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Processo n.º 954/05
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Mário Torres
 
  
 
  
 
  
 
                         Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal 
 Constitucional,
 
  
 
  
 
                1. A. vem reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no 
 n.º 3 do artigo 78.º‑A da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do 
 Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e 
 alterada, por último, pela Lei n.º 13‑A/98, de 26 de Fevereiro (LTC), da 
 decisão sumária do relator, de 30 de Novembro de 2005, que decidiu, no uso da 
 faculdade conferida pelo n.º 1 do mesmo preceito, negar provimento ao recurso 
 de constitucionalidade por ele interposto, por “não julgar inconstitucional a 
 norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal, 
 interpretada no sentido de que é inadmissível recurso para o Supremo Tribunal de 
 Justiça de acórdão condenatório proferido, em recurso, pelas Relações, que 
 confirmem (mesmo que parcialmente, desde que in melius) decisão da 1.ª 
 instância, quando o limite máximo da moldura penal dos crimes, individualmente 
 considerados, por que o arguido foi condenado não ultrapasse 8 anos de prisão”.
 
  
 
                         1.1. A decisão sumária reclamada tem o seguinte teor:
 
  
 
             “1. A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo 
 do artigo 70.°, n° 1, alínea a) [sic], da Lei de Organização, Funcionamento 
 e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de 
 Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 13‑A/98, de 26 de Fevereiro 
 
 (LTC), contra o despacho de 10 de Outubro de 2005 do Vice‑Presidente do Supremo 
 Tribunal de Justiça, que indeferiu reclamação apresentada contra o despacho do 
 Desembargador Relator do Tribunal da Relação do Porto, de 20 de Julho de 2005, 
 que não admitira, com invocação do disposto no artigo 400.º, n.º 1, alínea f), 
 do Código de Processo Penal (CPP), recurso deduzido contra acórdão dessa 
 Relação, de 27 de Outubro de 2004, que confirmara (embora parcialmente) a 
 decisão da primeira instância, sendo que nenhum dos crimes por que o arguido 
 foi condenado era passível de pena de prisão superior a oito anos.
 
             De acordo com o requerimento de interposição de recurso, o 
 recorrente pretender ver «apreciada a inconstitucionalidade do artigo 400.°, 
 n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal, quando interpretado como o foi na 
 decisão recorrida, isto é, considerando que, para efeitos de recurso, se tem de 
 atender, não ao objecto do processo, considerado aquando da acusação ou da 
 pronúncia, mas às penas parcelares aquando da decisão em primeira instância», 
 por «tal interpretação viola[r] os artigos 32.°, n.º 1, e 13.° da CRP», questão 
 de inconstitucionalidade esta que teria sido «levantada, oportunamente, no 
 processo, e designadamente na reclamação para a conferência [sic] do STJ, do 
 despacho que não admitiu o recurso que interpôs e motivou a fls. 13 216».
 
             Na aludida reclamação, o arguido expendera o seguinte:
 
  
 
             «2. O recorrente foi acusado e pronunciado por: um crime de 
 organização terrorista, previsto e punido pelo artigo 300.º, n.ºs 2, alínea a), 
 e 4, do Código Penal; um crime de extorsão, na forma continuada, previsto e 
 punido pelos artigos 79.º e 223.º, n.º 3, alínea a), do Código Penal; um crime 
 de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelos artigos 
 
 79.º, 143.º e 146.º, todos do Código Penal; um crime de coacção, na forma 
 continuada, previsto e punido pelos artigos 79.º e 154.º, n.º 1, todos do 
 Código Penal; um crime de detenção de arma proibida, na forma continuada, 
 previsto e punido pelos artigos 79.º e 275.º, n.º 1, do Código Penal; um crime 
 de dano com violência, previsto e punido pelos artigos 212.º e 214.º, n.º 1, 
 alínea a), do Código Penal.
 
             3. É jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça que, 
 para efeitos de recurso, é a acusação que define o objecto do processo.
 
             4. A título meramente exemplificativo, transcreve‑se o exarado em 
 recente acórdão da 3.ª Secção do STJ (Acórdão do STJ, de 13 de Outubro de 2004, 
 proferido no processo n.º 2152/04, da 3.ª Secção) sobre o tema:
 
  
 
             “(...) A acusação define o objecto do processo, seja esse objecto 
 entendido como o conjunto dos factos descritos e respectiva qualificação 
 jurídico‑penal; ou apenas entendido como a descrição dos factos socialmente 
 relevantes – pois é sabido que os factos poderão ser objecto de alteração (não 
 substancial) tanto no despacho de pronúncia, se a ela houver lugar – artigos 
 
 303.º e 309.º do CPP, como na audiência de julgamento, artigos 358.º e 359.º do 
 CPP –, e que o tribunal não está vinculado à qualificação jurídico‑penal dada 
 pela acusação.
 
