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Processo n.º 116/04
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Vítor Gomes
 
  
 
  
 
  
 
                  Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
                  
 
 1. A. impugnou, no Tribunal Central Administrativo, o despacho do Ministro 
 Adjunto do Primeiro Ministro, de 25-5-98, que homologou a lista de classificação 
 final do concurso interno condicionado de acesso, para preenchimento de uma vaga 
 de assessor principal da Carreira Técnica Superior, do Quadro de Pessoal do 
 Gabinete de Planeamento e de Coordenação do Combate à Droga (GPCCD), em que foi 
 graduado em 2.º lugar, cabendo o 1º lugar a B..
 
  
 
                  O Tribunal Central Administrativo concedeu provimento ao 
 recurso contencioso e anulou o acto recorrido com fundamento na violação do 
 artigo 5.º, n.º 1, alínea c) do Decreto-Lei n.º 498/88, de 30 de Dezembro. 
 Outros fundamentos da impugnação do acto recorrido foram julgados improcedentes.
 
  
 
                  Desta decisão interpuseram recurso para o Supremo Tribunal 
 Administrativo:
 
                  - a título principal, a contra-interessada e a autoridade 
 recorrida (o Ministro da Saúde, que sucedera na competência do autor do acto, 
 nos termos do artigo 22.º, n.º 3, da Lei Orgânica do XV Governo Constitucional);
 
                  - a título subordinado, o recorrente contencioso (e ora 
 recorrente).
 
  
 Por acórdão de 26 de Novembro de 2003, o Supremo Tribunal Administrativo 
 concedeu provimento ao recurso principal e negou provimento ao recurso 
 subordinado.
 
  
 
                  Deste acórdão vem o presente recurso para o Tribunal 
 Constitucional, interposto pelo recorrente A. mediante requerimento do seguinte 
 teor:
 
  
 
 “a) O recurso é interposto ao abrigo do disposto nas alíneas b), do n.º 1, do 
 artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção dada pela Lei n.º 
 
 85/89, de 7 de Setembro;
 b) Pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade da norma constante do 
 artigo 148.º, n.º 1, do Estatuto dos Magistrados Judiciais – na redacção 
 emergente da Lei n.º 81/98, de 3 de Dezembro – (aplicada por remissão do artigo 
 
 77.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais), quando interpretada 
 no sentido segundo o qual admite que jurista que integre o CSTAF pode exercer o 
 patrocínio judiciário no âmbito dos tribunais administrativos e, 
 consequentemente, no âmbito do presente recurso;
 c) Tal norma viola o disposto nos artigos 203.º, 13.º e 20.º, n.º 4 da CRP e o 
 artigo 10.º da DUDH;
 d) O recurso é ainda interposto ao abrigo da alínea i) do n.º 1, do artigo 70.º, 
 da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção dada pela Lei n.º 85/89, de 7 
 de Setembro;
 e) Pretendendo-se ver apreciada a ilegalidade da norma a que se refere a alínea 
 b) deste requerimento, interpretada nos termos consignados na mesma alínea;
 f) Tal norma viola o artigo 6.º, n.º 1 da CEDH;
 g) Finalmente, o presente recurso é interposto ao abrigo do disposto na alínea 
 b), do n.º 1, do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção 
 dada pela Lei n.º 85/89, de 7 de Setembro;
 h) Pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade das normas constantes do 
 regulamento do concurso interno condicionado de acesso para preenchimento de uma 
 vaga de assessor Principal da Carreira Técnica Superior do Quadro de Pessoal do 
 GPCCD, consubstanciado na Ordem de Serviço n.º 6/98, que, numa escala de zero a 
 vinte valores atribuíram à posse de Doutoramento a pontuação de vinte e à posse 
 de licenciatura a pontuação de dezoito valores;
 i) Tais normas ofendem o princípio da proporcionalidade, constante do artigo 
 
 266.º, n.º 2 da CRP;
 j) As questões da inconstitucionalidade e de ilegalidade vertidas nas alíneas a) 
 a f) foram suscitadas nas contra-alegações de recurso jurisdicional, enquanto a 
 questão de inconstitucionalidade vertidas nas alíneas h) e i) foi suscitada na 
 petição de recurso.”
 
  
 
  
 
                  Notificadas as partes para alegações, o recorrente alegou e 
 conclui nos seguintes termos:
 
 “1. No douto aresto recorrido, entendeu-se que o facto um jurista que integrava 
 o CSTAF exercer o patrocínio judiciário no âmbito dos tribunais administrativos 
 e, designadamente, no âmbito do presente recurso, era admissível à luz do 
 disposto no artigo 148.º, n.º 1, do EMJ (na redacção emergente da Lei n.º 81/98, 
 de 3 de Dezembro), já que se entendeu que tal preceito não violava o disposto 
 nos artigos 203.º, 13.º, 20.º, n.º 4 da CRP, 10.º da DUDH e 6º, n.º 1, da CEDH.
 
 2. Porém, tal preceito viola frontalmente esses normas, na medida em que, o 
 princípio da independência dos tribunais zela implicitamente pelo princípio da 
 imparcialidade, que a independência visa garantir.
 
 3. O princípio da independência dos tribunais garante-se pela proibição de 
 quaisquer situações que possam, em abstracto, levar a que esses Juízes possam 
 sentir-se ameaçados na sua independência.
 
 4. O facto de um dos membros do CSTAF órgão que, nos termos da lei, nomeia, 
 coloca, transfere, promove e exerce a acção disciplinar sobre juízes dos 
 tribunais administrativos e fiscais, exercer o patrocínio forense no âmbito da 
 jurisdição administrativa e fiscal é, em abstracto, susceptível de diminuir a 
 isenção e a independência dos magistrados chamados a julgar os litígios em que o 
 mesmo intervenha.
 
 5. Entender o contrário leva, ademais, a que se permita a criação de uma 
 aparência de falta de independência e, consequentemente, de imparcialidade, do 
 tribunal chamado a pronunciar-se nessas circunstâncias, já que o direito a um 
 processo justo e equitativo apenas se garante quando o tribunal é independente e 
 imparcial e parece ser independente e imparcial.
 
 6. Ao mesmo tempo e porque um processo equitativo exige, como elemento 
 co‑natural, que cada uma das partes tenha possibilidades razoáveis de defender 
 os seus interesses numa posição não inferior à parte contrária; ou, de outro 
 modo, deve ter a garantia de apresentar o seu caso perante o tribunal em 
 condições que não a coloquem em substancial desvantagem face aos eu oponente, e 
 porque os princípios do contraditório e da igualdade de armas são elementos 
 incindíveis de um processo equitativo, a interpretação preconizada pelo Tribunal 
 a quo contraria este princípio e coloca em causa a igualdade das partes perante 
 a lei, na medida em que uma delas aparece na lide em posição de poder 
 influenciar a carreira de quem vai decidir.
 
