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Processo  n.º 590/08
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
 
 
 Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional
 
 
 
 1. Relatório
 
  
 O arguido A. reclamou para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça (fls. 
 
 1529 a 1536) do despacho de 7 de Fevereiro de 2007, do Juiz Desembargador 
 Relator, do Tribunal da Relação do Porto (fls. 1503 a 1505), que, com fundamento 
 no artigo 400.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Penal, não admitiu o 
 recurso por si interposto do acórdão de 20 de Novembro de 2006.
 
  
 Por despacho do Conselheiro Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça de 20 
 de Dezembro de 2007 (fls. 1603-1616), foi indeferida a reclamação apresentada 
 pelo arguido A..
 
  
 Pode ler-se no texto do despacho, para o que agora releva, o seguinte:
 
 “ […]
 a) Conhecendo das reclamações deduzidas contra o despacho de 07.02.07
 
 1) Reclamação de B. 
 I. O arguido B. interpôs recurso para este Supremo Tribunal de Justiça do 
 acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto que, concedendo provimento 
 parcial ao recurso, o condenou na pena de 2 anos de prisão. 
 Por despacho do Ex.mo Desembargador Relator esse recurso não foi admitido, nos 
 termos do art. 400.º, n.° 1, alínea e), do CPP. 
 Desse despacho reclama o recorrente sustentando, além do mais, que a norma 
 contida no art. 400.°, n.° 1, alínea e), do CPP é inconstitucional por violação 
 dos arts. 13.º e 18.º, n.° 2, da CRP. 
 II. Cumpre apreciar e decidir. 
 No caso em apreço,  está em causa um acórdão da Relação do Porto que, em 
 consonância com o decidido em 1.ª instância, condenou o arguido pela prática de 
 um crime de fraude fiscal. p. e p. pelo art. 23°, n.°s 1, 2, alínea c), e 4, do 
 Decreto-Lei n.° 20-A/90, de 15/01, alterando, todavia, a medida da pena ali 
 fixada, reduzindo-a para 2 anos de prisão. 
 Ora, assim sendo, estamos perante um acórdão da Relação proferido em processo 
 por crime a que é aplicável pena de multa ou de prisão não superior a cinco 
 anos. Deste modo, não é admissível o recurso para este Supremo Tribunal de 
 Justiça, nos termos do art.°, 400.º, n.° 1, alínea e), do CPP. 
 Quanto à inconstitucionalidade imputada ao art. 400.°, n.° 1, alínea e), do CPP 
 por violação dos arts. l3.° e 18°, n.º 2, da CRP, refere-se, no respeitante ao 
 primeiro, que não pode o mesmo considerar-se infringido, por não se encontrar 
 caracterizada qualquer situação desrespeitadora do princípio da igualdade, uma 
 vez que, em situações como a dos autos, a ninguém é conferida a possibilidade de 
 recorrer. E também a interpretação normativa encontrada da citada alínea e) do 
 n.° 1 do art. 400.º do CPP não viola o art. 18.º,  nº 2, da CRP, porquanto o 
 
 único direito, a considerar-se restringido, seria o do recurso, mas o n.° 1 do 
 art. 32.° da Constituição só reconhece o duplo grau de jurisdição,  sempre que 
 estejam em causa as garantias de defesa. E no caso dos autos, como vimos, 
 intervieram tanto a 1.ª como a 2.ª instância.
 III. Pelo exposto, indefere-se a reclamação deduzida por B..
 
 […]
 
 3) Reclamação de A.
 I. O arguido A. interpôs recurso para este Supremo Tribunal de Justiça do 
 acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto que confirmara a decisão da 
 
 1.ª instância que o condenara na pena de 2 anos de prisão, onde suscita como 
 questão prévia a nulidade do acórdão que indeferira o pedido de aclaração 
 daqueloutro. 
 Por despacho do Ex.mo Desembargador Relator esse recurso não foi admitido, nos 
 termos do art. 400.º, n.° 1, alínea e), do CPP. 
 Desse despacho reclama o recorrente sustentando, além do mais, que a norma 
 contida no art. 400.º, n.° 1, alínea e), do CPP é inconstitucional por violação 
 dos arts. 13.º e 18.º, n.° 2, da CRP. 
 II. Cumpre apreciar e decidir.
 No que concerne ao recurso interposto do acórdão da Relação que manteve a 
 decisão da 1.ª instância, que condenara o arguido pela prática de um crime de 
 fraude fiscal, p. e p. pelo art. 23.º, n.ºs 1, 2, alínea c), e 4, do Decreto-Lei 
 n.º 20-A/90, de 15/01, na pena de 2 anos de prisão, remete-se para o que se 
 disse em 1) tanto no respeitante à interpretação da alínea e) do n.º 1 do art. 
 
