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Processo nº 702/2008
 
 3ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria Lúcia Amaral
 
 
 Acordam, em Conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
 
 I
 Relatório
 
  
 
 1.  A., S.A. reclama, ao abrigo do disposto no n.º 4, 
 do artigo 76.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, do despacho do Senhor 
 Juiz‑Desembargador Relator de 18 de Junho de 2008 que decidiu indeferir o 
 recurso para o Tribunal Constitucional interposto pela reclamante.
 
  
 
 2.  O despacho objecto da presente reclamação funda-se na circunstância de a ora 
 reclamante não ter suscitado expressamente a questão da inconstitucionalidade 
 nas alegações apresentadas no âmbito do recurso de apelação interposto para o 
 Tribunal da Relação do Porto.  
 
  
 
 3.  A reclamante alega que, contrariamente ao entendimento do Tribunal a quo, 
 suscitou efectivamente a questão de inconstitucionalidade no âmbito do processo. 
 A fundamentação da reclamação sub judice resume-se a duas conclusões das 
 alegações de recurso apresentadas pela reclamante perante o Tribunal a quo. 
 A saber, a conclusão V e a conclusão II, donde a reclamante retira que:
 
  
 A apelante/reclamante ao alegar (vide conclusão V): “Ao sustentar o entendimento 
 sufragado pelos peritos indicados pelo tribunal e pela entidade expropriante, a 
 sentença recorrida viola o disposto nos art.° 62°, da Constituição da República 
 Portuguesa, art.° 1310.°, do Código Civil, 1.º e 23.°, do Código das 
 Expropriações, preceitos estes que numa correcta interpretação e aplicação 
 impunham que a douta sentença recorrida sufragasse a posição sustentada pelo 
 perito indicado pelos expropriados e fixasse o valor da indemnização devida pela 
 parcela expropriada de acordo com o respectivo valor comum e corrente de 
 mercado, isto é, em 199,52€/m2 perfazendo o valor de indemnização pela parcela 
 expropriada o montante de €6.783,68 (seis mil setecentos e oitenta e três euros 
 e sessenta e oito cêntimos)”, levanta expressamente a questão da 
 inconstitucionalidade, por violação do disposto no artigo 62°, da Constituição 
 da República Portuguesa, do entendimento sufragado na decisão recorrida no que 
 concerne à interpretação e aplicação dos preceitos legais ali referidos, isto é, 
 do art.° 1310°, do Código Civil, 1.º e 23.°, do Código das Expropriações. 
 A apelante/reclamante ao alegar na conclusão “II” das suas alegações do recurso 
 de apelação: “A douta sentença recorrida ao sufragar a avaliação sustentada 
 pelos peritos indicados pelo tribunal e pela expropriante, viola o disposto nos 
 artigos 62.°, da Constituição da República Portuguesa, 1310°, do Código CMI, 
 
 23.°, n.° 1, 26.° e 23°, n.° 5, do Código das Expropriações, que numa correcta 
 interpretação e aplicação impõem que se sufrague a avaliação sustentada pelo 
 perito do expropriado, ainda que em posição minoritária, e se atribua ao 
 expropriado uma indemnização pela parcela expropriada correspondente a € 
 
 5.350,92 (cinco mil, trezentos e cinquenta euros e noventa e dois cêntimos)”, 
 levanta expressamente a questão da inconstitucionalidade, por violação do 
 disposto no artigo 62°, da Constituição da República Portuguesa, do entendimento 
 sufragado na decisão recorrida no que concerne à interpretação e aplicação dos 
 preceitos legais ali referidos, isto é, do art.° 1310.°, do Código Civil, 23°, 
 n.°s 1 e 5 e 26.°, do Código das Expropriações.
 
  
 
 4.  O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu o seguinte parecer:
 
  
 A presente reclamação é manifestamente improcedente.
 Na verdade, a entidade ora reclamante não suscitou, em termos adequados, 
 qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, limitando‑se a imputar 
 directamente à decisão proferida pelas instâncias o vício de 
 
 “inconstitucionalidade”, face, aliás, às circunstâncias concretas e peculiares 
 do caso em litígio.
 Não se questionando, deste modo, qualquer critério normativa, efectivamente 
 aplicado à dirimição do litígio pela decisão recorrida, inexiste objecto idóneo 
 do recurso interposto para este Tribunal, cujos poderes cognitivos se 
 circunscrevem – como é bem sabido – ao estrito controlo normativo da 
 constitucionalidade.
 