 7. Pelo exposto, a interpretação e aplicação do artigo 148.º, n.º 1, do EMJ nos 
 termos expostos, contrariou o disposto nos artigos 203.º, 13.º, 20.º, n.º 4 da 
 CRP e 10.º da DUDH.
 
 8. Bem como o artigo 6.º, n.º 1, da CEDH.
 
 9. Pelo que o preceito interpretado nesses termos é inconstitucional e ilegal.
 
 10. E nem se diga que esta solução é desproporcionada por impedir juristas 
 ilustres, professores de direito e advogados de fazerem parte do CSTAF já que, 
 os preceitos constitucionais em apreço interpretados e aplicados como se 
 defendem, só impedem que esses juristas actuem no âmbito da jurisdição 
 administrativa e fiscal, não impedindo que continuem a exercer o seu labor 
 noutras jurisdições.
 
 11. A norma constante do Regulamento do Concurso Interno Condicionado de Acesso 
 para Preenchimento de Uma vaga de Assessor Principal da Carreira Técnica 
 Superior do Quadro de Pessoal do GPCCD, consubstanciado na Ordem de Serviço n.º 
 
 6/98, que, numa escala de zero a vinte valores atribuíram à posse de 
 Doutoramento a pontuação de vinte e à posse de Licenciatura a pontuação de 
 dezoito valores ofende o princípio constitucional da proporcionalidade, vertido 
 no artigo 266.º, n.º 2, da CRP.
 
 12. De facto, a atribuição de uma diferença relativa de apenas dois pontos, na 
 escala de 0 a 20 valores, entre a posse do grau de Doutor e a posse do grau de 
 licenciado, anula a diferença relativa intrinsecamente existente entre estes 
 dois graus académicos.
 
 13. Diferença relativa essa que é espelhada na lei vigente (cfr. Decreto-Lei n.º 
 
 216/92, de 13 de Outubro) que regula o quadro jurídico de obtenção dos graus de 
 Mestre e de Doutor e que condiciona, mas não esgota, a obtenção destes graus à 
 posse de licenciatura.
 
 14. Exigindo ainda, para a obtenção do grau de Mestre uma classificação final de 
 licenciatura mínima de 14 valores, a submissão a um curso de Mestrado e a 
 aprovação de uma dissertação e ser discutida em público.
 
 15. E que exige, para a obtenção do grau de Doutor a posse do grau de Mestre ou 
 de uma licenciatura com classificação final mínima de 16 valores, ao que acresce 
 a apreciação de um currículo e a apresentação e discussão pública de uma prova 
 que terá que ter um carácter inovatório.
 
 16. Estes requisitos implicam que a obtenção do grau de Doutor pressuponha para 
 além do mérito intrínseco do próprio candidato em grau superior ao do mero 
 licenciado, investigações aprofundadas de vários anos, a serem submetidas ao 
 escrutínio público de um júri.
 
 17. Pelo que, ao estabelecer-se uma diferença relativa de apenas dois valores, 
 numa escala de 0 a 20 num item em que apenas está em causa a posse de 
 habilitações literárias e não qualquer outro factor, atribuiu-se um valor 
 excessivo ao grau de Licenciado por referência ao grau de Doutor.
 
 18. Pelo que a norma regulamentar em causa foi interpretada e aplicada em 
 violação do disposto no artigo 266.º, n.º 2, da CRP.
 Nestes termos, deve a norma constante do artigo 148.º, n.º 1, do EMJ ser julgada 
 inconstitucional quando interpretada e aplicada nos termos segundo os quais um 
 Jurista membro do CSTAF pode exercer o patrocínio judiciário na jurisdição 
 administrativa e fiscal.
 Mais deve a norma constante do Regulamento de Concurso Interno Condicionado de 
 Acesso para Preenchimento de Uma vaga de Assessor Principal da Carreira Técnica 
 Superior do Quadro de Pessoal do GPCCD, consubstanciado na Ordem de Serviço n.º 
 
 6/98, que, numa escala de zero a vinte valores atribuiu à posse de Doutoramento 
 a pontuação de vinte e à posse de Licenciatura a pontuação de dezoito valores 
 ser julgada inconstitucional quando interpretada e aplicada nos termos segundo 
 os quais não viola o princípio constitucionalidade da proporcionalidade.”
 
  
 
                  Além disso, o recorrente juntou dois pareceres técnicos que diz 
 reportados às questões tratadas nos números 11. a 18. das conclusões do recurso.
 
  
 
                  O Ministro da Saúde alegou no sentido do não provimento do 
 recurso, concluindo nos termos seguintes:
 
  
 
 “I. A imputação de inconstitucionalidade e ilegalidade à interpretação do n.º 1 
 do artigo 148.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais que fez vencimento no 
 acórdão recorrido tem por pretexto a situação pessoal do subscritor das 
 presentes alegações. Efectivamente, é pelo facto de o consultor designado ser 
 membro do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais e exercer a 
 advocacia e a consultoria que a interpretação em causa vem apelidada de 
 inconstitucional.
 II. Quer a Constituição quer a lei evoluíram em sentido concordante para a 
 determinação de que aos membros não Juízes do Conselho Superior da Magistratura 
 
 (e do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais) se aplicam as 
 garantias dos magistrados mas não as incompatibilidades. Assim o n.º 2 do artigo 
 
 218.º da Constituição e o n.º 1 do artigo 148.º do Estatuto dos Magistrados 
 Judiciais. Questionar a constitucionalidade de um é questionar a 
 constitucionalidade do outro, o que sempre colocaria a questão das normas 
 constitucionais inconstitucionais.
 III. As directivas constitucionais quanto à composição do Conselho Superior da 
 Magistratura (e ao Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais) 
 asseguram a manutenção de um pluralismo de pontos de vista por via das 
 diferentes fontes e legitimidades de indicação dos membros. Esse pluralismo 
 reflecte-se também numa lógica de funcionamento interna que contém em si os 
 freios e contra-pesos necessários a garantir a adequada ponderação de todos os 
 pontos de vista relevantes. Este modelo projecta-se, naturalmente, na 
 imparcialidade da gestão (administrativa) das magistraturas.
 IV. A Constituição não pretende afastar da pertença aos órgãos superiores das 
 magistraturas os profissionais não magistrados (professores, advogados, 
 juristas), que trabalham nas áreas em causa e que têm ideias sobre essas 
 questões. Pelo contrário, ao afastar a aplicabilidade das incompatibilidades dos 
 magistrados pretendeu precisamente assegurar o contributo das pessoas que 
 efectivamente trabalham nas áreas em causa e se preocupam com os problemas com 
 elas conexos. Pretender que um advogado que exerce nos tribunais comuns não pode 
 pertencer ao Conselho Superior da Magistratura só pode querer significar que a 
 Constituição não pretende a presença de advogados naquele órgão, já que os 
 advogados que só exercem nos tribunais administrativos não têm uma reflexão 
 específica nem interesse qualificado sobre as questões em causa. Não é esse, 
 seguramente, o sentido da Constituição.
 V. No caso concreto do processo que deu origem aos presentes autos nunca foi 
 invocada qualquer quebra de deveres concretos imparcialidade, nomeadamente, que 
 o sentido da decisão judicial se tenha ficado a dever à consideração de 
 elementos que não devessem ter sido considerados (como seria o caso da pertença 
 ao CSTAF do subscritor das presentes alegações).
 VI. Tendo em conta o escasso peso do item Habilitações Literárias (1/10) no 
 
