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Processo nº 477/2006.
 
 3ª Secção.
 Relator: Conselheiro Bravo Serra.
 
  
 
  
 
                      1. Em 5 de Junho de 2006 o relator proferiu os seguintes 
 despacho e decisão: –
 
                      “A pretensão constante do requerimento formulado pelos 
 arguidos e dirigido à ‘Merit[í]ssima Juíza Desembargadora do Tribunal da Relação 
 de Lisboa”’ enviado a coberto do expediente remetido por aquele Tribunal por via 
 do ofício nº 578, é indeferida, pois que o solicitado não só não pode ter 
 qualquer repercussão na impugnação que se deseja ser levada a efeito pelo 
 Tribunal Constitucional – sendo certo que a este órgão de administração de 
 justiça não compete entrar em linha de conta com matéria de facto não apreciada 
 pelos tribunais das ordens judiciais de onde emergem recursos de fiscalização 
 concreta da constitucionalidade –, como ainda é destituído de qualquer cabimento 
 e de suporte legal o pedido de suspensão do processo até que viesse a ser junta 
 aos autos certidão emanada ‘do serviço de finanças respectivo’ ‘comprovativa da 
 dívida da A., Ldª”, e se “já foi total ou parcialmente paga, com os bens da 
 falida’.
 
  
 
 ***
 
                      “1. Não se conformando com a sentença lavrada em 23 de 
 Junho de 2004 pela Juíza do 2º Juízo Criminal do Tribunal de comarca do Seixal – 
 sentença essa por intermédio da qual, pela prática de factos que foram 
 subsumidos ao cometimento, pelos arguidos B. e C., de um crime, na forma 
 continuada, de abuso de confiança, previsto e punível pelos números 1, 2 e 5 do 
 artº 105º do Regime Geral das Infracções Tributárias aprovado pela Lei nº 
 
 15/2001, de 5 de Junho, os condenou em dezoito meses de prisão, cuja execução 
 ficou suspensa pelo período de dois anos, sujeita à condição de, em tal prazo, 
 os condenados pagarem ao Estado, a quem deviam ter entregue, € 96.380,64 devidos 
 a título de imposto sobre o Valor Acrescentado, de Imposto sobre o Rendimento 
 das Pessoas Singulares que retiveram e de Imposto de Selo – recorrerem aqueles 
 arguidos para o Tribunal da Relação de Lisboa.
 
  
 
                      Na motivação adrede apresentada, formularam as seguintes 
 
 «conclusões»: –
 
  
 
                                                               ‘a) – O ACÓRDÃO Nº 
 
 1/98, de 29 de Julho, NUNCA INVOCADO, nestes autos, estabelece que os processos 
 relativos a crimes praticados antes de 1.10.1995 (data em que entrou em vigo o 
 Novo Código Penal, que estabelece novas regras) só não prescrevem se entretanto 
 os respectivos arguidos tiverem sido ouvidos por um juiz ou notificados de uma 
 decisão por um juiz, tal como estava previsto no Código Penal de 1982. Ora, 
 b) – A falta de entrega da declaração de IVA, relativa a Dezembro de 1994 e cuja 
 quantia deveria ter sido paga em 15 de Janeiro de 1995, é um ACTO ISOLADO, 
 praticado antes de 1. 10.1995, como f[a]cilmente se alcança. Da mesma forma, 
 c) – Também os crimes relativos à retenção e não entrega de IRS de 1994 (Outubro 
 a Dezembro, de 12.039,79 euros (antes 2.413.762$00) e imposto de selo de 1994 
 
 (Outubro a Dezembro) de 1.067,64 euros (214.043$00) estão também abrangidos peto 
 citado ACÓRDÃO. E, 
 d) – Os crimes peta retenção e não entrega, do IRS de 1995 (parte) – Janeiro até 
 
