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Processo n.º 553/07
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
 
  
 Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 I. Relatório
 
  
 
 1. A., arguido em processo-crime que correu termos no 5º Juízo Criminal do 
 Tribunal Criminal da Comarca de Lisboa, interpôs recurso da respectiva decisão 
 condenatória perante o Tribunal da Relação de Lisboa, sustentando, além do mais, 
 a inconstitucionalidade do artigo 127º do Código de Processo Penal.
 
  
 Tendo sido invocada, pelo Ministério Público, a extemporaneidade do recurso, o 
 arguido, na resposta a essa questão prévia, suscitou a inconstitucionalidade das 
 normas dos artigos 113º, 334º e 373º, n.º 3, do Código de Processo Penal, quando 
 interpretadas no sentido da desnecessidade de a decisão condenatória ser 
 pessoalmente notificada ao arguido ausente, e ainda a inconstitucionalidade das 
 normas dos artigos 7º do Decreto-Lei n.º 39/95, de 15 de Fevereiro, 107º, n.º 2, 
 do Código de Processo Penal, e 146º, n.º 1, do Código de Processo Civil, quando 
 interpretadas no sentido de que a impossibilidade de acesso às cópias das 
 gravações da audiência, para efeito do exercício do direito de recurso, deve ser 
 alegado pelas partes e não conhecido oficiosamente pelo Tribunal.
 
  
 O Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 27 de Março de 2007, rejeitou o 
 recurso, por extemporaneidade, dizendo o seguinte:
 
  
 No dia 28-10-2005, após a respectiva leitura, a sentença ora em causa foi 
 depositada na secretaria (cfr. Fls. 124 e 125); 
 Por requerimento, entrado em 04-11-2005, o supra mencionado arguido, pretendendo 
 interpor recurso de tal aresto, solicitou que lhe fosse entregue cópia da 
 gravação da prova produzida a fim de efectuar a sua transcrição (cfr. Fls. 127); 
 
 
 Por despacho, datado de 17-11-2005, em virtude de se não dispor de meios para 
 esse efeito, foi determinado que se procedesse à entrega ao Exm.° advogado do 
 requerente das cópias existentes na secção (cfr. Fls. 139); 
 Tal entrega foi efectuada, por termo, em 06-12-2005 (cfr. Fls. 144) 
 O recurso interposto pelo supra aludido arguido deu entrada no Tribunal a quo no 
 dia 21-12-2005 (cfr. Fls. 145). 
 Ora, dispõe o art.° 411º, n. ° 1, do Código de Processo Penal que o prazo para 
 interposição do recurso é de 15 dias e conta-se a partir da notificação da 
 decisão ou, tratando-se de sentença, do respectivo depósito na secretaria. 
 Em face deste comando legal, resulta, pois, óbvio que, no que se reporta a 
 sentenças, a contagem do sobredito prazo não se opera a partir da notificação 
 mas sim do inerente depósito. 
 Ora, conforme decorre da análise do caso concreto, é forçoso concluir que foi, 
 precisamente, por não se entender indispensável a presença do arguido que se 
 veio a proceder, publicamente, à leitura da sentença apenas perante o respectivo 
 defensor constituído (cfr. Art.° 332°, n.° 5, do CPP). 
 Deste modo, sempre o recorrente se teria de considerar notificado da sentença em 
 causa depois dessa ocorrência (cfr. Art.° 373°, n.° 3, do supramencionado 
 Código). 
 Contudo, de acordo com o que deixámos exarado supra, verifica-se que a lei 
 passou a fazer depender a contagem do prazo de recurso do depósito na 
 secretaria, isto, de certo, para evitar incertezas acerca do início do mesmo, 
 atendendo a alguma prática de publicação de sentenças sem que fosse 
 correspondente e simultaneamente facultado às partes o acesso ao seu teor. 
 Aliás, neste sentido se pronunciou já o colendo S.T.J., segundo o qual: “1 – o 
 prazo para interposição de recurso conta-se a partir da data da leitura e 
 depósito na secretaria, ainda que tenha sido deferido o requerimento do 
 assistente para ser notificado por carta registada no seu escritório, como foi 
 feito. II — A carta registada remetida a comunicar o teor do acórdão não tem a 
 virtualidade de transferir o início do prazo para a interposição do recurso.” 
 
