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Processo nº 564/2007 e 569/2007
 Plenário
 Relatora: Conselheira Maria Lúcia Amaral
 
                                                             
 
  
 
  
 Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
  
 I
 Relatório
 
  
 
 1.  O Partido da Terra‑MPT, através de requerimento subscrito por Paulo 
 Trancoso, na qualidade de Presidente do Partido da Terra, interpôs recurso do 
 despacho da Governadora Civil de Lisboa, de 14 de Maio de 2007, que designou o 
 dia 1 de Julho de 2007 para a realização de eleições intercalares para a Câmara 
 Municipal de Lisboa.
 O recurso deu entrada no Governo Civil de Lisboa, via fax, no dia 15 de Maio de 
 
 2007, pelas 16 h. 35 m.. O recorrente juntou cópia de uma certidão do Tribunal 
 Constitucional.
 O recurso foi remetido pelo Governo Civil de Lisboa ao Tribunal Constitucional, 
 acompanhado de fotocópia autenticada do despacho recorrido.
 O recurso tem a seguinte fundamentação:
 
  
 
 1 – De acordo com o consubstanciado no artigo 15° conjugado com o artigo 228º da 
 Lei 1/2001 de 14 de Agosto, o prazo mínimo para marcação de Eleições Autárquicas 
 Intercalares é de 60 dias, 
 
 2 – Contudo a Exma Senhora Governadora Civil de Lisboa procedeu à marcação com 
 um prazo de 45 dias, 
 
 3 – Com base no prazo referido a data limite para entrega de listas de 
 candidatura é o dia 20 de Maio, 
 
 4 – Situação que vem impossibilitar de forma irremediável a participação de 
 Grupos de Cidadãos Eleitores, a constituição de Coligações e a possibilidade de 
 os pequenos Partidos puderam [sic] exercer de forma digna os seus direitos de 
 participação na vida política de uma Democracia. 
 
  
 
 5 – O exercício dos direitos de cidadania não podem ser praticados sem uma 
 verdadeira participação de todos na construção da cidade. 
 
 6 – Assim o Despacho objecto do presente Recurso peca por ser “contra legem” e 
 por no seu âmago consubstanciar uma violação dos direitos de todos os cidadãos 
 pondo em causa os princípios democráticos e a possibilidade de a cidade de 
 Lisboa viver um Processo Eleitoral verdadeiramente livre e Democrático.
 
  
 
  
 
  
 
 2.  Por seu turno, Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta, na qualidade de 
 primeira subscritora do “Grupo de Cidadãos Eleitores”, constituído nos termos e 
 para os efeitos do artigo 16º, nº 1, alínea c), da Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 
 de Agosto, e na qualidade de candidata a Presidente da Câmara de Lisboa, 
 interpôs recurso do despacho da Governadora Civil de Lisboa, de 14 de Maio de 
 
 2007, que fixou a data das aludidas eleições intercalares.
 A recorrente juntou procuração forense, fotocópias do cartão de eleitor, do 
 cartão de identificação de entidade equiparada a pessoa colectiva e de um recibo 
 do Registo Nacional de Pessoas Colectivas relativo a emolumentos.
 O recurso foi apresentado a 16 de Maio no Tribunal Constitucional, tendo o 
 respectivo Presidente, por despacho da mesma data, determinado a sua remessa ao 
 Governo Civil de Lisboa, que ainda na mesma data, após registado, o reenviou ao 
 Tribunal Constitucional, acompanhado de fotocópia autenticada do despacho 
 recorrido.
 O recurso tem os seguintes fundamentos:
 
  
 
                                                                               1º 
 
 
 A Lei Fundamental prevê o direito de constituição de “Grupos de Cidadãos 
 Eleitores” como direito instrumental de outro direito: o de apresentação de 
 candidaturas para as eleições dos órgãos das Autarquias Locais (Artº 239, nº 4 
 do CRP) 
 
                                                                               2º 
 
 
 A Lei Orgânica 1/2001 de 14 de Agosto atribui a faculdade de apresentação de 
 candidaturas quer aos Partidos Políticos, quer a Coligações de Partidos 
 Políticos, quer aos “Grupos de Cidadãos Eleitores” (Art. 16º, n° 1 alínea c) 
 deste diploma). 
 
