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Processo n.º 73/06                                          
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria Helena Brito
 
  
 
  
 Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 
  
 I
 
  
 
  
 
 1.            A Companhia de Seguros A., SA. requereu, a fls. 276, a remição 
 obrigatória da pensão que vinha sendo atribuída a B., em consequência de 
 acidente de trabalho de que resultara a morte do seu cônjuge.
 
  
 
                  O acidente de trabalho ocorrera em 4 de Outubro de 1966 (fls. 
 
 276).
 
  
 
                  O valor originário da pensão era inferior a seis vezes a 
 remuneração mínima mensal garantida mais elevada, vigente nessa data, 
 perfazendo, com as sucessivas actualizações, o valor de mil oitocentos e seis 
 euros e trinta e oito cêntimos (fls. 276).
 
  
 
                  O Ministério Público promoveu que se deferisse a requerida 
 remição (fls. 284).
 
  
 
                  A beneficiária da pensão opôs-se à respectiva remição (fls. 
 
 287).
 
  
 
                  O Ministério Público manteve a promoção anterior (fls. 290).
 
  
 
  
 
 2.            Em 21 de Novembro de 2005, foi proferida a seguinte sentença pelo 
 juiz do Tribunal do Trabalho de Bragança (fls. 292 e seguintes):
 
  
 
  “[…]
 
 2. Nos termos dos artigos 33° n.º 1 da Lei 100/97 de 13/9 e 56° n.º 1 als. a) e 
 b) do D.L. 143/99 de 30/4, aplicável às pensões resultantes de acidentes 
 ocorridos antes da sua entrada em vigor, por força do disposto no artigos 41° 
 n.º 2 al. a) da Lei, passaram a ser obrigatoriamente remíveis as pensões anuais 
 devidas a sinistrados e a beneficiários legais de pensões vitalícias que não 
 sejam superior a seis vezes a remuneração mínima mensal garantida mais elevada à 
 data da fixação da pensão e as devidas a sinistrados, independentemente do valor 
 da pensão anual, por incapacidade permanente e parcial inferior a 30%. 
 Alinhamos com a posição expressa no Ac. do STJ de 13/7/2004 (n.º convencional 
 JSTJ000, in http://www.dgsi.pt), no sentido de que a data da fixação da pensão 
 não pode ser entendida como a data da decisão judicial que a fixou, mas antes a 
 data a partir da qual a pensão é devida. Esta tese não colide, salvo melhor 
 entendimento, com a jurisprudência uniforme fixada pelo STJ no seu Acórdão n.º 
 
 4/2005, publicado no DR I-A de 2/5/2005. 
 Ora, a pensão em causa é devida à beneficiária desde 5/10/1966. Por sua vez, o 
 seu valor inicial era de 2.738$75 (€ 13,66), ou seja, era inferior a seis vezes 
 a remuneração mínima mensal garantida mais elevada estabelecida pela primeira 
 vez pelo D.L. 217/74 de 27/5, que era de 3.300$00 (€ 13,64). 
 Estariam, pois, à partida, reunidos os pressupostos legais necessários à remição 
 obrigatória da pensão. 
 
 3. Contudo, tal como vem sendo entendido pelo Tribunal Constitucional 
 relativamente às pensões emergentes de incapacidades parciais permanentes 
 superiores a 30%, também no caso de pensões vitalícias por morte devidas aos 
 beneficiários legais as normas dos artigos 56° n.º 1 al. a) e 74° do D.L. 143/99 
 de 30/4 estão feridas de inconstitucionalidade por violação do direito à justa 
 reparação por acidente de trabalho ou doença profissional, consagrado no art. 
 
