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Processo nº 295/2007
 
 2ª Secção
 Relator: Conselheiro Rui Pereira 
 
  
 Acordam, em Conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 I
 Relatório
 
  
 
 1.     Nos presentes autos de reclamação, vindos do Tribunal da Relação de 
 
 Évora, em que figura como reclamante A. e como reclamado o Ministério Público, 
 foi interposto recurso de constitucionalidade, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do 
 artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, com os fundamentos que a seguir 
 parcialmente se transcrevem:
 
 1º  A decisão sob recurso assentou na aplicação aos presentes autos de Processo 
 Penal da norma constante do n.º 2 do artigo 720° do Código de Processo Penal, ex 
 vi do artigo 4° do Código de Processo Penal, aplicação essa que se reputa de 
 inconstitucional, por violação do princípio da presunção de inocência do arguido 
 até ao trânsito em julgado da decisão de condenação, ínsito no n.º 1 do artigo 
 
 110º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e no n.º 2 do artigo 32° da 
 Constituição da República Portuguesa. 
 
 2º  O recorrente foi “surpreendido” com a aplicação da citada norma do Código de 
 Processo Civil na decisão sob recurso, razão pela qual não podia, nos termos do 
 n.º 2 do artigo 75°-A da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro, na actual redacção, 
 ter anteriormente suscitado nos autos a questão da inconstitucionalidade que se 
 invoca. 
 
 3º  Conforme jurisprudência pacífica do Tribunal Constitucional, tal facto não 
 obsta ao conhecimento do presente recurso de constitucionalidade. 
 
 4º  Na realidade, pese embora conhecer-se a jurisprudência do Supremo ‘Tribunal 
 de Justiça citada na decisão sob recurso, que se respeita, discorda-se da mesma, 
 porquanto a aplicação do n.º 2 do artigo 720° do CPC ao processo penal, não só 
 viola o invocado princípio constitucional da presunção de inocência do arguido 
 até ao trânsito em julgado da decisão de condenação, como consubstancia uma 
 aplicação incoerente do direito, também ela inconstitucional. 
 
  
 
 2.     Não tendo o recurso de constitucionalidade sido admitido (os autos foram 
 remetidos à 1ª Instância - cf. pg.76), foi apresentada reclamação com os 
 seguintes fundamentos:
 
 1º  O douto despacho sob reclamação, em que foi ordenada a remessa do processado 
 
 à Primeira Instância, consubstancia uma retenção do recurso interposto em 
 
 3/01/2007 para o Tribunal Constitucional do douto acórdão proferido em 
 
 12/12/2006. 
 
 2º  Na realidade, em 25/01/2007, o ora recorrente reclamou para a Conferência 
 desse Venerando Tribunal suscitando o esclarecimento pelo Exmo. Relator do teor 
 dos dois despachos proferidos em 9/01/2007, na sequência da interposição do 
 aludido recurso para o Tribunal Constitucional, bem como que fosse determinada a 
 devolução dos autos principais a esse Tribunal para o Exmo. Relator proferir o 
 despacho que omitiu sobre o requerimento de interposição daquele recurso.
 
 3º  No despacho subsequente, de 30/01/2007, objecto desta reclamação, a 
 pronunciar -se sobre o requerido, ao invés de proferir despacho sobre o recurso 
 interposto para o Tribunal Constitucional, o Exmo. Relator ordenou a remessa do 
 processado à Primeira Instância.
 
