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Processo nº 562/2006
 
 2ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria Fernanda Palma
 
  
 
  
 Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 I
 Relatório
 
  
 
 1.  A. foi condenado, por acórdão do Tribunal do Círculo Judicial de Tomar, de 4 
 de Abril de 2005, como autor material de um crime de burla agravada, na pena de 
 
 3 anos de prisão.
 O arguido interpôs recurso da decisão condenatória para o Tribunal da Relação de 
 Coimbra. Nas respectivas alegações afirmou o seguinte:
 
  
 Uma interpretação e aplicação das normas decorrentes dos citados artigos 426.°, 
 n.° 1, do Código de Processo Penal e 105.° n.ºs 1 e 2 da Lei de Organização e 
 Funcionamento dos Tribunais Judiciais, como a que se fez nos autos, viola os 
 princípios e garantias de defesa do arguido, consignados no 
 n.° 1 do artigo 32.° da Constituição da República Portuguesa, na exacta medida 
 em que a forma de composição de um Tribunal Colectivo constitui uma garantia de 
 qualificação do tribunal e logo também, ainda que reflexamente, uma garantia de 
 defesa do arguido.
 
  
 Nas conclusões das alegações reiterou do seguinte modo o que anteriormente havia 
 dito:
 
  
 Uma aplicação das normas decorrentes dos artigos 426.°, n.° 1, do Código de 
 Processo Penal e 105.° 1 e 2 da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais 
 Judiciais, como a que se fez nos autos, viola os princípios e garantias de 
 defesa do arguido, consignados no n.° 1 do artigo 32.° da Constituição da 
 República Portuguesa, inconstitucionalidade incidental que se invoca para todos 
 os efeitos legais.
 
  
 
  
 O Tribunal da Relação de Coimbra, por acórdão de 26 de Abril de 2006 (fls. 1345 
 ss.), negou provimento ao recurso, confirmando o acórdão condenatório.
 
  
 
  
 
 2.  O arguido interpôs recurso de constitucionalidade nos seguintes termos:
 
  
 A., solteiro, técnico de contas, titular do Bilhete de Identidade n.° ……., de 
 
 ../../…. - Lisboa, residente na Rua … , 2300-456, Tomar, notificado do douto 
 acórdão de 26/04/2006, que o condenou em pena de prisão e em indemnização cível 
 com o qual se não pode conformar, vem do mesmo interpor recurso para o Venerando 
 Tribunal Constitucional, limitado às questões de constitucionalidade levantadas 
 no decurso do processo, o que faz nos termos e com os seguintes fundamentos: 
 
 1.º
 Nas alegações do recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra o recorrente 
 escreveu que: 
 Uma aplicação das normas decorrentes dos artigos 426.°, n.° 1, do Código de 
 Processo Penal e l05.° n.°s 1 e 2 da Lei de Organização e Funcionamento dos 
 Tribunais Judiciais, como a que se fez nos autos, viola os princípios e 
 garantias de defesa do arguido, consignados no n.° 1 do artigo 32.° da 
 Constituição da República Portuguesa, inconstitucionalidade incidental que se 
 invoca para todos os efeitos legais. 
 
 2.°
 O Tribunal da Relação de Coimbra não discorreu expressamente no douto acórdão 
 sobre este tema da constitucionalidade, pelo que considerou implicitamente que 
 as normas em causa não ofendem os princípios e garantias de defesa do arguido, 
 consignados no n.° 1 do artigo 32.° da Constituição da República Portuguesa. 
 
 3.º
 Assim sendo, o ora recorrente suscitou questão de constitucionalidade de normas, 
 que não obtiveram provimento, ou sequer decisão expressa específica, que abre a 
 via do recurso previsto na alínea b) do n.° 1 do artigo 70.° da Lei de 
 Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional que estabelece 
 que «Cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que 
 apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o 
 processo». 
 
 4.º
 Nos termos do disposto no artigo 105.°, n.° 2 da Lei de Organização e 
 Funcionamento dos Tribunais Judiciais «O tribunal colectivo é constituído por 
 dois juízes de círculo e pelo juiz do processo», sendo que o reenvio do processo 
 deve ser feita para Tribunal de igual categoria, o que não foi observado, pelo 
 que a interpretação e aplicação da lei feita pelo douto acórdão recorrido, ao 
 admitir impugnante Tribunal Colectivo composto apenas por um juiz de círculo, 
 com confirmação do decidido em 1.ª instância, viola as garantias de defesa 
 consignada no n.° 1 do artigo 32.° da Constituição da República Portuguesa, 
 sendo materialmente inconstitucionais as normas aplicadas que permitem tal 
 desiderato.
 