 (cfr. Acórdão de 15-01-1997, C. J. – Acórdãos do S.T.J., Ano V, Tomo 1—1997, 
 págs. 200 e seg.). 
 E não se nos afigura que este entendimento seja susceptível de atentar contra 
 qualquer exigência de ordem constitucional respeitante às garantias de defesa do 
 arguido (cfr. Art.° 32°, n.° 1, da C.R.P.). 
 Por outro lado, é certo que, quando impugne a decisão proferida sobre matéria de 
 facto, o recorrente deve especificar os pontos de facto que considera 
 incorrectamente julgados, as provas que impõem decisão diversa da recorrida e as 
 provas que devem ser renovadas, devendo as duas últimas especificações serem 
 feitas por referência aos suportes técnicos quando as provas tenham sido 
 gravadas (cfr. Art.° 412°, n° 3, alíneas a), b) e c), e n.º 4, do supra aludido 
 diploma de direito adjectivo penal). 
 Porém, o prazo de interposição de recurso é sempre o mesmo (o acima indicado), 
 quer se trate de recurso que incida exclusivamente sobre matéria de direito, 
 quer se trate de recurso que vise somente a impugnação da decisão sobre matéria 
 de facto, quer, ainda, se trate de recurso que, simultaneamente, verse matéria 
 de direito e impugne a decisão sobre matéria de facto e conta-se, em qualquer 
 dos casos, do depósito da sentença na secretaria. 
 E dizemos isto porque, seguramente, a lei não estabelece qualquer distinção, nem 
 quanto ao prazo, nem quanto ao momento a partir do qual se inicia a respectiva 
 contagem. 
 
 […] 
 Daí que, só se possa, legitimamente, concluir que, relativamente aos recursos em 
 processo penal que visem a impugnação da decisão proferida em matéria de facto, 
 não se aplica o supra mencionado normativo de direito adjectivo civil (cfr. 
 Acórdão de fixação de jurisprudência n.° 9/2005, de 11 de Outubro de 2005, in 
 D.R. Série 1-A de 6 de Dezembro do mesmo ano). 
 E que, outrossim, não se pode olvidar que, conforme vem assinalado na 
 fundamentação de tal acórdão, a gravação da prova, enquanto meio que permite 
 proporcionar a reapreciação da decisão em matéria de facto pelo tribunal de 
 recurso, está submetida a modos regulamentados de execução (cfr. Artigos 3° a 9° 
 do Decreto-Lei n.° 39/95, de 15 de Fevereiro), avultando, no que para estes 
 autos importa, a circunstância de os suportes técnicos respectivos deverem ser 
 colocados pelo tribunal à disposição das partes no prazo máximo de oito dias a 
 contar da respectiva diligência. 
 Nesta conformidade, estatui o art.° 7° do sobredito diploma que o tribunal 
 facultará cópia das gravações, devendo o mandatário, com a respectiva 
 solicitação, fornecer as fitas magnéticas necessárias, sendo que a resposta do 
 tribunal no prazo máximo que a lei impõe (oito dias) se harmoniza, por modo 
 adequado, com o exercício do direito ao recurso nos prazos fixados, isto até por 
 que, em caso de demora na disponibilidade das cópias, o interessado sempre 
 disporá da faculdade de invocar justo impedimento. 
 Aliás, entendendo-se, como se deixou já exarado supra, inexistir qualquer lacuna 
 no regime dos recursos penais em matéria de facto que cumpra suprir, não poderá 
 nunca obter-se alargamento do prazo da respectiva interposição com o fundamento 
 na necessidade prévia de obtenção de cópias dos registos magnéticos. 
 Até porque a motivação em processo penal constitui, quando bem interpretada na 
 sua função e finalidade processual, apenas uma delimitação do objecto do recurso 
 e a enunciação dos fundamentos, sendo o desenvolvimento dos fundamentos do 
 recurso objecto de intervenções posteriores, seja nas alegações na audiência 
 seja, quando o recorrente o requeira, em alegações escritas (cfr., nomeadamente, 
 Acórdão do S.T.J. de 03-03-2005, Processo 335/05-V Secção, in www.pgdlisboa.pt). 
 
