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Processo n.º 466/07
 
 3ª Secção
 Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins
 
  
 
  
 Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 I – RELATÓRIO
 
  
 
  
 
 1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos 
 do Supremo Tribunal de Justiça, em que figura como recorrente A. e como 
 recorridos o MINISTÉRIO PÚBLICO e B., foi proferida a seguinte Decisão Sumária:
 
  
 
 «I – RELATÓRIO
 
  
 
 1. Nos presentes autos, em que figura como recorrente A. e como recorridos 
 MINISTÉRIO PÚBLICO e B., vindos do Supremo Tribunal de Justiça, o primeiro 
 interpõe recurso do Acórdão de fls. 138 a 141, por – segundo o recorrente – ter 
 aplicado interpretação normativa que atenta contra “os artigos 13º, n.ºs 1 e 2, 
 
 26º, n.ºs 1 e 2, e 202º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa” [cfr. 
 requerimento de fls. 150 a 152]. 
 
  
 
  
 II – DA INADMISSIBILIDADE DO RECURSO 
 
  
 
 2. O recurso foi admitido, nos termos do n.º 1 do artigo 76º da LTC, pelo 
 tribunal recorrido – in casu, o Supremo Tribunal de Justiça –, em 26/03/07, 
 decisão que não vincula o Tribunal Constitucional, conforme resulta do n.º 3 do 
 preceito legal citado. Assim sendo, cumpre, em primeiro lugar, apreciar se estão 
 preenchidos todos os pressupostos de admissibilidade do recurso previstos nos 
 artigos 75º-A e 76º, nº 2, da LTC.
 
  
 
 3. Em sede de verificação dos pressupostos processuais subjectivos do recurso de 
 inconstitucionalidade, determina o n.º 2 do artigo 72º da LTC que apenas é parte 
 legítima o sujeito processual que “haja suscitado a questão da 
 inconstitucionalidade ou da ilegalidade de modo processualmente adequado perante 
 o tribunal que proferiu a decisão recorrida”.
 
  
 Sendo certo que este Tribunal tem admitido, em jurisprudência consolidada (cfr., 
 entre muitos outros, Acórdão nº 117/01), que o objecto da fiscalização da 
 constitucionalidade abrange não só normas jurídicas, como também interpretações 
 normativas, cumpre verificar se o recorrente suscitou de modo adequado a questão 
 da inconstitucionalidade da interpretação normativa aludida no respectivo 
 requerimento de recurso. 
 
  
 
 4. Da análise da alínea f) das conclusões do recurso extraordinário para fixação 
 de jurisprudência (cfr. fls. 112) constata-se que o recorrente não invocou a 
 inconstitucionalidade de qualquer interpretação normativa, limitando-se a 
 convocar em defesa da sua tese o respaldo constitucional decorrente dos artigos 
 
 13º, n.ºs 1 e 2, 26º, n.ºs 1 e 2 e 202º, n.º 2, todos da CRP. 
 
  
 Ora, a mera invocação genérica de preceitos normativos constitucionais em favor 
 de argumentação jurídica sobre a questão controvertida, não colocando em crise 
 qualquer interpretação de norma especificamente identificada, não é bastante 
 para satisfazer as exigências do n.º 2 do artigo 72º da LTC.
 
  
 
 5. Acresce que, independentemente da ausência de invocação de qualquer questão 
 de inconstitucionalidade de uma interpretação normativa, em sede de 
 requerimento, o recorrente nunca identifica qualquer sentido hermenêutico 
 alegadamente extraído da decisão recorrida, limitando-se a transcrever excertos 
 do acórdão recorrido e do acórdão que fundamenta o pedido de fixação de 
 jurisprudência.
 
  
 Através dessa estratégia processual, o recorrente opta por atacar directamente a 
 decisão proferida pelo tribunal recorrido e não qualquer interpretação normativa 
 específica. Limitando-se a invocar excertos da matéria dada como provada nos 
 acórdãos que originaram o pedido de fixação de jurisprudência, o recorrente 
 apenas vem atacar o juízo de subsunção da factualidade ao quadro normativo 
 infra-constitucional aplicável.
 
