar, 
 eliminar ou modificar a punição e as condições de execução das infracções 
 contra-ordenacionais estradais. É que, de um lado, aquelas definição, 
 eliminação, modificação e estabelecimento de condições de execução, desde que 
 não ofensivas de um regime geral, cabem na competência legislativa concorrente 
 do Governo, como, sem discrepâncias, tem sido realçado por este Tribunal (cfr., 
 a título meramente exemplificativo, os Acórdão números 56/84, in Diário da 
 República, I Série, de 9 de Agosto de 1984, 74/95, idem, II Série, de 12 de 
 Junho de 1995, 69/90, publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 15º 
 volume, 253 a 265, 436/2000, no Diário da República, II Série, de 17 de Novembro 
 de 2000, 461/2000, idem, idem, de 29 de Novembro de 2000, e 236/2003, idem, 
 idem, de 24 de Junho de 2003).
 
                  De outro, mesmo admitindo que, ao se gizar um regime específico 
 que, no particular de que curamos (isto é, partindo do pressuposto de que o 
 regime geral que deflui do Decreto-Lei nº 433/82 não permite, por si ou por meio 
 da remissão que faz no seu artº 33º para as normas do Código Penal, a suspensão 
 da execução tão somente em relação às penas acessórias), impunha uma 
 
 «consagração, também especial», da possibilidade da suspensão da execução da 
 sanções acessórias, consagração essa que se incluiria na reserva relativa de 
 competência legislativa do Parlamento a que alude a alínea d) do nº 1 do artigo 
 
 165º da Constituição, o que é certo é que estava já criado esse particular 
 regime”.
 
  
 Reiterando este entendimento – e, muito especificamente, o de que o Governo tem 
 competência (concorrente com a Assembleia da República) para definir, alterar e 
 eliminar contra-ordenações, bem como para modificar a sua punição –, é de 
 afirmar que, através do Decreto-Lei nº 44/2005, o Governo se limitou a modificar 
 a punição de determinado tipo de infracções (contra-ordenações muito graves). Ou 
 seja, o Governo não legislou sobre matéria que se inclua na reserva relativa de 
 competência da Assembleia da República (artigo 165º, nº 1, alínea d), da 
 Constituição), o que exclui a verificação do vício de inconstitucionalidade 
 orgânica assinalado no despacho do Tribunal da Comarca de Viana de Castelo. 
 Chegando-se a esta mesma conclusão ainda que se integre esta suspensão da 
 execução da sanção acessória nas condições de execução das infracções 
 contra-ordenacionais estradais.
 
  
 III. Decisão
 Pelo exposto, decide-se conceder provimento ao recurso, determinando a reforma 
 da decisão recorrida em conformidade com o decidido quanto à questão de 
 inconstitucionalidade.
 Sem custas.
 Lisboa,  9 de Janeiro de 2007
 Maria João Antunes
 Maria Helena Brito
 Rui Manuel Moura Ramos
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Artur Maurício