 400.º do CPP e das consequências resultantes da sua aplicação, como no 
 respeitante à inconstitucionalidade imputada ao referido artigo.
 III. Pelo exposto, indefere-se a reclamação deduzida por A..” 
 
  
 Deste despacho recorreu o arguido A. para o Tribunal Constitucional, ao abrigo 
 da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional, nos 
 seguintes termos (a fls. 1698/1699): 
 
  
 
 “ […]
 
 2- Pretende ver apreciada a constitucionalidade das seguintes normas: 
 a) A norma contida no artigo 400º, n°1, alínea f) do Código de Processo Penal, 
 na redacção anterior à dada pela Lei n° 48/2007, de 28 de Setembro. 
 Tal norma é violadora dos artigos 13° e 18°, n° 2 da Constituição da República 
 Portuguesa, tendo a questão da inconstitucionalidade sido suscitada nos autos, 
 como questão prévia e constituindo as conclusões 1) a 3) do recurso interposto 
 pelo ora recorrente para o Supremo Tribunal de Justiça a fls dos autos. 
 b) A norma contida no artigo 400º, nº 1, alínea e) do Código de Processo Penal, 
 na redacção dada pela Lei n° 48/2007 de 28 de Setembro. 
 Tal norma é violadora dos artigos 13º e 18°, n° 2 da Constituição da República 
 Portuguesa, tendo a questão da inconstitucionalidade sido suscitada nos autos no 
 requerimento de fls que constituiu a reclamação apresentada pelo recorrente 
 contra o despacho que não admitiu o recurso interposto para o Supremo Tribunal 
 de Justiça e nas conclusões constantes das alíneas a) a e) a fls dos autos. 
 
 […]”
 
  
 Por despacho de 16 de Abril de 2008 (cfr. fls. 1705/1708), não foi admitido o 
 recurso interposto pelo arguido A. para o Tribunal Constitucional, na parte em 
 que pede que seja apreciada a constitucionalidade da alínea f) do n.º 1 do 
 artigo 400.º do Código de Processo Penal, “por esta norma não ter sido aplicada 
 na decisão ora impugnada (despacho de 20.12.07), o que inviabiliza qualquer 
 julgamento sobre ela por parte do TC, porquanto os recursos de 
 constitucionalidade desempenham uma função instrumental.”
 
  
 Deste despacho reclamou A. para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto 
 no artigo 76º, n.º 4, da Lei do Tribunal Constitucional (fls. 1721/1722), 
 alegando o seguinte:
 
  
 
 “ […]
 
 1- Não foi admitido o recurso interposto para o Tribunal Constitucional na parte 
 respeitante à inconstitucionalidade imputada à alínea f) do n.º 1 do artigo 400º 
 do Código de Processo Penal, com o fundamento de que esta norma não teria sido 
 aplicada na decisão impugnada (despacho de 20/12/2007). 
 
 2- Nos termos do nº 1 do artigo 75°-A da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional 
 
 (LTC) no requerimento de interposição de recurso deverá ser indicada a norma 
 cuja inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal aprecie. 
 
 3- Por outro lado o n.º 2 do supra aludido artigo prevê que nos casos de 
 recursos interpostos ao abrigo das alíneas b) e f) do n.º 1 do artigo 70º (caso 
 do presente recurso) deverá ser indicada a peça processual onde o recorrente 
 suscitou a questão da inconstitucionalidade. 
 