  
 Ora, nos termos da Constituição e da sua Lei Orgânica, em sede de fiscalização 
 concreta da constitucionalidade, este Tribunal não dispõe de poderes para 
 sindicar juízos de subsunção de factos aos regimes normativos 
 infra-constitucionais aplicáveis, mas apenas tem competência apreciar a 
 inconstitucionalidade de normas  ou de interpretações de normas jurídicas 
 
 “stricto sensu”.
 
  
 
  
 
                                     III. DECISÃO
 
  
 
                                     Nestes termos, e ao abrigo do disposto no do 
 n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe 
 foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, e pelos fundamentos expostos, 
 decide-se não conhecer do objecto do recurso.
 
  
 Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 UC´s, nos termos do 
 n.º 2 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.»
 
  
 
 2. Inconformado com a decisão proferida, o recorrente A. vem agora reclamar para 
 a conferência, ao abrigo do artigo 78º-A, nº 3, da LTC, com os seguintes 
 fundamentos: 
 
  
 
 «A doutíssima decisão sustenta o não conhecimento do recurso, em suma, porque “ 
 
 (…) em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade, este Tribunal não 
 dispõe de poderes para sindicar juízos de subsunção de factos aos regimes 
 normativos infra-constitucionais aplicáveis, mas apenas tem competência para 
 apreciar a inconstitucionalidade de normas ou de interpretações de normas 
 jurídicas stricto sensu.” — parágrafo último do item II da decisão sumária.
 
  
 Salvo o devido e merecido respeito, que muito é, o recorrente discorda da 
 leitura que a Ex.ma Conselheira Relatora fez do seu requerimento, pois que nele 
 se argúi a inconstitucionalidade das normas invocadas na interpretação dada pelo 
 STJ no sentido de que o conjunto de factos que consubstanciam os arestos em 
 oposição de julgados “(...) não contém uma identidade factual bastante para 
 consubstanciar a invocada oposição de julgados, pois que a diferença semântica e 
 a diversa contextualização não são iguais nem sequer idênticas.” parte final do 
 
 3.° parágrafo do requerimento recursivo nesta sede. 
 
  
 Ora, afigura-se ao recorrente, aqui reclamante, que se mostra perfeitamente 
 perceptível que a questão da inconstitucionalidade por si arguida se traduz numa 
 errónea interpretação dada pelo Tribunal a quo quanto à necessidade de haver 
 coincidência de linguagem e contextualização para se poder aferir a oposição de 
 julgados, interpretação esta que não tem correspondência no texto das normas dos 
 n.ºs 1 e 2 do artº 437º do Código de Processo Penal, que se bastam com soluções 
 opostas a uma mesma questão de direito, sendo que a interpretação do espírito 
 legislativo tem que ter uma correspondência mínima no seu texto, ainda que 
 imperfeitamente expressa, como resulta do n.º 2 do artº 9º do Código Civil, e in 
 casu não tem.
 
  
 A pormenorização da factualidade que sustenta cada uma das decisões em confronto 
 
 é ali plasmada tão somente para contribuir à aferição do erro interpretativo e 
 da evidência de matéria incriminante, não para sustentar o recurso em si mesmo. 
 
  
 Ademais, se dúvidas houvesse acerca de alguma deficiência textual do recurso 
 nesta instância, - e sem conceder - sempre o reclamante teria o direito a ver-se 
 convidado a aperfeiçoar o seu requerimento de interposição do recurso, indicando 
 com melhor precisão os necessários elementos adjectivos, segundo a estrita 
 observância do peremptório dispositivo processual previsto no n.º 5 do art.º 
 
 75°-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro.
 
  
 Norma esta que se destaca do edifício processual garantindo que não seja um mero 
 descuido formal ou nebulosa explanação textual que obste à administração da boa 
 justiça, princípio basilar, meta última de todo a estrutura legal, a sujeição do 
 Direito à Justiça.
 
  
 Termos em que se requer que, em conferência, se aprecie o recurso interposto, 
 admitindo-o ou convidando o reclamante à submissão formal adequada, conforme o 
 supra invocado preceito.» 
 