 1. 10.1995, de 2.037,72 euros (16.050,32 euros: 12x9= 12.037,77) e imposto de 
 selo (parte) de Janeiro de 1.10.95 de 693,45 euros (924,05: 12x9 = 693,45 euros) 
 estão também abrangidos peto citado ACÓRDÃO. Assim, 
 e) - Estão extintos, nos termos do citado ACÓRDÃO 1/98 de 29 de Julho, os 
 procedimentos criminais contra os arguidos por prescrição relativamente aos 
 crimes referidos nas alíneas b); c) e d), destas conclusões.
 f) – Depois de quase dez anos ligados aos factos que constam da dota acusação, 
 da instrução contraditória e da audiência de julgamento, a decisão condenatória 
 
 é injusta a todos os títulos, pois tudo o que já passaram já foi pena bastante. 
 g) – A matéria de facto dada como provada, e na parte desfavorável aos arguidos, 
 tem, no entender da merit[í]ssima juíza ‘a quo’ (Folhas 9 e 10 da douta 
 sentença) a sua fundamentação na INFORMAÇÃO de folhas 10 dos autos, e documento 
 anexo Folhas 33 do mesmo documento, no documento de Folhas 261,ou seja a NOTA DE 
 VISITA, como se alcança da douta sentença. 
 h) – Embora corroborados pela única testemunha da douta acusação tais documentos 
 não podem ser usados para o que quer que seja, por não serem autênticos, mas sim 
 documentos internos impugnados na contestação, no recurso retido e nas 
 alegações, e que não fundamentam qualquer causa de pedir. Por outro lado, 
 i) – Salvo melhor e douto suprimento, a mert[í]ssima juíza ‘a quo’ condenou os 
 arguidos por que ‘são prementes as exigências de prevenção geral, considerando o 
 número de crimes desta natureza praticados no nosso País e reflectidas que estão 
 no próprio endurecimento progressivo das medidas primitivas dos crimes de índole 
 fiscal (Folhas 14, linhas 17 e seguintes da douta sentença recorrida. 
 j) – A merit[í]ssima juíza ‘a quo’ violou a lei do Bom Senso (se é que ele 
 existe nesta sociedade de novas tecnologias) e o princípio ‘IN DUBIO PRO REO’. 
 l) – A  merit[í]ssima juíza ‘a quo’, ao decidir como decidiu, na forma descrita 
 nas alíneas g), h) e i), cometeu ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA. Por isso, 
 m) – Os arguidos, na parte não abrangida pelo Acórdão nº 1/98 ou se assim não 
 f[o]r entendido, devem ser totalmente absolvidos por falta de prova. 
 n) – A falta de entrega da Declaração do IVA e das retenções e não entrega do 
 IRS e do Imposto de Selo, estas apesar de já haver trabalhadores ao serviço, 
 após a posse administrativa e a declaração de falência da A. Ldª que tinha um 
 director financeir[o], um técnico de contas e pessoal administrativo não é da 
 responsabilidade dos arguidos que, aliás, não têm qualquer antecedente de fuga 
 aos impostos. 
 o) – Os arguidos não agiram com dolo e nos termos dos artigos 13º, 14º, 15º do 
 Código Penal e artigo 8º do D.L. nº 433/82 de 27 de Outubro, aplicável por força 
 do artigo 3º da Lei nº 15/2001, de 5 de Junho só são puníveis os factos 
 praticados por dolo e este não está fundamentado nos autos para condenar 
 aqueles.
 p) – O artigo 24º do Regime Jurídico das Infracções Fiscais Não Aduaneiras em 
 vigor ao tempo da prática dos factos, substituído pelo artigo 105º, da Lei 
 
 15/2001 de 5 de Junho, É INCONSTITUCIONAL por vi[o]lar o artigo 27, nº 1 da 
 Constituição, em consonância com o previsto no artigo 1º do Protocolo nº 4 
 Adicional, à CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM, por que aplicou aos 
 arguidos a pena que consta da douta sentença recorrida.
 
     q) – Para a hipótese de não estarem prescritos todos ou parte do 
 procedimento criminal contra os arguidos, no todo ou em parte, ou para a 
 hipótese de não serem absolvidos, por falta de prova, ou por não terem agido com 
 dolo ou ainda para a hipótese de não ser declarada a inconstitucionalidade da 
 norma que os condenou, deve ser fixada em definitivo a dívida ao Estado com 
 compensação do seu crédito. E,
 r) – Consequentemente deve, por decisão judicial, ser declarado que os arguidos 
 a título de IVA (Dezembro de 1994) devem pagar apenas 7.529,21 euros (160.460,78 
 