 
 Em regra, o recorrente, logo após a entrega das cópias, poderá facilmente 
 elaborar as motivações de recurso, mediante a especificação reportada aos 
 suportes técnicos, tal como lhe é exigido pelo estabelecido no art.° 412°, n.° 
 
 4, com referência ao seu n.° 3, alíneas b) e c), do CPP. 
 Na medida em que, podendo os suportes técnicos referentes à prova gravada estar 
 
 à disposição do recorrente desde o início do prazo de interposição do recurso, 
 não se consegue vislumbrar motivo válido para entendimento diverso, 
 designadamente para o alargamento do respectivo prazo, sendo certo que de tal 
 entendimento não advém o cercear de quaisquer garantias de defesa 
 constitucionalmente consagradas. 
 O Tribunal Constitucional teve mesmo oportunidade de se pronunciar já pela 
 constitucionalidade da norma processual penal respectiva – art.° 411º do CPP -, 
 no caso do recurso visar a reapreciação da prova gravada, tendo considerado que 
 o prazo de 15 dias estabelecido naquele dispositivo não ofende as garantias de 
 defesa consagradas na Lei Fundamental por não constituir um encurtamento 
 inadmissível das possibilidades de defesa do arguido (cfr. Acórdão n.° 542/04 de 
 
 15 de Julho, em que foi relator o Exm.° Conselheiro Benjamim Rodrigues). 
 Porém, quando a ultimação das motivações de recurso não for susceptível de 
 ocorrer, mormente por demora na disponibilidade das pretendidas cópias, sempre 
 poderá o recorrente usar da faculdade de invocar justo impedimento e de assim 
 vir a ser admitida a prática do acto fora do prazo “normal” de 15 dias 
 legalmente previsto para a interposição do recurso em processo penal.
 Todavia, in casu, no requerimento de fls. 127, o arguido nada invocou, 
 permanecendo sem explicação a razão pela qual apenas solicitou cópias das 
 gravações quando se estava já no sétimo dia do prazo legalmente previsto para a 
 interposição do recurso e há muito expirara, quer o prazo máximo de 8 dias a 
 contar de cada uma das sessões de audiência de julgamento (a última sessão em 
 que se registou produção de prova teve lugar em 18-10-2005), quer o prazo de 3 
 dias de que dispunha para reclamar quanto à qualidade da própria gravação. 
 Destarte, torna-se até imperioso salientar que, nos termos do art.° 70, n.° 1, 
 do Decreto-Lei n.° 39/95, de 15 de Fevereiro, durante a audiência, são gravadas 
 simultaneamente uma fita magnética destinada ao tribunal e outra destinada às 
 partes. 
 Assim, dificilmente se concebe – nem vem sequer invocada – uma efectiva 
 impossibilidade de acesso ao suporte material da prova gravada, geradora de 
 justo impedimento, relativamente à não apresentação das motivações de recurso no 
 decurso do prazo de 15 dias previsto na lei para esse efeito. 
 Daí que, por força do que acaba de se expender, não se vislumbre a existência de 
 qualquer interpretação inconstitucional do estatuído nos artigos 107°, n.° 2, do 
 CPP e 146°, n.° 1, do CPC, reportada ao consagrado no art.° 32°, n.° 1, da CRP. 
 Nestes termos, impõe-se concluir que o recurso deduzido pelo arguido A. é 
 manifestamente extemporâneo, uma vez que, à data da sua interposição, estava já 
 precludida, de forma irremediável, a faculdade de reapreciação da matéria 
 objecto do mesmo. 
 
 […].
 
