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Processo n.º 615/07
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
 
  
 Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
 1. Relatório
 
  
 
  
 A. formulou um pedido de revisão de decisão condenatória, com fundamento no 
 disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 449º do Código de Processo Penal, que 
 foi a final denegado por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1 de Março de 
 
 2007.
 
  
 Deduziu depois um pedido de aclaração, que foi igualmente indeferido, por 
 acórdão de 19 de Abril de 2007.
 
  
 Desta última decisão interpôs o recorrente recurso de constitucionalidade nos 
 seguintes termos:
 
  
 Notificado do acórdão de 19 de Abril de 2007 proferido por esse tribunal, vem 
 dele interpor recurso para o Tribunal Constitucional, invocando expressamente a 
 violação do artigo 32º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, quando, 
 no seu modesto entender, a douta decisão releva o depoimento da arguida B. na 
 parte em que desfavorece a inocência do recorrente mas desvaloriza as 2 (duas) 
 declarações em que, sem margem para dúvidas, informa o inquiridor que houve da 
 parte de outro co-arguido a recomendação telefónica de “envolver o A.” para que 
 se dividisse a penalização por todos e o interessado “apanhasse uma pena mais 
 pequena”.
 De facto, e pese embora o princípio da livre apreciação da prova e a convicção 
 do tribunal, não se vê como tais prerrogativas do julgador podem colidir com uma 
 consagração constitucional bem clara que nos diz que o processo criminal 
 assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso.
 Sendo certo que, até esta data, o que o recorrente invoca em sede de “revisão do 
 processo” não foi desmentido pelas testemunhas que arrolou, aliás, partes 
 neutrais na acção crime.
 Faltando apenas esgotar as outras diligências probatórias que foram indeferidas 
 e com cuja decisão se não pode conformar, clamando mais uma vez pela sua 
 inocência.
 E, na óptica do recorrente, só assim se afastará toda a dúvida razoável já que 
 assiste ao arguido o princípio da presunção de inocência cabendo à acusação o 
 afastamento do benefício do in dubio pro reo – artigo 32º, nº 2, da C.R.P.
 Assim, e ao abrigo do artigo 75º. -A da Lei 28/82, de 15 de Novembro, vem 
 requerer a admissão do presente recurso.
 
  
 Convidado, pelo Ex.mo Conselheiro Relator no Supremo Tribunal de Justiça, a dar 
 cumprimento ao disposto no artigo 75º-A, n.º 1, da Lei do Tribunal 
 Constitucional, o recorrente veio dizer que pretendia a apreciação da 
 
 “interpretação da norma extraída do artigo 379º, n.º 1, alínea c), do Código de 
 Processo Penal, no sentido que o tribunal a quo lhe deu, ao não esgotar as 
 diligências probatórias testemunhais em devido tempo requeridas pelo arguido, 
 ora Recorrente, com violação da aplicação do artigo 32º, n.º 1, da C.R.P. que 
 expressamente invocou, isto é, sem a salvaguarda de todas as garantias de 
 defesa, incluindo o recurso, que lhe assistem, já que, por virtude de tal 
 amputação, o julgador deixa de pronunciar-se sobre questões que deveria 
 apreciar”.
 
  
 Tendo sido admitido o recurso no tribunal recorrido, o relator, no Tribunal 
 Constitucional, por decisão sumária, ao abrigo do disposto no artigo 78º-A, n.º 
 
 1, da Lei do Tribunal Constitucional, decidiu dele não tomar conhecimento, com 
 base nas seguintes ordens de considerações:
 
  
 Tendo o presente recurso sido interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do 
 artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, constitui seu pressuposto 
 processual a invocação pelo recorrente, durante o processo, da questão de 
 inconstitucionalidade que pretende ver apreciada pelo Tribunal Constitucional.
 Tal questão deve ter sido suscitada, como determina o artigo 72º, n.º 2, da 
 mesma Lei, de modo processualmente adequado perante o próprio tribunal 
 recorrido, em termos de este estar obrigado a dela conhecer. 
 Sucede que em nenhum momento do processo e, designadamente, no pedido de revisão 
 de sentença ou no subsequente do pedido de aclaração do acórdão que denegou a 
 revisão, vem suscitada a conformidade constitucional de qualquer interpretação 
 normativa relativa à referida disposição do artigo 379º, n.º 1, alínea c), do 
 Código de Processo Penal.
 De resto, o acórdão de 19 de Abril de 2007 não faz qualquer alusão à citada 
 norma (e não fez dela, portanto, qualquer aplicação ou interpretação susceptível 
 de ser arguida de inconstitucionalidade), e, como se depreende do requerimento 
 de interposição do recurso, acima transcrito, o recorrente insurge-se contra a 
 própria decisão recorrida, e não contra qualquer interpretação normativa nela 
 perfilhada. 
 Não tendo o recorrente suscitado, durante o processo, qualquer questão de 
 inconstitucionalidade normativa, nem tendo sido feita, na decisão recorrida, 
 qualquer aplicação da norma cuja inconstitucionalidade se pretende ver 
 apreciada, conclui-se que não é possível conhecer do objecto do recurso, por 
 falta de preenchimento dos seus pressupostos processuais.
 