 - 52.931,57 = 7.529,21 euros) valor da diferença entre o crédito a favor do 
 Estado e o crédito a favor da A., Ldª com fundamento em que aqueles nunca 
 poderão exercer o seu direito de regresso contra a sociedade, por se encontrar 
 falida.
 s) – A merit[í]ssima juíza ‘a quo violou, além do mais o artigo 410º, alíneas a) 
 e c) do nº 2 do Código de Processo Penal; aplicou e não devia aplicar a pena 
 prevista, actualmente mo artigo 105º do nº 1, 2, 5 e 7 da Lei nº 15/2001 de 5 de 
 Setembro; não aplicou e devia aplicar o disposto nos artigos 13, 14 e 15 do 
 Código Penal e artigo 8º do D.L. 433/82 de 27 de Outubro, aplicável por força do 
 artigo 3º da Lei nº 15/2001 de 5 de Junho; aplicou os artigos 30 nº 2, 40 do nº 
 
 1 e 71, nº 1 e 79º, todos do Código Penal, para aplicar a pena da douta sentença 
 recorrida, quando deveria tê-los absolvido por falta de prova, erro notório na 
 apreciação da prova e inexistência de dolo; não aplicou e deveria ter aplicado a 
 Lei nº 29/99 de 12 de Maio – Perdão genérico e Amnistia de Pequenas Infracções; 
 violou ainda a alínea d) (parte) e alínea e) do nº 1 do artigo 668º do C.P. 
 Civil.
 t) Os arguidos declaram que mantêm o interesse ‘in totum’ no RECURSO RETIDO, 
 relativo ao douto despacho de folhas 384 a 386 dos autos.
 u) – Os arguidos requerem nos termos e para os efeitos do disposto no nº 4 do 
 artigo 411º do C.P. Penal que, havendo lugar a alegações, elas sejam produzidas 
 por escrito.’
 
  
 
                      Na alegação escrita produzida no Tribunal da Relação de 
 Lisboa, os arguidos deram por ‘reproduzidas as conclusões constantes das 
 al[í]neas a), b), c), d), e), f), g), h), i), j), l), m), n), o), p), q), r) e 
 s) inclu[s]ive do requerimento de recurso’.
 
  
 
                      Tendo aquele Tribunal de 2ª Instância, por acórdão de 7 de 
 Dezembro de 2005, negado provimento aos recursos, vieram os arguidos solicitar a 
 respectiva aclaração, pretensão que veio a ser indeferida por aresto de 8 de 
 Fevereiro de 2006.
 
  
 
                      Pretenderam os arguidos interpor recurso para o Supremo 
 Tribunal de Justiça mas, como este não foi admitido por despacho proferido em 23 
 de Fevereiro de 2006 pela Desembargadora Relatora do Tribunal da Relação de 
 Lisboa, dele reclamaram para o Presidente daquele Alto Tribunal.
 
  
 
                      Tendo o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, por 
 despacho de 6 de Abril de 2006, indeferido a reclamação, vieram então os 
 arguidos apresentar nos autos requerimento com o seguinte teor: –
 
  
 
 ‘B. e C. melhor identificados nos autos, vêm, em seguimento do indeferimento da 
 reclamação do douto despacho do Tribunal da Relação de Lisboa, que não admitiu o 
 recurso do acórdão de 7.12.2005 e não se conformando, com este acórdão, 
 interp[o]r recurso para o Tribunal Constitucional, em secção, nos termos do nº 
 
 1, al[í]nea b) do artigo 70º, 75, 75-A, nº 2 da lei nº 28/82 de 15 de Novembro, 
 com os fundamentos seguintes: 
 a) – O Tribunal recorrido aplicou o artigo 105º, nº 1, 2 e 5 do RGIT (artigo 
 
 70º, nº 1, al[í]nea b) da lei nº 28/82 de 15 de Novembro) condenando os arguidos 
 a pena de prisão; 
 b) - Os arguidos não receberam as quantias peticionadas na acusação, as quais 
 deveriam ter sido pagas pela falida A., Lda, tendo a decisão sido contrária ao 
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13.12.2001, proferido no processo nº 
 