 âmbito da fórmula da Avaliação Curricular, a que acresce também escassa 
 relevância da alteração propugnada pelo recorrente como adequada às exigências 
 da proporcionalidade no interior do próprio item Habilitações Literárias (4/20 
 na relação entre doutoramento e licenciatura), é de considerar que tal 
 discrepância, se existisse, sempre seria irrelevante do ponto de vista do 
 princípio da proporcionalidade.
 VII. Considerando a conclusão anterior, deve ter-se em conta que mesmo que a 
 fórmula classificatória relativa à avaliação curricular fosse alterada de acordo 
 com os desejos do recorrente, supostamente para a ajustar aos comandos do 
 princípio da proporcionalidade, tal não implicaria qualquer alteração no 
 posicionamento relativo dos candidatos ao concurso. Não se descortina, portanto, 
 a existência de um interesse efectivo e tutelável na prossecução do presente 
 recurso de constitucionalidade. Assim, não subsistindo qualquer utilidade no 
 juízo de inconstitucionalidade requerido, deve o recurso ser rejeitado.
 VIII. As exigências de proporcionalidade na configuração da fórmula 
 classificatória estão necessariamente funcionalizadas à natureza do lugar a 
 prover. No caso, é manifesto que o cargo em causa pressupõe a licenciatura mas 
 não valoriza de um modo particularmente acentuado, face às funções que integram 
 o seu núcleo essencial, a existência de outros graus académicos, como o mestrado 
 ou o doutoramento. Verifica-se aliás, que a licenciatura deve ser bastante 
 valorizada no interior do item Habilitações Literárias (por ser um pressuposto 
 necessário), mas o próprio item em si, não assume grande relevância tendo em 
 conta o conteúdo funcional concursado. Deste modo, não se vê como possa ter sido 
 violado o princípio da proporcionalidade.
 IX. O escalonamento entre licenciatura, mestrado e doutoramento utilizado na 
 fórmula classificatória censurada corresponde ao escalonamento usual neste tipo 
 de concursos da função pública. Resulta do conhecimento prático da relevância da 
 diferenciação para efeito das funções a prover, e aplica uma orientação informal 
 de autovinculação administrativa que contribui para o respeito pelo princípio da 
 igualdade.
 X. Não é possível estabelecer um escalonamento abstracto entre doutoramento, 
 mestrado e licenciatura. Consoante as áreas do saber em causa, as exigências e o 
 valor do doutoramento variam de uma forma ampla. Nuns casos, o doutoramento está 
 muito próximo da licenciatura, sendo entendido como o termo da aprendizagem. 
 Noutros casos, o doutoramento está muito distante da licenciatura, sendo 
 entendido como o culminar de uma longa carreira académica. Os escalonamentos têm 
 de ser estabelecidos em concreto tendo em conta a sua finalidade. No caso em 
 apreciação, o escalonamento era adequado aos objectivos e, portanto, rejeitou as 
 exigências constitucionais de proporcionalidade.”
 
  
 
  
 
                  A contra-interessada B. alegou no sentido do não provimento do 
 recurso de constitucionalidade.
 
  
 
  
 
                  2. Após as alegações (fls. 616) o relator proferiu o seguinte 
 despacho:
 
  
 
 “Pode razoavelmente sustentar-se que não deve conhecer-se do recurso na parte em 
 que o seu objecto é o indicado na alínea i) [h)] do requerimento de 
 interposição, quer porque se considere que a questão não foi adequadamente 
 suscitada pelo recorrente, como questão de constitucionalidade normativa, 
 perante o Supremo Tribunal Administrativo, como exigem as disposições conjugadas 
 da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º e do n.º 2 do artigo 72.º da LTC (o 
 recorrente invoca, como lugar onde colocou o problema, a petição de recurso 
 contencioso), quer porque se recuse à “Ordem de Serviço” ou ao “aviso” a ela 
 anexo que define os termos do concurso a natureza de acto normativo, para 
 efeitos do sistema de fiscalização pelo Tribunal Constitucional.
 Por outro lado, não se vê como pode a previsão da alínea i) do n.º 1 do artigo 
 
 70.º da LTC servir, no caso, para abrir o acesso ao Tribunal Constitucional, 
 visto que não se vislumbra no acórdão recorrido recusa de aplicação de qualquer 
 norma constante de acto legislativo com fundamento em contrariedade com uma 
 convenção internacional ou a sua aplicação em desconformidade com anterior 
 decisão do Tribunal Constitucional sobre a questão.
 Assim, sendo plausível que, nesta parte, venha a decidir-se não conhecer do 
 recurso, notifique as partes para dizerem o que tiverem por conveniente sobre a 
 matéria desta exposição. “
 
  
 
  
 
                  Apenas o recorrente se pronunciou sobre esta questão, 
 sustentando que a questão de constitucionalidade das normas do regulamento do 
 concurso foi colocada atempadamente, de forma clara e perceptível, dando 
 cumprimento às exigências contidas nos artigos 70.º, n.º 1, alínea b) e 72.º, 
 n.º 2 da LTC e que a disposição impugnada do Aviso de abertura do concurso tem 
 natureza normativa.
 
  
 
                  Cumpre conhecer destas questões prévias.
 
  
 
  
 
                  3. Alega o recorrente que suscitou a questão da oposição entre 
 as normas constantes do Aviso de abertura do concurso e o princípio da 
 proporcionalidade vertido no artigo 266.º, n.º 2 da Constituição na petição do 
 recurso contencioso e no recurso subordinado do acórdão do TCA para o STA, 
 designadamente na alínea B) das respectivas conclusões, não deixando este último 
 Tribunal de conhecer dela, embora para concluir que tal desconformidade não 
 existia. Refere-se à alegação de que “a determinação dos factores de apreciação 
 e respectivas fórmulas violaram os princípios da igualdade, da 
 proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade, constantes dos artigos 266.º 
 n.º 2 da CRP, 5.º e 6.º do CPA e 5.º n.º 1, alíneas b) e d) do Decreto-Lei n.º 
 
 498/88, de 30 de Dezembro”. Quer sujeitar ao Tribunal Constitucional, em 
 processo de fiscalização concreta de constitucionalidade, o que diz ser a “norma 
 constante do Regulamento de Concurso Interno Condicionado de Acesso para 
 Preenchimento de uma Vaga de Assessor Principal da Carreira Técnica Superior, 
 consubstanciada na Ordem de Serviço n.º 6/98 que, numa escala de zero a vinte 
 valores, atribuíram [atribuiu] à posse de Doutoramento a pontuação de vinte e à 
 posse de Licenciatura a pontuação de dezoito valores”, por ofender o princípio 
 da proporcionalidade vertido no n.º 2 do artigo 266.º da Constituição.
 