                                                                               3º
 A Recorrente e estes cidadãos constituíram-se em Grupo de Cidadãos Eleitores, 
 promoveram o respectivo registo junto da entidade legalmente competente (Doc. 
 junto). 
 
  
 
                                                                               4º 
 
 
 Sempre e só com a finalidade de se agruparem, promoverem e apresentarem a sua 
 candidatura às eleições intercalares à Câmara Municipal de Lisboa. 
 
                                                                               5º 
 
 
 Onde a Recorrente assumirá o lugar de Candidata a Presidente da Câmara. 
 
                                                                               6º 
 
 
 Para que a candidatura do “Grupo de Cidadãos Eleitores” seja validamente 
 proposta terá de ser subscrita por 4000 eleitores por força do que dispõe o Artº 
 
 19º, nºs 1 e 2 da citada Lei Orgânica. 
 
                                                                               7º 
 
 
 Ou seja, apesar de a Lei Orgânica colocar em pé de igualdade os Partidos, as 
 Coligações e os Grupos de Cidadãos, o certo é que aqueles se acham em normal e 
 permanente exercício das suas funções, sendo dotados de órgãos próprios, de um 
 aparelho adequado e hábil para, em poucas horas, constituir uma candidatura. 
 
                                                                               8º 
 
 
 No entanto, um “grupo de cidadãos” para alcançar o benefício e o direito à 
 apresentação de uma candidatura, terá de recolher uma abundante adesão, muito 
 próxima da necessária para constituir um partido político ou erigir uma 
 candidatura à Presidência da República. 
 
                                                                               9º 
 
 
 Com a agravante de os subscritores, naqueles casos, poderem ser obtidos em todo 
 o território nacional e na emigração, num universo de mais de uma dezena de 
 milhão de eleitores, 
 
                                                                               
 
 10º 
 Ao passo que os subscritores dos “grupos de cidadãos” terão de provir dos 
 recenseados na autarquia a eleger – e só dessa autarquia (Artº 19º, nº 4 da Lei 
 Orgânica). 
 
                                                                               
 
 11º 
 Como se tal desigualdade não bastasse, eis que a Sra. Governador Civil de Lisboa 
 designou, no dia 14 de Maio, o dia 1 de Julho de 2007 para a realização da 
 eleição intercalar para a Câmara Municipal de Lisboa. 
 
                                                                               
 
 12º 
 Apesar de a dissolução ou vacatura da Câmara se ter operado no dia 12 de Maio. 
 
                                                                               
 
 13º 
 O que exigiria que o acto eleitoral fosse designado para o dia 14 de Julho ex vi 
 do Art. 222º da Lei Orgânica 1/2001, ou para um Domingo próximo dessa data. 
 
                                                                               
 
 14º 
 Daí que, como se pode facilmente concluir, a designação do dia 1 de Julho, 
 afronta directamente o que impõe o Art. 222°, nº 1 do Diploma Legal referido. 
 
                                                                               
 
 15º 
 Nem se diga que a redução em 25% da duração dos prazos, prevista no Art. 228º 
 desta Lei Orgânica tem aplicação neste particular caso. 
 
  
 
                                                                               
 
 16º 
 Na realidade, o prazo previsto no Art. 222º, nº 1, emana da norma especial 
 dirigida à particular hipótese de eleições intercalares, sendo, pois, caso 
 resolvido pela própria norma que expressamente previne e regula a situação 
 eleitoral em causa. 
 
                                                                               
 
 17º 
 Daí que a redução dos prazos em 25% só pode operar-se relativamente a todos os 
 demais prazos que a lei previne para as eleições não intercalares. 
 
                                                                               
 
 18º 
 Assim, o prazo a que se refere o Art. 20º (55 dias), uma vez reduzido em 25%, 
 ficará a durar 42 dias. 
 
                                                                               
 
 19º 
 Como se conclui, pois, a data do acto eleitoral deve ter lugar em data próxima 
 do dia 14 de Julho de 2007. 
 
