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Processo n.º 39/07
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Gil Galvão
 
  
 
  
 Acordam em conferência na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 I – Relatório
 
  
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, A., (ora 
 reclamada) intentou, em 2 de Março de 2004, contra B., Lda, (ora reclamante), 
 acção declarativa emergente de contrato de trabalho, no âmbito da qual pedia, 
 nomeadamente, a condenação da Ré a pagar-lhe certas quantias. Após diversas 
 vicissitudes processuais, veio a Ré, ora reclamante, invocando justo 
 impedimento, apresentar a sua contestação. Por decisão do Tribunal de Trabalho 
 de Aveiro, de 16 de Junho de 2004, foi julgado “não verificado justo 
 impedimento” e, consequentemente, não admitida “a contestação/reconvenção”. 
 Inconformada com esta decisão, agravou a Ré para o Tribunal da Relação de 
 Coimbra. Tendo sido determinado que o recurso teria subida diferida, reclamou a 
 Ré para o Presidente do Tribunal das Relação de Coimbra, requerendo subida 
 imediata. Este, porém, por despacho de 18 de Novembro de 2004, indeferiu a 
 reclamação. Prosseguiram, então, os autos, sendo proferida sentença em 10 de 
 Dezembro de 2004, na qual, considerando-se que “a Ré não contestou 
 atempadamente” e “confessados os factos articulados pela A”, se julgou a acção 
 procedente e se condenou aquela ao pagamento de determinadas quantias.
 
  
 
 2. Inconformada, a Ré apelou para o Tribunal da Relação de Coimbra, o qual, por 
 acórdão de 16 de Junho de 2005, conhecendo do agravo em tempo interposto, negou 
 provimento a este e julgou improcedente a apelação. Notificada, veio a Ré 
 requerer aclaração, tendo sido proferido novo acórdão em 19 de Janeiro de 2006 
 no qual se mantiveram rigorosamente aquelas decisões.
 
  
 
 3. Apresentou, então, a Ré um requerimento de recurso de revista para o Supremo 
 Tribunal de Justiça, apresentando as respectivas alegações. Por despacho de 1 de 
 Setembro de 2006, do Conselheiro relator no Supremo Tribunal de Justiça, não foi 
 o recurso admitido nem como revista, nem como agravo continuado. Reclamou a Ré, 
 ora reclamante, para a conferência, a qual, por acórdão de 11 de Outubro de 
 
 2006, não admitiu o recurso, indeferindo a reclamação deduzida.
 
  
 
 4. Notificada desta decisão, é interposto recurso, através do seguinte 
 requerimento:
 
 “[...], tendo-se tornado definitivo o douto Acórdão em que se decidiu pela 
 inadmissibilidade dos recursos interpostos, vem, respeitosamente, nos termos e 
 para efeitos do disposto no n.° 2 do Art.° 75º da LTC, requerer a interposição 
 de recurso para o Tribunal Constitucional.
 O presente recurso é interposto nos termos e para efeitos do disposto no Art.º 
 
 75.°-A da Lei n.° 28/82, de 15 de Novembro, ao abrigo do disposto na alínea b) 
 do n.° 1 do Art.° 70.º do mesmo Diploma Legal, reportando-se às doutas Decisões 
 recorridas, proferidas na 1.ª e 2ª. Instância, para declaração da 
 inconstitucionalidade das normas do Art.° 146.°, n.°s 1 e 2, do CPC, na 
 interpretação que delas é feita no douto Despacho recorrido da 1.ª Instância, 
 bem como no douto Acórdão proferido no Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, 
 por violação do disposto nos Art.°s 20.º, 202.° e 205.° da Const. da República 
 Portuguesa (tendo aquela inconstitucionalidade sido invocada nas alegações de 
 Agravo - conclusões VII e VIII - e de Revista - conclusões V a XV, inclusivé), 
 e, ainda, para declaração de inconstitucionalidade das normas do n.° 1, alíneas 
 c) e d) do Art.° 668.° e do Art.° 146°, n.°s 1 e 2, do CPC. no sentido em que as 
 mesmas são interpretadas e aplicadas naquele douto Acórdão da Relação de 
 Coimbra, por violação das ditas normas da CRP (tendo a inconstitucionalidade 
 sido invocada nas conclusões I a IV, inclusivé, XI e XV da alegações de 
 Revista).”
 
  
 
 5. Neste Tribunal, o relator proferiu, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 
 
 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei 
 n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decisão sumária no sentido do não conhecimento 
 do objecto do recurso. É o seguinte, na parte agora relevante, o seu teor:
 
 “[...] Após diversas vicissitudes processuais que ora não relevam, foi o recurso 
 admitido por despacho de 27 de Novembro de 2006. Cabe, antes de mais, decidir se 
 pode conhecer-se do objecto do recurso, uma vez que esta decisão de admissão não 
 vincula o Tribunal Constitucional (cfr. art. 76º, n.º 3, da Lei do Tribunal 
 Constitucional - LTC).
 