  
 Admitido o recurso de constitucionalidade (fls. 1373), o recorrente produziu 
 alegações que concluiu do seguinte modo:
 
  
 
 1ª
 Nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que 
 infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados (artigo 
 
 204.° da Constituição). 
 
 2ª
 Assim, em resumo, para o recorrente o não cumprimento do comando do n.° 1 do 
 artigo 426.°- A do Código de Processo Penal, com remessa para o Tribunal mais 
 próximo de categoria e composição idênticas às do tribunal que proferiu a 
 decisão recorrida, bem como a composição ad hoc de um tribunal colectivo, com 
 apenas um juiz de circulo e dois de comarca, sendo um deles auxiliar a aguardar 
 primeira colocação, em clara violação do comando do n.° 2 do artigo 105.° da Lei 
 de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, constitui em ambos os 
 casos interpretação e aplicação daquelas normas violadora das garantias de 
 defesa consignada no n.° 1 do artigo 32.° da Constituição da República 
 Portuguesa e até mesmo do princípio da igualdade do cidadão perante a lei. 
 
  
 Termos em que, apreciadas as questões de inconstitucionalidade indicadas devem 
 as mesmas ser reconhecidas e declaradas pelo Venerando Tribunal Constitucional, 
 com as legais consequências.
 
  
 O Ministério Público contra‑alegou, concluindo o seguinte:
 
  
 Não tendo o recorrente suscitado, durante o processo e em termos processualmente 
 adequados, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, idónea para 
 servir de base ao recurso que interpôs para o Tribunal Constitucional, não 
 deverá conhecer-se do respectivo objecto.
 
  
 O recorrente não respondeu à questão prévia suscitada pelo Ministério Público.
 
  
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
  
 
 
 
 
 II
 Fundamentação
 
  
 Questão prévia
 
  
 
 3.  O Ministério Público suscitou a questão prévia da não formulação nos autos 
 de uma qualquer questão de constitucionalidade normativa. O recurso da alínea b) 
 do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, tem por pressuposto 
 processual a suscitação durante o processo da questão de constitucionalidade 
 normativa.
 Nos presentes autos, o recorrente impugnou perante o tribunal recorrido uma 
 interpretação que, alegadamente, “se fez nos autos” de um conjunto de preceitos 
 infra‑constitucionais (artigos 426º, nº 1, do Código de Processo Penal, e 105º, 
 nºs 1 e 2, da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais), sem 
 indicar de modo perceptível a específica dimensão normativa que considera 
 inconstitucional. Com efeito, o recorrente limita‑se a fazer referência à 
 interpretação realizada pelas instâncias (sem a identificar) insurgindo‑se 
 contra o modo como o tribunal foi constituído.
 A conexão que o recorrente estabelece entre os preceitos invocados e a concreta 
 situação dos autos demonstra que o recorrente apenas impugnou a forma como 
 decorreu o julgamento pelo tribunal colectivo e não uma dimensão normativa que 
 tenha sido aplicada nos autos.
 Uma vez que o recorrente não suscitou qualquer questão de constitucionalidade 
 normativa perante o tribunal recorrido, este não apreciou qualquer questão de 
 constitucionalidade normativa.
 Não tendo o recorrente suscitado durante o processo qualquer questão de 
 constitucionalidade normativa de modo adequado, não se verifica o pressuposto 
 processual do recurso da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal 
 Constitucional, pelo que não se tomará conhecimento do objecto do presente 
 recurso.
 
 
 
 
 III
 Decisão
 
  
 
 4.  Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide não tomar conhecimento 
 do objecto do presente recurso de constitucionalidade.
 
  
 
  
 Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 12  UCs. 
 Lisboa, 16 de Novembro de 2006
 Maria Fernanda Palma
 Paulo Mota Pinto
 Benjamim Rodrigues
 Mário José de Araújo Torres
 Rui Manuel Moura Ramos