                                                                               
 
 20º 
 Não abandona a Recorrente a contradição aparente entre o que dispõe o Art. 222º 
 da Lei Orgânica, dum lado, e o Art. 59º, nº 4 da Lei 169/99 de 18 de Setembro, 
 por outro lado. 
 
                                                                               
 
 21º 
 Na realidade, aquela Lei impõe que “as eleições intercalares a que haja lugar 
 realizam-se dentro dos 60 dias posteriores ao da verificação do facto de que 
 resultam, salvo disposição em contrário”. 
 
                                                                               
 
 22º 
 Ao passo que a norma da Lei 169/99 diz que “As eleições realizam-se no prazo de 
 
 40 a 60 dias a contar da data da respectiva marcação”. 
 
                                                                               
 
 23º 
 São evidentes as antinomias entre uma norma e outra, impondo-se apurar se se 
 complementam ou se a Lei Orgânica, porque posterior, revoga a Lei das Autarquias 
 Locais, neste particular aspecto. 
 
                                                                               
 
 24º 
 Na realidade, enquanto aquela norma da Lei 1/2001 se reporta a todas e quaisquer 
 eleições “a que haja lugar”, o preceito da Lei 169/99 teria de ser interpretado 
 
 à luz da previsão dos seu nºs 1, 2 e 3, ou seja, nos caso de: 
 
 •     Morte, renúncia, suspensão ou perda de mandato; 
 
 •     Esgotamento da possibilidade da sua substituição e desde que não esteja em 
 efectividade de funções a maioria legal dos membros do órgão em causa; 
 
 •     Esgotada, em definitivo, a possibilidade do preenchimento da vaga de 
 Presidente da Câmara. 
 
                                                                               
 
 25º 
 No que diz respeito aos termos “a quo”, enquanto que a Lei Orgânica os fixa a 
 partir do momento da “verificação do facto de que resultam”, 
 
                                                                               
 
 26º 
 Sem definir a natureza desse facto (podendo ser a comunicação do Presidente da 
 Câmara à Assembleia Municipal (Artº 59º, nº 2 ou ao Governador Civil (mesma 
 norma), a deliberação daquele órgão ou a decisão deste, assim como a 
 publicitação da designação de data de eleição intercalar). 
 
                                                                               
 
 27º 
 Tal regime de fixação de termos “a quo” não coincide com o que a Lei 169/99 
 estabelece pois que, para esta Lei, ele deve contar-se “da data da respectiva 
 comunicação”. 
 
  
 
                                                                               
 
 28º 
 Finalmente (e para o que ora mais releva) no que diz respeito ao período 
 intercalar, a Lei 1/2001 diz que as eleições devem realizar-se “dentro dos 60 
 dias posteriores...” 
 
                                                                               
 
 29º 
 Ao passo que a Lei 169/99 diz que tais eleições devem ter lugar” no prazo de 40 
 a 60 dias a contar da data...” 
 
                                                                               
 
 30º 
 Perante estas insanáveis contradições, mandam as regras da interpretação 
 alcançar, a partir destas normas, “o pensamento legislativo, tendo sobretudo em 
 conta a unidade do sistema jurídico, as circunstancias em que a lei foi 
 elaborada” (Artº 9º, nº 1 do Código Civil), sem abandonar a presunção que o 
 legislador consagrou “as soluções mais acertadas que pretende alcançar” (Artº 
 
 9º, nº 3 do mesmo Diploma). 
 
                                                                               
 
 31º 
 Para obter tais objectivos, havemos de nos socorrer de alguns princípios gerais 
 do ordenamento jurídico eleitoral para as autarquias locais. 
 
                                                                               
 
 32º 
 Assim e em primeiro lugar, o prazo intercalar consagrado como regra é o de “80 
 dias de antecedência” e é marcado por decreto do Governo (Artº 15°, nº 1 da Lei 
 
 1/2001). 
 
                                                                               
 
 33º 
 No caso das eleições intercalares os prazos deverão ser reduzidos em 25% (Artº 
 
 228º da mesma Lei). 
 
                                                                               
 
 34º 
 Como se verifica, não foi por acaso que o Artº 222º fixou em 60 dias o prazo 
 intercalar, já que, como se sabe, 60 é 25% de 80. 
 