 3749/01 – 5a Secção. 
 
               c) – Não foi feita, como pedido, a compensação entre aquilo que a 
 falida devia pagar e aquilo que devia receber conforme consta do documento que 
 serviu de base ao apuramento do saldo. 
 d) – A inconstitucionalidade foi invocada na motivação de recurso da sentença do 
 
 2º Juízo Criminal do Seixal (artigos 90 e seguintes) e na motivação do recurso 
 do Acórdão da Relação de Lisboa (artigos 26º e seguintes). 
 e) – A compensação requerida, foi invocada nos articulados referidos na al[í]nea 
 anterior. 
 
            f) – Foram violados, nomeadamente os artigos 27º, nº 1, 32º do nº 1, 
 
 104º, nº 2 da Constituição. 
 Assim e por que estão em tempo: 
 
                                                Requerem, após o trânsito da 
 decisão que indeferiu a reclamação supra mencionada, a devolução do processado 
 para o Tribunal da Relação de Lisboa, para continuação dos respectivos termos. 
 
                                                Requerem, por último, se sigam os 
 ulteriores termos, considerando-se interposto o recurso para o Tribunal 
 Constitucional, nos termos legais, sempre com o suprimento do que for devido.’
 
  
 
                     A Desembargadora Relatora do Tribunal da Relação de Lisboa, 
 por despacho prolatado em 15 de Maio de 2006, admitiu o recurso interposto 
 mediante o transcrito requerimento.
 
  
 
                      2. Porque aquele despacho não vincula este Tribunal (cfr. 
 nº 3 do artº 76º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro) e porque se entende que o 
 recurso não deveria ter sido admitido, elabora-se, ex vi do nº 1 do artº 78º-A 
 da mesma Lei, a vertente decisão, por intermédio da qual se não toma 
 conhecimento do objecto da presente impugnação.
 
  
 
                      Basta ler o requerimento de interposição de recurso para se 
 ser facilmente conduzido à conclusão de que por sua via se não intenta a 
 apreciação da conformidade com a Constituição por banda de qualquer normativo 
 
 ínsito no ordenamento jurídico ordinário.
 
  
 
                      Na verdade, deflui de tal requerimento que aquilo que se 
 deseja questionar é: –
 
                      – a condenação sofrida pelos arguidos quando, na sua 
 perspectiva, os mesmos não teriam recebido as quantias referidas (supõe-se que é 
 isso que se deseja dizer e não ‘peticionadas’) na acusação, quantias essas que 
 seriam devidas por uma sociedade que já teria sido declarada falida;
 
                      – que a decisão condenatória é ‘contrária ao Acórdão do 
 Supremo Tribunal de Justiça de 13.12.2001, proferido no processo nº 3749/01 – 5ª 
 Secção’;
 
                      – que não teria sido levada a efeito uma compensação entre 
 um crédito, que seria detido pela sociedade falida e do qual seria devedor o 
 Estado, e o crédito que para este último adviria do não pagamento das quantias 
 
 (parece ser isso que os arguidos pretendem dizer), cujo pagamento foi 
 determinado na sentença condenatória proferida em 1ª instância como condição de 
 suspensão da execução das penas impostas aos arguidos;
 
                      – que a decisão (supõe-se que a querida agora recorrer) 
 violou os artigos 27º, nº 1, 32º, nº 1, e 104º, nº 2, da Lei Fundamental.
 
  
 
                      É de evidência que a pretensão consubstanciada no 
 requerimento de interposição de recurso não pode, minimamente, ser acolhida, 
 sabido que é que o objecto dos recursos de fiscalização concreta da 
 constitucionalidade versa sobre normas do ordenamento infra-constitucional e não 
 sobre outros actos do poder público tais como, verbi gratia, as decisões 
 judiciais qua tale consideradas.
 