             (...) É através do objecto do processo (acusação) que se determina 
 qual o tribunal competente (singular, colectivo...) para o julgamento e qual o 
 regime de recursos: um só grau ou dois graus – dupla jurisdição ou tripla 
 jurisdição. Tudo isto se prende, como é bom de ver, com a natureza e gravidade 
 do crime – gravidade aferida pela pena aplicável, moldura penal abstracta.
 
             Assim, definido que esteja o objecto do processo, determinadas 
 ficam desde logo as regras e os regimes do recurso atinentes a tal processo – 
 precisamente porque a lei as preestabeleceu, em obediência ao mínimo exigível, 
 v. g. princípio do juiz natural.”
 
  
 
             5. Mesmo que assim não fosse, e é, ainda assim, o recorrente tinha 
 direito a recurso para o STJ.
 
             6. Na verdade, foram-lhe aplicadas 9 penas parcelares, 
 respectivamente de 3 anos e 6 meses de prisão, 10 meses de prisão, 1 ano e 10 
 meses de prisão, 1 ano de prisão, 2 anos e 2 meses de prisão, 1 ano de prisão, 9 
 meses de prisão, 7 meses de prisão e 10 meses de prisão. Ora, as penas 
 parcelares somam 12 anos e 6 meses de prisão.
 
             7. Impõe o artigo 77.º, n.º 2, do Código Penal que a pena aplicável 
 em caso de concurso tem como limite máximo a soma das penas concretamente 
 aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos, e como limite 
 mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.
 
             8. Temos, pois, que no seu caso a moldura penal abstracta para a 
 pena concreta do concurso varia entre 42 meses e 12 anos e 6 meses.
 
             9. Logo, superior a 8 anos.
 
             10. Assim, e neste concreto caso, a moldura penal abstracta é 
 superior a 8 anos, sendo que se discute, outrossim, o cúmulo jurídico.
 
             11. De todo o modo, e como o próprio despacho reconhece, o acórdão 
 da Relação apenas confirmou parcialmente o acórdão do Tribunal Colectivo, ou 
 seja, não o confirmou. E, também assim, não deveria ter sido proferido 
 despacho de não admissão.
 
             12. De todo o modo, sobre a questão da admissibilidade do recurso, 
 já se havia pronunciado o Sr. Desembargador Relator por despacho de 7 de Março 
 de 2005, sobre o qual recaiu acórdão de 1 de Junho de 2005, não se pronunciando 
 sobre o que agora se discute, mas tão‑só sobre a matéria do invocado justo 
 impedimento.
 
             13. Está, pois, precludido o poder de a Relação ou o relator se 
 pronunciarem de novo sobre a questão da admissibilidade, sendo certo que, 
 naquela parte, o arguido recorrente não se conformou nem foi ainda 
 definitivamente convencido.
 
             14. Assim, razão não há para que o recurso não seja admitido, 
 devendo os autos prosseguir os seus trâmites normais.
 
             15. Por mera cautela, desde já se argúi a inconstitucionalidade da 
 interpretação que o M.mo Juiz Desembargador faz da alínea f) do n.º 1 do artigo 
 
 400.º do CPP, considerando que, para efeitos de recurso, se tem de atender, não 
 ao objecto do processo, considerado aquando da acusação ou da pronúncia, mas à 
 pena parcelar aquando da decisão em primeira instância, por violação dos artigos 
 
 32.º, n.º 1, e 13.º, n.º 1, da CRP.»
 
  
 
             O despacho do Vice‑Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, de 10 
 de Outubro de 2005, que indeferiu a reclamação, desenvolveu a seguinte 
 fundamentação:
 
  
 
 “II. Cumpre apreciar e decidir.
 No caso em apreço, está em causa um acórdão da Relação, proferido em processo 
 respeitante a um concurso de infracções que condenou o arguido na pena única de 
 oito anos e cinco meses de prisão. Com efeito, o referido acórdão absolveu o 
 arguido de um dos crimes de detenção de arma proibida por que vinha condenado, 
 mantendo no mais a decisão da 1.ª instância, que o condenara pela prática dos 
 seguintes crimes: um de associação criminosa, previsto e punido pelo artigo 
 
 299.º, n.º 1, do Código Penal; três de ofensa à integridade física qualificada, 
 previstos e punidos pelos artigos 143.º e 146.º, com referência à alínea g) do 
 n.° 2 do artigo 132.º do Código Penal; dois de extorsão, previstos e punidos 
 pelo artigo 223.º, n.º 1, do Código Penal; um de ofensa à integridade física 
 simples, previsto e punido pelo artigo 143.º, n.º 1, do Código Penal; e um de 
 detenção de arma proibida, previsto e punido pelo artigo 275.º, n.º 3, do Código 
 Penal.
 Assim sendo, estando em causa um acórdão da Relação proferido em processo 
 respeitante a um concurso de infracções, face ao disposto no artigo 400.º, n.º 
 
