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Processo n.º 252/05
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Vítor Gomes
 
  
 
  
 
  
 Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
 1.        O relator proferiu a seguinte decisão sumária:
 
  
 
 “1. A., identificada nos autos, intentou no Tribunal do Trabalho de Vila Nova de 
 Gaia, contra B., S.A., também ali identificada, acção emergente de contrato de 
 trabalho pedindo que fosse declarado nulo o seu despedimento e, em consequência, 
 que a ré fosse condenada a pagar-lhe as quantias indicadas na petição, no 
 montante global de 2.572.875$00, bem como as retribuições devidas desde a data 
 do despedimento até à sentença e, ainda, a reintegrá-la no seu posto de 
 trabalho.
 A ré arguiu a sua ilegitimidade na contestação com o fundamento de que a partir 
 de 1 de Agosto de 2000 a entidade patronal da autora passou a ser a C. S.A. – 
 Departamento de Catering, por ter sido a esta que foi atribuída a concessão do 
 refeitório onde a autora trabalhava, e, em reconvenção, pediu que se declarasse 
 extinto o vínculo laboral existente entre autora e ré a partir daquela data. A 
 autora requereu a intervenção provocada da dita sociedade, a qual foi admitida.
 A chamada contestou alegando a invalidade e ilegalidade da admissão do 
 chamamento, defendendo que a entidade patronal da autora era a ré, o que foi 
 indeferido, tendo, então a chamada interposto recurso de agravo o qual subiu com 
 o recurso interposto da sentença final.
 Por acórdão de 2 de Junho de 2003, o Tribunal da Relação do Porto revogou o 
 despacho que admitiu o chamamento, por entender que foi deduzido 
 extemporaneamente, e ordenou a repetição do julgamento, dado que neste foi 
 produzida prova que tinha sido arrolada pela chamada.
 Efectuado novo julgamento veio a ser proferida sentença a condenar a ré B. a 
 pagar à autora a quantia de € 237,66, respeitante a subsídio de férias em falta, 
 absolvendo-a dos demais pedidos, com o entendimento de que “a posição que do 
 contrato de trabalho da A. resultava se transmitiu para a C.”, nos termos do 
 artigo 37.º da LCT, pelo que não tendo a C. aceitado o trabalho da autora e 
 recusado ser sua entidade patronal, era de considerar que a despediu “sem justa 
 causa e sem processo disciplinar”, não podendo a ré B. ser condenada em 
 consequência deste despedimento e responsabilizada pelos créditos dele 
 resultantes.
 
 2. Inconformada recorreu a autora para o Tribunal da Relação do Porto, invocando 
 a ilegalidade do seu despedimento, que entende ser nulo, por falta de processo 
 disciplinar, pedindo a consequente condenação da ré nas quantias peticionadas. 
 Nas suas alegações formulou a autora as seguintes conclusões:
 
 1.                   «A autora fazia parte do quadro de pessoal da ré.
 
 2.                   A ré explorava apenas o refeitório onde trabalhava a A., 
 mas, tendo terminado o contrato de exploração onde trabalhava a A., nada impedia 
 que a ré atribuísse outras funções e noutro local à autora.
 
 3.                   A autora foi despedida, sem processo disciplinar, tal como 
 resulta da matéria de facto, pelo que tal despedimento é nulo.
 
 4.                   Sendo nulo, terá a ré de ser condenada a indemnizar a 
 autora, nos termos dos pedidos n.º 2 e 3 da petição inicial.
 
 5.                   Foi violado o disposto nas al. A) e b) do artigo 13º do 
 D.L. 64-A/89, de 27/2.»
 
  
 A ré B. interpôs recurso subordinado, suscitando, além do mais, a questão da sua 
 ilegitimidade “quanto ao pedido formulado pelo apelante relativamente aos 
 créditos vencidos após a transmissão do estabelecimento”, concluindo as suas 
 alegações nos seguintes termos:
 
  
 
 1.                  «A aferição da legitimidade das partes em função da alegada 
 titularidade do objecto do processo, da forma unilateral como o autor configura 
 a acção controvertida, viola os arts. 2º e 20º da C.R.P..
 