                                                                               
 
 35º 
 Por outro lado, a publicitação da data da eleição há-de operar-se em Diário da 
 República. 
 
                                                                               
 
 36º 
 Sendo o termo “a quo”, inexoravelmente, o da publicitação dessa data no órgão 
 oficial da República Portuguesa. 
 
                                                                               
 
 37º
 Não sendo legalmente suportável a comunicação particular (ou seja, a ausência de 
 comunicação) do Governador Civil para fixar o momento juridicamente relevante 
 para accionar os mecanismos eleitorais. 
 
                                                                               
 
 38º 
 Tanto mais que, no particular caso das eleições para as Autarquias Locais, o 
 universo de candidaturas não se cinge aos Partidos Políticos. 
 
                                                                               
 
 39º 
 Pelo que os cidadãos terão de ser informados pelo único meio legalmente 
 admissível: o da publicidade dos actos genéricos da Administração Pública ou o 
 da publicitação dos actos legislativos. 
 
                                                                               
 
 40º 
 Daí que o momento juridicamente relevante para fixar o termo “a quo” do prazo 
 intercalar terá de ser o da publicação em Diário da República do acto do 
 Governador Civil que designa o dia para a realização das eleições. 
 
                                                                               
 
 41º 
 Pois é a partir desse momento que todos os prazos consequenciais iniciam a sua 
 contagem decrescente. 
 
  
 
                                                                               
 
 42º 
 Seja para a actualização dos cadernos eleitorais, 
 
                                                                               
 
 43º
 Seja para as transferências de inscrição de eleitores, nos respectivos Cadernos 
 Eleitorais, 
 
                                                                               
 
 44º 
 Seja para a inscrição como novo eleitor, por aquisição de capacidade eleitoral 
 activa, 
 
                                                                               
 
 45º
 E, principalmente, para a constituição dos eventuais “Grupos de Cidadãos 
 Eleitores” que detêm legitimidade eleitoral similar à dos Partidos Políticos ou 
 Coligações de Partidos. 
 
                                                                               
 
 46º 
 Seja, finalmente, para a obtenção das 4.000 subscrições necessárias para 
 adquirir tal legitimidade (que, como se disse, têm de ser alcançadas num 
 universo restritíssimo de cidadãos eleitores). 
 
                                                                               
 
 47º
 Como se verifica, o legislador de 2001 actualizou os requisitos eleitorais, a 
 duração dos prazos intercalares, a redução em 25% desses prazos gerais, 
 tabelares, em caso de eleições intercalares. 
 
                                                                               
 
 48º 
 Nem se diga que uma interpretação puramente literal da expressão “dentro de 60 
 dias” adoptada pelo Art. 222º da Lei Orgânica absorve a redacção do Art. 59°, nº 
 
 4 da Lei das Autarquias Locais. 
 
                                                                               
 
 49º 
 E muito menos se utilize o fácil argumento (lateral e enviesado) que se poderá 
 extrair da expressão final da mesma norma da Lei Orgânica (“salvo disposição 
 especial em contrario”). 
 
                                                                               
 
 50º 
 Quer um, quer outro dos argumentos, abandonariam o pensamento actual do 
 legislador, dum lado. 
 
                                                                               
 
 51º 
 E, acima de tudo, os princípios gerais de direito eleitoral que exigem: 
 
 •     A publicidade e a publicitação da convocatória do acto eleitoral por via 
 dos meios legalmente impostos; 
 
 •     O início do termo a quo (e dos que dele decorrem) para a contagem do 
 período intercalar a partir da publicitação da data do acto eleitoral; 
 
 •     A igualdade de tratamento e de oportunidades entre os Partidos Políticos e 
 os “Grupos de Cidadãos Eleitores” (com expressão constitucional). 
 
                                                                               
 
 52º 
 Todos estes princípios foram abandonados pela Sra. Governador Civil de Lisboa, 
 quando designou o dia 1 de Julho de 2007 para a realização de eleições para a 
 Câmara Municipal. 
 
                                                                               
 
 53º
 O que fez no dia 14 de Maio de 2007. 
 
                                                                               
 
 54º
 Ou seja, com 46 dias de antecedência. 
 
                                                                               
 
 55º
 Sem qualquer publicidade, nos termos legalmente impostos. 
 