  
 
 É desta decisão que vem interposta a presente reclamação para a conferência, com 
 os seguintes fundamentos:
 
  
 
 1. Sustenta a douta decisão que, em nenhum momento do processo, vem suscitada a 
 conformidade constitucional de qualquer interpretação normativa relativa à 
 disposição do artigo 379º., nº. 1, alínea c), do Código de Processo Penal. 
 
 2. É que, durante o processo, não foi suscitado, pelo Recorrente, qualquer 
 questão de inconstitucionalidade normativa ou qualquer aplicação da norma cuja 
 inconstitucionalidade se pretende ver apreciada. 
 
 3. Motivo porque, a douta decisão entendeu por bem, não tomar conhecimento do 
 recurso. 
 
 4. Não obstante, o Reclamante vem contrapor o seguinte: 
 
 5. Está em causa a condenação de um arguido pela prática de um dos crimes mais 
 graves previstos e punidos no nosso ordenamento jurídico-penal. 
 
 6. O Reclamante, desde a primeira hora, protesta a sua inocência. 
 
 7. Há depoimentos contraditórios durante a instrução do processo, em sede de 
 julgamento e factos novos, em sede de revisão da sentença. 
 
 8. As testemunhas que foram arroladas pelo arguido, em sede de revisão de 
 sentença, confirmaram os factos invocados pelo mesmo arguido, já nesta fase 
 processual. 
 
 9. O Meritíssimo Juiz do Tribunal de 1ª Instância entendeu por bem rejeitar a 
 audição de algumas delas. 
 
 11. O arguido, ora Reclamante, invocou, desde sempre, a violação do princípio in 
 dubio pro reo e a diminuição das garantias de defesa, referindo, expressamente, 
 o imperativo constitucional ínsito no artigo 32º, n.º 1, da C.R.P. 
 
 12. E, para o arguido, a não audição de todas as testemunhas por si arroladas 
 constitui, do seu ponto de vista, quanto mais não seja, violação por omissão do 
 já referido preceito constitucional que assegura todas as garantias de defesa, 
 incluindo o recurso. 
 
 13. Em sede de despacho de aclaração, proferido pelo STJ, em 19 de Abril de 
 
 2007, o Douto Acórdão não se refere ao expressamente invocado artigo 32. °, n.º 
 
 1, da CRP, vindo apenas mencionar que do artigo 449.°, n.º 1, do CPP, só é 
 admissível a revisão de sentença transitada em julgado quando ocorrer alguma das 
 situações enunciadas nas quatro alíneas deste preceito, designadamente, a da 
 alínea d). 
 
 14. Porém, o arguido não entende, na sua modesta opinião, porque não foram 
 ouvidas as testemunhas que o julgador de primeira instância e o julgador do 
 tribunal de revisão quiseram dispensar, impossibilitando a realização de meios 
 de prova que poderiam afastar toda a réstia de dúvida acerca da sua condenação. 
 
 15. Mesmo que tais audições fossem inconclusivas ou despiciendas, tendo em 
 consideração a pena aplicada de 18 anos e 4 meses de prisão. 
 
 16. Vem a douta decisão, ora reclamada, referir que não é indicada a norma 
 violada, de acordo com o crivo de admissibilidade dos recursos constitucionais; 
 porém, sempre se dirá que o Acórdão de revisão também não refere a norma do 
 processo penal que confirma a condenação, indeferindo a revisão, e que poderia 
 ser atacada pelo arguido, sendo certo que o arguido questiona a desconformidade 
 da decisão proferida com o que materialmente consagra o artigo 32.°, n.º 1, da 
 CRP. 
 
 17. Ora, o Tribunal a quo absteve-se de conhecer de elementos de prova 
 
 “eventualmente” relevantes para uma decisão conscienciosa e livre de quaisquer 
 dúvidas, que naturalmente tem correspondência no já indicado artigo 379.°, n.º1, 
 alínea c), do CPP. 
 
