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Processo nº 625/08
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria João Antunes
 
  
 Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
 
 
 I. Relatório
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal Administrativo, em que é 
 recorrente A., S.A. e recorrida a Fazenda Pública, foram interpostos recursos 
 para o Tribunal Constitucional, ao abrigo das alíneas a), b) e i) do nº 1 do 
 artigo 70º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal 
 Constitucional (LTC) do acórdão daquele Tribunal de 19 de Setembro de 2007; ao 
 abrigo das alíneas a), b) e i) do nº 1 do artigo 70º desta Lei, do acórdão do 
 Supremo Tribunal Administrativo de 11 de Dezembro de 2007, no segmento em que 
 indefere a arguida nulidade processual; e ao abrigo das alíneas b) e f) do nº 1 
 do artigo 70º da mesma Lei do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 11 
 de Dezembro de 2007, no segmento em que indefere o pedido de reforma.
 
  
 
 2. Em 18 de Agosto de 2008, foi proferida decisão sumária, ao abrigo do nº 1 do 
 artigo 78º-A da LTC, pela qual se decidiu não tomar conhecimento do objecto dos 
 recursos interpostos. Para o que agora é objecto de reclamação, importa reter 
 apenas o seguinte passo da respectiva fundamentação:
 
  
 
 «2. A recorrente interpôs recurso do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo 
 de 11 de Dezembro de 2007, no segmento em que aquele indefere a arguida nulidade 
 processual, ao abrigo das alíneas a), b) e i) do nº 1 do artigo 70º da LTC.
 Apesar de não se poder dar como satisfeito o requisito da indicação das normas 
 cuja apreciação é requerida a este Tribunal (artigo 75º-A, nº 1, parte final, da 
 LTC), face ao teor do requerimento de interposição de recurso, nomeadamente por 
 nele não serem identificadas a dimensão normativa conferida à aplicação do 
 artigo 234º, parágrafo 3º, do Tratado de Roma nem a interpretação dos artigos 
 
 201º, nºs 1 e 2 e 279º, nº 1, do Código de Processo Civil, importa começar por 
 verificar os requisitos dos recursos interpostos, cuja não verificação 
 prejudica, por ser inútil, o convite previsto no nº 6 do artigo 75º-A da LTC
 
 (…)
 
 2.2. Cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que 
 apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o 
 processo, de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a 
 decisão recorrida (alínea b) do nº 1 do artigo 70º e nº 2 do artigo 72º da LTC).
 No caso presente, a recorrente não suscitou durante o processo, de forma 
 adequada, perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, uma questão de 
 inconstitucionalidade normativa reportada aos preceitos indicados no 
 requerimento de interposição de recurso. Designadamente, não o fez nos pontos 
 
 44. a 46. do requerimento de arguição de nulidade processual de 8 de Outubro de 
 
 2007 (fl. 393 e segs.). Tal circunstância obsta ao conhecimento do objecto do 
 recurso interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC e 
 justifica a prolação da presente decisão (artigo 78º-A, nº 1, da LTC)».
 
  
 
 3. Desta decisão vem agora a recorrente reclamar para a conferência, ao abrigo 
 do artigo 78º-A, nº 3, da LTC, com os fundamentos seguintes:
 
  
 
 «1. Em 2.2 daquela douta Decisão Sumária, é dito que a questão da 
 inconstitucionalidade normativa referida no recurso de 09.01.2008 (RO 8841 6764 
 
 0 PT) não foi suscitada, de forma adequada, perante o Tribunal recorrido.
 
 2. Ora, e contrariamente ao que se afirma em 2.2 daquela douta Decisão Sumária, 
 a Recorrente, em 44. do requerimento de arguição de nulidade processual de 
 
 08.10.2007, e na sequência do não reenvio prejudicial junto do TJCE, invocou a 
 inconstitucionalidade material do artigo 234° § 3º o Tratado de Roma, por 
 violação do princípio do juiz legal (ou natural), previsto no artigo 32° nº 9 da 
 CRP.
 
 3. E, em 46. do mesmo requerimento, invocou a inconstitucionalidade dos artigos 
 
 201° nº 1 e 2 e 279° nº 1 do CPC, por violação do princípio constitucional do 
 primado do direito comunitário sobre o direito interno, consagrado no artigo 8° 
 nº 4 da CRP, do princípio do juiz legal (ou natural), consagrado no artigo 32° 
 nº 9 da CRP, e do princípio da tutela jurisdicional efectiva, consagrado nos 
 artigos 20° nº 1 e 268° nº 4 da CRP.
 
 4. Assim, estas questões de inconstitucionalidade normativa foram suscitadas 
 adequadamente junto do Tribunal recorrido, antes da prolação da decisão 
 recorrida, de 11.12.2007, no segmento em que esta indeferiu a arguida nulidade 
 processual (ponto 1. daquela douta decisão), em cumprimento do artigo 72° nº 2 
 da LTC.
 