  
 
                                                                               
 
 56º 
 Sem permitir aos cidadãos constituir-se em “grupos de cidadãos eleitores”. 
 
                                                                               
 
 57º
 Estiolando todos os prazos, quer o que diz respeito à actualização dos cadernos 
 eleitorais, quer o que se reporta à obtenção de subscrição para as candidaturas 
 para que os Grupos de Cidadãos Eleitores se constituam. 
 
                                                                               
 
 58º 
 Privilegiando de forma acentuada e constitucionalmente inadmissível as 
 candidaturas institucionalizadas por via dos Partidos Políticos. 
 
                                                                               
 
 59º 
 Curiosamente, impedindo absolutamente a constituição de Coligações de Partidos. 
 
                                                                               
 
 60º 
 Já que tinham de ser constituídas e publicitadas até ao dia 14 de Maio, ou seja, 
 o prazo começava e acabava quase no mesmo dia (Artº 16°, nº 5 e 17°, nº 2 da Lei 
 Orgânica). 
 
                                                                               
 
 61º
 Uma vez que o prazo do Art. 17º, nº 2 (reduzido em 25%) era de 48 dias, e entre 
 o dia 15 de Maio e o dia 1 de Julho medeiam 46 dias. 
 
                                                                               
 
 62º 
 Ou seja, nem os Grupos de Cidadãos Eleitores gozam de prazo razoável para se 
 constituírem, nem sequer as coligações de Partidos beneficiam de qualquer 
 hipótese de surgirem. 
 
                                                                               
 
 63º 
 Verifica-se, em suma, que o Acto da Sra. Governador Civil de Lisboa, que designa 
 o dia 1 de Julho de 2007 para a realização de Eleições Intercalares para a 
 Câmara Municipal de Lisboa, enferma dos seguintes vícios: 
 a)   Violação do Artº 239º, nº 4 da CRP; 
 b)  Violação do Artº 13º e Art. 113º, nº 3, alínea b) e c) da CRP; 
 c)   Violação do Artº 16º, nº 1, alínea c) e Artº 19º da Lei Orgânica nº 1/2001 
 de 12 de Agosto; 
 d)  Violação do Artº 222º, nº 1 da Lei Orgânica nº 1/2001 de 14 de Agosto.
 
  
 
  
 O pedido formulado pela recorrente tem o seguinte teor:
 
  
 Neste termos, e nos mais de direito, deve ser julgado procedente o presente 
 Recurso e, consequentemente, declarado que: 
 a)   O Acto da Sra. Governador Civil de Lisboa que designa dia para Eleição 
 Intercalar para a Câmara Municipal de Lisboa deve ser publicado no Diário da 
 República; 
 b)  O termo a quo para os prazos dele decorrentes se inicia com tal publicidade; 
 
 
 c)   O período intercalar entre o termo “a quo” e a data de realização do acto 
 eleitoral não pode provocar uma desigualdade de oportunidades e tratamento entre 
 as diversas candidaturas, maxime o da constituição de Coligações entre Partidos 
 Políticos; 
 d)  O prazo intercalar de 46 dias estiola ou destrói a faculdade constitucional 
 e legal de constituição de Grupos de Cidadãos Eleitores se apresentarem a 
 sufrágio; 
 e)   O prazo legal intercalar entre o termo “a quo” e o acto eleitoral é de 60 
 dias, ou, no mínimo, próximo de 60 dias, face à imposição legal de o acto 
 eleitoral ter de coincidir com o Domingo.
 
  
 
  
 Cumpre apreciar. 
 