 59º n.º 1 al. f) da Constituição, quando interpretadas no sentido de imporem a 
 remição obrigatória total dessas pensões vitalícias, independentemente da 
 vontade do pensionista. 
 Transcreve-se, por elucidativa, parte da fundamentação do Acórdão n.º 56/2005 do 
 Tribunal Constitucional publicado no Diário da República, II Série, n.º 44 de 
 
 3/5/2005, doutamente relatado pelo Exm° Conselheiro Paulo Mota Pinto, no qual se 
 apreciou a inconstitucionalidade material do citado art. 74° do D.L. 143/99, 
 quando interpretado no sentido de abranger no conceito de pensões de reduzido 
 montante todas as pensões infortunísticas laborais, incluindo nelas as situações 
 de total ou elevada incapacidade permanente: 
 
 […]
 
 4. Os ensinamentos resultantes da jurisprudência constitucional citada, embora 
 se refiram ao artigo 74° do D.L. 143/99 de 30/4, valem igualmente para o art. 
 
 56° n.º 1 al. a) quando interpretado no sentido de impor a remição obrigatória 
 total, isto é independentemente da vontade do titular, de pensões atribuídas por 
 incapacidades parciais permanentes iguais ou superiores a 30%, na medida em que, 
 ao impor uma limitação ao direito do sinistrado poder optar, ou pela remição, 
 ou, antes, pelo recebimento da sua pensão sob a forma de renda anual, tal 
 interpretação põe em causa o princípio constitucional do direito à justa 
 reparação por acidente de trabalho ou doença profissional estabelecido no art. 
 
 59° n.º 1 al. f) da Constituição. 
 E valem também, salvo melhor entendimento, nos casos em que o pensionista não é 
 o trabalhador sinistrado, mas antes um seu beneficiário legal. 
 Com efeito, a lei estende o regime especial da reparação dos acidentes de 
 trabalho aos familiares dos trabalhadores, como decorre do disposto no art. 1° 
 da Lei 100/97, o que se justifica, na medida em que aqueles familiares 
 beneficiam, se não mesmo dependem, dos rendimentos do trabalho por estes 
 auferidos. Como decorre do disposto no art. 20° da referida lei, o direito 
 desses familiares é reconhecido, nuns casos, independentemente destes terem ou 
 não rendimentos próprios (cônjuge ou pessoa em união de facto e filhos até aos 
 
 25 anos enquanto frequentarem ensino médio ou superior ou quando afectados de 
 doença física ou mental que os incapacite sensivelmente para o trabalho) e, 
 noutros casos, porque o trabalhador contribuía regularmente para o seu sustento 
 
 (ascendentes ou quaisquer parentes sucessíveis à data da morte até aos 25 anos 
 enquanto frequentarem ensino médio ou superior ou quando afectados de doença 
 física ou mental que os incapacite sensivelmente para o trabalho). Em todas as 
 situações o pressuposto da atribuição ao beneficiário legal de uma pensão por 
 morte do trabalhador sinistrado é o da contribuição deste, presumida ou 
 efectiva, para o sustento daquele. Daí que a pensão por morte atribuída aos 
 beneficiários legais tenha a natureza de uma prestação de carácter alimentício, 
 que, se para uns funcionará como um complemento aos seus meios de subsistência, 
 para outros será o principal, se não mesmo o único meio de assegurar uma 
 subsistência condigna. 
 Em qualquer caso, o direito constitucional à justa reparação dos danos 
 emergentes de acidente de trabalho postula que, à semelhança do que sucede no 
 caso do pensionista ser o próprio trabalhador sinistrado, seja o beneficiário 
 legal, no seu livre arbítrio, a decidir qual a forma de reparação que melhor lhe 
 convém, isto é, a optar entre o recebimento da sua pensão em duodécimos e o 
 recebimento de um capital de remição, ponderando os riscos inerentes à sua 
 aplicação. 
 Em abono de tal entendimento, transcreve-se uma passagem do douto Acórdão do 
 Tribunal Constitucional n.º 379/2002, Proc. 172/02, de 26/2/2002, publicado no 
 D.R. II, 290, de 16/1/2002 (citado, aliás, no Ac. n.º 56/03 supra referido), que 
 embora se tivesse pronunciado pela conformidade constitucional da remição de 
 pensões por morte de reduzido montante perspectivada sob o prisma do princípio 
 da igualdade quando comparadas com outras pensões por morte que não sejam 
 consideradas de reduzido montante, não deixou de adiantar a desconformidade 
 constitucional da remição das mesmas pensões à luz do princípio da justa 
 reparação dos acidentes de trabalho: 
 