 2.                  A interpretação do art. 37º da L.C.T. que não considera 
 abrangido no referido normativo as situações em que uma empresa que confiava 
 determinado serviço a outra, põe termo ao contrato, passando ela própria a 
 assegurar tais serviços, ou entrega os mesmos a uma terceira, estranha ou do 
 mesmo grupo e desde que, a operação seja acompanhada da transferência de uma 
 entidade económica entre as duas empresas, viola o artigo 53º e 8º da C.R.P.»
 
  
 O Ministério Público no Tribunal da Relação do Porto lavrou o parecer de fls. 
 
 403 a 407, pugnando pelo não provimento da apelação e pelo não conhecimento do 
 recurso subordinado da ré por “falta de legitimidade desta para recorrer”, visto 
 ter obtido ganho de causa.
 
 3. Por acórdão de fls. 412 a 422, o Tribunal da Relação do Porto decidiu não 
 conhecer do recurso subordinado interposto pela ré e julgar procedente a 
 apelação, revogando a sentença recorrida na parte em que absolveu a ré B. e, em 
 consequência, declarou ilícito o despedimento da autora e condenou a ré B. a 
 reintegrá-la e a pagar-lhe a quantia de € 33.290,91, absolvendo-a dos demais 
 pedidos. Manteve ainda a sentença na parte em que havia condenado a ré a pagar a 
 quantia de € 237,66.
 Para tanto, fundamentou-se este aresto no seguinte:
 
  
 
 «III
 Recurso principal.
 Questão a apreciar.
 Se face á matéria provada, e sendo o despedimento da Autora ilícito, deveria o 
 Réu ser condenado a pagar-lhe as quantias referentes ao despedimento.
 O Mmo. Juiz a quo considerou que a factualidade provada aponta para a aplicação 
 do disposto no art.37 da LCT, pelo que tendo o estabelecimento onde laborava o 
 Réu sido entregue á C. - Departamento de Catering, e tendo esta recusado o 
 trabalho da Autora, é o Réu totalmente estranho á situação de despedimento 
 operado pela Sociedade C.. E como bem refere o Mmo. Juiz a quo, não existem 
 dúvidas que a Autora foi despedida. A questão é saber quem a despediu, ou seja, 
 qual era a entidade patronal da Autora: o Réu ou a C. S.A.
 A Autora, nas suas alegações de recurso, defende que o Réu não era dono do 
 estabelecimento onde trabalhava, pois apenas detinha a sua exploração, e que 
 face ao acordo celebrado em 28.7.95 passou a Autora a fazer parte do quadro de 
 pessoal do Réu, concluindo, assim, que a sua entidade patronal, na data do 
 despedimento, era o apelado e mais ninguém. Analisemos então.
 A. O contrato celebrado entre a D. e o Réu.
 Conforme os arts.2 e 3 do referido contrato o Réu obrigou-se a fornecer 
 refeições no estabelecimento da D., nos horários, frequência e forma previstos 
 nas condições suplementares (nas condições suplementares são referidos os 
 horários do restaurante e do bar, a composição da refeição, o custo das matérias 
 primas e outras condições). E segundo o art.5 nº1 do mesmo contrato a D. - dona 
 do refeitório - obrigou-se a pagar ao Réu as facturas mensais que este lhe 
 apresentar até 60 dias após a data da factura.
 E do teor de tais artigos conclui-se que o Réu não se obrigou a pagar «Uma 
 renda» ou qualquer quantia como contrapartida da exploração concedida (situação 
 que geralmente acontece quando se está perante uma concessão de exploração de 
 estabelecimento). Melhor dizendo, o Réu não se vinculou a prestar qualquer 
 prestação à D., mas antes foi esta que se obrigou a pagar os serviços ajustados 
 ao Réu – traduzidos no fornecimento de refeições.
 Tal significa que entre a D. e o Réu foi celebrado um contrato de prestação de 
 serviços e de fornecimento.
 E não obstante a existência de um contrato de prestação de serviços, poder-se-á 
 falar na existência de um estabelecimento – o refeitório – com vista a 
 aplicar-se o disposto no art. 37 da LCT?
 