 1, alínea f), 2.ª parte, do CPP, há apenas de ter “em conta a pena aplicável a 
 cada um dos crimes”, como nos refere Germano Marques da Silva, in Curso de 
 Processo Penal, III, 2.ª edição, pág. 325, e os acórdãos deste Supremo Tribunal 
 de Justiça, de 16 de Janeiro de 2003, de 13 de Fevereiro de 2003, de 16 de Abril 
 de 2003 e de 22 de Maio de 2003, in Colectânea de Jurisprudência – Acórdãos do 
 Supremo Tribunal de Justiça, ano [XI], tomo 1, pp. 162 e ss. e 186 e ss., e tomo 
 II, pp. 163 e ss. e 190 e ss., respectivamente.
 Ora, a nenhum dos crimes abrangido pelo concurso corresponde pena superior a 
 oito anos. Hoje a jurisprudência do STJ é neste sentido. E, por força da 
 interpretação extensiva a que deve ser sujeita a regra contida na alínea f) do 
 n.º 1 do artigo 400.º do CPP, a dupla condenatória integral conforme, 
 contemplada na sua letra, abrange, por maioria de razão, a dupla condenatória 
 parcial conforme, se desta resultar redução da pena para o arguido.
 Por último, o citado artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP, quando se refere a 
 acórdão proferido em recurso pelas Relações, em processo por crime a que seja 
 aplicável pena de multa ou de prisão não superior a cinco anos, não tem em 
 vista, ao contrário do que sustenta o ora reclamante, os crimes indicados na 
 acusação, uma vez que esta, não obstante delimitar o objecto do processo, 
 apenas releva para o julgamento a que o arguido é submetido nas instâncias.
 Quanto à alegação de que a interpretação dada pelo despacho reclamado ao artigo 
 
 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP é inconstitucional, refere‑se que as garantias 
 de defesa do arguido em processo penal não incluem o terceiro grau de 
 jurisdição, por a Constituição, no seu artigo 32.º, se bastar com um segundo 
 grau, já concretizado no caso dos autos, aquando do julgamento pela Relação.
 Acresce que não se visualiza nenhuma situação de desigualdade perante terceiros, 
 uma vez que em situações como a dos autos a ninguém é conferida a possibilidade 
 de recorrer.
 Não se julga, assim, inconstitucional a norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea 
 f), do CPP.
 III. Pelo exposto, indefere-se a presente reclamação.»
 
  
 
             2. A questão de constitucionalidade suscitada pelo recorrente é de 
 considerar «simples», por já ter sido objecto de anteriores decisões do 
 Tribunal Constitucional, o que possibilita a prolação de decisão sumária, nos 
 termos do n.º 1 do artigo 78.º‑A da LTC. Anote‑se que se entende consistir mero 
 lapso a referência do recorrente a que interpunha o recurso ao abrigo da alínea 
 a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, já que, patentemente, a decisão recorrida não 
 recusou a aplicação de qualquer norma com fundamento em inconstitucionalidade. 
 O recurso é, porém, admissível ao abrigo da alínea b) do mesmo preceito.
 
             Como se referiu, a questão de constitucionalidade que constitui 
 objecto do presente recurso já por diversas foi apreciada pelo Tribunal 
 Constitucional, que sempre concluiu pela não inconstitucionalidade da norma do 
 artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP, interpretada – como o foi na decisão ora 
 recorrida – no sentido de que, em caso de concurso de infracções, é 
 relativamente às penas parcelares aplicáveis aos crimes singulares que se tem de 
 aferir a ultrapassagem do limite máximo de 8 anos de prisão, necessário para 
 abrir a via de recurso para o STJ contra acórdãos das Relações que confirmem 
 decisão da 1.ª instância.
 
             A questão foi desenvolvidamente tratada no Acórdão n.º 189/2001 
 
 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, 50.º vol., pág. 285), no qual se 
 expendeu:
 
  
 
 «A questão que o recorrente suscita na sua reclamação para o Presidente do STJ 
 
 é, afinal, a da não consagração, no caso, de um terceiro grau de jurisdição, 
 pretendendo com a interpretação normativa que considera conforme à Constituição 
 abrir esse terceiro grau de recurso.
 
             Porém, não tem razão.
 
             6. A Constituição da República Portuguesa não estabelece em nenhuma 
 das suas normas a garantia da existência de um duplo grau de jurisdição para 
 todos os processos das diferentes espécies.
 
             Importa, todavia, averiguar em que medida a existência de um duplo 
 grau de jurisdição poderá eventualmente decorrer de preceitos constitucionais 
 como os que se reportam às garantias de defesa, ao direito de acesso ao direito 
 e à tutela judiciária efectiva.
 
             Não pode deixar de se referir que a jurisprudência do Tribunal 
 Constitucional tem tratado destas matérias, estando sedimentados os seus pontos 
 essenciais.
 
             Assim, a jurisprudência do Tribunal tem perspectivado a 
 problemática do direito ao recurso em termos substancialmente diversos 
 relativamente ao direito penal, por um lado, e aos outros ramos do direito, 
 pois sempre se entendeu que a consideração constitucional das garantias de 
 defesa implicava um tratamento específico desta matéria no processo penal. A 
 consagração, após a Revisão de 1997, no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, do 
 direito ao recurso mostra que o legislador constitucional reconheceu como 
 merecedor de tutela constitucional expressa o princípio do duplo grau de 
 jurisdição no domínio do processo penal, sem dúvida, por se entender que o 
 direito ao recurso integra o núcleo essencial das garantias de defesa.
 