                  
 
                  O Tribunal lembra que o controlo de constitucionalidade que lhe 
 
 é atribuído pela Constituição e pela LTC em recursos de fiscalização concreta é 
 um controlo normativo, no sentido de que apenas pode incidir sobre a 
 conformidade à Constituição de actos do poder normativo e não de actos do poder 
 público de outra natureza, ainda que susceptíveis de operar a definição 
 unilateral da situação jurídica dos destinatários ou de lhes serem impostos 
 coactivamente, designadamente decisões judiciais ou administrativas (cf. artigo 
 
 280.º da Constituição e artigo 70.º, n.º 1 da LTC).
 
  
 
                  Sucede que, sem contestar esta caracterização do recurso, o 
 recorrente propõe ao controlo de constitucionalidade uma disposição contida num 
 aviso de abertura de um concurso a que atribui caracter normativo. É o acerto 
 desta qualificação que importa começar por apreciar.
 
  
 
  
 
                  4. O Tribunal tem adoptado, desde o acórdão n.º 26/85 (Acórdãos 
 do Tribunal Constitucional, 5.º Vol. pág.19) e na sequência da jurisprudência da 
 Comissão Constitucional, um conceito funcional de norma que considera o mais 
 adequado aos fins prosseguidos pelo sistema de garantia jurisdicional instituído 
 da Constituição. De um modo geral, consideram-se normas, para este efeito, os 
 actos do poder público que contiverem uma regra de conduta para os particulares 
 ou para a Administração, um critério de decisão para esta última ou para o juiz 
 ou, em geral, um padrão de valoração de comportamentos. Mas não se exige a 
 natureza necessariamente geral e abstracta dos preceitos a sindicar, desde que 
 contidos em acto formalmente normativo (Cf., por último, Carlos Lopes do Rego, 
 
 “O objecto idóneo dos recursos de fiscalização concreta da constitucionalidade: 
 as interpretações normativas sindicáveis pelo Tribunal Constitucional”, 
 Jurisprudência Constitucional, 3, págs. 4 e segs., com elucidativo elenco 
 jurisprudencial).
 
  
 
                  Posto isto, para saber se a apreciação da constitucionalidade 
 da disposição em causa pode ser deferida ao Tribunal Constitucional, a primeira 
 tarefa a empreender consiste em determinar a natureza do acto em que ela se 
 contém. Efectivamente, da Administração Pública tanto emanam actos que 
 seguramente escapam à sindicação do Tribunal Constitucional (actos 
 administrativos), como actos que seguramente lhe estão sujeitos (regulamentos). 
 Entre estes dois extremos, o do acto que define uma situação jurídica individual 
 e concreta e o do acto que enuncia uma regra de conduta de modo geral e 
 abstracto, há candidatos menos nítidos.
 
                  É o que sucede, para só nos ocuparmos do que vem ao caso, com 
 os avisos ou anúncios de abertura dos concursos de selecção e recrutamento de 
 pessoal, que se integram na categoria dos actos administrativos gerais, que se 
 distinguem dos actos administrativos (individuais e concretos) por um lado e dos 
 regulamentos por outro, mas a que não se reconhece natureza normativa. 
 
  
 
                  Efectivamente, como diz o Prof. A. Queiró, “Teoria dos 
 Regulamentos”, Revista de Direito e de Estudos Sociais, Ano XXVII, n.ºs 1, 2, 3 
 e 4, pág. 2, não basta estarmos perante um acto geral para dizer que esse acto 
 tem materialmente caracter normativo, porque generalidade e normatividade não 
 constituem uma equação. Os actos administrativos gerais limitam-se a dispor de 
 acordo com uma norma, sobre uma situação concreta sobre que incide a acção da 
 Administração. Tais actos, não obstante se dirigirem a um círculo aberto de 
 pessoas, a uma pluralidade de destinatários não determinados nem determináveis, 
 esgotam os seus efeitos com uma única aplicação e perdem toda a sua razão de ser 
 para o futuro. Para uma nova aplicação a uma outra situação haverá que editar um 
 novo acto (no caso, um novo aviso de concurso). Diferentemente, acerca do acto 
 normativo pode dizer-se que a execução não o esgota, não o consome, antes o 
 afirma. 
 
                  Em suma, não tem carácter de acto normativo tanto o acto 
 individual (aquele que se aplica a pessoa ou pessoas determinadas), como o acto 
 singular (aquele cuja aplicação se esgota numa situação concreta e determinada).
 
  
 
                  Embora com isto se não eliminem todas as dificuldades de 
 qualificação (de que o plano urbanístico é o exemplo mais frequentemente citado 
 e em que o problema se reveste de mais interesse prático, a ponto de o 
 legislador sentir necessidade de intervir na qualificação para efeitos 
 contenciosos, eliminando a insegurança jurídica decorrente da controvérsia – 
 cfr. Fernando Alves Correia, Manual do Direito do Urbanismo, Vol. I, pág. 372 e 
 segs.), existe um consenso generalizado acerca da qualificação de certo tipo de 
 actos como actos administrativos gerais, sendo um desses a que é geralmente 
 negado carácter normativo, precisamente, o dos avisos de abertura de concurso 
 
 (Prof. A. Queiró, além do estudo citado, Lições de Direito Administrativo, Vol. 
 I, pág. 410; Rogério E. Soares, Direito Administrativo, 1978, pag. 80 e segs.; 
 Aldo Sandulli, “Sugli atti amministrattivi generali a contenuto non normativo”, 
 Scritti Giuridici, pág. 41 e segs.; A. Romano Tassone, in Diritto 
 Amministrativo, a cura de L. Mazzarolli et alli, Vol I, págs. 192 e segs.; René 
 Chapus, Droit Administratif Général, I, pág. 700 e segs ; E. Garcia de Enterria 
 e Tomás-Ramon Fernandez, Derecho Administrativo, pág. 173 e segs).   
 