 18. Não tendo sido exauridos, in casu, todos os elementos de prova suscitados 
 pelo arguido, em sede de revisão, ao arrepio da Constituição da República 
 Portuguesa e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. 
 
 19. Pelo que, salvo o devido respeito, que é muito, pelo Tribunal Superior a 
 quem o arguido apela, o respeito pela dignidade da pessoa humana não se 
 compadece com a verdade meramente formal, já que esta se deve subordinar à 
 verdade material, para que se faça justiça. 
 
  
 O Exmo Magistrado do Ministério Público considera que a reclamação carece 
 manifestamente de fundamento, porquanto a argumentação do reclamante em nada 
 abala os fundamentos da decisão reclamada, no que respeita à evidente 
 inverificação dos pressupostos do recurso interposto.
 
  
 Vem o processo à conferência sem vistos. 
 
  
 
 2. Fundamentação
 
  
 Pela decisão sumária ora reclamada, entendeu-se não tomar conhecimento do 
 recurso de constitucionalidade por ausência dos respectivos processuais, por não 
 ter sido suscitada, no decurso do processo, e, designadamente, no pedido de 
 revisão de sentença ou no subsequente do pedido de aclaração do acórdão que 
 denegou a revisão, a conformidade constitucional de qualquer interpretação 
 normativa relativa à referida disposição do artigo 379º, n.º 1, alínea c), do 
 Código de Processo Penal, que constituía o objecto do recurso. E também por, no 
 acórdão recorrido, se não te feito qualquer alusão à citada norma, e, por isso, 
 se não ter feito qualquer aplicação ou interpretação normativa susceptível de 
 ser arguida de inconstitucionalidade.
 
  
 Na sua reclamação o recorrente não põe propriamente em causa a validade deste 
 entendimento, e limita-se a contrapor que há depoimentos contraditórios durante 
 a instrução do processo, em sede de julgamento e factos novos, em sede de 
 revisão da sentença; que as testemunhas que foram arroladas pelo arguido, em 
 sede de revisão de sentença, confirmaram os factos invocados pelo mesmo arguido, 
 já nesta fase processual; que o Tribunal de 1ª Instância entendeu por bem 
 rejeitar a audição de algumas delas; que o arguido invocou, desde sempre, a 
 violação do princípio in dubio pro reo e a diminuição das garantias de defesa, 
 referindo, expressamente, o imperativo constitucional ínsito no artigo 32º, n.º 
 
 1, da Constituição; que a não audição de todas as testemunhas por si arroladas 
 constitui violação, por omissão, do já referido preceito constitucional; que, 
 enfim, o tribunal a quo se absteve de conhecer de elementos de prova 
 
 “eventualmente” relevantes para uma decisão conscienciosa e livre de quaisquer 
 dúvidas, que naturalmente tem correspondência no artigo 379.°, n.º1, alínea c), 
 do CPP.
 
  
 Ora, como se sabe, o Tribunal Constitucional não possui competência para 
 verificar se o tribunal recorrido usou convenientemente dos seus poderes de 
 cognição, se adoptou todas as diligências necessárias para a descoberta da 
 verdade ou se fez a melhor interpretação e aplicação da lei. Ao Tribunal 
 Constitucional também não cabe verificar a constitucionalidade da própria 
 decisão recorrida, visto que, no recurso de constitucionalidade com fundamento 
 na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, apenas 
 poderá aferir a conformidade constitucional de uma interpretação normativa que 
 tenha sido concretamente perfilhada pelo tribunal recorrido.
 
                   
 O recurso de constitucionalidade não poderia portanto ser aceite com base em 
 qualquer das considerações formuladas na reclamação. E constatando-se que, no 
 caso, não foi suscitada, durante o processo, qualquer questão de 
 inconstitucionalidade normativa, nem foi aplicada, na decisão recorrida, a norma 
 cuja inconstitucionalidade se pretende ver apreciada, haverá de concluir-se 
 necessariamente – tal como se concluiu na decisão reclamada - que não é possível 
 conhecer do objecto do recurso, por falta de preenchimento dos seus pressupostos 
 processuais.
 
  
 
 3. Decisão
 
  
 Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, acordam em indeferir a reclamação e 
 confirmar a decisão reclamada.
 
  
 
                   Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
 
  
 
  
 Lisboa, 11 de Julho de 2007
 Carlos Fernandes Cadilha
 Maria Lúcia Amaral
 Gil Galvão