  
 
  
 Dispensados os vistos, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II
 Fundamentos
 
  
 
 5.  O recurso de constitucionalidade foi intentado ao abrigo do disposto no 
 artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, nos termos do 
 qual cabe recurso para o Tribunal Constitucional de decisões que apliquem norma 
 cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo.
 Por outras palavras, sempre se há-de dizer que o nosso sistema de fiscalização 
 concentrada e incidental da constitucionalidade, não atribui competência ao 
 Tribunal Constitucional para controlar o modo como a matéria de facto foi 
 apurada pelos tribunais recorridos, nem sequer controlar o mérito da decisão 
 recorrida, em si mesma, ou, sequer, apurar se as normas nela aplicadas 
 correspondem ou não ao melhor direito. 
 No recurso de constitucionalidade tal como foi delineado pela Constituição da 
 República e pela Lei do Tribunal Constitucional, este Tribunal é apenas um órgão 
 de fiscalização da constitucionalidade de normas, em si mesmas (isto é, numa 
 interpretação enunciativa) ou em determinada interpretação particular, aplicada 
 na decisão recorrida (Cfr. neste sentido, entre outros, o Acórdão n.º 199/88, 
 publicado no Diário da República, II Série, de 28 de Março de 1989 e Acórdão n.º 
 
 178/95,  publicado no Diário da República, II Série, de 21 de Junho de 1995). 
 
  
 
 6. A resposta à questão de saber se a suscitação da inconstitucionalidade 
 normativa, perante o tribunal recorrido, ocorreu, no caso dos autos, durante o 
 processo e de forma processualmente adequada, encontra-se nas alegações do 
 recurso interposto perante o tribunal agora recorrido (fls. 361 e segs.), que o 
 reclamante concluiu, quando invoca normas que integram a Constituição da 
 República Portuguesa, do seguinte modo:
 
  
 V – Ao sustentar o entendimento sufragado pelos peritos indicados pelo tribunal 
 e pela entidade expropriante, a sentença recorrida viola o disposto nos art° 
 
 62.°, da Constituição da República Portuguesa, art.° 1310°, do Código Civil, 1.° 
 e 23.°, do Código das Expropriações, preceitos estes que numa correcta 
 interpretação e aplicação impunham que a douta sentença recorrida sufragasse a 
 posição sustentada pelo perito indicado pelos expropriados e fixasse o valor da 
 indemnização devida pela parcela expropriada de acordo com o respectivo valor 
 comum e corrente de mercado, isto é, em 199,52€/m2 perfazendo o valor de 
 indemnização pela parcela expropriada o montante de €6.783,68 (seis mil 
 setecentos e oitenta e três euros e sessenta e oito cêntimos).
 
  
 II – A douta sentença recorrida ao sufragar a avaliação sustentada pelos peritos 
 indicados pelo tribunal e pela expropriante, viola o disposto nos artigos 62°, 
 da Constituição da República Portuguesa, 1310.°, do Código Civil, 23.°, n.° 1, 
 
 26.° e 23.°, n.° 5, do Código das Expropriações, que numa correcta interpretação 
 e aplicação impõem que se sufrague a avaliação sustentada pelo perito do 
 expropriado, ainda que em posição minoritária, e se atribua ao expropriado uma 
 indemnização pela parcela expropriada correspondente a € 5.350,92 (cinco mil, 
 trezentos e cinquenta euros e noventa e dois cêntimos).
 
  
 
 7.  Ora, não pode deixar de concluir-se que, perante o Tribunal a quo, a 
 reclamante não enunciou, ou sequer impugnou com clareza, como inconstitucional, 
 um determinado sentido ou interpretação de uma norma, tendo-se limitado a 
 discutir a correcção da decisão recorrida no plano da aplicação directa dos 
 preceitos do Código das Expropriações (artigos 1.º e 23.º) e do Código Civil 
 
 (artigo 1310.º), todos de direito infra-constitucional. 
 Não causa, aliás, surpresa que o Tribunal da Relação do Porto não tenha 
 apreciado qualquer questão de constitucionalidade normativa. Com efeito, perante 
 a inexistência de um mínimo de substanciação da questão de constitucionalidade, 
 o Tribunal a quo não foi sequer chamado a exercer o poder que lhe confere o 
 artigo 204.º da Constituição da República Portuguesa.
 
  
 
 8.  O simples cotejo das conclusões das alegações de recurso que se trancreveu 
 revelam que a ora reclamante não suscitou de modo processualmente adequado, 
 perante o órgão jurisdicional que proferiu a decisão recorrida, a questão da 
 inconstitucionalidade das normas adoptadas pelo Tribunal a quo enquanto ratio 
 decidendi. Não tendo a reclamante cumprido devidamente o ónus de suscitação de 
 uma verdadeira questão de constitucionalidade de norma durante o processo 
 
 (pressuposto cuja falta já não poderia ser suprida mediante qualquer convite 
 para aperfeiçoamento do requerimento de interposição do recurso), não pode o 
 Tribunal Constitucional tomar conhecimento do objecto do presente recurso de 
 constitucionalidade.
 
  
 
  
 III
 Decisão
 
  
 Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide indeferir a 
 presente reclamação, confirmando a decisão reclamada não tomando, por isso, 
 conhecimento do recurso de constitucionalidade.
 
  
 Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 
  
 
  
 Lisboa, 1 de Outubro de 2008
 Maria Lúcia Amaral
 Carlos Fernandes Cadilha
 Gil Galvão