  
 
  
 II
 Fundamentação
 
  
 
 3.  Começando pela apreciação do recurso interposto pelo Partido da Terra 
 
 (recurso nº 564/2007).
 O recorrente interpõe, junto do Tribunal Constitucional, recurso do Despacho da 
 Governadora Civil de Lisboa – que designa o dia 1 de Julho de 2007 para a 
 realização das Eleições Intercalares para a Câmara Municipal de Lisboa – ao 
 abrigo do artigo 102º‑B da Lei do Tribunal Constitucional (Lei nº 28/82).
 Com efeito, e de acordo com o nº 2 do artigo 222º da Lei Eleitoral para as 
 Autarquias Locais, é ao governador civil que cabe marcar o dia da realização das 
 eleições intercalares. Assim sendo, a Governadora Civil de Lisboa, ao exarar o 
 despacho datado de 14 de Maio, exerceu competências próprias de um órgão da 
 administração eleitoral, pelo que, nos termos do nº 7 do referido artigo 102º‑B, 
 da sua decisão cabe recurso para o Tribunal Constitucional.
 Não se suscitam dúvidas quanto à tempestividade do recurso, que cumpre o 
 disposto no nº 2 do artigo 102º‑B da Lei nº 28/82. Do mesmo modo se reconhece a 
 legitimidade do recorrente que, sendo um Partido político, goza do direito de 
 formar coligações, designadamente para efeito de apresentação de candidaturas a 
 eleições autárquicas, sendo certo que, na petição do recurso, alegou o mesmo que 
 o acto impugnado impossibilitava a constituição das referidas coligações.
 Dado o curto prazo de interposição de recurso – e a não exigência de patrocínio 
 judiciário no mesmo (nº 6 do referido artigo 102º‑B) – entende‑se finalmente que 
 a invocação do vício do acto foi feita em termos suficientes para que se 
 reconheça o interesse em agir do recorrente.
 
  
 
 4.  O Partido da Terra requer que o Tribunal declare a nulidade do despacho da 
 Governadora Civil por esta ter marcado a data das eleições com uma antecedência 
 de 45 dias e não de 60, o que, no seu entender, violaria as normas conjugadas 
 dos artigos 15º e 228º da Lei Eleitoral para as Autarquias Locais, dos quais 
 resultaria que o prazo mínimo para a realização das eleições intercalares seria 
 de 60 dias.
 Deve, por isso, antes do mais decidir‑se se tem ou não razão, quanto a este 
 ponto, o recorrente, ou seja, se devem ou não estas eleições ser marcadas com 
 uma antecedência não inferior a 60 dias.
 Para este efeito, não são aplicáveis ao caso as normas invocadas pelo recorrente 
 
 (artigos 15º e 228º da Lei Eleitoral para as Autarquias Locais) tendo em conta a 
 existência de normas especiais que valem para a realização das eleições 
 intercalares. 
 Dispõe o nº 1 do artigo 222º da Lei Eleitoral para as Autarquias Locais: 
 
  
 As eleições intercalares a que haja lugar realizam‑se dentro dos 60 dias 
 posteriores ao da verificação do facto de que resultam, salvo disposição 
 especial em contrário.
 
  
 Dispõe o nº 4 do artigo 59º da Lei das Autarquias Locais:
 
  
 As eleições realizam‑se no prazo de 40 a 60 dias a contar da data da respectiva 
 marcação.
 
  
 
  
 De nenhuma destas normas se retira a proibição de fixação de um prazo inferior 
 ao de 60 dias.
 
  
 
  
 Com efeito, elas não podem deixar de ser lidas em conjugação com o disposto no 
 nº 4 do artigo 15º (também da Lei Eleitoral para as Autarquias Locais), segundo 
 o qual o dia dos actos eleitorais recai em domingo, feriado, ou, para o que 
 agora interessa, ainda feriado municipal, pelo que a antecedência de 60 dias 
 nunca deve, evidentemente, ser tida como um prazo que não permita modulações. 
 Ponto é que a sua fixação implique uma antecedência côngrua, adequada a todas as 
 exigências que a realização de um acto eleitoral comporta. Nesta medida, a 
 indicação da Lei das Autarquias Locais (Lei nº 169/99, de 18 de Setembro), 
 segundo a qual as eleições podem ser marcadas entre os 40 e os 60 dias a seguir 
 
 à data da convocação, poderá servir como um critério interpretativo do que deva 
 ser tido como uma antecedência côngrua: nunca menos que 40, não mais do que 60 
 dias.
 Dentro destes parâmetros, a Governadora Civil de Lisboa tinha à sua escolha 
 várias datas possíveis para a marcação do acto eleitoral: escolheu a Senhora 
 Governadora o dia 1 de Julho. Ao fazê‑lo, exerceu o poder que a lei lhe confere.
 No exercício de um tal poder, porém, a Governadora Civil deveria ter ponderado 
 todos os interesses em presença: por um lado, o interesse público em não 
 protelar excessivamente no tempo a situação de crise vivida na Autarquia, e, por 
 outro, a garantia de exercício, por parte de cidadãos e partidos, de direitos, 
 liberdades e garantias de participação política.
 Porém, no caso, tal não ocorreu.
 