  Vejamos então.
 O facto de o fornecimento de refeições ter de ser efectuado no dito refeitório 
 da D. –refeitório este apetrechado com mobiliário, máquinas e utensílios 
 facultados pela dona do mesmo –, tal não é suficiente para se concluir pela 
 existência de um estabelecimento comercial, com o significado de uma unidade 
 produtiva autónoma, ou como organização específica, susceptível, assim, de 
 transmissão ou transferência.
 Na verdade, a dona do refeitório – a D. –, conforme matéria provada, é uma 
 empresa participada do Grupo C. e tem por objecto a «elaboração e utilização de 
 elementos pré-fabricados, nomeadamente de construção civi1» - ,fls.212, 214 e 
 
 216 dos autos. A sua actividade não está, assim, ligada, á exploração de bares e 
 refeitórios. E se assim é não parece que a D. ao estabelecer que o Réu serviria 
 as refeições no seu refeitório, com tal estivesse a «criar» um estabelecimento 
 comercial, um valor de mercado.
 E o facto de no contrato em análise se falar em estabelecimento – art.1 nº 2 –, 
 certo é que tal é insuficiente para se concluir pela existência do mesmo. Aliás, 
 o Tribunal não está vinculado á qualificação jurídica que as partes dão aos 
 factos – art.664 do C.P.C..
 Não se desconhece que o conceito de estabelecimento constante do art.37 da 
 L.C.T. tem sido entendido de forma mais ampla.
 
 É a posição defendida pelo S.T.J. – na sequência da Directiva Comunitária 
 nº77/l87/CEE, na redacção dada pela Directiva 98/50/CE do Conselho de 29.6.98 – 
 que «para determinação de uma situação de transmissão de empresa, para efeitos 
 do art.37 da lei do contrato de trabalho - manutenção da identidade económica da 
 empresa, estabelecimento ou parte dele – não é necessário que existam relações 
 contratuais directas entre o cedente e o cessionário, pois que a transferência 
 se poderá efectuar também em duas fases, ou até por intermédio de um terceiro, 
 importando tão somente a conservação da identidade do estabelecimento e 
 prossecução da respectiva actividade, ou seja, sempre que a exploração da 
 empresa seja prosseguida sem interrupção pelo novo adquirente» – ac. do S.T.J. 
 de 27.9.00 no B.M.J. 499, p.281.
 Contudo, no caso, e mesmo seguindo o entendimento defendido pelo S.T.J., certo é 
 que o conjunto formado pelo refeitório – com os utensílios e máquinas aí 
 existentes – não constitui um todo organizado com vista ao exercício de uma 
 actividade. Antes diríamos que a D. se limitou a disponibilizar o local onde as 
 refeições deveriam ser servidas.
 Assim, e em conclusão, se dirá que
 
 1. Face ao teor do contrato celebrado entre a D. e o Réu conclui-se que entre 
 eles foi celebrado um contrato de prestação de serviços e fornecimento.
 
 2. Tal contrato, assim definido, não representa a exploração de um 
 estabelecimento comercial por parte do Réu.
 
 3. Pelo que ao caso não é aplicável o disposto no art.37 da LCT, o qual 
 pressupõe a existência de um estabelecimento.
 B. O acordo celebrado entre a C., o Réu e a Autora.
 Face ao teor do referido acordo, em especial as cls.2ª e 3ª, verifica-se que a 
 dita Sociedade cedeu a sua posição contratual ao Réu, no que respeita ao 
 contrato de trabalho que celebrou com a Autora – art.424 do C.C. –, ou seja, o 
 Réu, como cessionário, passou, por força do dito acordo, a ser a entidade 
 patronal da Autora, sendo certo que esta, com tal cedência, manteve todos os 
 direitos e regalias que até então usufruía ao serviço da Sociedade cedente.
 Isto significa que a partir de 1.8.95 o Réu passou a ser a entidade patronal da 
 Autora e obrigou-se a garantir-lhe como local de trabalho as instalações da D. 
 ou na área metropolitana do Porto – cl. 4ª do referido acordo.
 E a questão que se coloca é a seguinte: tendo o contrato de prestação de 
 serviços e fornecimento celebrado entre a D. e o Réu terminado para no 
 refeitório passar a prestar os mesmos serviços a C. – Departamento de Catering, 
 passou esta a ser a entidade patronal da Autora?
 A resposta terá de ser negativa pelas razões que atrás se deixaram expostas.
 Com efeito, se entre a D.e o Réu não houve transmissão de estabelecimento, por 
 precisamente o refeitório não ser um estabelecimento comercial, igual conclusão 
 há que retirar no caso da C. – Departamento de Catering, a qual sucedeu ao Réu.
 E precisamente por não se estar perante um estabelecimento comercial é que a C. 
 