                  Com efeito, ainda que por vezes se afirme de actos deste tipo 
 que eles constituem a “lei especial” do concurso, no sentido de que concretizam 
 a disciplina em que os termos posteriores do procedimento concursal há-de 
 desenvolver-se, a enunciação dos critérios de classificação e graduação dos 
 candidatos interessa apenas ao singular e concreto procedimento administrativo a 
 que se referem, esgotando o seu escopo com o respectivo acto final. Constituem o 
 acto propulsivo inicial de um procedimento de iniciativa pública (cf. artigo 
 
 54.º do Código de Procedimento Administrativo), sem qualquer “pretensão imanente 
 de duração” e sem outro valor ordenador senão o relativo a essa concreta série 
 ordenada de actos e formalidades tendentes à formação da vontade da 
 Administração Pública. São, na perspectiva procedimental, um acto preparatório – 
 o que não significa necessariamente que não possam comportar lesividade própria 
 para efeitos contenciosos, o que não está agora em causa – de uma decisão 
 administrativa que visa produzir efeitos numa situação individual e concreta. 
 Nascem para que essa decisão se tome e o seu efeito ordenador morre com ela.
 São, portanto, actos que não emanam do poder normativo da Administração, mas do 
 poder administrativo de prover, de que constituem, no tipo de procedimento em 
 causa, o primeiro acto da série. O que determina que os actos seguintes tenham 
 de se lhes subordinar não é terem eles produzido uma alteração no ordenamento 
 jurídico – externamente, portanto, a cada concreto procedimento –, mas a mera 
 relação de condicionamento ou vinculação progressiva entre os sucessivos actos 
 do procedimento. O controlo da sua conformidade, inclusivamente constitucional – 
 na medida em que seja metodicamente aceitável (ou necessário) o confronto 
 directo, para determinação da sua (in)validade, dos actos administrativos com a 
 Constituição, face à maior proximidade e densificação oferecida pelos princípios 
 gerais da actividade administrativa, designadamente os enunciados nos artigos 
 
 3.º e segs. do Código de Procedimento Administrativo –, compete ao tribunais a 
 que esteja cometido o controle da decisão administrativa de cujo processo de 
 formação tais avisos constituem o primeiro passo. 
 
  
 Em conclusão, não pode conhecer-se do recurso na parte que tem por objecto a 
 disposição do aviso de abertura do concurso a que se refere a alínea h) do 
 requerimento interposição, disposição essa que não tem carácter de norma para 
 efeito do artigo 280.º da Constituição e do n.º 1 do artigo 70.º da LTC (Cf., no 
 sentido de que as disposições deste género não são normas, para este efeito, o 
 voto de vencido do Conselheiro Presidente Cardoso da Costa no acórdão n.º 
 
 421/98, publicado no Diário da República, II Série, de 20 de Julho de 1998). 
 
  
 
  
 
                  5. Aliás, essa disposição nem sequer tem, no aviso de abertura 
 do concurso, o conteúdo que o recorrente enuncia. O ponto 11 do aviso limita-se 
 a estabelecer o método de selecção e os factores da avaliação curricular, 
 estabelecendo a ponderação da habilitação académica na fórmula respectiva, e 
 dizendo que nesse factor se ponderará “a titularidade de um grau académico ou a 
 equiparação legalmente reconhecida”, sem proceder à pontuação por grau 
 académico. A valoração de que o recorrente se queixa é já produto de um outro 
 acto, com diversa autoria: a posterior deliberação do júri do concurso que fixa 
 os critérios de ponderação nos diversos factores de avaliação (cfr. alínea D) da 
 matéria de facto fixada pelo acórdão do Tribunal Central Administrativo a fls. 
 
 298 e segs. e Acta de fls. 515). Trata-se, seguramente, de uma decisão 
 administrativa, embora intercalar ou instrumental da decisão final que ao júri 
 compete.
 
  
 
                  Também esta seria – ainda que se não aceitasse a fundamentação 
 primeiramente exposta quanto à natureza não normativa das disposições insertas 
 nos anúncios ou avisos de abertura dos concursos de recrutamento e selecção de 
 pessoal – razão suficiente para, nesta parte, não conhecer do objecto do 
 recurso.
 
  
 
  
 
                  6. Passando à norma constante do artigo 148.º, n.º 1, do 
 Estatuto dos Magistrados Judiciais – na redacção emergente da Lei n.º 81/98, de 
 
 3 de Dezembro – (aplicada por remissão do artigo 77.º do Estatuto dos Tribunais 
 Administrativos e Fiscais), quando interpretada no sentido segundo o qual admite 
 que jurista que integre o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e 
 Fiscais pode exercer o patrocínio judiciário no âmbito dos tribunais 
 administrativo, verifica-se que estão reunidos os pressupostos para conhecimento 
 do objecto do recurso, mas apenas ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º 
 da LTC, enquanto questão constitucionalidade e não ao abrigo da alínea i) do 
 mesmo preceito, enquanto questão de conformidade ao direito internacional 
 pactício.
 
  
 
                  Com efeito, não estamos perante um caso de desaplicação da 
 norma – bem ao contrário, é a sua aplicação que o recorrente lastima – e não foi 
 invocado que essa aplicação contrarie o anteriormente decidido pelo Tribunal 
 Constitucional sobre a questão (da conformidade ou desconformidade da norma com 
 a Convenção).
 
  
 
                  7. O n.º 1 do artigo 148.º do Estatuto dos Magistrados 
 Judiciais, que o acórdão recorrido considerou aplicável ao Conselho Superior dos 
 Tribunais Administrativos e Fiscais por força do artigo 77.º do Estatuto dos 
 Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 129/84, de 27 
 de Abril (diploma este alterado, mas não quanto a este preceito remissivo, 
 sucessivamente pela Lei n.º 4/86, de 21 de Março e pelo Decreto-Lei n.º 229/96, 
 de 22 de Novembro, no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 
 
 49/96, de 4 de Setembro), passou a dispor, na redacção que lhe foi dada pela Lei 
 n.º 91/98, de 3 de Dezembro, o seguinte:
 
  
 
 “1 - Aos vogais do Conselho Superior da Magistratura que não sejam juízes é 
 aplicável o regime de garantias dos magistrados judiciais.”
 
  
 
  
 
                  O ora recorrente opôs-se a que, na fase de recurso para o 
 Supremo Tribunal Administrativo, a autoridade administrativa recorrida fosse 
 representada por um consultor jurídico (artigo 26.º da LTTA, aprovada pelo 
 Decreto-Lei n.º 267/85, de 16 de Julho) que tinha, também, a qualidade de membro 
 do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, sustentando que o 
 n.º 1 do art.º 148.º do EMJ, na interpretação que permite tal patrocínio, 
 infringe os artigos 203.º (princípio da independência dos tribunais), 13.º 
 
 (princípio da igualdade) e 20.º, n.º 4 (direito a um processo equitativo) da 
 Constituição, princípios que diz também vertidos no artigo 10.º da Convenção 
 Europeia dos Direitos do Homem.
 
  
 
                  
 
                  Decorrendo a alegada violação do princípio da independência dos 
 juízes e dos tribunais de uma norma referente ao estatuto dos membros não juízes 
 dos órgãos de governo das magistraturas – a norma que resulta das disposições 
 conjugadas do n.º 1 do artigo 148.º do EMJ e do artigo 77º do ETAF, quando 
 interpretados no sentido de que um jurista que integre o Conselho Superior dos 
 Tribunais Administrativos e Fiscais pode exercer o patrocínio judiciário no 
 
 âmbito dos tribunais da respectiva jurisdição – impõe-se começar por atender ao 
 que a Constituição estabelece quanto a esse estatuto. 
 