  
 
  
 
  
 
 5.  Determina o artigo 228º da Lei das Autarquias Locais:
 
  
 No caso de realização de eleições intercalares, os prazos em dias previstos na 
 presente lei são reduzidos em 25%, com arredondamento para a unidade superior.
 
  
 Esta norma é aplicável quer ao prazo em dias previsto para o anúncio público de 
 apresentação de coligações de partidos e a consequente comunicação da sua 
 constituição ao Tribunal Constitucional (até ao 65º dia anterior à realização da 
 eleição: nº 2 do artigo 17º da Lei Eleitoral para as Autarquias Locais), quer ao 
 prazo em dias previsto para apresentação das listas de candidatos perante o juiz 
 do tribunal competente (e que é até ao 55º dia anterior ao da realização das 
 eleições: artigo 20º, nº 1, da mesma Lei).
 Ao escolher‑se o dia 1 de Julho como data de realização das eleições, o termo do 
 prazo para a apresentação das candidaturas coincidirá – nos termos conjugados 
 dos já referidos artigos 20º e 228º da Lei Eleitoral – com o dia 21 de Maio. Por 
 seu turno, o termo do prazo para o anúncio e comunicação das coligações 
 coincidiria – nos termos conjugados dos artigos 17º, nº 2, e 228º da mesma Lei – 
 com o dia 14 de Maio, ou seja, com o próprio dia em que se emitiu o despacho em 
 que se convocou as eleições.
 Significa isto que o acto do Governo Civil, ao escolher, entre as várias datas 
 possíveis, a de 1 de Julho, tornou inviável o exercício de um direito de 
 participação política com assento expresso no texto constitucional (artigo 239º, 
 nº 4) – o direito à formação de coligações de partidos.
 Por este motivo, é inválido o acto impugnado, por ter decorrido do seu exercício 
 o sacrifício do direito dos partidos a constituírem coligações.
 A consequente anulação do despacho recorrido tem por efeito a necessidade de 
 emissão de um novo despacho que marque a data das eleições, data essa que deverá 
 ser escolhida de forma a assegurar o exercício efectivo dos direitos, liberdades 
 e garantias de participação política, ainda que tal justifique a desconsideração 
 do prazo fixado no nº 1 do artigo 222º da Lei Eleitoral para as Autarquias 
 Locais.
 
  
 
 6.  Na medida em que a anulação do despacho determina uma ampliação do prazo 
 para apresentação de candidaturas de Grupos de Cidadãos, julga‑se prejudicada a 
 apreciação do recurso nº 569/2007, interposto por Maria Helena do Rego da Costa 
 Salema Roseta, na qualidade de primeira subscritora do “Grupo de Cidadãos 
 Eleitores”.
 
  
 III
 Decisão
 
  
 
 7.  Pelos fundamentos expostos, decide‑se:
 
  
 a)      Dar provimento ao recurso apresentado pelo Partido da Terra-MPT anulando 
 o despacho recorrido, sem prejuízo das formalidades procedimentais antes 
 praticadas; e em consequência, 
 
  
 b)      Julgar prejudicado o conhecimento do recurso nº 569/2007, interposto por 
 Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta, na qualidade de primeira 
 subscritora do “Grupo de Cidadãos Eleitores”.
 