 5. Razão pela qual, e salvo o devido respeito, havia lugar, pelo menos, à 
 formulação de convite para a Recorrente indicar os demais elementos 
 eventualmente em falta, nos termos do artigo 75°-A nº 5 e 6 da LTC».
 
  
 
 4. Notificada, a recorrida respondeu, sustentando que deve ser confirmada a 
 rejeição do recurso de inconstitucionalidade.
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II. Fundamentação
 A decisão reclamada considerou que a recorrente não suscitou, de forma adequada, 
 perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida – o acórdão do Supremo 
 Tribunal Administrativo de 11 de Dezembro de 2007, no segmento em que indefere a 
 arguida nulidade processual – uma questão de inconstitucionalidade normativa 
 reportada aos artigos 234º, parágrafo 3º, do Tratado de Roma e 201º, nºs 1 e 2 e 
 
 279º, nº 1, do Código de Processo Civil. Por esta razão se decidiu pelo não 
 conhecimento do objecto do recurso, interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do 
 artigo 70º da LTC.
 A reclamante sustenta que invocou a inconstitucionalidade do artigo 234º § 3º do 
 Tratado de Roma e dos artigos 201º, nº 1 e 2 e 279º, nº 1, do Código de Processo 
 Civil nos pontos 44. e 46. do requerimento de arguição de nulidade processual. 
 Estes pontos, já expressamente considerados na decisão reclamada, com remissão 
 para as páginas dos autos em que se encontram, têm o seguinte teor:
 
  
 
 «42. A falta deste reenvio, ou “cooperação judiciária”, traduz-se numa omissão 
 de uma formalidade processual prévia legalmente imposta, susceptível de influir 
 sobre a decisão da causa.
 
 43. Ou seja, numa nulidade processual, com as legais consequências (artigos 201º 
 nº 1 e 2 do CPC).
 Caso contrário,
 
 44. Prossegue-se uma interpretação inconstitucional do artigo 234º, parágrafo 
 
 3º, do Tratado de Roma, por violação do princípio do juiz legal (ou natural), 
 consagrado, entre outros, no artigo 32º nº 9 da CRP, pois nega-se a competência 
 exclusiva atribuída ao TJCE para julgar as questões relativas ao direito 
 comunitário.
 
 45. Viola-se o princípio da supremacia do direito comunitário (no caso, daquele 
 artigo 234º nº 3 do Tratado de Roma), constitucionalmente consagrado, como 
 princípio fundamental, no artigo 8º nº 4 da CRP.
 
 46. E os artigos 201º nº 1 e 2 e 279º nº 1 do CPC serão interpretados e 
 aplicados em violação do princípio constitucional do primado do direito 
 comunitário sobre o direito interno, consagrado no artigo 8º nº 4 da CRP, do 
 princípio do juiz legal (ou natural), consagrado no artigo 32º nº 9 da CRP, e do 
 princípio da tutela jurisdicional efectiva, consagrado nos artigos 20º nº 1 e 
 
 268º nº 4 da CRP (…)» (itálico aditado).
 
  
 Esta passagem não corresponde, de facto, à suscitação adequada de uma questão de 
 inconstitucionalidade normativa. 
 Quando se suscita a inconstitucionalidade de determinada interpretação 
 normativa, necessário é que se identifique essa interpretação em termos de o 
 Tribunal, no caso de a vir a julgar inconstitucional, a poder enunciar na 
 decisão, de modo a que os destinatários dela e os operadores do direito em geral 
 fiquem a saber que essa norma não pode ser aplicada com um tal sentido (cf., 
 entre muitos outros, o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 106/99, disponível 
 em www.tribunalconstitucional.pt). O que corresponde à exigência legal no 
 sentido de a questão de inconstitucionalidade ser suscitada de modo 
 processualmente adequado, perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, 
 em termos de este estar obrigado a dela conhecer (artigo 72º, nº 2, da LTC). 
 Ora, dos presentes autos, decorre que o Supremo Tribunal Administrativo 
 indeferiu a nulidade processual reportada aos artigos 234º, § 3º do Tratado de 
 Roma e 279º, nº 1, e 201º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, sem conhecer 
 de qualquer questão de inconstitucionalidade normativa (cf. fl. 448 dos 
 presentes autos) e sem que a ora reclamante tivesse invocado qualquer omissão de 
 pronúncia.
 
  
 Resta, assim, concluir pelo indeferimento da presente reclamação.
 
  
 III. Decisão
 Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, 
 confirmar a decisão sumária na parte em que foi reclamada.
 Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 Lisboa, 30 de Setembro de 2008
 Maria João Antunes
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Gil Galvão