  
 
                  O Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais é 
 um órgão de existência constitucionalmente pressuposta, embora a respectiva 
 composição e o estatuto dos respectivos membros não sejam directamente regulados 
 na Constituição, contrariamente ao que sucede com o Conselho Superior da 
 Magistratura (Cf. n.º 2 do artigo 218.º e n.º 2 do artigo 217.º da 
 Constituição). Porém, para o que neste processo se discute – as 
 incompatibilidades a impor aos seus membros, para preservar a independência dos 
 juízes da respectiva ordem jurisdicional – os dados a considerar são os mesmos e 
 as soluções não podem deixar de ser idênticas. Com efeito, independentemente de 
 saber em que extensão o que a Constituição preceitua quanto ao Conselho Superior 
 da Magistratura se impõe como paradigma constitucional dos outros conselhos 
 superiores das magistraturas (Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e 
 Fiscais e Conselho Superior do Ministério Público), não se vislumbram razões 
 para que o estatuto dos membros não juízes do órgão de gestão dos juízes dos 
 tribunais administrativos e fiscais seja mais ou menos exigente do que o dos 
 membros daquele outro órgão.
 
                  
 
  
 
                  8. Na versão da Constituição resultante da revisão de 1982, aos 
 membros do Conselho Superior da Magistratura aplicavam-se as regras sobre 
 garantias e incompatibilidades dos juízes (n.º 2 do artigo 223.º da CP82). Na 
 revisão constitucional de 1989 considerou-se esta extensão excessiva (Gomes 
 Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., 
 pág. 828) e a Constituição passou a determinar que aos membros do Conselho 
 Superior da Magistratura eram aplicáveis as regras relativas a garantias dos 
 juízes e já não as regras relativas a incompatibilidades (n.º 2 do artigo 222.º 
 da CRP89). Efectivamente, ao impor aos membros não juízes a proibição extrema do 
 exercício de outras funções que é cominada para os juízes (cf. n.º 3 e 5 do 
 actual artigo 216.º), essa regra era susceptível de dissuadir o pluralismo na 
 composição do órgão tal como constitucionalmente pretendido, afastando 
 precisamente aquelas personalidades estranhas à magistratura de que mais útil 
 contributo seria de esperar pelo conhecimento dos problemas da jurisdição 
 inerente à sua actividade científica e prática, mas que compreensivelmente não 
 estariam dispostas a sacrificar toda a actividade profissional para integrar o 
 CSM (e, por extensão, o CSTAF).  
 
                  O propósito do legislador constituinte é claramente assumido 
 nas seguintes passagens das actas da Comissão Especial da Revisão Constitucional 
 
 (CERC) quando no seu seio se discutiu a proposta de revisão de que emergiu 
 
 (Diário da Assembleia da República, II Série, n.º 49-RC, de 22 de Outubro de 
 
 1988) e de que veio a resultar a aprovação do texto que actualmente constitui o 
 n.º 2 do artigo 218.º:
 
  
 
 “O Sr. José Magalhães (PCP):- Sr. Presidente, esta proposta é relevante, e é-o 
 para resolver um problema que está pendente desde há longos meses e que foi 
 suscitado por todos nós ao aprovarmos o Estatuto dos Magistrados Judiciais.
 Se a Constituição estabelece que são aplicáveis a todos os vogais, incluindo os 
 eleitos pela Assembleia da República, as regras sobre as incompatibilidades, 
 então está suscitada uma questão melindrosíssima. A lei actual não tem isso em 
 conta, a lei actual «liberta» dessa incompatibilidade alguns dos membros do 
 Conselho. E nós, ponderando a situação criada, entendemos que pode ter 
 justificação uma certa diferenciação. De facto, pode justificar-se que vigore um 
 regime diferente de incompatibilidades para os elementos eleitos pela Assembleia 
 da República. Mais franca e directamente, está aqui em causa a 
 constitucionalização do actual Estatuto dos Magistrados Judiciais, sob pena de 
 se abrir uma melindrosa questão, que pode passar, um dia destes, por algum 
 accionamento do sistema adequado e pela correspondente jurisprudência. Cremos 
 que, numa matéria deste melindre, a solução deveria ser expedita e certeira, 
 para podermos tirar todas as ilações, sob pena de alguma hipocrisia na 
 manutenção de um status contrário à Constituição, por debilidade ou má confecção 
 da correspondente norma constitucional.
 Creio que hoje, após alguns anos de vigência do Conselho Superior da 
 Magistratura e de um juízo já possível sobre a importância dos elementos eleitos 
 pela Assembleia da República, estabelecer uma diferenciação é já só uma questão 
 de bom senso. Espero, portanto, que seja também uma questão de consenso.
 O Sr. Vera Jardim (PS)
 
 […]
 
 É evidente que sobre as incompatibilidades – há pouco o Sr. Deputado José 
 Magalhães interveio nesse sentido – o estatuto não contém uma regra deste teor. 
 Teremos de estar atentos a esse aspecto, visto que, se não retirarmos isto, 
 corremos o risco de não poder dignificar o Conselho Superior da Magistratura com 
 várias categorias (professores de Direito, advogados, etc.), que, evidentemente, 
 não aceitarão ser eleitos ou designados pelo Presidente da República. Foi por 
 isso mesmo que há pouco tentei interromper o Sr. Deputado José Magalhães, para 
 ver se ele não estaria também de acordo que os dois não magistrados designados 
 pelo Presidente da República (na nossa versão), ou um (na versão actual da 
 Constituição), fossem também isentos dessas incompatibilidades, que ficariam 
 apenas para os magistrados, pois, em matéria de vencimentos, sabemos que o 
 magistrado continua com o seu vencimento, ao passo que exigir a um advogado, a 
 um professor de Direito ou a um jurisconsulto que vá para o Conselho Superior da 
 Magistratura em condições deste tipo não terá, evidentemente, acolhimento por 
 parte daqueles.
 
 […]
 O Sr. Presidente: 
 
 […]
 A terceira questão respeita ao problema de estender aos membros do Conselho 
 Superior da Magistratura os direitos e garantias e também as incompatibilidades 
 de que gozam os magistrados enquanto vogais do órgão citado.
 Admitimos que a redacção dada ao artigo 223.º pelo PSD possa ir demasiado longe 
 no sentido de que poderá haver alguns aspectos, designadamente em matéria de 
 incompatibilidades, que, eventualmente, possam ser um pouco mais restringidos, 
 desde que não seja funcionalmente exigível para a garantia da sua 
 imparcialidade, àqueles que não forem membros do conselho permanente, Daí que 
 esta matéria, que foi, aliás focada pelo PS, pudesse justificar uma redacção 
 mais restritiva, porque reconhecemos que pode ser difícil a um professor de 
 Direito ou a um advogado ser membro do Conselho Superior da Magistratura, em 
 termos de satisfazer plenamente todas as regras relativas às incompatibilidades 
 que vigoram para os juízes. Porém, com esta ressalva parece-nos que é importante 
 que o cargo de membro do Conselho Superior da Magistratura seja suficientemente 
 salvaguardado para garantir a sua independência.
 