 6.1. Em primeiro lugar, há que referir que o recurso previsto na alínea b) do 
 n.º 1 do artigo 70º da LTC só pode ser interposto, conforme resulta do n.º 2 do 
 mesmo artigo, de decisões que não admitam recurso ordinário. Assim - e desde 
 logo – é necessário concluir que um tal recurso nunca poderia, ao contrário do 
 que pretende a recorrente, incidir sobre a interpretação feita na decisão do 
 Tribunal de 1ª instância, cuja sentença se mostra naturalmente “consumida” pelo 
 acórdão proferido pelo Tribunal da Relação.
 
 6.2. Por outro lado, o recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da 
 LTC visa submeter à apreciação deste Tribunal a apreciação da 
 constitucionalidade de norma(s) jurídica(s), e não das decisões judiciais que as 
 aplicam, e pressupõe, designadamente, que o recorrente tenha suscitado, de modo 
 processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, a 
 inconstitucionalidade da(s) norma(s) que pretende ver apreciada(s) pelo Tribunal 
 Constitucional. Vejamos se tal aconteceu.
 
 6.2.1. Refere a recorrente, no requerimento de interposição do recurso, em 
 cumprimento do dever que lhe incumbe de indicar a peça processual em que 
 suscitou a “inconstitucionalidade das normas do Art.° 146.°, n.°s 1 e 2, do 
 CPC”, que o fez “nas alegações de Agravo - conclusões VII e VIII - e de Revista 
 
 - conclusões V a XV, inclusivé”. Ora, sendo inteiramente irrelevante a 
 suscitação que porventura tivesse sido efectuada na alegação do recurso de 
 revista - que, aliás, nem sequer foi admitido - uma vez que não foi esse o 
 tribunal que proferiu a decisão recorrida, há que verificar se nas invocadas 
 conclusões VII e VIII das alegações do recurso de agravo, tal aconteceu.
 Vejamos, então, se nessa peça processual, a recorrente suscitou “de modo 
 processualmente adequado”, a questão de constitucionalidade que agora pretende 
 ver apreciada. Nas referidas conclusões, a recorrente, após declarar que “não 
 podia o douto despacho recorrido indeferir aquela invocação do justo 
 impedimento”, afirma o seguinte:
 
 “[...] VII - Assim não se entendendo no douto despacho recorrido violou-se o 
 disposto quer no citado art° 146° do CPC, quer até, o disposto no art° 20°, 202° 
 e 205° da CRP 
 VIII - Além disso a recorrente não invocou apenas o justo impedimento - o que 
 fez subsidiariamente e para o caso de não ser atendido o pedido de que se 
 considerasse não haver fundamento para que tivesse decorrido o prazo p ara a 
 prática do acto - o que não foi considerado no douto despacho recorrido que 
 assim e salvo o devido respeito, contém omissão de pronúncia, em violação do 
 disposto no art° 668° n° 1 d) do CPC. Contra alegou a agravada defendendo a 
 justeza do despacho impugnado, tendo a Ex. ma Sr.ª Juíza, sustentado 
 tabelarmente a decisão que tomou.[...]”
 Ora, esta forma de proceder, não corresponde, manifestamente, ao cumprimento 
 mínimo do ónus de suscitação decorrente do n.º 2 do artigo 72º da LTC, uma vez 
 que basta ler essas conclusões para se constatar que não está suscitada, de modo 
 processualmente adequado, nenhuma questão de constitucionalidade normativa. Com 
 efeito, se atentarmos no seu teor, verificamos que a recorrente não cuida aí de 
 imputar, como devia, a violação da Constituição a qualquer norma, mas, quando 
 muito, à própria decisão recorrida. Aliás, sublinhe-se, quando se sustenta que 
 determinada postura é, simultaneamente, violadora de preceitos do ordenamento 
 jurídico infra-constitucional e de normas constitucionais só se pode concluir 
 que se está a questionar a própria decisão judicial e não a constitucionalidade 
 dos preceitos ordinários. Mas, nessa hipótese, é pacífico que não está aberta 
 via de recurso para este Tribunal, já que é jurisprudência pacífica e 
 sucessivamente reiterada que, estando em causa a própria decisão em si mesma 
 considerada, não há lugar ao recurso de fiscalização concreta de 
 constitucionalidade vigente em Portugal. Assim resulta do disposto no artigo 
 
 280º da Constituição e no artigo 70º da Lei n.º 28/82, e assim tem sido afirmado 
 pelo Tribunal Constitucional em inúmeras ocasiões. Assim sendo, não se pode 
 conhecer da questão colocada.
 
