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Processo nº 583/2007
 
 3ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria Lúcia Amaral 
 
  
 Acordam, em Conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 I
 Relatório
 
  
 
 1.  A. vem reclamar da decisão sumária de fls. 274 e segs., que decidiu não 
 conhecer do objecto do recurso de constitucionalidade por aquele interposto do 
 acórdão do Tribunal da Relação do Porto de fls. 248 e segs., pelo facto de o 
 recorrente não ter suscitado durante o processo, como devia, uma questão de 
 inconstitucionalidade normativa.
 Pode ler-se na fundamentação da decisão ora reclamada:
 
  
 
 3.   O Tribunal da Relação do Porto admitiu (fls. 270 dos autos) o recurso de 
 constitucionalidade que foi interposto por A. do acórdão proferido pela 1ª 
 Secção Criminal daquele mesmo tribunal.
 Porém, e nos termos do nº 2 do artigo 76º da Lei nº 28/82 (Lei do Tribunal 
 Constitucional) tal recurso não deveria ter sido admitido.
 Com efeito, o requerimento por meio do qual o referido recurso é interposto não 
 satisfaz os requisitos do artigo 75º‑A da Lei do Tribunal Constitucional. O 
 recorrente (fls. 268 dos autos) não identifica a norma cuja 
 inconstitucionalidade (ou ilegalidade) pretende que o Tribunal aprecie; não 
 indica qual a norma ou princípio constitucional (ou legal) que considera ter 
 sido violado; não menciona a peça processual em que foi suscitada a questão de 
 inconstitucionalidade ou ilegalidade.
 E nem se diga que, perante a falta de todas estas indicações – razoavelmente 
 exigidas pelos nºs 1 e 2 do artigo 75º‑A, porque necessárias para a delimitação 
 do âmbito dos poderes cognitivos do Tribunal Constitucional –, deveria o juiz 
 convidar o requerente a prestá‑las, nos termos dos nºs 5 e 6 do mesmo artigo.
 
 É que, no caso, não faltam só os requisitos específicos do requerimento do 
 recurso de constitucionalidade. Para além deles faltam os próprios pressupostos 
 do recurso, tal como os configura a Constituição (artigo 277º, nº 1, e artigo 
 
 280º, nº 1) e a Lei do Tribunal Constitucional (artigo 70º).
 Diz o recorrente que interpôs o recurso de constitucionalidade ao abrigo da 
 alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional. Sem razão o 
 diz. Pressuposto deste tipo de recurso é, como se sabe, que a decisão recorrida 
 tenha feito efectiva aplicação de normas cuja inconstitucionalidade tenha sido 
 suscitada, pelo recorrente, durante o processo. Assim é por o recurso de 
 constitucionalidade, em direito português, incidir apenas sobre normas (artigos 
 
 277º, nº 1 e 280º, nº 1, da CRP) e nunca sobre decisões, nomeadamente judiciais. 
 
 
 Ora sucede que A. procurou interpor um recurso de constitucionalidade, não 
 incidente sobre normas, mas directamente respeitante a decisão judicial em si 
 mesma considerada. Ao fazê‑lo, o recorrente agiu como se o Tribunal 
 Constitucional fosse uma instância de amparo: as conclusões de motivação do seu 
 recurso para o Tribunal da Relação do Porto (fls. 204 verso a 207 verso) bem o 
 demonstram. Aí, suscitada é a inconstitucionalidade da própria decisão judicial 
 que o condenara por um crime de condução de veículo em estado de embriaguez 
 
 (fls. 206 verso dos autos):
 
  
 A sentença, na parte recorrida, viola os arts. 9º nº 1, 61º al. b), 71º, 119º 
 al. c), d), e), 283º nº 3 al. c), 311º nº 1 e 3, 359º e 379º do Código de 
 Processo Penal e o art. 32º nº 1 e 5 da Constituição da República Portuguesa
 
  
 e não a inconstitucionalidade de qualquer norma que tal decisão tenha aplicado 
 
 (o facto de, no pedido de aclaração do acórdão do Tribunal de Relação, aparecer 
 de algum modo formulada a questão de inconstitucionalidade da norma é 
 irrelevante; como bem se sabe, os incidentes pós‑decisórios não são meios 
 idóneos para suscitar a questão de constitucionalidade, que deve logicamente ser 
 invocada em momento em que o tribunal a quo ainda possa conhecer da questão 
 
 (Acórdão nº 490/98, disponível em www.tribunalconstitucional.pt e demais 
 jurisprudência aí citada).
 Como o Tribunal Constitucional não pode conhecer da inconstitucionalidade de 
 decisões judiciais – visto que não existe, em direito português, o que em outros 
 ordenamentos se designa por “recurso de amparo” ou “queixa constitucional” – 
 profere‑se, para este caso, Decisão Sumária ao abrigo do nº 1 do artigo 78º‑A da 
 Lei do Tribunal Constitucional, por se entender que, nele, não pode o Tribunal 
 conhecer do objecto do recurso.
 