             Porém, mesmo aqui e face a este específico fundamento da garantia 
 do segundo grau de jurisdição no âmbito penal, não pode decorrer desse 
 fundamento que os sujeitos processuais tenham o direito de impugnar todo e 
 qualquer acto do juiz nas diversas fases processuais: a garantia do duplo grau 
 existe quanto às decisões penais condenatórias e também quanto às respeitantes à 
 situação do arguido face à privação ou restrição da liberdade ou a quaisquer 
 outros direitos fundamentais (veja‑se, neste sentido, o Acórdão n.º 265/94, in 
 Acórdãos do Tribunal Constitucional, 27.º vol., pág. 751 e seguintes).
 
             Embora o direito de recurso conste hoje expressamente do texto 
 constitucional, o recurso continua a ser uma tradução das garantias de defesa 
 consagradas no n.º 1 do artigo 32.º (O processo criminal assegura todas as 
 garantias de defesa, incluindo o recurso). Daí que o Tribunal Constitucional 
 não só tenha vindo a considerar como conformes à Constituição determinadas 
 normas processuais penais que denegam a possibilidade de o arguido recorrer de 
 determinados despachos ou decisões proferidas na pendência do processo (v. g., 
 quer de despachos interlocutórios, quer de outras decisões, Acórdãos n.ºs 
 
 118/90, 259/88 e 353/91, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 15.º, pág. 
 
 397, vol. 12.º, pág. 735, e vol. 19.º, pág. 563, respectivamente, e Acórdão n.º 
 
 30/2001, sobre a irrecorribilidade da decisão instrutória que pronuncie o 
 arguido pelos factos constantes da acusação particular quando o Ministério 
 Público acompanhe tal acusação, ainda inédito), como também tenha já entendido 
 que, mesmo quanto às decisões condenatórias, não tem que estar necessariamente 
 assegurado um triplo grau de jurisdição, assim se garantindo a todos os 
 arguidos a possibilidade de apreciação da condenação pelo STJ (veja‑se, neste 
 sentido, o Acórdão n.º 209/90, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 16.º 
 vol., pág. 553).
 
             Uma tal limitação da possibilidade de recorrer tem em vista impedir 
 que a instância superior da ordem judiciária accionada fique avassalada com 
 questões de diminuta repercussão e que já foram apreciadas em duas instâncias. 
 Esta limitação à recorribilidade das decisões penais condenatórias tem, assim, 
 um fundamento razoável.
 
             7. No caso em apreço, como se referiu, o recorrente entende que a 
 interpretação feita, na decisão recorrida, da alínea f) do n.º 1 do artigo 
 
 400.º do CPP viola os artigos 13.º, 20.º e 32.º da Constituição, uma vez que a 
 lei atende apenas como patamar máximo para não admitir o recurso a condenação 
 por crime a que seja aplicável pena não superior a 8 anos, mesmo que haja 
 concurso de infracções.
 
             O artigo 400.º do CPP foi alterado pela Lei n.º 59/98, de 25 de 
 Agosto, diploma que veio introduzir modificações no processo penal e deu à 
 alínea f) a redacção que ainda mantém. De acordo com a proposta de revisão do 
 processo penal (Proposta de Lei n.º 157/VII, Diário da Assembleia da República, 
 II Série‑A, n.º 27, de 28 de Janeiro de 1998), as modificações introduzidas na 
 legislação processual penal visavam obter melhorias nos objectivos de economia 
 processual, de eficácia e de garantia, que já informavam a anterior 
 regulamentação.
 
             Assim, e nos termos da exposição de motivos daquela proposta de lei, 
 introduziram‑se modificações destinadas a dar mais consistência e eficácia aos 
 meios disponíveis, de entre elas se assinalando as de maior relevo para o caso: 
 pretendeu‑se restituir ao STJ a função de tribunal que apenas conhece de 
 direito, mas com excepções; manteve‑se a tramitação unitária dos recursos, mas 
 sem haver um único modelo de recurso; faz‑se um uso discreto do princípio da 
 
 “dupla conforme”, harmonizando objectivos de economia processual com a 
 necessidade de limitar a intervenção do STJ a casos de maior gravidade; 
 retoma‑se a ideia da diferenciação orgânica, apenas fundada no princípio de que 
 os casos de pequena e média gravidade não devem, por norma, chegar ao Supremo 
 Tribunal de Justiça, etc. (cf., sobre esta matéria, Maia Gonçalves, Código de 
 Processo Penal Anotado, 12.ª edição, pág. 754).
 