  
 
  
 Lisboa, 18 de Maio de 2007
 Maria Lúcia Amaral
 Vítor Gomes
 Benjamim Rodrigues
 João Cura Mariano
 José Borges Soeiro
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Maria João Antunes
 Mário José de Araújo Torres
 Carlos Fernandes Cadilha (vencido nos termos da declaração de
 voto anexa)
 Ana Maria Guerra Martins (vencida conforme declaração de voto
 Anexa)
 Rui Manuel Moura Ramos
 
  
 
  
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 
  
 
  
 Teria rejeitado o recurso apresentado pelo Partido da Terra, por considerar que 
 o recorrente não concretizou o seu interesse processual quanto à impugnação do 
 acto recorrido, com fundamento na violação do direito à apresentação de 
 candidaturas coligadas, e por entender que, nessa circunstância, a eventual 
 violação desse direito apenas poderia ser apreciada oficiosamente pelo Tribunal 
 Constitucional caso pudesse caracterizar um vício de nulidade por ofensa do 
 conteúdo essencial de um direito fundamental (artigo 33º, n.º 1, alínea d), do 
 Código de Procedimento Administrativo), o que não sucede, na hipótese, porquanto 
 a possibilidade de apresentação de candidaturas em coligação constitui um mero 
 princípio do sistema eleitoral (artigo 239º, n.º 4, da Constituição), que apenas 
 indirectamente se repercute no direito fundamental dos cidadãos à participação 
 política (artigo 48º da Constituição).
 
  
 Nestes termos, não julgaria prejudicado a apreciação do recurso apresentado pela 
 
 1ª subscritora do “Grupo de Cidadãos Eleitores”, que suscitou, com legitimidade 
 e em tempo, a questão da impossibilidade de apresentação de candidaturas por 
 grupos de cidadãos.
 
                              
 
                           Carlos Fernandes Cadilha
 
  
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 
  
 
  
 Votei vencida por considerar que não estão reunidos os pressupostos processuais 
 de conhecimento do pedido. 
 
  
 
 É meu entendimento que o acto da Governadora Civil de Lisboa de marcação de 
 eleições intercalares para a Câmara Municipal de Lisboa para o dia 1 de Julho de 
 
 2007, embora provindo de um órgão administrativo, não configura verdadeiramente 
 um acto de administração eleitoral, recorrível para este Tribunal, ao abrigo do 
 artigo 8º, alínea f), da LTC, antes se apresentando como um acto da função 
 política stricto sensu. 
 
  
 Como afirma Jorge Miranda, os actos da função política stricto sensu 
 caracterizam-se por visarem dirigir a actividade do Estado e definir a título 
 primário e global, o interesse público, ao contrário dos actos típicos da função 
 administrativa, que visam a satisfação quotidiana das necessidades colectivas, 
 mediante a necessária subordinação à Constituição e à lei (in Manual de Direito 
 Constitucional, Tomo V, Coimbra, 2004, p. 23).
 
  
 Com efeito, no que diz respeito aos actos de marcação de eleições, todos eles 
 são praticados no exercício de poderes políticos do Presidente da República ou 
 do Governo. A alínea b) do artigo 133º da CRP atribui tal poder ao Presidente da 
 República, órgão de soberania que não participa no exercício da função 
 executiva. E quanto às eleições autárquicas, compete ao Governo a marcação da 
 data do acto eleitoral, por força do n.º 1 do artigo 15º da Lei Eleitoral dos 
 
 Órgãos das Autarquias Locais (aprovada pela Lei Orgânica 1/2001. Ora, tal poder 
 não pode deixar de encontrar o seu fundamento constitucional na alínea j) do n.º 
 
 1 do artigo 197º da CRP (“Praticar os demais actos que lhe sejam cometidos pela 
 Constituição ou pela lei” – com sublinhado nosso), que integra norma 
 constitucional epigrafada de “Competência política”. Caso estivéssemos perante 
 um verdadeiro acto de administração eleitoral, tal poder encontrar-se-ia 
 certamente em alguma das alíneas do artigo 199º da CRP, correspondente à 
 
 “Competência administrativa”.
 
  
 Não se vislumbram razões para qualificar o acto de marcação de eleições 
 autárquicas intercalares do Governador Civil de modo diverso dos anteriores, 
 atento o manifesto paralelismo de situações.  
 
  
 Tendo chegado a esta conclusão, considero que este Tribunal não é competente 
 para conhecer dos pedidos formulados pelos recorrentes, ficando, assim, 
 prejudicado o conhecimento de fundo da matéria em apreço.
 Lisboa, 18 de Maio de 2007
 Ana Maria Guerra Martins