 […].”
 
  
 
  
 
                  Todavia, a evolução constitucional não teve imediata 
 correspondência no n° 1 do artigo l48° do Estatuto dos Magistrados Judiciais, 
 aprovado pela Lei n.º 21/85, de 30 de Julho, alterada ao abrigo da autorização 
 concedida pela Lei n.º 80/88, de 7 de Julho, pelo Decreto-Lei n.º 342/88, de 28 
 de Setembro, e pelas Leis n.ºs  2/90, de 20 de Janeiro, 10/94, de 5 de Maio, 
 
 44/96, de 3 de Setembro, 81/87, de 3 de Dezembro, e 143/99, de 31 de Agosto, que 
 continuou a determinar aplicabilidade aos membros não juízes do Conselho 
 Superior da Magistratura (e, por remissão, aos membros não juízes do Conselho 
 Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais) das incompatibilidades dos 
 magistrados judiciais. Suscitado o problema em recurso de fiscalização concreta, 
 num processo oriundo da jurisdição administrativa, a fórmula do n° 1 do artigo 
 
 148.° da Constituição veio a ser declarada conforme com a Constituição pelo 
 Acórdão do Tribunal Constitucional n° 627/98 (Diário da República, II Série, de 
 
 19 de Março). Entendeu o Tribunal que, não obstante a restrição da fórmula 
 constitucional à aplicabilidade, apenas e tão só, das garantias dos magistrados 
 judiciais aos membros não juízes dos conselhos superiores e não já das 
 incompatibilidades como anteriormente, a manutenção da aplicação destas mesmas 
 incompatibilidades por via legal não viola os princípios da necessidade, 
 adequação ou proporcionalidade, não sendo uma medida excessiva para assegurar a 
 imparcialidade e isenção do próprio Conselho.
 
                  Face a este juízo de não inconstitucionalidade e à reacção dos 
 vogais não juízes do CSM, designadamente aqueles que eram advogados, a uma 
 
 “releitura” do n.º 1 do artigo 148.º do EMJ que os impedisse, na prática, de 
 exercer a sua profissão, a Assembleia da República aprovou a Lei n° 81/98, de 3 
 de Dezembro, que emulou o texto constitucional, introduzindo a seguinte redacção 
 no n.° 1 do artigo 148.° do Estatuto dos Magistrados Judiciais: «Aos vogais do 
 Conselho Superior da Magistratura que não sejam juízes é aplicável o regime de 
 garantias dos magistrados judiciais». É essa a redacção que está actualmente em 
 vigor. Ou seja, o n.° 1 do artigo 148.° do Estatuto dos Magistrados Judiciais 
 acompanha quase ipsis verbis a fórmula do n.° 2 do artigo 218.° da Constituição, 
 com o qual o legislador quis fazer  coincidir o direito ordinário (cf. a 
 exposição de motivos do Projecto de Lei n.º 585/VII, Diário da Assembleia da 
 República, II Série A, de 19 de Novembro de 1998).  
 
  
 
                  Há, portanto, identidade de conteúdo dispositivo entre a norma 
 questionada e a norma constitucional. Os preceitos têm redacção substancialmente 
 idêntica e foram editados para resolver o mesmo problema. Deste modo, sendo 
 indiscutível que, ao dispor sobre o estatuto dos membros não juízes do CSM e por 
 extensão do CSTAF, a Constituição não quis sujeitá-los às incompatibilidades dos 
 juízes, não pode atribuir-se ao preceito constitucional que consagra o princípio 
 da independência dos tribunais um sentido contraditório com aquela outra regra 
 constitucional. Dito de outro modo, não pode a este princípio atribuir-se o 
 alcance de tornar inconstitucionais preceitos de direito ordinário pelo simples 
 facto de não imporem a esses membros incompatibilidades de que o n.º 2 do artigo 
 
 218.º da Constituição os quis libertar.  
 
  
 
  
 
                  9. É certo que aquilo que o recorrente entende que decorre do 
 princípio da independência dos tribunais é uma incompatibilidade mais restrita 
 ou de alcance mais limitado. O recorrente não propõe que a esses membros do 
 Conselho seja vedado o desempenho de qualquer outra função pública ou privada. 
 Nem sequer que lhes seja proibido o exercício do mandato judicial, de um modo 
 geral ou absoluto. O que tem como desconforme ao referido princípio 
 constitucional é que a lei permita aos membros não juízes dos órgãos de governo 
 das magistraturas o exercício do patrocínio judiciário nos processos que correm 
 termos nos tribunais da respectiva ordem jurisdicional: aos vogais do CSM nos 
 tribunais judiciais e aos vogais do CSTAF nos tribunais administrativos e 
 fiscais.
 
  
 
                  Todavia, mesmo com este alcance mais restrito, se iria ao 
 arrepio da intenção que levou o legislador constituinte a retirar do estatuto 
 constitucional dos membros dos órgãos de gestão das magistraturas a regra da 
 incompatibilidade que dele constava, sem estrita necessidade quanto à garantia 
 da independência dos juízes. 
 
  
 Na verdade, o pluralismo da composição dos órgãos que gerem as magistraturas 
 judicial e administrativa pressupõe que os membros não juízes que neles tomam 
 assento conheçam e se interessem pelos problemas da jurisdição em causa. Se os 
 membros não juízes do CSTAF – e mutatis mutandis os membros do CSM – não puderem 
 exercer a sua actividade profissional na área compromete-se o objectivo de obter 
 a colaboração nessas relevantíssimas funções, melhor, corre-se o risco de 
 afastar, as personalidades cujo exercício profissional e actividade científica 
 mais as habilitará com o conhecimento dos problemas da jurisdição e reflexão 
 sobre os modos de resolvê-los que são necessários para um exercício esclarecido 
 do cargo. 
 Ora, não é indispensável levar os mecanismos de realização do princípio da 
 independência dos tribunais, na vertente dita de independência interna dos 
 juízes, ao ponto de inconstitucionalizar a possibilidade do exercício de mandato 
 forense, nos tribunais da jurisdição, pelos vogais não magistrados do respectivo 
 Conselho.
 
  
 
 É certo que um dos corolários do princípio da independência dos tribunais 
 
 (artigo 203.º da Constituição) é a independência pessoal dos juízes. 
 Independência esta que se traduz em o juiz, no exercício da sua função 
 jurisdicional, apenas estar submetido à lei, ou melhor, às fontes de direito 
 constitucionalmente reconhecidas, sem obediência a ordens ou a instruções 
 
 (independência funcional). Independência dos juízes que se analisa numa dimensão 
 externa e numa dimensão interna. A independência interna – que é o que para o 
 caso releva – traduz-se na independência perante os órgãos ou entidades 
 pertencentes ao poder jurisdicional (Gomes Canotilho, Direito Constitucional e 
 Teoria da Constituição, 5.ª ed., pág. 658).
 