 5. – (...). 
 No caso sub judice o beneficiário da pensão não é o próprio sinistrado, uma vez 
 que este morreu, mas poder-se-á defender que, também aqui, haverá que proceder a 
 idêntica ponderação: se, face a um quadro em que as pensões tendem 
 inevitavelmente a degradar-se, se consideraram inconstitucionais as normas que 
 estabelecem «uma limitação ao poder do trabalhador de pedir ou não a remição», 
 justificar-se-ia também um juízo de inconstitucionalidade para uma interpretação 
 normativa que, por morte do trabalhador, impõe a remição obrigatória das 
 pensões, sujeitas a actualizações anuais e ajustes por idade dos beneficiários, 
 para assim se salvaguardar a liberdade de o beneficiário correr os riscos do 
 capital de remição (...). 
 A mesma ponderação é feita, num caso semelhante, no Ac. n.º 21/2003, do 
 T.Const., de 15/1/2003, publicado no D.R. II, n.º 42 de 19/2/2003, no qual se 
 refere, a dado passo, que «tal como naquelas [Acórdãos n.ºs 302/99 e 482/99] 
 anteriores decisões (face a um quadro em que as pensões tendiam inevitavelmente 
 a degradar-se) se consideraram inconstitucionais as normas que estabeleciam ‘uma 
 limitação ao poder do trabalhador de pedir ou não a remição’, dir-se-ia que 
 haveria que chegar agora a um juízo de inconstitucionalidade da interpretação da 
 norma (...) que impõe a remição obrigatória de pensões, por morte do 
 trabalhador, sujeitas a actualizações anuais e reajustes por idade dos 
 beneficiários, desde que tenham a oposição destes, para se salvaguardar a 
 liberdade de o beneficiário ‘correr os riscos de aplicação do capital de 
 remição’, como naquelas decisões». 
 Conclui-se, pois, que a interpretação do art. 56° n.º 1 al. a) do D.L. 143/99 de 
 
 30/4 no sentido de impor a remição obrigatória total, isto é independentemente 
 da vontade do titular, de pensões vitalícias atribuídas por morte aos 
 beneficiários legais do sinistrado falecido, defendida pela seguradora 
 responsável e pela Digna Procuradora da República, põe em causa o princípio 
 constitucional do direito à justa reparação por acidente de trabalho ou doença 
 profissional estabelecido no art. 59° n.º 1 al. f) da Constituição, na medida em 
 que impõe uma limitação ao direito do beneficiário-pensionista poder optar, ou 
 pela remição, ou, antes, pelo recebimento da sua pensão sob a forma de renda 
 anual. 
 
 5. Pelo exposto, considerando que a beneficiária nestes autos declarou não 
 aceitar a remição da sua pensão, decide-se não aplicar, por inconstitucional, 
 por violação do art. 59° n.º 1 al. f) da Constituição, a norma resultante do 
 art. 56° n.º 1 al. a) do D.L. 143/99 de 30/4, quando interpretada no sentido de 
 impor a remição obrigatória total, isto é independentemente da vontade do 
 titular, de pensões atribuídas por incapacidades parciais permanentes superiores 
 a 30% ou por morte, e, consequentemente, indeferir a requerida remição 
 obrigatória da pensão fixada nestes autos à beneficiária B.. 
 
 […].”.
 
  
 
 3.            Desta sentença recorreu o Ministério Público para o Tribunal 
 Constitucional, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal 
 Constitucional, pretendendo a apreciação da conformidade constitucional da norma 
 do artigo 56º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de Abril, 
 
 “quando interpretada por forma a impor a remição obrigatória total, isto é, 
 independentemente da vontade do titular, de pensões atribuídas por incapacidades 
 parciais permanentes superiores a 30% ou por morte” (fls. 298).
 