  
 
  
 
 2.  O reclamante diz o seguinte na sua reclamação: 
 
  
 
 2. CRÍTICA DA DECISÃO RECLAMADA 
 Salvo o devido respeito por opinião contrária, o reclamante entende que se 
 encontram preenchidos os pressupostos do recurso de constitucionalidade e, como 
 tal, dever-se-ia lançar mão do disposto no art° 75°-A n.° 5 e 6 da LTC, como se 
 irá demonstrar. 
 Antes de mais começar-se-á por dizer que o requerimento de interposição de 
 recurso do reclamante está, efectivamente, incompleto, pelo que se deveria fazer 
 uso do disposto no art° 75°-A n.° 5 da LTC. 
 De facto, é entendimento do reclamante que, não só o presente recurso não 
 pretendeu recorrer ao Tribunal Constitucional como instância de amparo de uma 
 decisão judicial em si mesma considerada – porquanto se encontram preenchidos 
 
 “os próprios pressupostos do recurso” –, como deveria também o recorrente ter 
 sido convidado a aperfeiçoar o seu requerimento de interposição de recurso nos 
 termos do disposto no n.° 5 e 6 do artigo 75°-A da Lei 2 8/82. 
 Na decisão reclamada diz-se que no recurso interposto para o Tribunal da Relação 
 do Porto, o recorrente não suscitou de forma processualmente correcta nenhuma 
 questão de inconstitucionalidade. 
 No entanto, não deveria deixar de ser feito o convite ao aperfeiçoamento 
 previsto no n.° 5 e 6 do artigo 75°-A da Lei 28/82, mormente por imperativo 
 legal, e porque seria indicado pelo recorrente a norma legal concreta que se 
 entende violadora da Lei Fundamental, por não se encontrar esta somente arguida 
 na aclaração requerida ao Tribunal da Relação do Porto, conforme resulta da 
 fundamentação da decisão sumária. 
 Tal convite deveria estender-se às várias situações nas quais pode o 
 requerimento de recurso apresentado ser deficiente, ainda que por imperícia do 
 defensor. 
 Tal entendimento, atento o direito de defesa do arguido, veio a postular-se 
 também nos processos contra ordenacionais instaurados nos termos do D.L. n.° 
 