  
 O arguido interpôs então recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da 
 alínea b), do n.º 1, do artigo 70º, da Lei do Tribunal Constitucional, nos 
 seguintes termos:
 
  
 Suscitou o recorrente perante o Tribunal da Relação, na resposta ao parecer do 
 Ministério Público relativamente ao qual foi notificado, que os artigos 334º, 
 
 373º, nº 3, e 113º, todos do Código de Processo Penal, quando interpretados no 
 sentido da decisão condenatória não ser notificada ao arguido ausente, por 
 ofender as garantias de defesa, eram inconstitucionais, face ao disposto no 
 artigo 32º, nº 1, da CRP, por entender tratar-se de um direito inalienável.
 Também suscitou o recorrente a inconstitucionalidade dos artigos 107º do Código 
 de Processo Penal, 146º, nº 1, do Código de Processo Civil e 7º do Decreto-Lei 
 nº 39/95, por ofender de igual forma o artigo 32º, nº 1, da CRP, quando 
 interpretados no sentido da impossibilidade de acesso às cópias da gravação, 
 para além do prazo legal, por inobservância deste prazo por parte da secção de 
 processos, dever ser alegada pelas partes, e não conhecida oficiosamente pelo 
 Tribunal, por dispor nos autos de todos os elementos para desse vício conhecer.
 Nestes termos requer que o recurso seja admitido.
 
  
 Tendo sido o recurso admitido no tribunal recorrido, o relator, no Tribunal 
 Constitucional, por decisão sumária, ao abrigo do disposto no artigo 78º-A, n.º 
 
 1, da Lei do Tribunal Constitucional, decidiu dele não tomar conhecimento, com 
 base nas seguintes ordens de considerações:
 
  
 Relativamente à primeira interpretação normativa – a que se reporta aos artigos 
 
 334º, 373º, n.º 3, e 113º do Código de Processo Penal e que diz respeito à 
 desnecessidade de notificação da decisão condenatória ao arguido ausente -, 
 importa salientar que, só a título acessório, o tribunal recorrido teceu 
 considerações sobre a obrigatoriedade de notificação da sentença condenatória ao 
 arguido ausente.
 Com efeito, a questão a decidir pelo tribunal recorrido era outra: a de saber a 
 partir de que momento se devia contar o prazo para interpor recurso da decisão 
 condenatória.
 E a esta questão respondeu o tribunal recorrido através da aplicação do artigo 
 
 411º, n.º 1, do Código de Processo Penal – nos termos do qual o prazo para 
 recorrer deve contar-se a partir do depósito da sentença na secretaria -, não 
 através da aplicação dos preceitos legais indicados pelo recorrente.
 Importa, pois, concluir, quanto à primeira interpretação normativa identificada 
 pelo recorrente, que a mesma não constituiu o fundamento da decisão recorrida.
 Ora, só pode afirmar-se que a interpretação normativa que se submete à 
 apreciação do Tribunal Constitucional foi aplicada pelo tribunal recorrido, nos 
 termos e para os efeitos do artigo 70º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal 
 Constitucional, quando essa interpretação integra a motivação da decisão 
 recorrida.
 A razão está em que, só nesses casos, o recurso de constitucionalidade possui 
 utilidade: se o tribunal recorrido adoptou a interpretação normativa que se 
 submete à apreciação do Tribunal Constitucional a título meramente acessório ou 
 marginal, nenhuma utilidade tem a sua apreciação pelo Tribunal Constitucional, 
 pois que, seja qual for a decisão que este Tribunal venha a proferir sobre a 
 questão, sempre a decisão recorrida se manterá (pois que o seu sentido não 
 depende da tal interpretação normativa adoptada a título acessório ou marginal, 
 mas apenas da interpretação normativa que constituiu o fundamento da decisão).
 Não pode, assim, conhecer-se do objecto do presente recurso de 
 constitucionalidade, no que se refere à primeira interpretação normativa 
 indicada pelo recorrente, por não estar preenchido um dos seus pressupostos 
 processuais.
 Quanto à segunda interpretação normativa cuja apreciação o recorrente pretende – 
 que se reporta aos artigos 107º do Código de Processo Penal, 146º, n.º 1, do 
 Código de Processo Civil, e 7º do Decreto-Lei n.º 39/95, e que diz respeito à 
 necessidade de alegação pelas partes (e, portanto, inexistência de um dever de 
 conhecimento oficioso pelo tribunal) da impossibilidade de acesso às cópias da 
 gravação -, cumpre também reconhecer que do texto da decisão recorrida não 
 decorre tal entendimento.
 Na verdade, o tribunal recorrido, ao referir, depois de indicar vários elementos 
 dos autos, que “dificilmente se concebe – nem vem sequer invocada – uma efectiva 
 impossibilidade de acesso ao suporte material da prova gravada”, deu claramente 
 a entender que a impossibilidade de acesso ao suporte material da prova gravada 
 constitui uma circunstância que pode decorrer dos próprios autos, não dependendo 
 a sua atendibilidade de alegação pelas partes.
 Dito de outro modo: se o tribunal recorrido entendesse que a impossibilidade de 
 acesso ao suporte material da prova gravada constitui uma circunstância cuja 
 atendibilidade depende de alegação das partes, não se compreenderia a alusão que 
 esse tribunal começou por fazer aos elementos dos autos, pois que lhe bastaria 
 declarar que tal alegação não fora feita, a fim de concluir no sentido de que, 
 ao recorrente não tinha sido impossível aceder ao suporte material da prova 
 gravada. 
 Não pode, assim, conhecer-se do objecto do presente recurso de 
 constitucionalidade, no que se refere à segunda interpretação normativa indicada 
 pelo recorrente, por esta interpretação não ter sido aplicada na decisão 
 recorrida e, assim, não estar preenchido um dos pressupostos processuais do 
 recurso.
 