  
 
                  O recurso foi admitido por despacho de fls. 303.
 
  
 
  
 
 4.            Nas alegações (fls. 310 e seguintes), concluiu assim o Ministério 
 Público:
 
  
 
 “1 – Face à firme corrente jurisprudencial, formada na esteira do decidido no 
 acórdão n.º 56/05, não se conforma com o princípio constitucional da justa 
 reparação dos danos emergentes de acidentes laborais, estabelecido no artigo 
 
 59°, n.º 1, alínea f) da Constituição da República Portuguesa, o regime que se 
 traduz em impor ao trabalhador/sinistrado ou, no caso de morte, ao 
 familiar/beneficiário – contra a sua vontade expressa no processo – a 
 obrigatória remição das pensões vitalícias que – independentemente do seu 
 montante pecuniário – visam compensar graus elevados – superiores a 30% – de 
 incapacidade laboral. 
 
 2 – Tal entendimento tanto se justifica quanto às pensões fixadas anteriormente 
 
 à vigência do Decreto-Lei n.º 143/99 (previstas no artigo 74°), como às pensões 
 decorrentes de acidentes já ocorridos após vigorar este diploma legal, cuja 
 remição obrigatória está prevista e regulada no artigo 56°. 
 
 3 – Não viola o princípio da igualdade a circunstância de – em consequência da 
 remição da pensão – certos trabalhadores ou beneficiários receberem um capital 
 indemnizatório, que passam a administrar livremente, enquanto os restantes 
 continuam a receber uma indemnização expressa em pensão ou renda vitalícia, não 
 objecto de remição. 
 
 4 – Porém, a norma constante do artigo 56°, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º 
 
 143/99, ao impor, independentemente da vontade do trabalhador ou beneficiário, a 
 remição obrigatória total de pensões atribuídas por incapacidades parciais 
 permanentes superiores a 30%, ou por morte do sinistrado, ofende o princípio 
 constitucional da justa reparação de danos causados por acidentes laborais. 
 
 5 – Termos em que deverá confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade constante 
 da decisão recorrida.”.
 
  
 
                  A recorrida não contra-alegou (fls. 321).
 
  
 
                  Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
  
 II
 
  
 
  
 
 5.            Já depois da produção de alegações pelo Ministério Público, veio o 
 Tribunal Constitucional a proferir um acórdão sobre a questão de 
 constitucionalidade que constitui o objecto do presente recurso. 
 
  
 No Acórdão n.º 457/2006, de 18 de Julho (disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt), o Tribunal Constitucional julgou 
 
 “inconstitucional, por violação do artigo 59º, n.º 1, alínea f), da Constituição 
 da República Portuguesa, a norma do artigo 56º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei 
 n.º 143/99, de 30 de Abril, interpretada no sentido de impor a remição 
 obrigatória de pensões devidas por acidentes de trabalho, ocorridos 
 anteriormente à data da entrada em vigor desse diploma, de que haja resultado a 
 morte do sinistrado, que não sejam superiores a seis vezes a remuneração mínima 
 mensal garantida mais elevada à data da fixação da pensão, opondo-se o 
 beneficiário à remição”.
 
  
 
 É a seguinte a fundamentação deste acórdão:
 
  
 
 “[…]
 Conforme se refere nas alegações do Ministério Público, era sustentável – face à 
 situação de facto subjacente à decisão recorrida, reportada a acidente de 
 trabalho ocorrido em 1986 [no caso dos autos, em 1966] – que se considerasse 
 aplicável o disposto no artigo 74.º, e não directamente o estatuído no artigo 
 