 433/82 (Cfr. Ac TC 320/02 in D.R. de 7/10/2002), o que acentua a importância que 
 um sistema processual justo atribui a todo e qualquer arguido a que se imponha 
 uma pena, sanção acessória, multa ou coima. 
 Deveria então o arguido ter sido convidado a aperfeiçoar o seu requerimento de 
 interposição de recurso, onde indicaria a norma que expressamente arguiu de 
 inconstitucional no entendimento dado pelo tribunal recorrido. 
 Com efeito, para a interposição de um recurso de constitucionalidade nos termos 
 da alínea b) do n.° 1 do artigo 70° da Lei do Tribunal Constitucional, tal lei 
 prevê 3 requisitos: 
 a) Suscitação durante o processo de uma inconstitucionalidade normativa; 
 b) Aplicação dessa norma com o sentido alegadamente constitucional, como 
 critério de decisão da causa; 
 e) Esgotamento prévio dos recursos ordinários. 
 Assim, dos 3 requisitos impostos pela lei do Tribunal Constitucional, a 
 suscitação durante o processo de uma inconstitucionalidade normativa é condição 
 sine qua non para que se possa verificar o pressuposto da aplicação dessa mesma 
 norma com o sentido alegadamente inconstitucional como critério de decisão da 
 causa. 
 Sendo que indubitavelmente neste caso se encontram esgotadas as possibilidades 
 de interposição de recurso ordinário. 
 Vem a presente decisão sumária que ora se reclama fundamentar a improcedência do 
 recurso, porquanto entende não ter sido suscitada durante o processo uma 
 inconstitucionalidade normativa. 
 Ora, o recorrente interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto contendo 
 motivação e conclusões. 
 Assim, na motivação apresentada o recorrente explanou todas as razões de direito 
 que entendia constituírem uma interpretação das disposições legais aplicáveis 
 num sentido inconstitucional. 
 No entanto, o recorrente aceita que nas conclusões do recurso a invocação da 
 inconstitucionalidade venha deficientemente formulada. 
 Apesar disso, dos V pontos nos quais o recorrente estruturou o seu recurso, no 
 ponto I, II e III debruçou-se sobre a inconstitucionalidade da decisão recorrida 
 porquanto enfermava de uma interpretação não conforme com a Lei Fundamental por 
 violação do princípio das garantias de defesa e do contraditório, sendo que dos 
 outros dois pontos em que estruturou o recurso, o IV se debruçou sobre a 
 temática da medida da pena – matéria na qual o recorrente viu parcialmente 
 procedente o seu recurso – e o V, constituído pelas obrigatórias conclusões. 
 Entende-se na decisão sumária que só na aclaração do acórdão proferido pelo 
 Tribunal da Relação do Porto o recorrente suscitou a inconstitucionalidade da 
 interpretação do artigo 283° n.° 3 alínea c) do CPP no sentido de que a acusação 
 não necessita de conter as sanções acessórias em que o arguido pode ser 
 condenado, afrontando tal entendimento o princípio das garantias de defesa e do 
 contraditório previstas no art. 32° n.° 1 e 5 da CRP. 
 Sobre a questão de constitucionalidade, disse-se na motivação e conclusões do 
 recurso o seguinte: 
 O recorrente iniciou a motivação do seu recurso, precisamente com a questão da 
 obrigatoriedade de indicação na acusação de todas as disposições legais 
 aplicáveis: “Dispõe o art. 283°, no seu n.º 3 alínea c), que da acusação deve 
 constar, sob pena de nulidade, a indicação das disposições legais aplicáveis aos 
 factos que resultaram suficientes e indiciariamente demonstrados no inquérito.” 
 Seguidamente, concretizou o exposto sobre a obrigatoriedade da acusação conter 
 todas as disposições legais aplicáveis, ao delimitar a situação ao caso em 
 análise, 
 
 “Acontece que da acusação de fls. 51 e 52 dos autos nenhuma referência é feita à 
 pena acessória de inibição de conduzir, nem ao art. 69° do Código Penal, que 
 prevê precisamente a aplicação, por crime de condução de veículo em estado de 
 embriaguez, de tal pena.” 
 No ponto II da motivação, o recorrente, na sequência do exposto no ponto I, – 
 que se configura como que uma introdução ao debatido nos pontos II e III – 
 pugnou pela procedência do vício da inexistência da sentença na parte em que 
 condena o reclamante na pena acessória e se assim não se entendesse, pela sua 
 nulidade: 
 
 “Com a admissão da acusação fica definitivamente fixado o objecto do processo, e 
 fixa-se nos precisos moldes em que ele é definido na acusação. (Cfr. Ac. TRP de 
 
 12-01-2005, in www.dgsi.pt)” 
 
 “Assim sendo, não havendo na acusação qualquer referência à pena acessória de 
 inibição de conduzir, nem à norma que a prevê – art. 69° do Código Penal – a 
 aplicação daquela norma extravasa o domínio do objecto do presente processo.” 
 
 “Não fazendo parte daquele objecto, a sua concreta aplicação encontra-se fora do 
 alcance dos poderes de cognição do tribunal a quo “. 
 
 “O tribunal a quo ao condenar o recorrente em 4 meses de inibição de conduzir 
 violou o princípio sententia debet esse conformis libello. 
 Na decorrência da estrutura acusatória do nosso Processo Penal é efectiva e 
 definitivamente a acusação que define o thema decidendum do processo. É ela que 
 delimita os poderes de cognição do tribunal, efeito a que Figueiredo Dias 
 apelida de vinculação temática do tribunal. (Figueiredo Dias, Direito Processual 
 Penal, vol. I, pág. 145)” 
 