  
 
                      Por outro lado, na motivação de recurso, os arguidos ao 
 defenderem (cfr. item 90º G) daquela motivação) que era ‘INCONSTITUCIONAL NOS 
 TERMOS DO ARTIGO 27º, Nº 1 E 2º DA CONSTITUIÇÃO, EM CONSONÂNCIA COM O PREVISTO 
 NO ARTIGO 1º DO PROTOCOLO ADICIONAL À CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM, 
 A APLICAÇÃO AOS ARGUIDOS DE QUALQUER PENA DE PRISÃO, COM OS FUNDAMENTOS DA DOUTA 
 SENTENÇA RECORRIDA, AO ABRIGO DO ARTIGO 105º, DA LEI Nº 15/2001 DE 5 DE JUNHO’, 
 claramente que estavam a pôr em causa a condenação constante da sentença então 
 impugnada.
 
  
 
                      O que significa que não suscitaram qualquer questão de 
 inconstitucionalidade precedentemente ao proferimento do acórdão tirado no 
 Tribunal da Relação de Lisboa e ora desejado impugnar.
 
  
 
                      Ainda por outro lado, mesmo que por mera hipótese de 
 raciocínio se admitisse que com o que foi escrito na «conclusão» p) (acima 
 transcrita) da motivação de recurso para aquele Tribunal de 2ª instância, 
 pretendiam os arguidos suscitar uma questão de inconstitucionalidade normativa 
 
 (admissão essa, porém, que não teria qualquer plausibilidade, já que também ali 
 se reportam à aplicação ‘aos arguidos [d] a pena que consta da douta sentença 
 recorrida’), o que é certo é que, nesse raciocínio hipotético, o recurso seria 
 manifestamente infundado, atenta a jurisprudência seguida por este Tribunal e 
 que se tem traduzido em inúmeras decisões, podendo, de entre elas, 
 exemplificarem-se os Acórdãos números 312/2000, 494/2004 e 336/2005, disponíveis 
 em www.tribunal constitucional.pt.
 
  
 
                      Em face do que se deixa dito, não se toma conhecimento do 
 objecto do recurso, condenando-se os impugnantes nas custas processuais, 
 fixando-se a taxa de justiça em seis unidades de conta.”
 
  
 
                      Da decisão que supra se transcreveu reclamaram os arguidos, 
 fazendo-o por intermédio de requerimento em que disseram: –
 
  
 
     “A presente reclamação para a conferência vem da decisão de folhas ... que 
 não toma conhecimento do objecto do recurso.
 
     Salvo melhor e douto suprimento a decisão, de que se reclama, faz uma 
 interpretação muito rest[r]itiva da lei fundamental, é injust[a] e não tem em 
 conta os factos relevantes que, a serem apreciados, conduzirão forçosamente a 
 uma decisão favorável aos arguidos e nem está suficientemente fundamentada. Foi 
 proferida com rapidez, alivia os serviços, mas com tal decisão terminam para 
 sempre as esperanças dos arguidos em que lhes seja feita justiça. Por outro 
 lado, depois de tudo ser tirado aos arguidos, com a falência, mandam-se para a 
 prisão por não poderem pagar a dívida que não lhes pertence. Por último a 
 decisão ao remeter para a jurisprudência do tribunal sem aclarar o que o deve 
 ser, é um caminho fácil, mas não o mais adequado e que não dignifica a Justiça, 
 a nenhum título. Vejamos melhor.
 
     Como se alcança dos autos os arguidos invocaram a Inconstitucionalidade do 
 artigo 105° da lei 15/2001 de 5 de Junho por violar o artigo 27°, nº 1 da lei 
 fundamental e a Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Tal invocação não foi 
 atendida e devia tê-lo sido, pois a situação é diferente daquela que é referida 
 nos diversos acórdãos do Tribunal Constitucional. Neste caso os arguidos ficaram 
 sem a sociedade A., Lda. e sem o dinheiro do IVA, como se alcança dos autos. 
 Mais: No recurso interposto do Acórdão da Relação invocaram ainda a violação do 
 nº 1 do [ ]artigo 32° e 162° da Co[ns]tituição. Não lhes foram dadas garantias 
 de defesa e as que lhes foram dadas não defenderam os seus direitos. Tal recurso 
 não foi admitido. Também não foi admitida a reclamação oportunamente apresentada 
 no Supremo Tribunal. Como é bem fácil de ver os factos oportunamente invocados 
 devem ser apreciados pelo Tribunal Constitucional, tal como bem decidiu a 
 Meritíssima Juíza Desembargadora da Relação de Lisboa. É certo que será mais um 
 recurso que sendo apreciado aumentará o serviço do Tribunal Constitucional. No 
 entanto Senhores Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional, a Justiça não 
 se pode compadecer por falta de meios materiais ou humanos. Os arguidos estão a 
 ser vítimas de um enorme erro judiciário. Por isso o recurso deve ser admitido.
 