             A norma que vem questionada refere‑se claramente à moldura geral 
 abstracta do crime que preveja pena aplicável não superior a 8 anos: é este o 
 limite máximo abstractamente aplicável, mesmo em caso de concurso de 
 infracções, que define os casos em que não é admitido recurso para o STJ de 
 acórdãos condenatórios das Relações que confirmem a decisão de primeira 
 instância.
 
             Significa isto que o patamar a partir do qual a decisão da Relação 
 
 é irrecorrível é o que fixa em pena não superior a 8 anos a pena aplicável a 
 determinado crime, independentemente de, no caso, terem sido várias as 
 infracções cometidas em concurso. Relevante, para efeitos de 
 
 (in)admissibilidade de recurso é a pena aplicável ao crime cometido e não a 
 soma das molduras abstractas de cada um dos crimes em concurso.
 
             Como já se referiu, mesmo em processo penal, a Constituição não 
 impõe ao legislador a obrigação de consagrar o direito de recorrer de todo e 
 qualquer acto do juiz e, mesmo admitindo‑se o direito a um duplo grau de 
 jurisdição como decorrência, no processo penal, da exigência constitucional 
 das garantias de defesa, tem de aceitar‑se que o legislador penal possa fixar 
 um limite acima do qual não seja admissível um terceiro grau de jurisdição: 
 ponto é que, com tal limitação se não atinja o núcleo essencial das garantias de 
 defesa do arguido.
 
             Ora, no caso dos autos, o conteúdo essencial das garantias de 
 defesa do arguido consiste no direito a ver o seu caso examinado em via de 
 recurso, mas não abrange já o direito a novo reexame de uma questão já 
 reexaminada por uma instância superior.
 
             Existe, assim, alguma liberdade de conformação do legislador na 
 limitação dos graus de recurso. No caso, o fundamento da limitação – não ver a 
 instância superior da ordem judiciária comum sobrecarregada com a apreciação de 
 casos de pequena ou média gravidade e que já foram apreciados em duas instâncias 
 
 – é um fundamento razoável, não arbitrário ou desproporcionado, e que 
 corresponde aos objectivos da última reforma do processo penal.
 
             Tem, por isso, de se concluir que a norma do artigo 400.º, n.º 1, 
 alínea f), do CPP não viola o princípio das garantias de defesa, constante do 
 artigo 32.º, n.º 1, da Constituição.
 
             8. Mas também não viola o princípio do acesso ao direito e à tutela 
 judicial efectiva, constante do artigo 20.º, nem o princípio da igualdade, 
 consagrado no artigo 13.º, ambos da Constituição.
 
             De facto, o artigo 20.º estabelece que “a todos é assegurado o 
 acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses 
 legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de 
 meios económicos” e ainda que “todos têm direito a que uma causa em que 
 intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo 
 equitativo” (n.ºs 1 e 4). Ora, no caso em apreço, a questão foi objecto de 
 apreciação por duas instâncias, pelo que não se pode afirmar que tenha havido 
 violação do preceito, uma vez que dele apenas resulta que o legislador terá de 
 assegurar imperativamente e sem restrições o acesso a um grau de jurisdição.
 
             Também quanto ao princípio da igualdade não foi violado, uma vez que 
 a limitação estabelecida na norma questionada não se afigura como arbitrária ou 
 desproporcionada, sendo admissível desde que não atinja o conteúdo essencial 
 das garantias de defesa do arguido, que, como se referiu, não abrangem o direito 
 ao exame de questão já reexaminada em duas instâncias.
 
             Por último, importa referir que a situação paralela mencionada pelo 
 recorrente – a do critério para fixação da competência dos tribunais para 
 julgamento – não tem que ser invocada para apreciar a limitação a um triplo 
 grau de jurisdição, uma vez que não se trata de situações essencialmente iguais 
 que exijam tratamento igual. No caso do artigo 14.º trata‑se da distribuição da 
 competência funcional e material entre o tribunal colectivo e o tribunal 
 singular. No caso do artigo 400.º trata‑se de uma limitação do direito de 
 recurso cujos parâmetros e finalidades são inteiramente diferentes dos que 
 subjazem à questão da distribuição de competência, pelo que não faz sentido 
 invocar aqui o princípio da igualdade.
 
             De acordo com o exposto, a norma da alínea f) do n.º 1 do artigo 
 
 400.º do CPP não viola nem o artigo 13.º nem o artigo 20.º ou o artigo 32.º, 
 todos da Constituição da República Portuguesa, não sendo assim 
 inconstitucional.»
 
  
 
             Este entendimento foi reiterado, quanto à específica interpretação 
 da norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP ora em causa, nos Acórdãos 
 n.ºs 336/2001, 369/2001, 435/2001, 490/2003 e 610/2004 (todos disponíveis em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt).
 