 “O Ministério Público ao não fazer referência ao art. 69° do Código Penal, não 
 chamou para o objecto do processo a consciência da ilicitude, por parte do 
 recorrente, dos factos relativamente à sanção aplicável por força daquela 
 disposição legal. 
 Não podendo o tribunal recorrido aferir da ilicitude dos factos face à pena 
 acessória de inibição de conduzir, não pode aquele aplicá-la. 
 Ao fazê-lo, a sentença recorrida, na parte em que condena o recorrente a 4 meses 
 de inibição de conduzir é INEXISTENTE.” 
 Seguindo de perto Germano Marques da Silva, in ob. cit., vol. II, pág. 92/93, 
 podemos seguramente dizer que “A categoria da inexistência afasta-se do 
 princípio geral da tipicidade das nulidades e de igual princípio geral da sua 
 sanção”, porquanto “É bem de ver que seria tecnicamente inconcebível, para além 
 de profundamente iníquo, deixar sem tutela vícios do acto mais graves do que os 
 que a lei prevê como constituindo nulidades.” 
 
 “Assim, “A sentença é inexistente quando condena o arguido que não tenha sido 
 acusado ou por facto que não constitua objecto do processo.” 
 
 “Mas mesmo que assim não se entenda, sempre a violação do objecto do processo 
 tem de configurar uma nulidade insanável.” 
 Arguidos os vícios de inexistência ou nulidade da sentença recorrida, o 
 recorrente continuou o desenvolvimento da sua motivação, de acordo com uma 
 graduação lógica, que partindo das nulidades processuais, culminou na arguição 
 da violação da Lei Fundamental. 
 Aliás, logo na primeira consideração do ponto III da motivação expôs o arguido: 
 
 “A sentença, na parte recorrida, viola um outro princípio basilar do Processo 
 Penal – princípio do contraditório. 
 Decorre dos arts. 32º, nº 5 da Constituição da República Portuguesa e 61º alínea 
 b) do Código de Processo Penal como garantia de defesa de qualquer arguido o 
 direito a exercer o contraditório.” 
 E de imediato indicou o arguido a violação concreta que se pretendeu arguir 
 expondo que “Nada se dizendo na acusação deduzida quanto à aplicação ao 
 recorrente, por via do crime que lhe foi imputado, da pena acessória de inibição 
 de conduzir, nem mesmo se fazendo referência ao art. 69° do Código Penal, não 
 podia o recorrente defender-se quanto à aplicação e medida daquela”. 
 Concluindo por referir que a sentença, na parte recorrida “(..) ofende tal 
 basilar princípio da nossa ordem jurídica.” 
 Nas conclusões 25ª a 28ª, expendeu o recorrente considerações bastantes sobre a 
 ofensa dos princípios fundamentais das garantias de defesa e do contraditório: 
 
 “25ª Decorre dos arts. 32°, n.° 5 da Constituição da República Portuguesa e 61º 
 alínea b) do Código de Processo Penal, enquanto garantia de defesa de qualquer 
 arguido, o direito a exercer o contraditório. 
 
 26ª Também sob o argumento da garantia do exercício do direito ao contraditório 
 se impõe a delimitação, na acusação, dos factos e crimes imputados a um arguido, 
 para que este se possa defender (cfr. Ac. TRP de 12-01-2005, in www.dgsi.pt).
 
 27ª Nada se dizendo na acusação deduzida quanto à aplicação ao recorrente, por 
 via do crime que lhe foi imputado, da pena acessória de inibição de conduzir, 
 nem mesmo se fazendo referência ao art. 69° do Código Penal, não podia o 
 recorrente defender-se quanto a tal sanção. 
 