                  Mas para que o juiz seja independente não basta que não esteja 
 sujeito a ordens ou instruções. Para que a independência seja substancial é 
 necessário que a decisão do caso não provenha de um juiz condicionado na 
 condução do processo ou no sentido da decisão pelo receio de um desfavor ou pela 
 esperança de um prémio (sine spe nec metu). 
 
                  Neste sentido, a independência do juiz é antes de mais uma 
 responsabilidade ético-social, só podendo ser juiz quem tenha a fortaleza de 
 
 ânimo necessária para responder a essa exigência primordial do cargo, o que deve 
 ser assegurado, antes de mais, pelos mecanismos de recrutamento, selecção e 
 disciplina. Mas é também uma questão de mecanismos institucionais e estruturas 
 organizatórias, incluindo na relação com os conselhos superiores de 
 administração e gestão das magistraturas, que constituem o modelo organizacional 
 de defesa da independência externa dos magistrados relativamente a outros 
 poderes estranhos à organização judiciária, mas de que podem emergir 
 constrangimentos para a actuação imparcial do juiz ( ou como tal serem temidos, 
 de acordo com a teoria das aparências ), por acção directa ou pela expectativa 
 de agradar ou receio de desagradar aos membros de um órgão de que depende a 
 respectiva carreira. 
 
                  Todavia, não pode levar-se a preocupação com as aparências a 
 extremos esterilizantes. Ora, a independência e imparcialidade do juiz são 
 assegurados por meios institucionais e organizatórios que esbatem a relação 
 individualizada entre o juiz e os membros que integram os órgãos de gestão e 
 disciplina das magistraturas, designadamente com aqueles que representem 
 interesses das partes em processos em que tenham de intervir. 
 Em primeiro lugar, pela natureza colegial e pela composição do órgão que é 
 presidido pelo presidente do respectivo Supremo Tribunal e inclui vogais que são 
 juízes e outros que o não são ou não tem necessariamente de o ser. Centrando-nos 
 no CSTAF, este órgão era então composto por personalidades de diversa 
 proveniência e processo de designação, a saber (artigo 99.º do ETAF84):
 
  
 
 “(…)
 a)            O presidente do Supremo Tribunal Administrativo, que preside;
 b)           Um juiz eleito de entre e pelos juízes da Secção de Contencioso 
 Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo;
 c)            Um juiz eleito de entre e pelos juízes da Secção de Contencioso 
 Tributário do Supremo Tribunal Administrativo;
 d)           O presidente do Tribunal Tributário de 2ª Instância;
 e)            Um juiz dos tribunais administrativos de círculo eleito pelos seus 
 pares;
 f)             Um juiz dos tribunais tributários de 1ª instância ou dos 
 tribunais fiscais aduaneiros eleito pelos seus pares;
 g)            Um jurista de reconhecida competência em matérias administrativas 
 e com experiência na administração activa, designado pela Assembleia da 
 República;
 h)            Um jurista de reconhecida competência em matérias fiscais e com 
 experiência na administração activa, designado pela Assembleia da República;
 i)              Um docente das faculdades de Direito que tenha regido 
 disciplinas de direito administrativo, designado pela Assembleia da República;
 j)              Um docente das faculdades de Direito que tenha regido 
 disciplinas de direito fiscal, designado pela Assembleia da República;
 l)              Um jurista de reconhecido mérito, designado pela Assembleia da 
 República
 
 (…).”
 
  
 
  
 Por outro lado, a própria actuação dos conselhos superiores, enquanto órgãos 
 administrativos, está sujeita aos parâmetros constitucionais da justiça, da 
 imparcialidade, da proporcionalidade e da igualdade (artigo 266.º da CRP) e a 
 controlo judicial, então perante o Pleno do Supremo Tribunal Administrativo 
 
 (artigo 24.º, alínea d) do ETAF84) e actualmente perante a Secção do Contencioso 
 Administrativo do mesmo Supremo Tribunal (cfr. artigo 24.º, n.º 1, alínea vii) 
 do ETAF, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro).
 
  
 
                  Finalmente, convém recordar que no caso concreto do processo 
 que deu origem aos presentes autos nunca foi invocada qualquer suspeita de 
 quebra de deveres de imparcialidade, nomeadamente, de que o sentido da decisão 
 ou a condução do processo tenha sido influenciado por elementos que não deviam 
 ser considerados, nunca tendo o recorrente levantado a questão da intervenção do 
 consultor jurídico designado para patrocinar a autoridade recorrida senão na 
 fase de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo. E, além disso, quando 
 particulares circunstâncias puderem pôr em dúvida a imparcialidade de algum juiz 
 que deva intervir, o sistema jurídico põe à disposição do interessado os meios 
 necessários e adequados para reacção concreta que são as garantias processuais 
 de imparcialidade (cfr. artigos 122.º e segs. do CPC).
 
  
 
  
 
                  11. O que acaba de dizer-se quanto à não violação do princípio 
 da independência dos tribunais vale para afastar também a violação dos 
 princípios da igualdade (artigo 13.º da CRP) e da garantia do processo 
 equitativo (n.º 4 do artigo 20.º da CRP), porque não está em causa senão o 
 efeito que na igualdade das partes no processo poderia resultar da violação 
 daquele princípio. 
 
                  E também não há que ponderar especificadamente as alegadas 
 violações ao artigo 10.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e ao n.º 
 
 1 do artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direito do Homem que, nesta matéria, 
 não consagram direitos ou princípios que a Constituição não garanta, nem o 
 recorrente deduziu argumentação que obrigue a ponderação suplementar.
 
  
 
                  Tanto basta para concluir que a norma do n.º 1 do artigo 148.º 
 do Estatuto dos Magistrados Judiciais (na redacção emergente da Lei n.º 81/98, 
 de 3 de Dezembro), aplicada por remissão do artigo 77.º do Estatuto dos 
 Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 129/84, de 7 
 de Abril, interpretada no sentido de que um jurista que integre o Conselho 
 Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais pode exercer o patrocínio 
 judiciário, no âmbito de processos pendentes naqueles tribunais, não viola 
 qualquer das disposições indicadas pelo recorrente.
 
  
 
                  12. Decisão
 
  
 
                  Pelo exposto decide-se:
 
  
 a)        Não tomar conhecimento do recurso na parte em que tem por objecto a 
 disposição relativa à avaliação da habilitação académica, nos métodos de 
 selecção constantes do Aviso de abertura do concurso para provimento de um lugar 
 de assessor principal, anexo à ordem de serviço n.º 6/98 do Gabinete de 
 Coordenação e Combate à Droga;
 b)       Negar provimento ao recurso, na parte em que dele se conhece.
 c)         Condenar em custas o recorrente, com 20 (vinte) UCs de taxa de 
 justiça.
 
  
 
  
 Lisboa, 2 de Março de 2007
 Vítor Gomes
 Bravo Serra
 Gil Galvão
 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
 Artur Maurício