  
 Desta decisão interpõe o arguido reclamação para a conferência, que, na parte 
 
 útil, tem os seguintes fundamentos:
 
  
 
 […]
 
 7º Quanto à 1ª questão – desnecessidade de notificação da decisão condenatória 
 do arguido ausente:
 
 É um facto que o Tribunal da Relação apenas faz referência ao artigo 411º,  nº 
 
 1, do Código de Processo Penal. 
 Porém não é menos verdade, que, ao pronunciar-se da forma e amplitude que o faz 
 deixa claro que não aceita o entendimento do recorrente, ou seja, na decisão os 
 contextos normativos invocados, embora não lhes faça referência o que na prática 
 conduz à mesma coisa. 
 
 8°. – Na verdade, afigura-se-nos que se não torna indispensável que o juiz 
 indique, na decisão, os normativos susceptíveis de violarem os preceitos 
 constitucionais, embora o deva fazer, sendo suficiente que os afloramentos 
 expressos na decisão, se contenham nas normas invocadas pelo recorrente.
 
 9º - Ao fazer alusão apenas ao citado normativo, o ilustre juiz relator quis 
 dizer que os normativos invocados pelo recorrente artigos 334º, 373º, n.º 3, e 
 
 173°. Do CPP, quando interpretados nos termos do artigo 411º, n°. 1, do CPP não 
 ofendiam as garantias de defesa invocadas pelo arguido, deixando essa 
 interpretação na decisão recorrida, desprezando prazos previstos na lei, e 
 invocados pelo recorrente, sento certo que lhe não assiste razão por tal 
 entendimento encurtar de forma inadmissível e ilegal o direito à defesa.
 
 10º - Direito que assiste ao reclamante e que clama lhe seja concedido tendo em 
 vista a apreciação da decisão de fundo, qual seja, a proferida pelo tribunal da 
 
 1ª instância e que no entendimento do Tribunal da Relação não será objecto de 
 apreciação. 
 
 2ª. Questão:
 
 11º - Do texto da decisão ora reclamada depreende-se que o Tribunal da Relação 
 acabou por admitir que “o acesso ao suporte material da prova gravada constitui 
 uma circunstância que pode decorrer dos próprios autos, não dependendo a sua 
 atendibilidade de alegação pelas partes”. 
 
 12°. – Ora, do texto da decisão recorrida não é isso que resulta.
 