     Por outro lado constando dos autos que os arguidos não se apoderaram das 
 quantias que eram devidas pela falida A., Lda. e não se provando que agiram de 
 má fé qual é a Constituição do Mundo que dá cobertura a estas situações? Quase 
 apetece perguntar, como fez ANASTÁCIA que dirigindo-se ao Imperador romano lhe 
 diz: Qual é a lei que proíbe uma irmã de enterrar o irmão morto, mesmo sendo seu 
 inimigo? Que lei Constitucional dá cobertura a situações como as descritas nos 
 autos?
 Também por isso o recurso deve ser admitido.
 
     Como consta dos autos não foi operada a compensação pedida e deveria tê-lo 
 sido, como é bem fácil de ver. Se não for admitido o recurso ou a este não for 
 dado provimento teremos a seguinte situação: O Estado quer cobrar aos arguidos, 
 todas as quantias peticionadas, receber ainda a sua quota parte da massa falida 
 e fica com o IVA não compensado que consta do Mapa elaborado pela Sr.ª 
 Inspectora Tributária. Se assim f [o]r, o Estado vai receber o que tem direito e 
 o que não tem direito, locupletando-se [à] custa alheira. Qual é a lei 
 fundamental que protege estas situações Senhor Conselheiro Relator? Por isso a 
 decisão de não admitir o recurso é injusta e também por esta razão o recurso 
 deve ser admitido.
 
     Alcança-se ainda que a decisão não está minimamente fundamentada tendo 
 presente a gravidade das situações abrangidas. De facto a decisão reclamada 
 limita-se, ‘a grosso modo’[à] transcrição das conclusões formuladas nos autos e 
 em cada articulado mas não foram tidas em conta nenhuma das conclusões 
 transcritas nem sobre, elas foi proferida qualquer decisão.
 
     Nos termos do nº 5 do artigo 75-A da Lei nº 28/82 de 15 de Novembro, o 
 Senhor Juiz Conselheiro/Relator poderia/deveria convidar os requerentes a 
 prestar as indicações que fossem julgadas necessária mas tal não foi julgado 
 necessário.
 
     É certo, que o recurso admitido pelo Tribunal da Relação de Lisboa não 
 vincula o Tribunal Constitucional. No entanto a Senhora Desembargadora do 
 Tribunal da Relação de Lisboa admitiu o recurso com fundamento no Acordo 
 
 [supõe-se que se quereria dizer acórdão] proferido por esse Tribunal onde foi 
 apreciada toda a matéria de facto e de direito (49 páginas).
 E no caso ‘sub-judice’ a decisão reclamada, sem fundamentação não é justa por 
 contrariar o recurso admitido pelo Tribunal da relação de[ ] Lisboa.
 
     Com este fundamento o recurso deve ser admitido.
 Por último na RECLAMAÇÃO do despacho do Tribunal da Relação de Lisboa que não 
 admitiu o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, foi requerido na alínea g) 
 
 ‘Informação, a solicitar, oficiosamente, pelo Tribunal, ao 2° Serviço de 
 Finanças do Seixal, para saber, nomeadamente, quanto foi pago, da quantia 
 exigida, pela massa falida (da A., Lda.). Nem sequer foi proferido qualquer 
 despacho. Foi enviada a reclamação sem mais. E logo após o despacho, que 
 atribu[i]u o recurso os autos foram imediatamente enviados para o Tribunal 
 Constitucional sem sequer ter corrido o prazo legal. Por esse facto quando os 
 arguidos ali entregaram o requerimento referida na1ª  parte da decisão ora 
 reclamada, há muito que os autos já lá não estavam. E tal requerimento deveria 
 ter sido, só poderia ter sido apreciado e decidido pela Relação de Lisboa, se 
 assim o entendesse. Mas tal não foi feito.
 