 28ª Mais uma razão para a sentença, na parte recorrida, ser julgada INEXISTENTE 
 pois que ofende tal basilar princípio da nossa ordem jurídica”. 
 Não se pode esquecer que, como se defende nos Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional n°s 248/90 e 17/97 (publicados, respectivamente, no D.R. 2ª 
 série, de 23/01/1991 e de 30/04/1997), “No domínio dos processos de fiscalização 
 concreta de constitucionalidade, ao contrário do que acontece em sede de 
 fiscalização abstracta, não é possível dissociar-se a norma ou normas postas em 
 causa, da própria relação jurídica substancial a que foi ou foram aplicadas, nem 
 tão pouco das circunstâncias objectivas em que essa aplicação ocorreu. E isto é 
 assim porque será a partir da norma concretamente aplicada que se há-de formar o 
 juízo deste Tribunal sobre a eventual invalidade constitucional da referida 
 norma.” 
 Ora, entende o reclamante que o ónus de formular a questão da 
 inconstitucionalidade nas instâncias tem como ratio a possibilidade do 
 conhecimento dessa questão de inconstitucionalidade por essas mesmas instâncias, 
 ou seja, o Tribunal Constitucional deve ser uma 2ª instância em matéria de 
 conhecimento de questões de inconstitucionalidade. 
 E se assim é, pela leitura do acórdão recorrido, claramente se constata que o 
 tribunal recorrido se debruça sobre a questão da inconstitucionalidade arguida. 
 Com efeito, se dúvidas restassem, no requerimento de aclaração tendo a mesma 
 questão sido colocada, a Relação veio a proferir novo acórdão no qual se diz 
 claramente: “Quanto à questão subjacente ao primeiro esclarecimento solicitado, 
 consideramos que o acórdão é suficientemente claro.” 
 Ora, se assim é ainda que o recorrente não tenha colocado correctamente a 
 questão de constitucionalidade, certo é que o tribunal recorrido da mesma 
 conheceu, pelo que a ratio legis do ónus de suscitar a questão de 
 constitucionalidade foi cumprida: o tribunal recorrido conheceu da questão, tal 
 como reafirmou no acórdão que recaiu sobre o pedido de aclaração. 
 De facto, como se disse, o acórdão recorrido pronunciou-se quanto à 
 inconstitucionalidade arguida se bem que de forma sucinta como se transcreve: 
 
 “De qualquer modo, resulta de tudo quanto atrás se referiu que a omissão de 
 referência na acusação à sanção acessória de inibição de conduzir e à norma que 
 a prevê – artigo 69°, n.° 1, alínea a) – em nada viola o principio do 
 contraditório previsto no artigo 35 n.° 5 da Constituição (..)”
 Aliás, foi na esteira desta breve referência à violação da Lei Fundamental que o 
 recorrente requereu a aclaração acórdão, introduzindo com maior ênfase a questão 
 já levantada nas motivações de recurso, ou seja: a de a acusação não fazer 
 referência alguma à aplicação de uma sanção acessória. 
 E este entendimento não pode ser rebatido sob uma análise estritamente 
 formalista, porquanto: 
 a) Ao longo de todo o recurso interposto, o recorrente citou o acórdão do 
 Tribunal da Relação do Porto que, em decisão sobre situação semelhante, julgou 
 inconstitucional por violação do principio do contraditório a interpretação do 
 artigo 283º n.° 3 al. c) do CPP no sentido de não impor que a acusação 
 contivesse a menção à aplicação de uma sanção acessória (cfr. Ac. TRP de 
 
 12-01-2005, in www.dgsi.pt) 
 b) O acórdão recorrido pronunciou-se clara e especificamente sobre a questão de 
 constitucionalidade alegada. 
 E se tal não bastasse, é entendimento deste tribunal, que “Afirmar que uma 
 norma, na interpretação que lhe foi dada por qualquer tribunal afronta a lei 
 fundamental, vale como arguição de inconstitucionalidade e é, assim, fundamento 
 de recurso (Ac. 33/88)”, sendo que este entendimento constitui jurisprudência 
 firme do Tribunal Constitucional (neste sentido, o Acórdão do Tribunal 
 Constitucional de 07/02/1996, in B.M.J. n° 454, pg. 275 e o Acórdão do Tribunal 
 Constitucional de 29/10/1997, in B.M.J. n° 470, pg. 140). 
 Daí que, o recurso interposto deveria ter sido admitido, pronunciando-se este 
 Tribunal sobre se a interpretação do disposto no artigo 283° n.° 3 alínea c) do 
 Código de Processo Penal, no sentido de que na acusação pode ser omitida a 
 aplicabilidade de uma sanção acessória ao arguido, deve ser tida por 
 inconstitucional por violação do artigo 32º n.° 1 e n.° 5 da Constituição da 
 República Portuguesa.
 
  
 O representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional respondeu 
 pela seguinte forma à reclamação:
 
  
 
 1°
 A presente reclamação é manifestamente improcedente. 
 
 2°
 Na verdade, a argumentação do reclamante em nada abala os fundamentos da decisão 
 reclamada, quanto à evidente inverificação dos pressupostos do recurso: não 
 tendo o recorrente suscitado, durante o processo e em termos processualmente 
 adequados, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, é evidente que 
 carece de legitimidade para interpor o recurso tipificado na alínea b) do n° 1 
 do artigo 70° da Lei do Tribunal Constitucional.
 