 13º. – Diz a dado passo a douta decisão recorrida – “Porém, quando a ultimação 
 das motivações de recurso não for susceptível de ocorrer; mormente pela demora 
 na disponibilidade das pretendidas cópias, sempre poderá o recorrente usar da 
 faculdade de invocar justo impedimento e de assim vir a ser admitida a prática 
 do acto fora do prazo «norma» de l5 dias…. 
 E acrescenta 
 
 - Todavia, in casu no requerimento de fls. 127 o arguido nada invocou, … 
 solicitou cópias quando se já estava no 7°. Dia do prazo máximo de 8 dias …quer 
 do prazo de 3 dias de que  dispunha para reclamar quanto à qualidade da prova. 
 
  - “Assim dificilmente se concebe — nem vem sequer invocada — uma efectiva 
 impossibilidade de acesso ao suporte material … geradora de justo impedimento, 
 relativamente à não apresentação das motivações de recurso no decurso do prazo 
 de 15 dias…
 
 - Daí que, por força do que se acaba de expender não se vislumbra a existência 
 de qualquer interpretação inconstitucional… pelo que se impõe concluir-se que o 
 recurso deduzido pelo arguido… é manifestamente extemporâneo… e deve ser 
 rejeitado por se verificar causa que devia ter determinado a sua não admissão.”
 
 14º. – Salvo o devido respeito não sufragamos o entendimento do ilustre 
 magistrado reclamado.
 
 15º - Os fundamentos invocados pelo Tribunal da Relação foram bem diferentes dos 
 expressos na decisão proferida pelo Tribunal Constitucional e foi com base na 
 violação dos preceitos invocados pelo recorrente que o tribunal recorrido 
 rejeitou a apreciação do recurso da decisão condenatória. 
 
  
 No seu parecer, o Exmo magistrado do Ministério Público pronunciou-se pelo 
 indeferimento da reclamação por entender que a mesma não põe em causa o 
 essencial da fundamentação nem o sentido da decisão sumária proferida.
 
  
 Vem o processo à conferência sem vistos.
 
  
 
  
 
  
 II Fundamentação
 
  
 
  
 
 2. No recurso para o Tribunal Constitucional, o recorrente pretendia ver 
 analisadas duas questões de inconstitucionalidade: uma referente às normas dos 
 artigos 334º, 373º, nº 3, e 113º, do Código de Processo Penal, quando 
 interpretadas no sentido de a decisão condenatória penal não ter de ser 
 notificada ao arguido ausente, por violação das garantias de defesa consagradas 
 no artigo 32º, nº 1, da CRP; outra relativa às normas dos artigos 107º do Código 
 de Processo Penal, 146º, nº 1, do Código de Processo Civil e  7º do Decreto-Lei 
 nº 39/95, quando interpretadas no sentido de a impossibilidade de acesso às 
 cópias da gravação, para além do prazo legal, por inobservância deste prazo por 
 parte da secção de processos, dever ser alegada pelas partes, e não conhecida 
 oficiosamente pelo Tribunal, por violação da mesma disposição do artigo 32º, nº 
 
 1, da CRP.
 
  
 Por decisão sumária, entendeu-se não tomar conhecimento do recurso por 
 inverificação dos respectivos pressupostos processuais, em relação a uma das 
 interpretações normativas por se considerar que ela não tinha constituído o 
 fundamento principal da decisão recorrida, e em relação a outra com base na 
 ideia de que ela não tinha sido aplicada nessa mesma decisão.
 
  
 O reclamante discorda deste entendimento, quanto àquele primeiro aspecto, por 
 considerar que o Tribunal da Relação, embora não faça uma referência expressa às 
 normas dos artigos 334º, 373º, n.º 3, e 113° do CPP, acaba por aceitar uma 
 interpretação dessas normas desconforme à Constituição por força da aplicação do 
 estabelecido no artigo 411º, n°. 1, do mesmo Código. 
 
  
 O argumento é insubsistente.
 