     Sendo certo que a Justiça deve ser rápida é no entanto também verdade que as 
 decisões amadurecidas têm tendência a ser mais justas. E a decisão reclamada não 
 
 é justa. Os arguidos podem não vencer esta batalha, mas têm o direito de os 
 deixarem lutar até ao fim.
 Também com este fundamento o recurso deve ser admitido.
 CONCLUSÕES:
 a) Como se alcança dos autos os arguidos invocaram a inconstitucionalidade do 
 artigo 105° da Lei nº 15/2001 de 5 de Junho por violar, além do mais, o artigo 
 
 27°, nº 1 da Lei Fundamental, o que não foi atendido.
 b) – No recurso do Acórdão da Relação de Lisboa, que não foi admitido, invocaram 
 ainda a violação do nº 1 do artigo 32° e 162° da Constituição.
 c) – Também não foi admitida a reclamação, oportunamente apresentada, do 
 despacho que não admitiu o recurso.
 d) – Os arguidos esgotaram todos os meios jurídicos disponíveis para fazerem 
 valer os seus direitos.
 e) – Os factos atempadamente invocados devem ser apreciados pelo tribunal 
 Constitucional, conforme recurso admitido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, de 
 forma a evitar que os arguidos sejam vítimas de enorme erro judiciário. E
 f) – Com fundamento nos factos referidos nas alíneas anteriores o recurso deve 
 ser admitido e revogada a decisão ora reclamada. Por outro lado,
 g) – Os arguidos não se apoderaram das quantias que eram devidas pela falida A., 
 Lda. e não se provou que agiram de má fé. Por isso,
 h) – - Que Lei Fundamental pode dar cobertura a situações como as descritas nos 
 autos? Ou como dizia ANASTÁCIA, para o Imperador Romano: Qual é a lei que proíbe 
 uma irmã de enterrar o irmão morto, mesmo sendo inimigo?
 i) – Também com este fundamento o recurso deve ser admitido.
 j) – Como consta dos autos não foi operada a compensação pedida, e descrita nos 
 autos e se não for admitido o recurso ou a este não for dado provimento 
 verificar-se-á que o Estado quer cobrar dos arguidos todas as quantias 
 peticionadas, receber a sua quota parte na massa falida e ficar ainda com o IVA 
 não compensado (de montante semelhante ao devido) ou seja o Estado vai 
 locupletar-se [à] custa alheia, o que não é legal, nem leg[í]timo, nem justo. 
 Por isso,
 
 1) – Também com este fundamento o recurso deve ser admitido.
 m) – A decisão ora reclamada não está suficientemente fundamentada e o Sr. 
 Conselheiro/Relator, nos termos do nº 5 do artigo 75-A da Lei nº 28/82 de 15 de 
 Novembro poderia/deveria convidar os requerentes a prestar as indicações que 
 fossem julgadas necessárias, o que não foi feito. Por esse facto,
 n) – Deve ser apreciado o recurso admitido pelo Tribunal da Relação de Lisboa.
 Em consequência,
 o) – Deve ordenar-se o prosseguimento dos autos mandando-se notificar os 
 recorrentes para apresentarem as suas alegações, nos termos do nº 5 do artigo 
 
 78-A da Lei 28/82 de 15 de Novembro. 
 p) – Deve a presente reclamação seguir com os presentes autos, nos termos 
 legais, mas se assim não for entendido, devem extrair-se certidões das seguintes 
 peças: procurações de folhas…[a]legações de recurso da sentença do Tribunal do 
 Seixal, Acórdão da Relação de Lisboa, Aclaração, recurso do Acórdão, reclamação 
 do despacho que não admitiu o recurso, requerendo do Recurso para o Tribunal 
 Constitucional e o mais legal.”
 
  
 
                      Pronunciando-se sobre a reclamação, o Ex.mo Representante 
 do Ministério Público junto deste Tribunal veio dizer que a mesma era 
 manifestamente improcedente, sendo que a argumentação do reclamante se 
 alicerçava “numa errada perspectiva do que seja a natureza normativa dos 
 recursos de fiscalização concreta e dos ónus que justificadamente incidem sobre 
 a parte que pretende colocar à apreciação do Tribunal Constitucional uma questão 
 dessa natureza”.
 