 6.2.2. Pretende, ainda, a recorrente a “declaração de inconstitucionalidade das 
 normas do n.° 1, alíneas c) e d) do Art.° 668.° e do Art.° 146°, n.°s 1 e 2, do 
 CPC” Alega que “a inconstitucionalidade [teria] sido invocada nas conclusões I a 
 IV, inclusivé, XI e XV da alegações de Revista”. Ora, independentemente da 
 questão de saber se o terá sido ou não, o facto é que, ainda que tal tivesse 
 acontecido, não deixaria essa alegada suscitação de ser inteiramente irrelevante 
 para o presente recurso, uma vez que a decisão recorrida é o acórdão da Relação 
 de Coimbra e, consequentemente, haveria de ter sido perante este Tribunal, antes 
 de proferida a decisão recorrida, que a questão de constitucionalidade deveria 
 ter sido suscitada. Não o tendo sido, não se pode dela conhecer.
 
 7. Em face do exposto, há que concluir que se não pode conhecer do objecto do 
 recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do 
 Tribunal Constitucional, por manifesta falta dos seus pressupostos de 
 admissibilidade.[...]”
 
  
 
 6. Inconformada, veio a ora reclamante, ao abrigo do disposto no artigo 78º-A, 
 nº 3, da LTC, reclamar para a Conferência, afirmando, nomeadamente, o seguinte:
 
 “[...] 5 — Assim, esgotadas as vias de recurso ordinário, a ora Reclamante, 
 invocando o disposto no n.º 2 do Artigo 75º da LTC, requereu a interposição de 
 recurso para este Tribunal. 
 
 [...]
 
 7 — Salvo sempre o devido respeito pela douta Fundamentação da douta Decisão ora 
 impugnada, em nenhum outro momento anterior poderia a ora Reclamante submeter à 
 apreciação deste Tribunal as inconstitucionalidades anteriormente suscitadas, 
 que sempre, pela via do recurso ordinário, foi submetendo ao Tribunal Superior, 
 a não ser a partir do momento em que, em recurso ordinário, o Tribunal ad quem 
 considerou inadmissível tal recurso, por douta Decisão transitada, pois só então 
 ficou esgotada a via do recurso ordinário. 
 
 8 — Por outro lado, nunca as doutas Decisões anteriormente proferidas sobre ‘as 
 questões de constitucionalidade’ transitaram (hoc sensu) em julgado, mantendo-se 
 em aberto a possibilidade de submeter a sua apreciação a este Venerando 
 Tribunal.
 Termos em que, e melhores de direito, que desde já se consideram 
 proficientemente supridas, submete a questão da admissibilidade do presente 
 recurso à apreciação de V. Exas., requerendo seja proferida douta Decisão no 
 sentido da admissibilidade do presente recurso, com fundamento nas normas legais 
 citadas, as quais, salvo sempre o devido respeito pela opinião contrária, foram 
 violadas na douta Decisão ora impugnada.[...]”
 
  
 
 7. Notificada a reclamada, nada disse.
 
  
 Dispensados os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
  
 III – Fundamentação
 
  
 
 8. Na decisão sumária reclamada concluiu-se no sentido da impossibilidade de 
 conhecer do objecto do recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º1 do 
 artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, no essencial, por não ter o 
 recorrente suscitado, de modo processualmente adequado e perante o tribunal que 
 proferiu a decisão recorrida, como exige o n.º 2 do art. 72º da Lei do Tribunal 
 Constitucional, qualquer questão de constitucionalidade normativa susceptível de 
 integrar o recurso que interpôs.
 
  
 A ora reclamante pretende contestar esta conclusão, invocando que “em nenhum 
 outro momento anterior poderia a ora Reclamante submeter à apreciação deste 
 Tribunal as inconstitucionalidades anteriormente suscitadas, que sempre, pela 
 via do recurso ordinário, foi submetendo ao Tribunal Superior, a não ser a 
 partir do momento em que, em recurso ordinário, o Tribunal ad quem considerou 
 inadmissível tal recurso, por douta Decisão transitada, pois só então ficou 
 esgotada a via do recurso ordinário.”
 
  
 Manifestamente, porém, sem qualquer razão. Na verdade, como já se demonstrou na 
 decisão sumária reclamada, em termos que não são minimamente abalados pela 
 presente reclamação, pelo que agora se reiteram, o recurso não pode ser 
 conhecido, não porque as questões só tenham sido colocadas ao Tribunal 
 Constitucional após esgotadas as vias de recurso ordinário, mas sim porque, ao 
 contrário do que sustenta a reclamante, sem, todavia, adiantar qualquer facto 
 que o comprove, nenhuma questão de constitucionalidade normativa foi suscitada 
 perante o Tribunal que proferiu a decisão recorrida, podendo e devendo sê-lo, 
 não havendo na decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Coimbra nada de 
 insólito ou de imprevisível.
 
  
 
  
 III - Decisão
 
  
 Nestes termos, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, 
 confirmar a decisão reclamada no sentido do não conhecimento do recurso.
 Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 Lisboa, 12 de Março de 2007
 Gil Galvão
 Bravo Serra
 Artur Maurício