 56.º, n.º 1, alínea a), do Decreto‑Lei n.º 143/99, de 30 de Abril.
 No entanto, foi esta última a norma cuja aplicação foi expressamente recusada, 
 com fundamento na sua inconstitucionalidade, pela decisão recorrida, pelo que é 
 a questão da sua conformidade constitucional que constitui objecto do presente 
 recurso, embora circunscrita à dimensão delimitada pela situação subjacente à 
 decisão. Isto é: constitui objecto do presente recurso a norma constante do 
 artigo 56.º, n.º 1, alínea a), do Decreto‑Lei n.º 143/99, de 30 de Abril, 
 interpretada no sentido de impor a remição obrigatória de pensões devidas por 
 acidentes de trabalho, ocorridos anteriormente à data da entrada em vigor desse 
 diploma, de que haja resultado a morte do sinistrado, que não sejam superiores 
 a seis vezes a remuneração mínima mensal garantida mais elevada à data da 
 fixação da pensão, opondo‑se o beneficiário à remição.
 São numerosas as decisões deste Tribunal sobre a presente problemática, embora 
 incidindo em casos em que beneficiário da pensão é o próprio sinistrado e do 
 acidente haja resultado incapacidade parcial permanente superior a 30%.
 Pelo Acórdão n.º 34/2006, na sequência do Acórdão n.º 56/2005 e das Decisões 
 Sumárias n.ºs 234/2005 e 247/2005, foi declarada «a inconstitucionalidade, com 
 força obrigatória geral, da norma constante do artigo 74.º do Decreto‑Lei n.º 
 
 143/99, de 30 de Abril, na redacção dada pelo Decreto‑Lei n.º 382‑A/99, de 22 de 
 Setembro, interpretado no sentido de impor a remição obrigatória total de 
 pensões vitalícias atribuídas por incapacidades parciais permanentes do 
 trabalhador/sinistrado, nos casos em que estas incapacidades excedam 30%, por 
 violação do artigo 59.º, n.º 1, alínea f), da Constituição da República 
 Portuguesa». Esse juízo de inconstitucionalidade foi reiterado no Acórdão n.º 
 
 73/2006 e da aludida declaração de inconstitucionalidade foi feita aplicação 
 nos Acórdãos n.ºs 82/2006 e 112/2006 e nas Decisões Sumárias n.ºs 34/2006, 
 
 36/2006, 38/2006, 39/2006, 48/2006, 76/2006, 180/2006, 219/2006 e 234/2006.
 E, relativamente à norma, ora em causa, do artigo 56.º, n.º 1, alínea a), do 
 Decreto‑Lei n.º 143/99, cuja aplicação fora recusada, com fundamento em 
 inconstitucionalidade, pelas decisões recorridas (embora se tratasse de 
 acidentes ocorridos antes da entrada em vigor desse diploma), o Tribunal 
 Constitucional, considerando transponível a fundamentação desenvolvida a 
 propósito do artigo 74.º, julgou‑a inconstitucional nos Acórdãos n.ºs 58/2006, 
 
 118/2006, 204/2006, 292/2006, 322/2006 e 323/2006. Este juízo de 
 inconstitucionalidade foi reiterado nas Decisões Sumárias n.ºs 87/2006, 
 
 102/2006, 110/2006, 111/2006, 128/2006, 129/2006, 131/2006, 144/2006, 145/2006, 
 
 148/2006, 159/2006, 160/2006, 195/2006, 207/2006, 261/2006 e 262/2006, na 
 generalidade das quais nenhuma alusão se faz à data do acidente. Constituiu 
 fundamento do juízo de inconstitucionalidade constante de todos os Acórdãos e 
 Decisões Sumárias acabados de citar a violação do artigo 59, n.º 1, alínea f), 
 da Constituição da República Portuguesa, e, nos Acórdãos n.ºs 322/2006 e 
 
