 Imprimir acórdão
 Imprimir acórdão   
			
Processo n.º 948/06
 
 2.ª Secção
 Relator : Conselheiro Paulo Mota Pinto
 
  
 
  
 
  
 Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 I. Relatório
 
 1.A Administração do Condomínio “A.”, melhor identificada nos autos, veio 
 reclamar para este Tribunal Constitucional do despacho do Relator no Supremo 
 Tribunal de Justiça de 6 de Julho de 2006 (fls. 545) que não lhe admitiu o 
 recurso para o Tribunal Constitucional, interposto ao abrigo do artigo 70.º, n.º 
 
 1, alínea a), da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal 
 Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro).
 Pode ler-se na reclamação apresentada:
 
 «Decidiu o Venerando Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça, no 
 douto Despacho a fls..., de que ora se reclama, não admitir o recurso interposto 
 pela ora Reclamante, alegando o seguinte: 
 
 “Como resulta do preceituado no art.º 732.º-A CPC, citado no despacho do 
 relator, tanto os pedidos como as sugestões de revista ampliada têm como limite 
 temporal, paro a suo apresentação a prolação do acórdão que conheço da revista 
 
 (v. Amândio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, pág. 297, que 
 refere o Ac. do TC 261/2002, de 18/6, DR, II Série de 24/7/2002, que decidiu não 
 ser inconstitucional, por violação do art.º 20.º, n.º 1, da CRP, o disposto no 
 art.º 732.º-A quando interpretado no sentido de o requerimento das partes apenas 
 poder ser apresentado até à prolação do acórdão que julga a revista”.
 Venerandos Conselheiros, com o devido respeito, que é muito, existe uma 
 incongruência entre o decidido pelo Venerando Conselheiro Relator e o requerido 
 pela ora Reclamante aquando do seu requerimento de interposição de recurso para 
 este Venerando Tribunal, consequentemente, não se entende a “ratio” da 
 
 “fundamentação” alegada pelo Venerando Conselheiro Relator. 
 Saliente-se, por não despiciendo que, em momento algum dos presentes autos 
 pugnou a ora Reclamante pela ilegalidade e inconstitucionalidade do art.º 
 
 732.º-A do Código de Processo Civil. 
 Acresce que, e salvo o devido respeito por opinião divergente, nos termos e para 
 os efeitos do n.º 2 do art.º 76.º da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional: “O 
 requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional deve ser 
 indeferido quando não satisfaça os requisitos do art.º 75.º-A, mesmo após o 
 suprimento previsto no seu n.º 5 quando a decisão o não admita, quando o recurso 
 haja sido interposto fora do prazo, quando o requerente careça de legitimidade 
 ou ainda, no caso dos recursos previstos nas alíneas b) e f) do n.º 1 do art.º 
 
 70.º, quando forem manifestamente infundados”. 
 Ora, “in casu”, todos os requisitos exigidos estão preenchidos, pelo que no 
 entender da Reclamante a “ratio” da decisão de não admissibilidade do recurso 
 
 “sub judice”, bem como da fundamentação para a mesma, na medida em que é 
 claramente inepta e ininteligível face ao requerido pela ora Reclamante. 
 
 É curial referir e, fora de grandes cogitações, a mesma não poderá fundamentar a 
 decisão de rejeição do recurso “sub judice”, porquanto não se insere nos 
 requisitos exigíveis para tal inadmissibilidade. 
 Venerandos Conselheiros, Ex.as, dos Requerimento de interposição de recurso a 
 fls..., resultam inequivocamente todos os requisitos exigidos para a 
 admissibilidade/aceitação do recurso, sendo certo que a decisão é susceptível de 
 recurso, a ora Reclamante tem legitimidade para tal e fê-lo em tempo, além de 
 que, o mesmo não se poderá, de todo, considerar infundado, pois está em causa a 
 preterição de direitos fundamentais. 
 Pelo que, não se vislumbram os fundamentos que motivaram o Venerando Conselheiro 
 Relator a não admitir o recurso, preterindo, desta forma o vertido no n.º 2 do 
 art.º 76.º da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional, ex vi art.ºs 70.º, 75.º e 
 