 4- Considerando que o artigo 70° é omisso no que se refere ao facto de ser 
 condição de admissibilidade do recurso ter sido ou não aplicada a norma referida 
 pelo recorrente na decisão que se impugna; 
 
 5- Ora, o reclamante cumpriu os requisitos legais de admissibilidade do recurso, 
 designadamente referiu que a questão da inconstitucionalidade teria sido 
 suscitada no recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça (conclusões 1 
 a 3); 
 
 6- Pelo exposto, o recurso interposto para o Tribunal Constitucional nos termos 
 da à alínea f) do n.º 1 do artigo 400º do Código de Processo Penal deverá ser 
 admitido.”
 
  
 O Representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional 
 pronunciou-se nos seguintes termos (fls. 1725 v.º):
 
  
 
 “A presente reclamação carece manifestamente de fundamento sério.
 Na verdade, o reclamante confunde, em termos obviamente inadmissíveis, os planos 
 dos pressupostos de admissibilidade dos recursos de fiscalização concreta e dos 
 requisitos formais do requerimento através do qual os mesmos são interpostos, 
 chegando à insólita conclusão de que teriam automaticamente de ser admitidos 
 todos os recursos cujos requerimentos satisfizessem todos os requisitos formais!
 
  Trata-se de tese obviamente insustentável, cabendo naturalmente ao relator, no 
 Tribunal “a quo”, o poder-dever de verificar o preenchimento dos vários 
 pressupostos de admissibilidade do recurso, como ocorre com a efectiva aplicação 
 da norma questionada.”
 
  
 
  
 
 2. Fundamentação
 
  
 Compete ao tribunal que tiver proferido a decisão recorrida apreciar a admissão 
 do recurso para o Tribunal Constitucional, devendo o requerimento de 
 interposição de recurso ser indeferido não só quando não satisfaça os requisitos 
 do artigo 75.º-A, mas também quando a decisão o não admita, quando o recurso 
 haja sido interposto fora de prazo, quando o requerente careça de legitimidade 
 ou, no caso dos recursos previstos nas alíneas b) e f) do n.º 1 do artigo 70.º, 
 quando forem manifestamente infundados (cfr. n.ºs 1 e 2 do artigo 76.º da Lei do 
 Tribunal Constitucional).
 
  
 Ora, tendo o recurso sido interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 
 
 70.º da Lei do Tribunal Constitucional, constitui seu pressuposto processual a 
 aplicação, na decisão recorrida, da norma ou interpretação normativa cuja 
 conformidade constitucional se pretende que o Tribunal Constitucional aprecie.
 
  
 Este pressuposto processual decorre da natureza instrumental do recurso 
 constitucional e visa garantir a utilidade da decisão, pois se a norma ou 
 interpretação normativa cuja conformidade constitucional se pretende que o 
 Tribunal Constitucional aprecie não coincidir com aquela que foi efectivamente 
 aplicada pela decisão recorrida, a decisão que vier a ser proferida pelo 
 Tribunal Constitucional é insusceptível de alterar o sentido da decisão do 
 tribunal recorrido.
 
  
 Como resulta do requerimento de interposição do recurso, o recorrente pretende 
 que o Tribunal Constitucional aprecie a conformidade constitucional da norma 
 contida no artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal, na 
 redacção anterior à dada pela Lei n° 48/2007, de 28 de Setembro.
 
  
 Contudo, o despacho recorrido indeferiu a reclamação apresentada pelo arguido, 
 não por aplicação do disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do Código de 
 Processo Penal, mas sim por aplicação, como expressamente refere, do disposto na 
 alínea e), nos termos da qual não é admissível recurso de um acórdão da Relação 
 proferido em processo por crime a que é aplicável pena de multa ou de prisão não 
 superior a cinco anos. 
 
  
 Assim sendo, não tendo sido aplicada, na decisão recorrida, a norma cuja 
 conformidade constitucional o recorrente submete à apreciação do Tribunal 
 Constitucional, não pode conhecer-se do objecto do recurso, por falta de 
 preenchimento de um dos seus pressupostos processuais.
 
  
 Nada justificando, em consequência, a alteração do julgado.
 
  
 
 3. Decisão
 
  
 Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, desatende-se a presente reclamação.
 
  
 Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
 
  
 Lisboa, 24 de Setembro de 2008
 Carlos Fernandes Cadilha
 Maria Lúcia Amaral
 Gil Galvão