 323/2006 (embora com votos dissidentes quanto a este fundamento), ainda a 
 violação do princípio da confiança.
 Recentemente, pelo Acórdão n.º 438/2006, o Tribunal Constitucional apreciou, 
 pela primeira vez, embora reportada ao artigo 74.º do citado diploma, a mesma 
 questão de inconstitucionalidade ora em causa, em que beneficiário da pensão não 
 era o sinistrado, já que do acidente resultou a sua morte, mas sim a sua viúva, 
 e decidiu «julgar inconstitucional, por violação conjugada do disposto na alínea 
 f) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição e do princípio da confiança, 
 inerente ao princípio do Estado de Direito, consagrado no artigo 2.º da 
 Constituição, a norma constante do artigo 74.º do Decreto‑Lei n.º 143/99, de 30 
 de Abril (na redacção emergente do Decreto‑Lei n.º 382‑A/99, de 22 de Setembro), 
 interpretada no sentido de impor a remição obrigatória total de pensões 
 vitalícias atribuídas por morte, opondo‑se o titular à remição, pretendida pela 
 seguradora».
 Como nesse Acórdão se reconhece, «pese embora a circunstância de o titular (por 
 direito próprio, não por sucessão) do direito à pensão não ser, aqui, o 
 trabalhador, não se afasta o critério da tutela constitucional do direito à 
 
 ‘assistência e justa reparação’ por ‘acidentes de trabalho’ para aferir a 
 validade constitucional da norma em apreciação, já que o direito a pensão 
 desempenha, no fundo, uma função de substituição da contribuição que o 
 vencimento do trabalhador significava para a subsistência do beneficiário».
 Na verdade, apesar da formulação literal do preceito constitucional («1. Todos 
 os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de 
 origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito: (…) f) A 
 assistência e justa reparação, quando vítimas de acidente de trabalho ou de 
 doença profissional.»), não parece sustentável que o direito à justa reparação 
 de acidente de trabalho fique circunscrito à pessoa do trabalhador. Nenhuma 
 razão material justificaria que, exactamente nos casos em que o sinistro laboral 
 teve mais graves consequências – a morte do trabalhador –, se tornasse mais 
 ténue a exigência constitucional da justiça da reparação.
 
 É certo que para as situações em que o beneficiário da pensão não é o 
 trabalhador sinistrado não valem todos os argumentos aduzidos na jurisprudência 
 deste Tribunal atrás citada, em especial o que apela à maior ou menor valia do 
 salário que o trabalhador poderá continuar a auferir de acordo com a sua 
 capacidade residual de trabalho.
 No entanto, o cerne do juízo de inconstitucionalidade radica em que a imposição 
 da remição de pensões, que o beneficiário já vinha auferindo e que não são de 
 reduzido montante, apesar da oposição desse beneficiário a essa remição (e, 
 assim, com desrespeito da autonomia da sua vontade), atenta a maior 
 aleatoriedade dos proventos que se poderão obter com a aplicação do capital face 
 
 à percepção regular da pensão, não assegura a «justa reparação» 
 constitucionalmente imposta.
 Neste contexto, assume relevância a consideração, exposta na passagem 
 transcrita do Acórdão n.º 438/2006, da função, que a pensão tem, de 
 substituição da contribuição que o vencimento do trabalhador significava para a 
 subsistência do beneficiário.
 Consideração que é assim desenvolvida:
 
 «Essa função é, aliás, revelada pelos termos em que o artigo 20.º da Lei n.º 
 
 100/97 define, quer o círculo dos titulares, quer as condições da sua 
 atribuição.
 Basta verificar que o direito é reconhecido a pessoas a quem o sinistrado, em 
 vida, estava legalmente obrigado a prestar alimentos ou, em certos casos, os 
 prestava de facto: cônjuge (cfr. artigos 1672.º, 1675.º, 2009.º, n.º 1, alínea 
 a), e 2015.º do Código Civil), ex‑cônjuge ou cônjuge judicialmente separado de 
 pessoas e bens com direito a alimentos (cfr. artigos 2009.º, n.º 1, alínea a), e 
 