  
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
  
 II
 Fundamentos
 
  
 
 3.  Adianta-se desde já que a presente reclamação não pode obter provimento, 
 pois não abala os fundamentos em que se baseou a decisão reclamada. 
 Não relevam, desde logo, as considerações do reclamante relativas ao 
 preenchimento dos pressupostos de um recurso de fiscalização concreta de 
 constitucionalidade fundado no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal 
 Constitucional. Com efeito, este Tribunal tem salientado, em aplicação do 
 disposto no artigo 72.º, n.º 2, da mesma Lei, que incumbe ao recorrente o ónus 
 de suscitar a inconstitucionalidade durante o processo de modo 
 procedimentalmente adequado, “o que exige que, ao suscitar-se uma questão de 
 inconstitucionalidade, se deixe claro qual o preceito legal cuja legitimidade 
 constitucional se questiona, ou, no caso de se questionar certa interpretação de 
 uma dada norma, qual o sentido ou a dimensão normativa do preceito que se tem 
 por violador da lei fundamental” – assim o Acórdão n.º 199/88 (publicado no 
 Diário da República, II Série, de 28 de Março de 1989).
 
 É, pois, sobre o recorrente que incumbe o ónus de definir a norma ou dimensão 
 normativa cuja constitucionalidade pretende ver apreciada, não sendo ao Tribunal 
 Constitucional que compete averiguar essa norma – como parece pretender o 
 recorrente, ao afirmar, a fls. 285 verso da presente reclamação, que “(a)o longo 
 de todo o recurso interposto, o recorrente citou o acórdão do Tribunal da 
 Relação do Porto que, em decisão sobre situação semelhante, julgou 
 inconstitucional por violação do princípio do contraditório a interpretação do 
 artigo 283.º n.º 3 al. c) do CPP no sentido de não impor que a acusação 
 contivesse a menção à aplicação de uma sanção acessória (cfr. Ac. TRP de 
 
 12-01-2005, in www.dgsi.pt)”.
 Na presente reclamação afirma-se também que “(o) acórdão recorrido pronunciou-se 
 clara e especificamente sobre a questão de constitucionalidade alegada.” 
 Todavia, verifica-se que, nos termos do já citado artigo 72.º, n.º 2, da Lei do 
 Tribunal Constitucional, os “recursos previstos nas alíneas b) e f) do n.º 1 do 
 artigo 70.º só podem ser interpostos pela parte que haja suscitado a questão da 
 inconstitucionalidade ou da ilegalidade de modo processualmente adequado perante 
 o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a 
 dela conhecer”. Trata-se, como indica a própria epígrafe deste artigo 72.º, de 
 uma regra relativa à “legitimidade para recorrer” – e não à recorribilidade da 
 decisão –, pelo que é necessário que a exigência de suscitação tenha sido 
 cumprida pela parte que vem a interpor o recurso de constitucionalidade. A 
 exigência legal, para que se verifique a legitimidade para recorrer para o 
 Tribunal Constitucional, é no sentido de que a parte recorrente haja suscitado a 
 questão da inconstitucionalidade normativa de modo processualmente adequado 
 perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida (e em termos de este estar 
 obrigado a dela conhecer).
 Reitera‑se, assim, a conclusão essencial sustentada pela Decisão Sumária 
 reclamada: neste caso, não faltou só o cumprimento dos requisitos do recurso de 
 constitucionalidade; o que nele faltou foi a própria perfeição dos pressupostos 
 do recurso.
 Ao caso não é, pois, aplicável o nº 5 do artigo 75º‑A da Lei do Tribunal 
 Constitucional.
 
 É que o ‘convite’ ao aperfeiçoamento a que se refere o preceito não deve ser 
 feito (artigo 137º do Código de Processo Civil, ex vi do artigo 69º da Lei do 
 Tribunal Constitucional) quando não estão preenchidos, no caso, os próprios 
 pressupostos do recurso.
 
  
 III
 Decisão
 
  
 Pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir a presente reclamação e condenar 
 o reclamante em custas, com 20 unidades de conta de taxa de justiça.
 
  
 Lisboa, 11 de Julho de 2007
 Maria Lúcia Amaral
 Carlos Fernandes Cadilha
 Gil Galvão