 – que não era dona do refeitório – celebrou com o Réu e a Autora o contrato de 
 cessão da posição contratual.
 Se no caso houvesse transmissão ou transferência do estabelecimento 
 desnecessário era a celebração do acordo de cessão da posição contratual atento 
 o disposto no art.37 da LCT. A tal conclusão se chega conjugando o teor do 
 contrato e acordo juntos aos autos.
 Por isso, com a celebração do acordo de cessão da posição contratual passou a 
 Autora a pertencer aos quadros do Réu, pelo que estava este obrigado a mantê-la 
 ao seu serviço, independentemente de ele – Réu – manter-se ou não naquele 
 refeitório por força do contrato que celebrou com a dona do mesmo.
 E no caso do Réu – B. – é mais flagrante a inexistência de um estabelecimento 
 aquando da cessação do contrato de prestação de serviços, na medida em que ele 
 cessou a sua actividade nesse refeitório mas não cessou a actividade a que se 
 dedica.
 Mas poderia argumentar-se: mas então teria o Réu que receber todos os empregados 
 que trabalham nos refeitórios e nos quais aquele presta serviços! E certo que 
 para o Réu não decorre tal obrigação. Só que como no caso foi celebrado o acordo 
 de cessão da posição contratual, a obrigação de o Réu receber a Autora decorre 
 de tal acordo, já que não se está perante um estabelecimento.
 E o CCT celebrado entre a ARESP e a FETESE para o sector das cantinas, 
 refeitórios e fábricas de refeições publicado no BTE nº 3, 1ª série, de 22.1.95, 
 veio acautelar, no art.56 nº1, precisamente aquelas situações em que não existe 
 transmissão do estabelecimento, determinando que «quando se verificar a cessação 
 do contrato celebrado entre a entidade concedente e a concessionária, a entidade 
 que passar a executar e ou a supervisionar o serviço, seja ou não a própria 
 cedente, obriga-se a ficar com todos os trabalhadores que ali normalmente 
 prestem serviço há mais de 90 dias imediatamente anteriores á data da 
 cessação...» – neste sentido é a posição de Maria Regina Redinha em «a 
 mobilidade interempresarial na contratação colectiva», em Questões Laborais, ano 
 
 1996, nº 8, p.152 e segts.
 Contudo, tal preceito não é aplicável ao caso dos autos por a PE publicada no 
 BTE nº 24/95 ter excluído – art.1 – do âmbito da sua aplicação as entidades 
 patronais que se dediquem á actividade de catering, como é o caso da C. – 
 Departamento de Catering.
 Por tudo o que se deixou dito conclui-se, assim, que a carta enviada pelo Réu á 
 Autora configura um despedimento ilícito, na medida em que ele era a entidade 
 patronal da Autora.
 C. Das quantias devidas á Autora por força do despedimento.
 Está provado que a Autora foi admitida ao serviço da Sociedade Construções C. em 
 
 2.6.86.
 Assim, e atento o disposto no art.13 nº 1 al. b) da LCCT tem a Autora direito a 
 ser reintegrada e a receber as remunerações devidas desde a data do despedimento 
 
 – 1.8.00 – até á data do presente acórdão nos termos do art.13 nº1 al. a) do 
 mesmo diploma legal e acórdão uniformizador de jurisprudência com o nº 1/04 
 publicado no DR nº7, I-A série, de 9.1.04, a saber:
 
 1. Remuneração de Agosto a Dezembro de 2000 e subsídio de Natal no montante de 
 
 686.100$00 (114.350$00X6) - € 3.422,25;
 
 2. Remunerações de Janeiro a Dezembro e subsídios de férias e de natal, e no que 
 respeita aos anos de 2001,2002, 2003, no montante de 4.802.700$00 
 
 (114.350$00X42) - € 23.955,77;
 
 3. Remunerações de Janeiro a 11 de Outubro de 2004 e subsídio de férias no 
 montante de 1.185.428$00 (114.350$00X10 + 114.350$00:30X 11) - € 5.912,89. 
 Total: € 33.290,91. Improcede o pedido de indemnização formulado pela Autora ao 
 abrigo do art.13 nº 3 da LCCT já que a mesma não deu cumprimento á parte final 
 da al. b) do nº 1 da citada disposição legal, bem como improcede o pedido de 
 pagamento dos créditos que reclamou ao abrigo do art.10 do D.L.874/76 de 28.12, 
 na medida em que a Autora é reintegrada, não tendo, assim, cessado a relação 
 laboral. Relativamente às férias vencidas e não gozadas a sentença recorrida 
 conheceu de tal questão a qual não foi objecto de recurso por parte da Autora.
 