  
 
  
 
 3. Notificado da reclamação, o Ministério Público, junto deste Tribunal veio 
 apenas “dizer que a mesma não põe em causa os fundamentos e o sentido da decisão 
 sumária proferida, pelo que deverá aquela ser indeferida e esta mantida” (fls. 
 
 170). Quanto à recorrida B., notificada para responder ao requerimento de 
 reclamação, não procedeu à entrega de qualquer resposta dentro do prazo 
 legalmente fixado.
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
  
 II – FUNDAMENTAÇÃO
 
  
 
 4. O ora reclamante vem agora, e pela primeira vez, sustentar que “a questão de 
 inconstitucionalidade por si arguida se traduz numa errónea interpretação dada 
 pelo Tribunal «a quo» quanto à necessidade de haver coincidência de linguagem e 
 contextualização para se poder aferir a oposição de julgados, interpretação esta 
 que não tem correspondência no texto das normas dos n.ºs 1 e 2 do artº 437º do 
 Código de Processo Penal, que se bastam com soluções opostas a uma mesma questão 
 de direito” (fls. 166). 
 
  
 Fê-lo, no entanto, tarde demais, uma vez que no sistema português de 
 fiscalização concreta da constitucionalidade, o Tribunal Constitucional apenas 
 pode sindicar, em sede de recurso, as decisões que tenham aplicado norma cuja 
 inconstitucionalidade haja sido suscitada, de modo processualmente adequado, 
 perante o tribunal recorrido.
 
  
 Ora, em sede de alegações de recurso para fixação de jurisprudência, o ora 
 reclamante limita-se a afirmar, de modo genérico e sem referência a qualquer 
 norma individualizada, que, atentos os factos dados como provados, o tribunal 
 recorrido apenas poderia ter concluído pela existência de oposição de julgados, 
 
 “sob pena de, em interpretação diferente, se estar violando os imperativos dos 
 art.s 13º, n.ºs 1 e 2, 26º, n.ºs 1 e 2, e 202º, n.º 2, todos da Constituição da 
 República Portuguesa” (fls. 112 e 113). 
 
  
 Deste modo, reitera-se a fundamentação da decisão sumária, de acordo com a qual 
 o ora reclamante não colocou, atempada e adequadamente, em crise qualquer juízo 
 de inconstitucionalidade de qualquer norma, por parte do tribunal recorrido, mas 
 apenas um juízo quanto à subsunção de factos a determinada qualificação 
 jurídica, neste caso, a de “oposição de julgados”.
 
 5. Daqui decorre que não se trata de uma mera questão de dúvida “acerca de 
 alguma deficiência textual do recurso nesta instância”, conforme sugerido pelo 
 reclamante a fls. 166, mas antes da verificação de que a questão de 
 inconstitucionalidade não foi oportuna e adequadamente suscitada de modo a que o 
 tribunal recorrido ficasse obrigado a dela conhecer, pelo que de nada teria 
 servido à ora Relatora ter convidado o reclamante a aperfeiçoar o requerimento 
 de interposição do recurso para este Tribunal, nos termos do n.º 5 do artigo 
 
 75º-A da LTC, dado que nunca esse aperfeiçoamento seria susceptível de suprir – 
 como é evidente – as deficiências das alegações já oportunamente produzidas e 
 apreciadas pelo Supremo Tribunal de Justiça. 
 
  
 Assim sendo, o reclamante não conseguiu abalar a bondade dos fundamentos da 
 decisão sumária, pelo que a presente reclamação é manifestamente improcedente.
 
  
 
  
 
  
 III. DECISÃO
 
  
 Pelos fundamentos supra expostos, e ao abrigo do disposto no do n.º 3 do artigo 
 
 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei 
 n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decide-se indeferir a presente reclamação, 
 confirmando, assim, a decisão reclamada de fls. 159 a 161 dos presentes autos.
 
  
 Custas devidas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC´s, nos 
 termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.
 Lisboa, 4 de Julho de 2007
 Ana Maria Guerra Martins
 Vítor Gomes
 Gil Galvão