 75.º-A, todos da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional bem como o estatuído 
 nos art.ºs 20.º, 202.º, 203.º, 204.º e 205.º da Constituição da República 
 Portuguesa. 
 Salvo o devido respeito, que é muito, tal decisão, bem todas as decisões 
 posteriores à prolação da sentença são uma gritante denegação da Justiça. 
 Tanto assim é que, face ao supra exposto, outra não poderá ser a conclusão, 
 porquanto o Supremo Tribunal de Justiça olvidou a verificação de todos os 
 requisitos legais para a admissibilidade do recurso, bem como o dever de 
 fundamentação das decisões, estatuído no n.º 2 do art.º 713.º do Código Civil, 
 além de contrariar jurisprudência uniformizadora. 
 Cumpre não olvidar o estatuído no n.º 1 do art.º 202.º e 203.º, ambos da 
 Constituição da República Portuguesa, pois incumbe aos Tribunais a administração 
 da justiça, dever este preterido com a rejeição do recurso “sub judice”, em 
 detrimento da verificação de todos os requisitos legalmente exigidos. 
 Consequentemente, não existindo motivo legal fundamentado, a decisão do 
 Venerando Conselheiro Relator não obedece à necessidade de assegurar a defesa 
 dos interesses legalmente protegidos, conforme vertido no n.º 2 do art.º 202.º 
 da Constituição da República Portuguesa. 
 Venerandos Conselheiros, a independência dos Tribunais no exercício da função 
 jurisdicional, não os isenta do cumprimento da lei, isto é os Tribunais devem 
 aplicar as leis que não infrinjam a Constituição e os princípios nela 
 consignados – art.ºs 203.º e 204.º da Constituição da República Portuguesa (Ac. 
 STJ de 19.02.2004), bem como, nos termos e para os efeitos do art.º 205.º da 
 Constituição da República Portuguesa, ex vi, n.º 2 do art.º 713.º e 158.º ambos 
 do Código de Processo Civil, as suas decisões, quando não sejam de mero 
 expediente deverão ser fundamentadas, o que não aconteceu “in casu”.»
 Anteriormente, fora apresentada a reclamação de fls. 553 e seg., sustentada nos 
 fundamentos seguintes:
 
 «Venerandos Juízes Conselheiros 
 Administração do Condomínio “A.”, reclamante nos autos à margem referenciados, 
 tendo sido notificada da decisão a fls. ..., não se conformando, vem da mesma 
 reclamar 
 Venerandos Conselheiros, 
 Mais uma vez não entende a “ratio” da decisão, que ora se reclama, porquanto a 
 mesma cinge-se a duas palavras: “IMPERTINENTE E DESATEMPADO”. 
 Venerandos Conselheiros, 
 Portugal é um Estado de direito democrático, princípio consagrado no art.º 2.º 
 da C.R.P.. 
 Num Estado de direito democrático, as partes, no âmbito de um processo judicial, 
 têm o direito de saber, melhor, têm direito a que lhes sejam comunicados os 
 motivos de uma decisão judicial – art.º 205.º, n.º 1, da C.R.P., e art.º 713.º, 
 n.º 2, do C.P. Civil. 
 Venerandos Conselheiros, 
 V. Exas., ao longo de todo o processo, olvidaram o disposto nos artigos 
 supracitados, deles fizeram tábua rasa, pois à ora reclamante, não foi 
 comunicado o motivo pelo qual todos os recursos foram julgados improcedentes. 
 No que concerne à decisão que ora se reclama, os Venerandos Conselheiros, não 
 fundamentam a sua impertinência, nem a sua extemporaneidade. 
 Venerandos Conselheiros, 
 A decisão que ora se Reclama, tem como objecto um Requerimento de interposição 
 de recurso para o Tribunal Constitucional, elaborado de acordo com o disposto 
 nos art.ºs 75.º, 75.º-A e fundamentado de acordo com o disposto no art.º 70.º, 
 todos da L.O.T.C. (Lei Orgânica do Tribunal Constitucional). Consequentemente, 
 O requerimento “sub judice” é pertinente e tempestivo. 
 Termos em que, deverá ser dado provimento à presente reclamação, sendo admitido 
 o recurso interposto para o Tribunal Constitucional.»
 Sobre a reclamação pronunciou-se a recorrida B. S.A, nos seguintes termos:
 
 «1. O art.º 76.º, n.º 4, da LTC admite a reclamação do despacho que indefira o 
 requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional. 
 