             Neste último Acórdão, que confirmou Decisão Sumária do ora relator, 
 e em que o então recorrente igualmente sustentava que a interpretação correcta 
 do direito ordinário deveria ser a de considerar «pena aplicável» a 
 abstractamente prevista para os crimes constantes da acusação, consignou‑se o 
 seguinte:
 
  
 
 «(...) o que o recorrente em rigor contesta é a interpretação dada pelo acórdão 
 recorrido à noção de “pena aplicável” constante da norma da alínea f) do n.º 1 
 do artigo 400.º do CPP. São conhecidos os divergentes sentidos que a essa 
 expressão têm sido dados ou propostos. O recorrente vem sustentar que “pena 
 aplicável” é a que respeita aos crimes imputados na acusação (...), e não aos 
 crimes julgados provados na decisão condenatória da 1.ª instância (...), 
 confirmada pelo acórdão da Relação da qual apenas o arguido interpôs recurso 
 para o Supremo Tribunal de Justiça.
 
             Não foi a preconizada pelo recorrente a interpretação acolhida pelo 
 acórdão recorrido e o que compete ao Tribunal Constitucional é, não aquilatar 
 da correcção dessa interpretação do direito ordinário, mas, tomando‑a como um 
 dado, apreciar se a mesma viola alguma norma ou princípio constitucionais.
 
             Nesta perspectiva, o único vector a ter em conta, como assinala o 
 Ministério Público, é o do direito ao recurso, a propósito do qual a 
 jurisprudência do Tribunal Constitucional tem reiteradamente afirmado não ser 
 constitucionalmente imposto um terceiro grau de jurisdição, mesmo em matéria 
 penal. Desta sedimentada orientação do Tribunal Constitucional resulta a 
 inexorável conclusão da não inconstitucionalidade da norma do artigo 400.º, 
 n.º 1, alínea f), do CPP, seja qual for o entendimento que se dê à expressão 
 
 “pena aplicável” (...).
 
             Ora, como se registou no citado Acórdão n.º 131/2004, é de 
 qualificar como “simples” uma questão de inconstitucionalidade sempre que da 
 adopção da fundamentação de anteriores decisões do Tribunal Constitucional 
 derive a imposição de uma determinada solução dessa questão, mesmo que nessas 
 decisões não tenham sido especificamente apreciados todos os argumentos 
 aduzidos pelo recorrente, e sobretudo quando, como no caso ocorre, a invocação 
 de novas normas e princípios constitucionais “traduzem um enquadramento 
 jurídico manifestamente inadequado”, como refere o Ministério Público. Na 
 verdade, respeitando a questão de constitucionalidade ora em apreço à 
 possibilidade de limitação dos graus de recurso em processo penal, surge como 
 manifestamente desadequado o enquadramento da questão reportado aos n.ºs 2 e 5 
 do artigo 32.º da CRP ou ao princípio da protecção da confiança e da segurança 
 jurídica consagrado no artigo 2.º da CRP (este, aliás, nem sequer invocado no 
 requerimento de interposição de recurso de constitucionalidade), com base no 
 argumento de que o objecto do processo é definido pela acusação, argumento este, 
 aliás, refutado pelo acórdão recorrido, que recordou a possibilidade de 
 alteração desse objecto e salientou o absurdo que seria o arguido, 
 
 “favorecido” pela condenação por menos crimes e por crimes menos graves do que 
 os que constavam da acusação, vir defender a possibilidade de condenação pelos 
 crimes que lhe foram imputados na acusação (...).
 
             Nada impedia, pois, que a questão suscitada a propósito do recurso 
 do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça fosse qualificada como “simples” e, 
 como tal, objecto de decisão sumária no sentido da não inconstitucionalidade da 
 norma questionada.»
 
  
 Estas considerações são inteiramente aplicáveis ao presente caso.
 
  
 
             3. Em face do exposto, decide‑se, ao abrigo do n.º 1 do artigo 
 
 78.º‑A da LTC:
 
             a) Não julgar inconstitucional a norma do artigo 400.º, n.º 1, 
 alínea f), do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de que é 
 inadmissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdão condenatório 
 proferido, em recurso, pelas Relações, que confirmem (mesmo que parcialmente, 
 desde que in melius) decisão da 1.ª instância, quando o limite máximo da moldura 
 penal dos crimes, individualmente considerados, por que o arguido foi condenado 
 não ultrapasse 8 anos de prisão; e, consequentemente,
 
             b) Negar provimento ao presente recurso, confirmando a decisão 
 recorrida, na parte impugnada.”
 
  
 
                         1.2. A reclamação do recorrente apresenta a seguinte 
 fundamentação: 
 
  
 
 “Primeiramente, entende o reclamante que a questão colocada, embora já decidida 
 por diversas vezes neste Tribunal, não é uma questão simples.
 E a primeira razão porque não é questão simples radica no próprio número de 
 vezes em que foi trazida ao Tribunal.
 O facto de ter sido decidida, pelo menos maioritariamente, no sentido ora 
 reclamado, não basta à caracterização da simplicidade da questão.
 Existem diferentes teorias e vertentes e cada caso é um caso que, salvo o devido 
 respeito, merece adequada e privativa ponderação.
 A verdade é que no STJ a matéria não é consensual, como se argumentou na 
 reclamação para o Senhor Presidente do STJ, transcrita a fls. 2 a 4 da decisão 
 reclamada.
 Sendo pacifico que é a acusação que define o objecto do processo para efeitos de 
 recurso, não se vê nem aceita como pode apenas para obviar ao julgamento em 
 segundo grau de recurso pelo STJ defender que já não é a acusação que define 
 tal objecto, mas sim cada uma das penas parcelares aplicadas.
 Tal matéria respeita a direitos fundamentais, é de especial melindre e colide 
 