  
 O recurso de constitucionalidade com fundamento na alínea b) do n.º 1, do artigo 
 
 70º, da Lei do Tribunal Constitucional, como é o caso, pressupõe que, pela 
 decisão recorrida, tenha sido aplicada norma cuja inconstitucionalidade tenha 
 sido suscitada no processo. Não bastará, por isso, uma mera referência de 
 passagem ou a alusão indirecta à norma que vem arguida de inconstitucionalidade 
 para que se considere preenchido o pressuposto processual. Por outro lado, o 
 carácter instrumental do recurso para o Tribunal Constitucional – que se 
 pronuncia apenas sobre questão de inconstitucionalidade – justifica que se 
 considere prejudicado o julgamento da questão, por inutilidade, quando a decisão 
 sobre o recurso de constitucionalidade não possa ter qualquer influência sobre o 
 desfecho da causa (sobre o interesse processual enquanto pressuposto processual 
 do recurso de constitucionalidade, vejam-se, entre muitos outros, os Acórdãos 
 n.º s 93/95, de 21 de Fevereiro, e 317/2004, de 5 de Maio).
 
  
 Não é, por isso, admissível, à partida, que a interpretação normativa que o 
 recorrente põe em causa – e que constitui objecto do recurso – seja aquela que 
 resulte, não directamente da aplicação das normas que são invocadas no recurso, 
 mas indirectamente por efeito da aplicação de um outro preceito legal a que as 
 instâncias recorreram para fundamentar a sua decisão.
 
  
 No caso vertente, o que sucede é que – estando em causa a questão da 
 extemporaneidade do recurso – o Tribunal da Relação considerou que o prazo para 
 interposição do recurso penal se contava a partir do depósito da sentença na 
 secretaria, isso por aplicação do artigo 411º, n.° 1, do Código de Processo 
 Penal, que justamente prevê que o prazo se conte «a partir da notificação da 
 decisão ou, tratando-se de sentença, do respectivo depósito na secretaria». 
 Certo é que, de seguida, o acórdão recorrido também afirma (fazendo expressa 
 referência ao artigo 373º, n.º 3, do CPP) que, não estando o arguido presente na 
 sala de audiência, sempre teria de considerar-se notificado da sentença através 
 da sua leitura perante o defensor constituído (tal como esse preceito prevê). 
 Esse é, no entanto, um argumento meramente lateral e não decisivo para a solução 
 jurídica do caso, como se depreende de um excerto subsequente, onde se lê: 
 
 «[C]ontudo, de acordo com o que deixámos exarado supra, verifica-se que a lei 
 passou a fazer depender a contagem do prazo de recurso do depósito na 
 secretaria, isto, de certo, para evitar incertezas acerca do início do mesmo, 
 atendendo a alguma prática de publicação de sentenças sem que fosse 
 correspondente e simultaneamente facultado às partes o acesso ao seu teor».
 
  
 O acórdão reporta-se, pois, ao artigo 411º, nº 1, do CPP e é a interpretação que 
 dele se faz, em matéria de contagem do prazo de recurso – aliás, na linha do 
 entendimento da jurisprudência do STJ, a que se faz também alusão –, que se 
 considera, no mesmo aresto, não ser susceptível de violar as garantias de defesa 
 do arguido.
 
  
 A questão de constitucionalidade que foi suscitada no processo, por sua vez, não 
 
 é essa, mas uma outra, que se reporta aos artigos 334º, 373º, n.º 3, e 113º do 
 Código de Processo Penal e que diz respeito à desnecessidade de notificação da 
 decisão condenatória ao arguido ausente. Na verdade, os artigos 334º e 373º, n.º 
 
 3, do CPP (enquadrados pela disposição do artigo 113º, que apenas institui as 
 regras gerais em matéria de notificações) apenas se referem às situações de 
 ausência do arguido na audiência, estabelecendo o regime em que esta pode 
 prosseguir sem a sua comparência e determinando uma presunção de notificação do 
 arguido ausente por via da leitura pública da sentença.
 