 4º  Ora, a omissão de pronúncia sobre a admissibilidade do recurso para o 
 Tribunal Constitucional consubstancia um indeferimento ou uma retenção da sua 
 subida, susceptíveis de apresentação da presente reclamação para o tribunal ad 
 quem.
 O Ministério Público pronunciou-se do seguinte modo:
 Importa salientar minimamente que já correu termos neste Tribunal o processo 
 
 1133/06, em que foi proferido o Acórdão nº 119/07, confirmando a decisão sumária 
 de não conhecimento do recurso de constitucionalidade reportado ao acórdão 
 proferido pela Relação em 1/11/06, tendo como objecto as normas incidentes sobre 
 o “agendamento” com o mandatário da data da audiência em processo penal.
 O recurso – cuja “rejeição” teria motivado a presente reclamação – é reportado 
 ao acórdão da Relação de 12/12/06, constante de fs. 62/65 dos autos, incidindo 
 sobre a constitucionalidade da aplicação, em processo penal, do regime de defesa 
 contra manobras dilatórias abusivas, consagrado no artigo 720º, nº 2, do Código 
 de Processo Civil.
 Mesmo que se admita que o despacho reclamado consubstanciou uma “retenção 
 atípica” ou “anómala” na subida a este Tribunal do recurso da fiscalização 
 concreta interposto pelo reclamante, susceptível de se enquadrar na segunda 
 parte do nº 4 do artigo 76º da Lei do Tribunal Constitucional., é evidente que a 
 questão de constitucionalidade suscitada é “manifestamente infundada”, o que 
 ditaria a improcedência da reclamação: não pode, na verdade, duvidar-se que a 
 aplicação do regime de defesa contra manobras dilatórias em qualquer espécie ou 
 tipo de processo - visando evitar para as partes ou sujeitos processuais, 
 através de um uso manifestamente abusivo e anómalo dos instrumentos processuais, 
 
 “bloqueiem os efeitos da decisões proferidas – não viola qualquer preceito ou 
 princípio constitucional.
 Isto mesmo foi, aliás, afirmado e decidido no citado Acórdão nº 119/07, face à 
 
 “questão prévia” ali suscitada pelo recorrente, consignando-se que a aplicação 
 de tal regime tem sido inclusivamente feita pelo Tribunal Constitucional, 
 remetendo-se para os termos do acórdão nº 256/2000.
 
  
 
 3.            Cumpre apreciar e decidir.
 II
 Fundamentação
 
  
 
 4.     O reclamante interpôs o recurso de constitucionalidade que pretende ver 
 admitido ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal 
 Constitucional. Ora, este recurso tem como pressuposto ter sido suscitada a 
 questão de constitucionalidade durante o processo.
 O reclamante afirma, no requerimento de interposição de recurso, que não teve 
 oportunidade processual para suscitar a questão antes da prolação do acórdão 
 recorrido, uma vez que foi “surpreendido” pela aplicação da norma do nº 2 do 
 artigo 720º do Código de Processo Civil (norma que considera inconstitucional 
 quando aplicada em Processo Penal). Porém, no mesmo requerimento, afirma 
 conhecer a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça que sustenta a 
 aplicação daquele preceito ao processo penal, acrescentando que discorda do seu 
 sentido.
 Verifica-se, assim, que a decisão recorrida não pode ser considerada inesperada, 
 pelo que impendia sobre o reclamante o ónus da suscitar a questão de 
 constitucionalidade durante o processo.
 
 5.     Por outro lado, a questão de constitucionalidade sempre seria considerada 
 manifestamente infundada já que nenhuma norma constitucional impede a aplicação 
 do mecanismo previsto no nº 2 do artigo 720º do Código de Processo Civil ao 
 processo penal (para evitar o uso manifestamente abusivo e anómalo de 
 instrumentos processuais).
 Com efeito, uma tal aplicação não viola as garantias de defesa consagradas nº 1 
 do artigo 32º da Constituição, sendo de notar que a celeridade processual (sem 
 pôr em causa as garantias de defesa) é um desígnio que o legislador 
 constitucional associa à própria presunção de inocência no nº 2 do artigo 32º.
 
 6.     A presente reclamação é, portanto, improcedente.
 
  
 III
 Decisão
 
  
 
 7.            Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide rejeitar a 
 presente reclamação.
 
  
 Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 ucs.
 Lisboa, 2 de Maio de 2007
 Rui Pereira
 Mário José de Araújo Torres
 Rui Manuel Moura Ramos