 ***
 IV
 Recurso subordinado
 Questão prévia – sua admissibilidade.
 O Réu B. veio recorrer subordinadamente pedindo que seja declarado parte 
 ilegítima quanto aos direitos da Autora vencidos após a transmissão do 
 estabelecimento operada em 1.8.00, assim se mantendo a sua absolvição quanto aos 
 pedidos relativos a créditos posteriores àquela data.
 O pedido formulado pelo Réu – e que é objecto do recurso subordinado – não é 
 admissível na medida em que relativamente ao mesmo Réu – B. – obteve vencimento.
 Na verdade, a sentença recorrida sufragou e atendeu à posição ora colocada pelo 
 B. no presente recurso. E sendo pressuposto do recurso subordinado que a parte 
 tenha ficado vencida – art. 682º, n.º1, do CPC – decide-se não conhecer do 
 recurso subordinado interposto pelo Réu.»
 
 4. Inconformada com este aresto veio a ré B., SA., com fundamento na alínea b) 
 do n.º 1 do artigo 70.º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, interpor recurso 
 para o Tribunal Constitucional, nos seguintes termos:
 
  
 
 «O recurso tem cabimento, desde logo, porque desse douto Acórdão já o requerente 
 não pode interpor qualquer recurso ordinário por já haverem sido esgotados todos 
 os que no caso cabiam.
 Depois, porque perante o TRIBUNAL CONSTITUCIONAL a requerente pretende sustentar 
 que é inconstitucional e ilegal a interpretação do art. 37.º da lei Individual 
 do Contrato de Trabalho, que considera que sendo fornecidas refeições por certa 
 empresa em refeitório, devidamente equipado, pertencente a outra empresa que 
 contratou esse fornecimento, não se aplica o art. 37.º da LICT, por isso ser 
 insuficiente para se concluir pela existência de um estabelecimento comercial.
 O que seria indispensável e é condição de aplicabilidade do citado art. 37.º.
 A ser inconstitucional tal interpretação, como pensa a requerente que é, a sua 
 aplicabilidade sobrepõe-se e inutiliza as consequências jurídicas que pudessem 
 derivar do Acordo de Cessão de Posição Contratual celebrado entre a C., o Réu e 
 a Autora e considerado determinante pelo douto Acórdão para se decidir como se 
 decidiu.
 O que, neste particular, corresponde à questão de saber se a constitucionalidade 
 se encontra ou não na decisão da primeira instância (agora revogada) e na 
 posição defendida pelo Senhor Procurador da República no seu douto parecer, 
 segundo o qual o disposto no art. 37º da LCT., impunha-se “a todos os 
 trabalhadores independentemente da sua vontade”.
 A existência ou inexistência de estabelecimento in casu foi analisada pelo 
 requerente, designadamente na alínea d) das contra-alegações apresentadas em 
 
 2002/12/16, para responder a alegações da empresa C., S.A..
 E, nas alegações do recurso subordinado, que foi sucessivamente considerado 
 admissível e legal até à decisão final, o requerente, prevenindo a hipótese de 
 ir de “vitória em vitória” até á inapelável “derrota final” alegou que a 
 condenação da Ré, a ora requerente, assim imposta constituiria só por si uma 
 violação do art. 53.º e 8.º da Constituição da República Portuguesa.
 Porquanto, constituiria uma decisão surpresa que estaria em contravenção coma 
 prática e violaria normas convencionais que os sindicatos e empregadores 
 quiseram consagrar para os casos como o que constitui o objecto destes autos e 
 violaria ainda as normas do Direito Comunitário referidas nas doutas sentenças 
 da primeira instância e as normas constitucionais acima citadas».
 E, no ponto 2, das alegações apresentadas no recurso subordinado, mais 
 precisamente refere que “A interpretação do art. 37.º da LCT que não considera 
 abrangido no referido normativo as situações em que uma empresa que confiava 
 determinado serviço a outra, põe termo ao contrato, passando ela própria a 
 assegurar tais serviços, ou entrega os mesmos a uma terceira estranha ou do 
 mesmo grupo e desde que a operação seja acompanhada da transferência de uma 
 entidade económica entre as duas empresas viola o art. 53.º e 8.º da C.R.P.”»
 