  
 A norma que foi aplicada ao caso foi, porém, a do artigo 411º, n.º 1 (que manda 
 contar o prazo de recurso do depósito da sentença na secretaria) e dela não se 
 pode depreender um qualquer juízo de constitucionalidade relativamente à 
 inexigência de uma notificação pessoal do arguido quando este se encontre 
 ausente.
 
  
 
 3. O reclamante também suscitou a questão da inconstitucionalidade das normas 
 dos artigos 107º do Código de Processo Penal, 146º, nº 1, do Código de Processo 
 Civil e 7º do Decreto-Lei nº 39/95, por violação do artigo 32º, nº 1, da CRP, 
 quando interpretadas no sentido de que a impossibilidade de acesso às cópias da 
 gravação, para além do prazo legal, por inobservância deste prazo por parte da 
 secção de processos, dever ser alegada pelas partes, e não conhecida 
 oficiosamente pelo Tribunal.
 
  
 As normas dos artigos 107º do Código de Processo Penal e 146º, nº 1, do Código 
 de Processo Civil referem-se à possibilidade legal de as partes, em processo 
 penal ou em processo civil, praticarem acto processual fora de prazo com 
 fundamento em circunstância que não lhe seja imputável e possa caracterizar-se 
 como justo impedimento. Por sua vez, o artigo 7º do Decreto-Lei nº 39/95 
 
 (diploma que veio consagrar a possibilidade de documentação e registo das 
 audiências finais e da prova neles produzida para efeito de recurso) impõe a 
 obrigatoriedade de o tribunal facultar à parte interessada, no prazo de oito 
 dias após a audiência, cópia das gravações de prova.
 
  
 O recorrente alegou que a declaração de extemporaneidade do recurso penal 
 poderia representar uma interpretação inconstitucional daquelas referidas 
 disposições, por violação das garantias de defesa do arguido, no ponto que 
 tornasse exigível (para a prática do acto processual fora de prazo) a invocação 
 do justo impedimento que seja decorrente da própria impossibilidade de o 
 recorrente aceder às gravações por facto que seja imputável à secretaria 
 judicial.
 
  
 O que o acórdão recorrido ponderou a este propósito – depois de descrever o 
 mecanismo legal de interposição de recurso para reapreciação da matéria de facto 
 
 – é que dificilmente se poderia conceber – nem vinha sequer invocada - «uma 
 efectiva impossibilidade de acesso ao suporte material da prova gravada, 
 geradora de justo impedimento, relativamente à não apresentação das motivações 
 de recurso no decurso do prazo de 15 dias previsto na lei para esse efeito».  
 Isso até porque, conforme aí se expôs, nos termos legalmente previstos, «durante 
 a audiência, são gravadas simultaneamente uma fita magnética destinada ao 
 tribunal e outra destinada às partes», o que – infere-se – permitirá facultar 
 imediatamente aos interessados cópia dos registos.
 
  
 Sem excluir, portanto, a hipótese de a parte poder recorrer ao mecanismo 
 processual do justo impedimento quando, em última análise, se depare com uma 
 situação de demora na disponibilização das gravações, o acórdão formula um juízo 
 de constitucionalidade partindo essencialmente da virtualidade do sistema legal 
 para assegurar a apresentação atempada das alegações de recurso, mesmo quando 
 visem a impugnação da matéria de facto.
 
  
 Não há, assim, uma tomada de posição quanto ao carácter de não oficiosidade do 
 conhecimento dos eventuais obstáculos ao cumprimento do prazo para a 
 apresentação das alegações de recurso, ou, dito de outro modo, não decorre da 
 decisão recorrida que tenha sido a não invocação do justo impedimento que tenha 
 determinado a rejeição do recurso por intempestividade.
 
  
 Não se vê, por isso, também motivo, nessa parte, para alterar o julgado
 
  
 III Decisão
 
  
 Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, acordam em indeferir a reclamação e 
 confirmar a decisão reclamada.
 
  
 Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
 
  
 Lisboa, 11 de Julho de 2007
 
  
 Carlos Fernandes Cadilha
 Maria Lúcia Amaral
 Gil Galvão