 2. Porém, no caso vertente não se vislumbra qual o recurso para o Tribunal 
 Constitucional a que a reclamante se quer reportar. 
 
 3. Pelo que, desde logo, nunca poderia haver lugar a qualquer “reclamação” para 
 o Tribunal Constitucional. 
 
 4. Acresce que a reclamante nem sequer identifica qual a disposição legal ou 
 princípio cuja inconstitucionalidade quer ver declarada. 
 
 5. Antes, pelo contrário, declara que: 
 
 “Saliente-se, por não despiciendo que, em momento algum dos presentes autos 
 pugnou a ora Reclamante pela ilegalidade e inconstitucionalidade do art.º 
 
 732.º-A do Código de Processo Civil”. 
 
 6. Não se compreende, portanto, esta litigância da reclamante, porquanto, como é 
 sabido, o Tribunal Constitucional não aprecia a inconstitucionalidade de 
 decisões, mas de normas ou de princípios. 
 
 7. Mas, o que é facto é que, com esta litigância, a reclamante causa incómodo e 
 despesas à R. recorrida, nomeadamente com honorários de advogado em patrocínio 
 em tribunal superior, que não podem ser avaliados em menos de € 2.000,00. 
 
 8. Dispõe o art.º 456.º, n.º 2, al. a), do C.P.C. que: 
 
 “Diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave: 
 a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia 
 ignorar;” 
 
 9. Ora, no caso vertente, a pretensão da reclamante carece manifestamente de 
 fundamento, como se deixou demonstrado. 
 
 10. E a reclamante não podia ignorar esta gritante falta de fundamento, tanto 
 mais que se encontra patrocinada por Ilustre Mandatária, em tribunal superior, 
 onde os requisitos de rigor e cuidado têm de ser mais exigentes, até por 
 respeito para com os Venerandos Conselheiros. 
 
 11. Dispõe o art.º 456.º, n.º 1, do CPC: 
 
 “Tendo litigado de má fé, a parte será condenada em multa e numa indemnização à 
 parte contrária, se esta a pedir”. 
 Termos em que: 
 a) a presente reclamação deverá ser liminarmente indeferida; 
 b) a reclamante deverá ser condenada como litigante de má fé em multa e 
 indemnização à R. não inferior a € 2.000,00.»
 Sobre a referida reclamação pronunciou-se ainda o Ministério Público, no sentido 
 da sua falta de fundamento sério, dizendo:
 
 “Na verdade – e para além da questão da intempestividade do recurso, se 
 reportado ao acórdão final proferido pelo STJ – é manifesto que se não mostra 
 colocada qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, susceptível de 
 constituir objecto idóneo de um recurso de fiscalização concreta – sendo 
 aberrante a invocação da alínea a) do n.º 1 do art.º 70.º da Lei n.º 28/82 num 
 caso em que obviamente não foi recusada, com fundamento em 
 inconstitucionalidade, a aplicação de qualquer preceito legal.”
 Vistos os autos, cumpre decidir.
 II. Fundamentos
 
 2.Importa começar por notar que a presente reclamação visa, tão-somente, a 
 apreciação dos requisitos de admissibilidade do recurso de constitucionalidade 
 apresentado perante o Supremo Tribunal de Justiça. Como se tem dito em anterior 
 jurisprudência – cfr. v. g. os acórdãos n.ºs 269/94 e 178/95 (publicados em 
 Acórdãos do Tribunal Constitucional, respectivamente, no 27.º vol., pp. 
 