  
 
 5. O recurso foi admitido no tribunal a quo por despacho de fls. 431, mas tal 
 decisão não vincula o Tribunal Constitucional (cfr. n.º 3 do artigo 76.º da Lei 
 n.º 28/82, de 15 de Novembro), entendendo-se, no caso, não poder conhecer-se do 
 objecto do recurso, por falta dos respectivos pressupostos de admissibilidade, 
 sendo de proferir decisão sumária ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 
 
 78.º-A da citada Lei n.º 28/82.
 Com efeito, a admissibilidade do recurso de fiscalização concreta de 
 constitucionalidade, interposto ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, 
 alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, como é o caso, implica, para que 
 possa ser admitido e conhecer-se do seu objecto, a congregação de vários 
 pressupostos, entre os quais a aplicação pelo Tribunal recorrido, como sua ratio 
 decidendi, de norma cuja constitucionalidade haja sido suscitada durante o 
 processo, considerada esta norma na sua totalidade, em determinado segmento ou 
 segundo certa interpretação, mediatizada pela decisão recorrida.
 Assim, tem o recorrente o ónus de referenciar normativamente, de forma clara e 
 perceptível, a questão de constitucionalidade, em termos de o Tribunal recorrido 
 saber que tem essa questão para resolver, pondo, desse modo, em causa, por 
 alegada violação de preceito ou de princípio constitucional, o critério jurídico 
 utilizado na decisão ao aplicar a norma jurídica questionada.
 
 6. Dispõe o n.º 2 do artigo 72.º da LTC que o recurso previsto na alínea b) do 
 n.º 1 do artigo 70.º só pode ser interposto pela parte que haja suscitado a 
 questão da inconstitucionalidade ou ilegalidade “de modo processualmente 
 adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este 
 estar obrigado a dela conhecer”.
 No caso, verifica-se que a ora recorrente apenas suscitou a questão de 
 constitucionalidade da interpretação do artigo 37.º da LCT, que quer submeter a 
 apreciação do Tribunal Constitucional, nas alegações do recurso subordinado que 
 interpôs da sentença de 1ª instância. É, aliás, essa a peça processual que a 
 recorrente refere no requerimento de interposição, quando trata de dar 
 cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 75.º-A da LTC, como lugar onde 
 suscitou a questão de constitucionalidade. 
 Sucede, porém, que o Tribunal da Relação não conheceu do recurso subordinado, 
 por julgar tal recurso inadmissível. Esta decisão de não conhecimento tornou-se 
 definitiva, não estando em causa no presente recurso a norma que a isso 
 conduziu. Assim sendo, é inevitável concluir que a recorrente não colocou a 
 questão de constitucionalidade de modo processualmente adequado perante o 
 tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a 
 dela conhecer. Seria contraditório afirmar que um recurso subordinado de que o 
 tribunal da causa não conhece por ser inadmissível é meio adequado para colocar 
 uma questão de constitucionalidade em termos de esse “tribunal estar obrigado a 
 dela conhecer”. Salvo, obviamente, se a questão respeitar a essa mesma 
 admissibilidade, o que não é o caso.
 E não estamos perante uma daquelas situações excepcionais ou anómala em que a 
 jurisprudência do Tribunal, num entendimento funcionalmente adequado do referido 
 