 (in casu) com a liberdade das pessoas.
 Não pode fazer‑se dela um julgamento por argumentação repetitiva, mas antes 
 analisar e reanalisar em busca da decisão justa, cada vez mais justa e conforme 
 ao direito vigente.
 Longe de ser questão simples é, salvo o devido respeito, questão muito complexa.
 Por outro lado, também é pacifico que o acórdão da Relação apenas confirmou 
 parcialmente o acórdão do Tribunal Colectivo, razão por que, por este lado, não 
 
 é de aplicar aquela alínea f) do n.° 1 do artigo 400.º do Código do Processo 
 Penal, por não se verificar o requisito da confirmação exigido.
 Por fim, argumento ainda não expendido nem analisado, a interpretação que o 
 Tribunal fez da norma do artigo 400.º, n.° 1, alínea f), do Código de Processo 
 Penal, ao sufragar que é a cada uma das penas parcelares que tem que se atender 
 para efeitos de admissão de recurso para o STJ, introduz no processo penal a 
 regra potencialmente ditatorial e inimpugnável do império da 1.ª instância: 
 para evitar que o recurso de um qualquer arguido fosse apreciado pelo STJ, 
 bastaria que o Tribunal da 1.ª instância, em vez de aplicar uma pena, consoante 
 o caso, de 5 ou 8 anos, aplicasse (passe o absurdo) penas de menos 1 dia. 
 Estaria descoberta a possibilidade de impedir a verificação pelo STJ de grande 
 parte das decisões criminais e, pior que isso, sairia minado o sistema jurídico 
 no seu âmago, atenta a «lotaria» que representa o ser julgado por um ou outro 
 Tribunal, sabido que de um para outro Tribunal a medida da pena é variável.
 Não esquecendo a independência e imparcialidade dos juízes, a verdade é que 
 aceitar‑se a doutrina a que aderiu a decisão sumária de que se reclama, seria 
 deixar apenas e só nas mãos do juiz de julgamento, e só deste, determinar se uma 
 determinada pena poderia ou não ser objecto de apreciação pelo STJ.
 Ora, tal função é privativa do legislador, que não cabe aos Tribunais 
 substituir.
 Por tudo o exposto, a decisão reclamada viola efectivamente, e como se arguiu na 
 interposição de recurso, as garantias de defesa do arguido resultantes do artigo 
 
 32.º da CRP, na medida em que surge como efectivamente limitadora do direito ao 
 recurso que o Código de Processo Penal consagra e viola também o artigo 13.º da 
 CRP, no entendimento já defendido.
 Em conclusão:
 a) A douta decisão sumária de que se reclama andou mal, s. d. r., ao defender 
 que é relativamente às penas parcelares aplicáveis aos crimes singulares que se 
 tem de aferir a ultrapassagem do limite máximo de 8 anos de prisão, necessário 
 para abrir a via de recurso para o STJ contra acórdãos das Relações que 
 confirmem decisão da primeira instância.
 b) Tal matéria respeita a direitos fundamentais, é de especial melindre e colide 
 
 (in casu) com a liberdade das pessoas.
 c) Andou mal o Tribunal ao proferir decisão sumária, pois se trata de matéria 
 complexa e melindrosa e não simples como se decidiu.
 d) O acórdão da Relação apenas confirmou parcialmente o acórdão do Tribunal 
 Colectivo, razão por que, por este lado, não é de aplicar aquela alínea f) do 
 n.° 1 do artigo 400.º do Código do Processo Penal, por não se verificar o 
 requisito da confirmação exigido.
 e) Aceitar a doutrina a que aderiu a decisão sumária de que se reclama seria 
 deixar apenas e só nas mãos do juiz de julgamento, e só deste, determinar se uma 
 determinada pena poderia ou não ser objecto de apreciação pelo STJ.
 f) Ora, tal função é privativa do legislador, que não cabe aos Tribunais 
 substituir.
 g) A decisão reclamada, na interpretação que fez do artigo 400.º, n.º 1, alínea 
 f), do CPP, viola efectivamente, e como se arguiu na interposição de recurso, 
 as garantias de defesa do arguido resultantes do artigo 32.° da CRP, na medida 
 em que surge como efectivamente limitadora do direito ao recurso, que o Código 
 de Processo Penal consagra, e viola também o artigo 13.° da CRP, no entendimento 
 já defendido.”
 
  
 
                         1.3. Notificado desta reclamação, o representante do 
 Ministério Público neste Tribunal apresentou a seguinte resposta:
 
  
 
             “1.º – A presente reclamação é manifestamente improcedente.
 