 1165-1172, e no 30.º vol., pp. 1109-1119), “este Tribunal nas reclamações, tendo 
 nos autos elementos para isso, deve decidir se sim ou não se verificam os demais 
 pressupostos do recurso. Exige-o o facto de a decisão que ele vier a proferir, 
 quando revogue o despacho reclamado, que é um despacho de indeferimento, fazer 
 caso julgado quanto à admissibilidade do recurso, como prescreve o artigo 77.º, 
 n.º 4, da Lei do Tribunal Constitucional”.
 Desta forma, o que está em causa na reclamação dirigida à não admissão do 
 recurso não é a reapreciação dos fundamentos dessa decisão, mas a verificação da 
 indevida preterição da admissão de um recurso de constitucionalidade. (Neste 
 sentido, v. g., Acórdãos n.ºs 490/98, 24/99 e 571/99, todos disponíveis em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt, e os dois últimos também no Diário da República, 
 II Série, de 11 de Março de 1999 e de 15 de Novembro de 2000, respectivamente).
 
 3.Como resulta claramente do requerimento de interposição do recurso de 
 constitucionalidade, o reclamante identificou o tipo de recurso – o da alínea a) 
 do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional – e indicou a norma 
 jurídica pretensamente objecto de recusa de aplicação, cuja constitucionalidade 
 pretendia ver apreciada: a norma do artigo 712.º do Código de Processo Civil, ao 
 dizer que “o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa decidiu em detrimento da 
 norma vertida no art.º 712.º do C. P. Civil”.
 Ora, como se escreveu no Acórdão n.º 350/92, publicado no Diário da República, 
 II Série, de 16 de Março de 1993 (e outros se poderiam mencionar no mesmo 
 sentido), o recurso de constitucionalidade com base naquela alínea do 1.º do 
 referido artigo 70.º só se abre “se o tribunal a quo tiver rejeitado, com 
 fundamento na sua inconstitucionalidade, a aplicação ao caso concreto do 
 conteúdo ou do regime jurídico constante de uma determinada norma jurídica”. Há, 
 pois, que analisar o acórdão recorrido para apurar se nele se verificou uma tal 
 recusa de aplicação da citada norma.
 Desde logo se suscita aqui, porém uma dificuldade: a de saber qual o acórdão de 
 que o recorrente pretendeu interpor recurso de constitucionalidade. No entanto, 
 independentemente dessa dificuldade, que poderia ser superada através de um 
 convite ao reclamante para aperfeiçoamento do seu requerimento de recurso, a 
 verdade é que tal convite seria no presente caso uma acto inútil, já que, como 
 salienta na sua alegação o representante do Ministério Público neste Tribunal, 
 em nenhuma das decisões possivelmente recorridas se verificou uma recusa, 
 expressa ou implícita, de aplicação, com fundamento na violação de norma 
 constitucional, de qualquer preceito legal.
 Não está, pois, preenchido o requisito da citada alínea a) do n.º 1 do artigo 
 
 70.º da Lei do Tribunal Constitucional. 
 
 4.Diga-se, aliás, que, ainda que se entendesse que teria havido lapso do 
 recorrente ao indicar aquela alínea pois o que, afinal, pretendia era 
 suportar-se na alínea b) do mesmo artigo 70.º, n.º 1, o que é certo é que, até 
 ao momento da interposição do recurso de constitucionalidade, nunca (como 
 admite) suscitou qualquer questão de constitucionalidade reportada à norma do 
 artigo 712.º do Código de Processo Civil. E não se pode vir dizer que o 
 recorrente não teve oportunidade processual de suscitar a questão de 
 inconstitucionalidade em momento anterior ao requerimento de interposição do 
 recurso para o Tribunal Constitucional.
 Não poderia, pois, considerar-se preenchido um dos pressupostos processuais do 
 recurso interposto ao abrigo da alínea b) do artigo 70.º, n.º 1, da Lei do 
 Tribunal Constitucional – a suscitação durante o processo da questão de 
 inconstitucionalidade da norma impugnada –, e, consequentemente, não poderia do 
 mesmo tomar-se conhecimento.
 Não se verificando os requisitos indispensáveis para se tomar conhecimento do 
 recurso, a presente reclamação tem de ser indeferida.
 III. Decisão
 Pelo fundamentos expostos, decide-se indeferir a presente reclamação e condenar 
 o reclamante em custas, com 20 (vinte) unidades de conta de taxa de justiça.
 Lisboa, 21 de Novembro de 2006
 Paulo Mota Pinto
 Mário José de Araújo Torres
 Rui Manuel Moura Ramos