 ónus, vem admitindo não ser exigível a colocação da questão antes de ser 
 proferida a decisão recorrida. Pelo contrário, no desenrolar normal da lide, a 
 recorrente dispôs da oportunidade para confrontar o tribunal a quo com esta 
 questão de inconstitucionalidade, que foram as contra-alegações do recurso 
 principal. 
 Com efeito, a sentença considerara que tinha havido transmissão de 
 estabelecimento e que isso impunha a transmissão da posição no contrato de 
 trabalho para o cessionário, nos termos do artigo 37.º da LCT. A autora, no 
 recurso para a Relação, sustentou que a matéria de facto não permitia configurar 
 qualquer transmissão de estabelecimento entre a ré B. e a C. S.A., mas apenas 
 uma cessão de exploração que cessara, continuando a autora a fazer parte do 
 quadro de pessoal da B. onde ingressara por força do acordo anteriormente 
 celebrado entre esta empresa e aquela outra. Estava, assim, claramente colocada 
 a questão da qualificação dos factos como transmissão de estabelecimento para 
 efeitos do artigo 37.º da LCT. Era essa a questão colocada em primeira linha – 
 depois, perante a resposta positiva, teria ainda de saber-se qual o grau e 
 sentido da imperatividade desse regime -   pelo que, se a ora recorrente 
 pretendia objectar com a inconstitucionalidade desse entendimento oposto ao da 
 sentença e que a autora queria ver aceite pela Relação, o modo processualmente 
 idóneo seria  contra-alegar e levantar aí a questão da inconstitucionalidade.  
 Optou, porém, por não produzir tais alegações, deslocando a questão para um 
 recurso subordinado inadmissível, pelo que não pode considerar-se cumprido o 
 
 ónus de suscitar a questão perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida.
 Tanto basta para que não possa conhecer-se do objecto do recurso.  
 
 7. E, face do exposto, decide-se, nos termos do n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei 
 n.º 28/82, de 15 de Novembro, não tomar conhecimento do objecto do recurso.
 Custas a cargo da recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 unidades de 
 conta. “
 
  
 
  
 
  
 
 2. A recorrente reclamou para a conferência ao abrigo do n.º 3 do artigo 78.º-A 
 da LTC, argumentando em síntese: 
 
  
 
 - Com a importância económica e social em obter uma resposta segura dos 
 tribunais à questão de direito laboral com que se articula a questão de 
 constitucionalidade e o relevo jurídico-constitucional desta;
 
 -  Que, apesar da possível inadequação formal da via escolhida, o certo é que 
 nada na lei processual obriga a apresentar contra-alegações e que  a questão de 
 constitucionalidade foi claramente colocada pela ora reclamante no recurso 
 subordinado, em clara oposição ao expresso nas alegações da contraparte, em 
 termos de o Tribunal da Relação não poder ignorar que estava em crise a 
 constitucionalidade do entendimento que acabou por fazer vencimento.
 
  
 
  
 
 3. A parte contrária não respondeu à reclamação.
 
  
 
  
 
 4. As, aliás judiciosas, considerações da reclamante não abalam os fundamentos 
 da decisão reclamada, nomeadamente as vertidas no seu n.º 6 acima transcrito, 
 que se confirmam.
 
  
 Acrescentar-se-á, apenas, que o facto de o recorrido não ter, em geral, o ónus 
 de apresentar contra-alegações é irrelevante para o problema. O recorrido está 
 sujeito à regra do n.º 2 do artigo 72.º da LTC e ao ónus que decorre deste 
 preceito, em conjugação com a alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da mesma Lei e a 
 alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º da Constituição, e que não depende da posição 
 que o interessado ocupe na instância,nem da fase do processo. Quem obteve ganho 
 de causa por decisão sujeita a recurso, se entende que a pretensão da parte 
 contrária assenta em norma (ou sentido normativo) inconstitucional, tem de 
 precaver-se, suscitando essa inconstitucionalidade de modo processualmente 
 adequado perante o tribunal que vai julgar o recurso, para poder aceder ao 
 Tribunal Constitucional (ao abrigo deste fundamento de recurso de fiscalização 
 concreta e constitucionalidade) perante eventual decisão que o venha a 
 desfavorecer. O que não pode dar-se por cumprido através do que tenha sido 
 alegado no recurso subordinado, a pretexto de que, de um modo ou de outro, o 
 tribunal da causa sempre foi alertado para a existência da questão de 
 constitucionalidade. As alterações introduzidas na LTC pela Lei n.º 13-A/98, de 
 
 26 de Fevereiro, tornaram expressa a exigência de que a questão seja suscitada 
 de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão 
 recorrida, em termos de este estar obrigado a dele conhecer. A rejeição desse 
 recurso, cujo acerto não está agora em discussão, implica um juízo definitivo de 
 inadequação desse meio, no caso concreto, para vincular o tribunal da causa a 
 apreciar as questões nele versadas. 
 
  
 
  
 
 5. Decisão
 
  
 Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação e condenar a recorrente nas 
 custas, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
 Lisboa, 22 de Setembro de 2006
 Vítor Gomes
 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
 Artur Maurício