 2016.º do Código Civil), filhos (cfr. artigos 1874.º, 1880.º, 2009.º, n.º 1, 
 alínea b), do Código Civil), ascendentes (cfr. artigo 2009.º, n.º 1, alínea b), 
 do Código Civil) e quaisquer parentes sucessíveis, desde que o sinistrado 
 
 ‘contribuísse com regularidade para o seu sustento’. No último caso, há um 
 alargamento (subjectivo) em relação ao que consta do artigo 2009.º, alíneas d) e 
 e), do Código Civil, todavia contrabalançado com a exigência acabada de referir.
 Quanto ao direito a pensão reconhecido ao unido de facto, há que ter em conta 
 que o artigo 6.º da Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, exige, como condição de 
 atribuição da pensão, a reunião das condições constantes do artigo 2020.º do 
 Código Civil, ou seja, para que o agora interessa, a titularidade do ‘direito a 
 exigir alimentos da herança do falecido’.».
 Concluindo‑se, como se conclui, que a dimensão normativa ora em apreço viola o 
 disposto no artigo 59.º, n.º 1, alínea f), da CRP, torna‑se desnecessário 
 apreciar se também ocorre violação do princípio da confiança.
 
 […].”.
 
  
 
                  É para esta fundamentação que agora também se remete, 
 confirmando-se consequentemente a decisão recorrida, na parte em que recusou a 
 aplicação, com fundamento em inconstitucionalidade, da interpretação normativa 
 que constitui o objecto do presente recurso.
 
  
 III
 
  
 
 6.            Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, o Tribunal 
 Constitucional decide:
 
  
 a)            Julgar inconstitucional, por violação do artigo 59º, n.º 1, alínea 
 f), da Constituição da República Portuguesa, a norma do artigo 56º, n.º 1, 
 alínea a), do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de Abril, interpretada no sentido de 
 impor a remição obrigatória de pensões devidas por acidentes de trabalho, 
 ocorridos anteriormente à data da entrada em vigor desse diploma, de que haja 
 resultado a morte do sinistrado, que não sejam superiores a seis vezes a 
 remuneração mínima mensal garantida mais elevada à data da fixação da pensão, 
 opondo-se o beneficiário à remição;
 
  
 b)            Consequentemente, negar provimento ao recurso, confirmando a 
 decisão recorrida, na parte impugnada.
 
  
 
  
 Lisboa, 26 de Setembro de 2006
 
  
 Maria Helena Brito
 Rui Manuel Moura Ramos
 Maria João Antunes
 Carlos Pamplona de Oliveira – com declaração
 Artur Maurício (com declaração)
 
  
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 Votei a decisão com um fundamento não totalmente coincidente.
 Entendo – conforme, aliás, já escrevi em declaração ao Acórdão n.º 204/06 –, que 
 a norma impugnada atinge elementos essenciais da pensão infortunística já 
 fixada, prejudicando de forma inadmissível a reparação a que se destina. Na 
 verdade, o modo como a pensão foi integrada no património do beneficiário 
 durante o período de tempo em que lhe foram regularmente pagas as prestações 
 pecuniárias devidas a este título, confere ao interessado o direito a não 
 sofrer, independentemente da sua vontade ou da ocorrência de uma causa 
 superveniente, inesperadas alterações no montante, na periodicidade, e na 
 regularidade do processamento desses abonos. 
 Em suma, é a violação do princípio da confiança que conduz – em minha opinião – 
 ao juízo de inconstitucionalidade da norma.
 
  
 
  
 Carlos Pamplona de Oliveira
 
  
 Declaração de Voto
 
  
 Muito embora aceite um julgamento de inconstitucionalidade da norma em causa, na 
 dimensão apreciada, com o fundamento autónomo da violação do artigo 59º, nº 1, 
 alínea f), da Constituição, entendo na linha dos Acórdãos nºs. 322/06 e 323/06, 
 que subscrevi, que se verifica igualmente a violação do referido preceito 
 constitucional em conjugação com o princípio da confiança.
 
  
 
                                                                                  
 
   Artur Maurício