  
 
                      Cumpre decidir.
 
  
 
  
 
                      3. Da simples leitura do requerimento corporizador da 
 reclamação e acima reproduzido extrai-se, à saciedade, que não são carreados 
 quaisquer fundamentos válidos que invalidem o que se contém na decisão ora 
 impugnada quando na mesma se formulou um juízo de não conhecimento do objecto do 
 recurso intentado interpor para este Tribunal.
 
  
 
                      Há, por outro lado, que sublinhar que na decisão sub specie 
 não se deixou de admitir (embora por via hipotética de raciocínio) que, se, com 
 o que foi escrito na «conclusão» p) da motivação de recurso interposto para o 
 Tribunal da Relação de Lisboa, os ora reclamantes pretendiam suscitar uma 
 questão de inconstitucionalidade normativa reportada ao artº 24º do Regime 
 Jurídico das Infracções Fiscais não Aduaneiras, norma que, na óptica dos 
 impugnantes, veio a ser «substituída» pelo artº 105º da Lei nº 15/2001, de 5 de 
 Junho, o recurso, então, apresentar-se-ia como manifestamente infundado, atenta 
 a jurisprudência que tem sido seguida sem divergências por este órgão de 
 administração de justiça.
 
  
 
                      Parecem olvidar os reclamantes os poderes cognitivos deste 
 Tribunal nos recursos de fiscalização concreta da constitucionalidade – 
 circunscrito à apreciação da conformidade com o Diploma Básico –, já que vêm 
 brandir com matéria fáctica que, na sua perspectiva, teria sido dada por assente 
 na ordem dos tribunais de onde emergiu este recurso, vindo também esgrimir com a 
 actuação desses mesmos tribunais, dessa sorte esquecendo, como, aliás, se 
 sublinhou na decisão em crise, que o objecto das impugnações do jaez da presente 
 não abarca actos emanados do poder público como as decisões judiciais qua tale 
 consideradas.
 
  
 
                      No que tange à alegada falta de fundamentação da decisão 
 impugnada, é manifesta a falta de razão dos reclamantes.
 
  
 
                      Na verdade, na mesma estão, clara e suficientemente, 
 expendidas as razões que conduziram ao não conhecimento do objecto do recurso.
 
  
 
                      E, no que concerne à circunstância, invocada pelos 
 reclamantes, de não ter sido formulado o convite a que alude o nº 6 (e não nº 5) 
 do artº 75º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, é evidente que os impugnantes 
 confundem duas distintas realidades: os pressupostos do recurso de fiscalização 
 concreta da constitucionalidade e os requisitos do requerimento de interposição 
 desse recurso.
 
  
 
                      Se os primeiros se não congregam (ou algum deles se não 
 encontra presente) – e, por isso, o recurso não é admissível – é por demais 
 
 óbvio que não será por via de um cabal cumprimento dos requisitos do 
 requerimento de interposição de recurso que é suprida a inexistência daqueles.
 
  
 
                      Assinale-se, por fim, que, como identicamente é vincado na 
 decisão reclamada, a admissão do recurso não vincula o Tribunal Constitucional, 
 como expressamente se estatui no nº 3 do artº 76º da Lei nº 28/82.
 
  
 
                      Uma última palavra para, referentemente ao que é 
 peticionado em p) do requerimento corporizador da reclamação em apreço, se fazer 
 notar que os autos pendentes neste Tribunal contêm todos os elementos 
 permissores da decisão que neles foi proferida em 5 de Junho de 2006 e da 
 presente, motivo pelo qual a solicitação em causa é, no mínimo, ininteligível.
 
  
 
                      Em face do que se veio de dizer, indefere-se a reclamação, 
 condenando-se os impugnantes nas custas processuais, fixando-se a taxa de 
 justiça em vinte unidades de conta.
 Lisboa, 22 de Junho de 2006
 Bravo Serra
 Gil Galvão
 Rui Manuel Moura Ramos