             2.º – Na verdade, a argumentação do reclamante em nada abala a firme 
 corrente jurisprudencial formada acerca da questão suscitada e invocada 
 precisamente como base da decisão reclamada.”
 
  
 
                         Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
                2.1. O reclamante começa por discordar da qualificação da questão 
 de constitucionalidade que constitui objecto do presente recurso como “simples” 
 e, como tal, habilitadora da decisão do recurso por decisão sumária do relator, 
 com os argumentos de que já foi trazida numerosas vezes a este Tribunal, a 
 matéria não seria consensual no STJ, respeita a direitos fundamentais, é de 
 especial melindre e colide com a liberdade das pessoas, o que tudo implicaria 
 que a questão fosse qualificada de “complexa”.
 
                Resulta, porém, claramente do n.º 1 do artigo 78.º‑A da LTC que 
 se consideram “simples”, assim possibilitando a prolação de decisão sumária, 
 entre outras, as questões de constitucionalidade que já foram objecto de 
 anteriores decisões do Tribunal Constitucional, como manifestamente ocorre com a 
 questão objecto do presente recurso, sobre a qual já incidiram – sempre, e por 
 unanimidade, no sentido da não inconstitucionalidade da norma em causa – os 
 Acórdãos n.ºs 189/2001, 336/2001, 369/2001, 490/2003 e 616/2005 e ainda as 
 Decisões Sumárias n.ºs 143/2005 e 209/2005.
 
                A “simplicidade” da questão, por já ter sido anteriormente 
 apreciada pelo Tribunal Constitucional, em nada é afectada pelas circunstâncias 
 de alguns recorrentes continuarem a suscitá‑la, de alegadamente persistirem 
 divergências, ao nível da interpretação do direito ordinário, nos tribunais 
 judiciais, ou de a matéria regulada pela norma em causa respeitar a direito 
 fundamental.
 
                Acresce que, como se assinalou na decisão sumária ora reclamada, 
 já no Acórdão n.º 131/2004 se esclareceu que é de qualificar como “simples” uma 
 questão de inconstitucionalidade sempre que da adopção da fundamentação de 
 anteriores decisões do Tribunal Constitucional derive a imposição de uma 
 determinada solução dessa questão, mesmo que nessas decisões não tenham sido 
 especificamente apreciados todos os argumentos aduzidos pelo recorrente.
 
  
 
                2.2. Quanto ao mérito da decisão sumária reclamada, o recorrente 
 continua a insistir em argumentos que respeitam, não à conformidade 
 constitucional da interpretação normativa adoptada pela decisão recorrida (única 
 questão de que ao Tribunal Constitucional cabe conhecer), mas à correcção dessa 
 interpretação face ao direito ordinário.
 
                Ora, como já se salientou, ao Tribunal Constitucional não compete 
 apreciar a correcção da interpretação do direito ordinário feita pela decisão 
 recorrida, mas tão‑só apurar se essa interpretação, que recebe como um dado da 
 questão, é, ao não, conforme às normas e princípios constitucionais.
 
                Tudo se passa, pois, como se existisse uma norma legal que, de 
 forma clara e explícita, dissesse que não havia recurso para o STJ de acórdãos 
 das Relações que tivessem confirmado (mesmo que parcialmente, desde que in 
 melius) decisão da 1.ª instância, quando o limite máximo da moldura penal dos 
 crimes, individualmente considerados, por que o arguido fora condenado não 
 ultrapassasse 8 anos de prisão. À pergunta sobre se essa norma seria 
 inconstitucional, a resposta do Tribunal Constitucional tem sido – e continua, 
 no presente caso, a ser – negativa, pela elementar razão de que não é 
 constitucionalmente imposto, mesmo em processo penal, um terceiro grau de 
 jurisdição.
 
                O “novo argumento” esgrimido pelo reclamante, assente em 
 hipotéticos comportamentos perversos dos juízes de 1.ª instância, que 
 aplicariam penas de 5 ou 8 anos de prisão menos 1 dia só para impedir o recurso 
 dos arguidos para o STJ, é claramente irrelevante e impertinente, pois o que 
 determina, na interpretação normativa perfilhada pela decisão recorrida, a 
 recorribilidade para o STJ dos acórdãos das Relações é a moldura penal abstracta 
 dos crimes, individualmente considerados, cuja condenação foi confirmada na 2.ª 
 instância, e não a pena concretamente aplicada na 1.ª instância; com efeito, o 
 recurso seria admissível se a pena máxima aplicável a qualquer um dos crimes por 
 que o arguido foi condenado fosse igual ou superior a oito anos de prisão, 
 independentemente da pena concreta cominada na 1:ª instância e na Relação.
 
  
 
                         3. Em face do exposto, acordam em indeferir a presente 
 reclamação.
 
                         Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 
 
 20 (vinte) unidades de conta.
 Lisboa, 3 de Janeiro de 2006.
 
  
 Mário José de Araújo Torres 
 Paulo Mota Pinto
 Rui Manuel Moura Ramos